19/03/2024 - Edição 540

Ágora Digital

De analfabeto funcional para analfabeto funcional

Publicado em 15/08/2018 12:00 - Victor Barone

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Três em cada dez jovens e adultos de 15 a 64 anos no País – 29% do total, o equivalente a cerca de 38 milhões de pessoas – são considerados analfabetos funcionais. Eles têm graves dificuldades de entender conceitos simples e até de se expressar. Nada mais natural que esta forma cruel de exclusão cidadã se reflita, também, nas candidaturas a presidência da República.

A qualidade do debate proposto pela extrema direita nestas eleições é, em parte, resultado disso e ameaça nivelar muito por baixo a troca de ideias e propostas que deveria nortear a disputa presidencial.  O deputado federal Cabo Daciolo (Patriota) e seu colega de Câmara, Jair Bolsonaro (PSL), têm protagonizado um show de sandices que ecoa nas fatias menos civilizadas da população e enchem de esperança e orgulho os analfabetos da democracia, escolarizados ou não.

No debate da Band, por exemplo, Daciolo apregoou que o Brasil tem “400 bilhões de sonegadores”. Isto é, quase 53 vezes a população planetária. Bolsonaro, por sua vez, tentou explicar o significado da palavra indolência. “É a capacidade de perdoar? Veja aí no dicionário. É a capacidade de perdoar? O índio perdoa”, afirmou, esculhambando a língua portuguesa para reinterpretar a fala do seu vice, general Antonio Hamilton Mourão, sobre a “indolência” indígena como herança nefasta dos brasileiros.

Também na Band, indagado sobre seu programa para o ensino, Bolsonaro respondeu que cada capital terá um colégio militar. Foi a meta mais ambiciosa mencionada pelo candidato (veja abaixo).

Ainda no debate, Daciolo provocou Ciro Gomes sobre a “Ursal”, a temível União das Repúblicas Socialistas da América Latina, onde bolcheviques morenos redesenhariam as fronteiras nacionais ao som de "Apenas um rapaz latino americano”. Dias mais tarde, descobriu-se que a Ursal era uma brincadeira criada 17 anos atrás por uma professora conservadora (leia mais abaxo).

Estas são apenas as mais recentes sandices dos dois patetas que disputam entre si o voto dos asnos.

No SPC

O trecho do debate dos presidenciáveis na TV Bandeirantes mais visto na semana passada no YouTube é o que Ciro Gomes, num confronto com Jair Bolsonaro, se dirige aos eleitores e diz: “Eu vou tirar o seu nome do SPC”. Confira.

Ursal

Outro campeão de audiência do debate da Band foi o o trecho em que o cabo Daciolo pergunta a Ciro sobre a Ursal.

Mas que diabo é a Ursal?

A Ursal (União das Repúblicas Socialistas da América Latina), sigla virtualmente desconhecida que virou piada nas redes sociais na semana passada após ser citada por Cabo Daciolo (Patriota) no primeiro debate na TV (leia a nota acima), é uma “ficção” criada há 17 anos pela socióloga e professora universitária aposentada Maria Lucia Victor Barbosa. O termo foi inventado em 2001 como uma ironia, uma crítica a um encontro do Foro de São Paulo em Havana que ocorreu naquele ano. 

Recado da Manu pero Daciolo

Briga de cachorro doido

Dias após o debate da Band, aliados de Jair Bolsonaro (PSL) distribuíram vídeo no WhatsApp com ataque a Ciro Gomes (PDT). A edição do filme sugere que Ciro mentiu ao rebater o candidato cabo Daciolo (Patriota), que afirmou que o pedetista era fundador do Foro de São Paulo e o questionou sobre plano para criar a Ursal (União das Repúblicas Socialistas da América Latina). Na resposta, Ciro alegou não saber “o que é isso”, em referência à Ursal. O vídeo distribuído por aliados de Bolsonaro confronta esta fala com entrevistas em que ele afirma que já foi ao Foro “algumas vezes”, ignorando que a resposta do pedetista era sobre a suposta união socialista.

Daciolo sobe o monte

O candidato a presidente do partido Patriota, Cabo Daciolo, subiu um monte, jejuou e, de tablete em punho avisou que a sociedade secreta Illuminati vai tentar matá-lo. 

Estratégia sagrada

A atuação do cabo Daciolo (Patriota) no primeiro debate dos presidenciáveis fez do deputado um protagonista de memes, mas também rendeu a ele a pecha de escada de Jair Bolsonaro (PSL). Adilson Barroso, o presidente do partido que alçou Daciolo ao estrelato, explica que a meta é exatamente a oposta. Segundo o dirigente da sigla, o objetivo do partido é que o bombeiro roube votos de Bolsonaro por ter perfil semelhante ao do ex-capitão do Exército, que rejeitou o Patriota antes de se abrigar no PSL. “Deus tem seus desígnios e nos garantiu uma pessoa como Daciolo“, disse Barroso. De acordo com o presidente do Patriota, Daciolo pode ser uma opção para evangélicos. “Ele é verdadeiramente temente a Deus. Não nos deixou divulgar o nome dele há 50 dias porque disse que estava fazendo jejum.”

Lula candidato…

A presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Rosa Weber, decidiu manter o processo de registro de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso. Caberá a ele, um defensor ferrenho da Lei da Ficha Limpa, na qual Lula potencialmente se enquadra, analisar a documentação entregue pelo candidato e levar o caso para julgamento no plenário do TSE, composto por sete ministros. O prazo final para que o plenário julgue processos de registro de candidatura é 17 de setembro. Auxiliares de ministros dizem acreditar que haverá decisão antes do dia 31 de agosto, o que deverá impedir a participação de Lula no horário eleitoral.

