30/04/2024 - Edição 540

Poder

Ex número 1 da Polícia Federal vai ganhar R$ 56 mil em Roma

Publicado em 02/03/2018 12:00 -

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Recém-empossado no comando do Ministério Extraordinário da Segurança Pública, o ministro Raul Jungmann determinou no último dia 27 a demissão do diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, indicado por caciques do MDB para chefiar a corporação. Segovia estava à frente da PF desde novembro de 2017. Quem assumiu o cargo foi o delegado Rogério Galloro, que comandava a Secretaria Nacional de Justiça (SNJ).

A mudança ocorre após uma série de polêmicas protagonizadas pelo diretor-geral da PF. Acusado de atuar para blindar o presidente Michel Temer, Segovia afirmou em entrevista à agência de notícias Reuters que o inquérito que investiga o emedebista pelo chamado “Decreto dos Portos” poderia ser arquivado por falta de provas.

“Ali, em tese, o que a gente tem visto nos depoimentos, as pessoas têm reiteradamente confirmado que não houve nenhum tipo de corrupção, não há indícios realmente de qualquer tipo de recurso ou dinheiro envolvidos. Há muitas conversas e poucas afirmações que levem realmente a que haja um crime”, disse.

O então diretor-geral da PF também fez críticas ao trabalho do delegado Cleyber Malta Lopes, responsável pelo caso. “Ele pode ser repreendido, pode até ser suspenso dependendo da conduta que ele tomou em relação ao presidente”, afirmou.

A repercussão negativa da entrevista levou o ministro Luís Roberto Barroso, relator da investigação no Supremo Tribunal Federal (STF), a intimar Fernando Segovia a explicar suas declarações. O diretor-geral da PF respondeu que sua fala havia sido distorcida, garantindo ao ministro que não iria interferir no inquérito.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou ao Supremo que formalizasse uma ordem judicial para proibir “qualquer ato de ingerência” sobre o inquérito por parte do diretor-geral da Polícia Federal. Já nesta terça, o ministro Barroso afirmou em despacho considerar que Fernando Segovia estava “devidamente ciente de que deve se abster de qualquer pronunciamento” sobre o processo.

Boa grana

Segovia não perde por esperar. Ganha. Foi premiado por Michel Temer com o posto de adido da PF na embaixada do Brasil em Roma. Durante três anos, sua renda mensal bruta será de pouco mais de R$ 56 mil. O valor líquido ultrapassará os R$ 51 mil. A cifra equivale a uma vez e meia o salário do presidente da República e dos ministros de Estado, limitado a R$ 33,7 mil, o teto remunetário do serviço público.

Deve-se a distorção a uma rentável peculiaridade: em missão no exterior, os servidores da PF ficam em situação análoga à dos diplomatas e adidos militares. Recebem contracheques vitaminados por verbas apelidadas de “indenizatórias”. Elas tonificam a remuneração, mas não são consideradas parte do salário. Além de isentas do Imposto de Renda, estão fora do alcance do chamado “abate-teto”, uma regra que deveria engolir um pedaço dos vencimentos sempre que eles subissem no telhado.

Reação

A demissão de Segovia foi recebida com surpresa e apreensão por delegados e peritos da corporação.

O presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Edvandir Paiva, afirmou que a mudança não era esperada pela categoria.

“A gente não esperava mais essa mudança, porque toda a instabilidade criada pelas declarações do diretor-geral no carnaval foi sucedida por fatos nacionais, como a intervenção no Rio de Janeiro e a criação do Ministério da Segurança Pública. Achávamos que essa situação estava resolvida, e o doutor Segovia ficaria até o final do governo, quem sabe. Fomos pegos um pouco de surpresa”, disse.

Para o delegado, a substituição de Fernando Segovia na direção-geral da PF foi impulsionada por suas declarações polêmicas, que “o colocaram em uma situação ruim internamente” e criaram “uma crise de confiança dentro da Polícia Federal”.

Já o presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, disse esperar que o novo diretor-geral da PF atue em favor de todas as categorias da instituição, sem ceder a pautas corporativas ou pressões políticas.

“A gente sempre fica com apreensão em relação a esse tipo de mudança. Estamos acompanhando com atenção”, destacou. “Mudanças nos órgãos são coisas normais, a gente sabe que isso acontece mesmo. Mas, em qualquer processo de mudança, o que a gente sempre vai cobrar e esperar é que se garanta e assegure que o órgão continue funcionando de acordo com o interesse público, sem pautas corporativas, sem pressões políticas, que não podem influenciar no trabalho investigativo”, ponderou.

“O que a gente espera é que, independente da escolha do ministro, o diretor-geral seja um diretor-geral de todos. Nós temos, dentro da Polícia Federal, várias carreiras diferentes. O que a gente quer é que se tenha um diretor-geral que converse com todas essas carreiras, que congregue com todas. Era isso que a gente tinha no Segovia, e que a gente espera que se tenha agora também nessa gestão do Galloro”, acrescentou Camargo.

Lista tríplice

Para o delegado Edvandir Paiva, o nome de Rogério Galloro era uma escolha natural para a direção-geral da PF. Ele defendeu, no entanto, que as indicações futuras ao cargo sejam feitas segundo o modelo da lista tríplice, nos moldes das escolhas para a Procuradoria-Geral da República (PGR).

“Não é nenhuma surpresa para a categoria dos delegados que ele [Galloro] um dia pudesse ser o diretor-geral da Polícia. Não há nenhuma grande restrição ao nome dele. Vamos ver como ele irá conduzir a Polícia Federal, e esperamos que ele nos ajude, na verdade, a fortalecer a PF com um sistema de proteção, nos apoiando na criação de um mandato para o próximo diretor-geral com lista tríplice. Veja que na PGR existem esses institutos. Eles passaram recentemente por mudanças lá, inclusive em meio a denúncias contra o presidente da República, e lá não houve nenhum tipo de comoção ou de problema institucional. A Polícia Federal, como não tem essa proteção, acaba sofrendo com isso”, justificou.

O presidente da ADPF ressaltou ainda que a categoria sempre defendeu que os diretores-gerais da Polícia Federal fossem escolhidos com base em uma lista tríplice, pleito ignorado pelo governo.

“A ADPF sempre defendeu o mandato por lista tríplice, e tinha uma lista em que a primeira colocada era a delegada Erika Marena. Como não foi uma opção do governo, e nós não temos isso garantido na legislação, nos cabe receber bem o próximo diretor-geral da Polícia, dialogar com ele, e colaborar com ele no fortalecimento da PF. É isso que nos cabe nesse momento”, completou Edvandir.


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