29/03/2024 - Edição 540

Artigo da Semana

Gestão do terror e resistência em tempos de fascismo

Publicado em 11/10/2018 12:00 -

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O fascismo é o regime do terror e concretiza-se sempre por fatos muito parecidos. Basta que passemos os olhos por algumas das mais famosas obras sobre o período de ascensão do nazismo (ideologia de extrema-direita[1]) para enxergarmos semelhanças com o que se passa atualmente no Brasil[2]. Os fatos estão cada dia mais próximos; avizinham-se com rapidez.

Foi ainda semana passada que uma amiga chegou-me atônita para pedir um conselho, porque estavam comentando que se o Partido dos Trabalhadores vencesse as eleições, as crianças seriam sexualmente abusadas nas escolas pelos professores – já que, supostamente, elas seriam tocadas com lascívia em sala de aula. Esse fato e o alarde em torno do suposto Kit Gay para conversão sexual das crianças (material esse que nunca existiu de fato) ilustram bem a forma de atuação do fascismo. A exploração do medo da perversão sexual e do destino da infância são eficazes meios de controle.

E assim o terror alcança seu objetivo: aterroriza e destrói as (inter)subjetividades. Ora! Se o perigo está tão próximo, que alguém nos proteja, então! O sujeito que teme assujeita-se e invoca a segurança do fascismo, porque o que se aproxima parece ser muito pior. O terror mantém os indivíduos unidos pelo medo, não pela vontade política. E é por isso que o fascismo costuma ser eleito, e não imposto.

O terror fascista no Brasil é “um museu de grandes novidades” e recobra velhas formas: o comunismo, a insegurança de sair às ruas, a infecção homossexual… É assim que estes elementos tornam-se dispositivos de controle no interior de uma maneira muito própria de sermos autoritários.

 Tudo isso com o devido apoio das instituições jurídicas as quais ainda permitem que um candidato que defenda em público o fuzilamento da “petralhada”[3] continue livremente na corrida presidencial. O Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal foram tomados pelo mesmo temor que assola a população e silenciam obedecendo ao fascismo. Porém, é preciso lembrar a lição de Hannah Arendt [4] de que “em política, obediência e apoio são a mesma coisa”.

A pergunta a qual resta é: o que nos pode livrar do fascismo? Eu respondo: a união e a resistência. Resistir ainda é possível. Recobrando novamente Hannah Arendt [5] (autora judia perseguida pelo nazismo) “já se observou muitas vezes que o terror só pode reinar absolutamente sobre homens que se isolam uns contra os outros e que, portanto, uma das preocupações fundamentais de todo governo tirânico é provocar esse isolamento. O isolamento pode ser o começo do terror; certamente é o seu solo mais fértil e sempre decorre dele. Esse isolamento é, por assim dizer, pré-totalitário; sua característica é a impotência, na medida em que a força sempre surge quando os homens trabalham em conjunto (…); os homens isolados são impotentes por definição”.

E é por o isolamento ser o “solo mais fértil” do fascismo que é preciso estabelecer alianças neste momento. As redes virtuais tornaram-se o meio por excelência de organização do fascismo. Que as conquistemos! Também as ruas precisam ser conquistadas. Não se pode deixar que o medo da violência impeça que expressemos nossa vontade política, nem que formemos redes de ação e apoio uns aos outros. Seremos os democratas que salvaremos este país!

Foram me chamar
Eu estou aqui, o que é que há?

 Emerson Erivan de Araújo Ramos – Professor universitário, mestre em Ciências Jurídicas pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba e doutorando em Sociologia pela mesma instituição.

[1] A situação política do Brasil chegou ao absurdo de ter-se que reforçar que o nacional-socialismo, em verdade, é uma ideologia de extrema-direita, e não uma forma de socialismo. É bem verdade que autores como Hannah Arendt (Origens do totalitarismo, 1989 [1951]) e Wilhelm Reich (A psicologia de massas do fascismo, 1972 [1946]) apontam semelhanças entre as formas que o nazismo e o stalinismo constituíram-se, porém se tratam de semelhanças do ponto de vista da forma de gestão da vida e da constituição do eu nos governos, jamais do ponto de vista da organização dos meios de produção.
[2] Além dos livros acima citados, merecem destaque as obras Modernidade e Holocausto (Zygmunt Bauman, 1997) e Os alemães (Norbert Elias, 1997).
[3] O que pode ser visualizado no seguinte vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=AB05-8kUuj8.
[4] Eichmann em Jerusalém: Um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Companhia das Letras, 1999, p 302.
[5] Origens do totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989 [1951], p. 526.


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