29/03/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

O mito do voto consciente

Publicado em 12/01/2018 12:00 - Rodrigo Amém

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Ganhador do prêmio Nobel em Economia em 2017, Richard H. Thaler dedicou a sua carreira ao estudo de uma ideia que pode parecer cretinamente óbvia, mas é um verdadeiro "ovo de Colombo": os agentes centrais da Economia são seres humanos, ou seja, propensos a erros.

Pode parecer absurdo para o leigo mas, durante muito tempo, especialistas construíam seus modelos econômicos baseados na presunção de que as pessoas tomam decisões sobre finanças baseadas em lógica e racionalidade.

Existe até uma alegoria para descrever este cidadão ideal, o protagonista da maior parte dos artigos de economia, o "homo economicus". O cidadão sem impulsos, inseguranças e incongruências. O indivíduo que só toma decisões embasadas em lógica matemática. Em outras palavras, parte considerável da teoria econômica comportamental é concebida sob o ponto de vista de uma sociedade de androides. Uma coisa muito Black Mirror, mesmo.

Mas não somos andróides. A gente gasta mais do que ganha, consome mais do que precisa, vai pro Serasa, compra Gucci, Birkin, Herbalife. Somos humanos, mas não necessariamente racionais. Pelo menos não o tempo todo. Assim como nosso corpo evoluiu para correr longas distâncias, nosso cérebro evoluiu para a racionalidade.

Votaremos por protesto, por influências sociais, por preconceito, por raiva, por medo, pela promessa de uma confirmação de nossa visão de mundo. Depois, serão quatro anos raciocinando justificativas para os equívocos em nossas escolhas.

Duas habilidades que a maioria prefere exercitar esporadicamente, quando muito.

Poucas das nossas decisões são racionais ou objetivas. Somos guiados por uma bagagem que nem sequer suspeitamos carregar. Traumas, influências de grupos sociais, tradições, ignorâncias, fobias, inseguranças. Isso tudo forma aquilo que chamamos de "subjetivo".

E esse subjetivo é quem faz as escolhas por nós. O que nós racionalizamos depois, são as justificativas para esta escolha.  Pensar, nesses casos, é um exercício de confirmação, não de escrutínio.

Em 2018, seremos bombardeados com os costumeiros apelos pelo alusivo "voto consciente". Como se fosse possível virar uma chave na têmpora e passar a ver o mundo sem qualquer tipo de viés. Como se apenas Homo Economicus tivesse título de eleitor. Não é assim que caminha a humanidade.

Votaremos por protesto, por influências sociais, por preconceito, por raiva, por medo, pela promessa de uma confirmação de nossa visão de mundo. Votaremos como votou o eleitor de Trump, de Hillary, de Maluf, de Lula, de Putin. Votaremos como seres irracionais. Votaremos como seres humanos. Depois, serão quatro anos raciocinando justificativas para os equívocos em nossas escolhas.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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