Palavra do Editor
Publicado em 29/05/2014 12:00 -
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Normas criadas sob forte impacto emocional mais cedo ou mais tarde tendem a frustrar as expectativas, resultando em fracassos retumbantes. Nessas horas, população e parlamentares mobilizam-se para aprovar leis cujo resultado principal é quebrar o equilíbrio que idealmente existia no sistema.
Um bom exemplo é Lei da Palmada, ou Lei Menino Bernardo (em homenagem ao menino Bernardo Boldrini, assassinado no Rio Grande do Sul), que pretende fazer com que pais e educadores não possam recorrer a castigos corporais, mesmo moderados, ainda que sejam na intenção de educar as crianças.
Os principais suspeitos do assassinato de Bernardo são o pai e a madrasta, que estão presos, aguardando julgamento Ele foi morto com uma injeção letal e enterrado em uma cova. Uma barbaridade. Mas, é esta a ideia que os deputados têm de “castigo físico”? O assassinato deliberado praticado por um pai ou uma madrasta pode ser comparado a uma palmada educativa?
A Lei da Palmada diz o seguinte:
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I – castigo corporal: ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente.
II – tratamento cruel ou degradante: conduta que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente.
Art. 17-B. Os pais, integrantes da família ampliada, responsáveis ou qualquer outra pessoa encarregada de cuidar, tratar, educar ou vigiar crianças e adolescentes que utilizarem castigo corporal ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação, ou a qualquer outro pretexto estarão sujeitos às medidas previstas no art. 129, incisos I, III, IV, VI e VII, desta Lei, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.”
Será necessário estabelecer em lei o que é um castigo abusivo, violento ou cruel, o que é que humilha ou ridiculariza uma criança ou adolescente. Estamos irremediavelmente no campo das suposições e interpretações, o que tornará a aplicação desta lei um verdadeiro furdunço legal. Uma palmada se enquadra nesta lei? Uma bronca bem dada é humilhante?
No cenário mais problemático (e bastante plausível) um estranho – qualquer pessoa – que achar que os pais estão "ameaçando" ou "humilhando" seu filho, poderá denunciá-los. Um adolescente problemático poderá denunciar seus pais na primeira delegacia até mesmo inventando agressões que não ocorreram.
O assassinato deliberado praticado por um pai ou uma madrasta pode ser comparado a uma palmada educativa?
A subsecretária nacional de Direitos da Criança e do Adolescente, Carmen Oliveira, assegurou que o projeto visava reprimir as “palmadas reiteradas ou a palmada que vai à surra e que vai ao espancamento, que vai agravando a conduta de violência". Ora, não é o que diz o projeto. À letra fria da lei qualquer tapinha no bumbum será crime, O mesmo para a humilhação (repreender em público é humilhar?).
O deputado Alessandro Molon (PT), relator do projeto, também justificou na mesma linha de Carmen. “Tem criança sendo queimada com ferro, com colher, sendo espancada e morta. Não há punição para os pais, é só orientação”, afirma. Agressões deste tipo já são punidas pela Lei. Agredir alguém, qualquer indivíduo, filho ou não, é crime de lesão corporal.
Atualmente, além do ECA, cabe à Constituição e aos códigos Civil e Penal regulamentarem as relações familiares – nesse quesito entram os castigos físicos. Na prática, o pai que dá "palmadas educativas" pode ser chamado à Justiça para uma conversa com assistentes sociais e psicólogos. Quando a agressão é mais severa, ele pode perder a guarda da criança e responder criminalmente. A pena varia muito, mas, se for configurada tentativa de homicídio, ultrapassa 20 anos de prisão.
Finalmente, como diabos o governo vai provar e punir casos de simples palmadas? As próprias crianças e adolescentes vão denunciar seus pais por levarem umas palmadas na bunda?
Nos totalitarismos de direita e de esquerda os filhos costumam ser estimulados a denunciar os pais que não se adequam a visão do Estado do que seja um cidadão “correto”. O Estado, afinal de contas, deve ficar acima da família…
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