Manobrando

A defesa do ex-presidente presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em ação que tratará exclusivamente da inelegibilidade do petista, pedindo à Corte que suspenda o efeito da Lei da Ficha Limpa no caso do ex-presidente.

Carmen, Esquivel e Lula

Moro intocável

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva publicou um artigo no jornal americano The New York Times dizendo que “há um golpe de direita no Brasil”. No texto, escrito da prisão, o petista faz críticas ao juiz Sérgio Moro, ao governo Temer e à imprensa brasileira. Para ele, Moro se tornou intocável. “Mas o problema não é Sr. Moro, são aqueles que o elevam a esse estado intocável: a direita e as elites neoliberais que sempre se opuseram à nossa luta por justiça social e igualdade no Brasil”, disse em trecho do texto.

Haddad nos debates

Auxiliares do PT na área jurídica já preparam argumentos para tentar garantir a participação do ex-prefeito Fernando Haddad como substituto de Lula nos debates e sabatinas. Citarão o artigo 79 da Constituição que fala do papel do vice-presidente. O texto diz que o vice deve auxiliar o presidente “sempre que por ele convocado para missões especiais”. O argumento será o de que, se empossado, o vice desempenha tal papel, por simetria seria possível fazer o mesmo no período eleitoral.

Merdalhou de vez

O candidato a presidente Ciro Gomes (PDT) fez um diagnóstico dramático da vida no Brasil e mencionou vitórias contra a ditadura e a inflação como incentivos para a renovação política. “Nós ganhamos todas, isso é importante para quem está desanimando, para quem está revoltado. Agora merdalhou geral. Não dá para dizer diferente”, resumiu em um salão na Vila Missionária, bairro no extremo sul da capital paulista.

Lula, Haddad, Temer e Bolsonaro

Ciro vingativo

Depois de assistir o PT armar a maior trairagem contra Ciro Gomes (PDT), Fernando Haddad cobrou do pedetista o apoio à sua participação nos debates presidenciais. Recebeu o troco.

''O PT é meu adversário'', declarou Ciro nesta terça-feira, antes de indagar o óbvio: “Quem é o candidato do PT à Presidência? É o Lula. Por que o Haddad vai para os debates? Compreende o que eu estou dizendo? Isso depende de mim? Então o Bolsonaro pode mandar o general [Hamilton Mourão]. É cada uma…''.

Lindona fake

 

Comendo capim

​​Imagens aéreas que vêm sendo compartilhadas em grupos de WhatsApp e em redes sociais que mostram a inscrição “Bolsonaro 2018” em lavouras são verdadeiras. O escrito em apoio ao candidato à Presidência do PSL, Jair Bolsonaro, foi feito duas vezes, em fazendas localizadas em Mato Grosso do Sul, nas cidades vizinhas de Maracaju e Sidrolândia, no fim do ano passado, na época do plantio da soja, e neste ano, no período do plantio de milho. As terras são da família Basso. Um dos proprietários, Ari Basso, é ex-prefeito de Sidrolândia. Ele foi eleito em eleição suplementar em 2013 e ficou no cargo até dezembro de 2016.

Saia justa

O debate sobre privilégios do Judiciário foi parar na sala de aula de Ricardo Lewandowski, do STF. Ele foi cobrado pelas regalias pagas a juízes por um aluno que relatava as péssimas condições em que vive na Casa do Estudante, o alojamento da Faculdade de Direito da USP. O rapaz sugeriu que o ministro fizesse uma doação no valor do auxílio-moradia à reforma do prédio e disse que ele precisa entender que não só filhos de magistrados estudam ali, mas também os “do porteiro e da empregada”.

Segundo relatos, o aluno pediu a palavra a Lewandowski para anunciar a criação de um fundo para melhorias no edifício precário que abriga estudantes que não têm onde morar. Durante a fala, ele questionou o dinheiro gasto com regalias do Judiciário e voltou as baterias contra o auxílio-moradia.

O jovem disse que um mês de auxílio-moradia (R$ 4.377) seria o suficiente para custear as bolsas de dez alunos pobres da faculdade e exortou o ministro a convencer os colegas de corte que estudaram na São Francisco a doarem o valor do benefício ao fundo pró-alojamento.

Lewandowski não interrompeu o estudante. Só ao final explicou que ministros do Supremo não recebem auxílio-moradia. Ele fez questão de detalhar a remuneração que recebe –o salário, que defendeu estar defasado, e eventualmente compensações por viagens.

O ministro dá aulas na USP há mais de 40 anos. Esta não é a primeira vez que é interpelado em sala. Ele costuma dizer que o debate é típico do ambiente acadêmico e deve ser estimulado.

Indião

O vice na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), o general da reserva Hamilton Mourão (PRTB), se autodeclarou indígena ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na semana passada, Mourão havia dito que o país herdou “indolência” do índio e “malandragem” do negro. A declaração, que causou polêmica e revolta de algumas entidades, foi feita durante evento na Câmara de Indústria e Comércio de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha.

Ciro e os picaretas

No último dia 12 de julho, num ato partidário do PDT em Fortaleza, Ciro declarou:  ''…Toda a minha agressividade é contra a ladroeira. Já fui processado pelo Michel Temer, já fui processado pelo Eduardo Cunha, já fui processado pelo Eunício Oliveira —esse aí pelo menos uns 70 processos—, mas não tem um homem de bem que tenha me levado à Justiça. Só o puro corrupto, o puro picareta, o puro assaltante dos dinheiros do povo.''

Ferrou tudo

Não há salvação com o modelo político que vigora no Brasil, disse o ministro do STF Luís Roberto Barroso em debate em São Paulo. Para o magistrado, o sistema proporcional de lista aberta adotado no país é um “desastre completo”.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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