25/04/2024 - Edição 540

Mato Grosso do Sul

Puccinelli recebia 30% de propina sobre valor do benefício dado a empresas, afirma delator

Publicado em 17/11/2017 12:00 -

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Segundo o pecuarista Ivanildo da Cunha Miranda, o ex-governador André Puccinelli (PMDB) embolsava 30% dos benefícios concedidos a empresas durante seu governo. A afirmação foi feita em delação da Operação Papiros de Lama, 5ª fase da Lama Asfáltica (assista os vídeos).

De acordo com a delação, o ex-governador recebeu em propina R$ 150 milhões da JBS, em 13 anos, para conceder R$ 500 milhões em impostos estaduais. Essa cobrança para concessão dos Termos de Ajustes de Regime Especial (Tares) já havia sido mencionada na delação premiada de Wesley Batista, um dos donos da JBS.

“Quem recebia o benefício fiscal, vamos dizer recebia um milhão de reais, por exemplo, desse um milhão de reais ele tinha que dar trezentos mil”, afirmou Ivanildo na delação.

O pecuarista ainda disse que assim que conheceu Joesley Batista, outro dono da JBS, o empresário doou para caixa dois meio milhão de reais.

“O então candidato me disse para procurar o Joesley que ele iria fazer uma doação para nos ajudar. Aí que eu comecei a conhecer a estrutura da parte interna da JBS. Chegando lá fui falar com o senhor Joesley, sem o André Puccinelli candidato, e o seu Joeesley falou que ia doar mais quinhentos mil reais, todos por fora, tudo em dinheiro”, afirmou.

Com o tempo, o operador de campanha do peemedebista foi ficando mais próximo e chegou a emprestar R$ 1 milhão para o então governador do estado. Mas a quitação da dívida teria sido feita pela JBS.

“O André em junho de 2007, aonde [sic] ele me falou que era muito grato pelo serviço, que eu fui muito importante e que ele queria saldar o que ele devia comigo, aquele um milhão que eu emprestei para ele. Desse 2007 até o final do ano, o repasse foi para me pagar um milhão de reais que eu tinha de crédito com ele”, disse o delator.

Papiros de Lama

Segundo a investigação da Polícia Federal, Controladoria-Geral da União (CGU) e Receita Federal, o ex-governador André Puccinelli é apontado como chefe de um esquema de propina existente há mais de 10 anos em Mato Grosso do Sul. O montante de desvio comprovado, até o momento, é de R$ 235 milhões, conforme divulgou o delegado da PF, Cléo Mazzotti.

O delegado explicou que o ex-governador mantinha as operações com empresas envolvidas na lavagem de dinheiro.

O ex-governador e o filho dele, André Puccinelli Júnior, foram presos nessa fase da operação, mas ficaram um dia no presídio e saíram após a concessão de liberdade provisória pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3).

Além das prisões, o ex-secretário-adjunto de Fazenda André Luiz Cance e os empresários João Amorim, João Baird, Mirched Jafar Júnior, Antonio Cortez e João Mauricio Cance foram levados coercitivamente para depor na sede da Superintendência da Polícia Federal da capital sul-mato-grossense.

Também foram cumpridos mandados em Nioaque e Aquidauana e em São Paulo, além dos 24 de busca e apreensão.

Desvios

A investigação apontou que os recursos eram desviados por meio do direcionamento de licitações públicas, superfaturamento de obras públicas, aquisição fictícia ou ilícita de produtos, financiamento de atividades privadas sem relação com a atividade-fim de empresas estatais, concessão de créditos tributários com vistas ao recebimento de propina e corrupção de agentes públicos.

De acordo com a PF, a propina era mascarada de diversas formas. Uma delas, era a compra, sem justificativa plausível, de obras jurídicas, por parte de empresa concessionária de serviço público e direcionamento dos lucros, por interposta pessoa, a integrante do grupo investigado.

O chefe da Controladoria-Geral da União (CGU) em Mato Grosso do Sul, José Paulo Barbiere, disse que os suspeitos deverão devolver cerca de R$ 22 milhões na forma de GRU [Guia de Recolhimento da União]. De acordo com ele, o valor é mais um prejuízo que foi causado ao funcionalismo público.

As apurações, com a quebra de sigilo fiscal e bancário, mostraram um patrimônio dos envolvidos avaliado em R$ 160 milhões.

Quem é o delator que levou Puccinelli a cadeia

Durante o período de varredura dos documentos da Operação Lama Asfáltica – iniciou no dia 9 de julho de 2015, para investigar irregularidades em obras públicas -, o pecuarista Ivanildo da Cunha Miranda procurou a Polícia Federal para ter o benefício da delação premiada.

Antes de virar produtor rural, Ivanildo se aposentou como gerente de um banco particular. Como pecuarista bem-sucedido, também comprou uma empresa em Corumbá, município na região do Pantanal de Mato Grosso do Sul, uma distribuidora de bebidas.

Ivanildo foi entrar para a política em 2006, a convite de Puccinelli, então candidato ao governo do estado pelo PMDB. O envolvimento do pecuarista foi cada vez mais profundo, tanto que chegou a fazer um empréstimo para bancar despesas de campanha do homem que seria eleito governador.

"Ele sempre estava dizendo que estava apertado por dinheiro, que as doações estavam poucas e até me solicitou nesses dias um empréstimo, no qual eu fiz um empréstimo de um milhão de reais pra ele", disse o pecuarista na delação.

Por ser homem de confiança de André, Ivanildo foi escolhido para arrecadar dinheiro junto a quatro grandes frigoríficos, entre eles a JBS. O dinheiro repassado pela empresa era caixa dois, segundo o delator.

A assessoria da J&F Investimentos, holding que responde pela JBS, informou que a empresa não vai comentar.

“Joesley me apresentou um rapaz chamado Denilto, financeiro dele, ele ligou para um rapaz chamado Florisvaldo, que depois eu ia conhecer no mesmo dia. Ele me entregou uma caixa de papelão de arquivo, daquelas quadrada, quinhentos mil reais, eu fui de avião, peguei esse negócio e entreguei pro candidato na residência dele”, disse Ivanildo

Ivanildo tinha livre acesso ao governador e sempre marcava encontros no apartamento de Puccinelli ou na Governadoria.

“Entreguei poucas vezes na Governadoria, poucas vezes. Mas entreguei 90% no apartamento dele. Têm várias pessoas lá que me viu [sic] entrando lá, os porteiros. Eu já era conhecido lá, eu ia duas vezes por mês na casa do então governador André Puccinelli”, delatou.

A função de Ivanildo era recolher propina dos frigoríficos e entregar ao governador. Por esse serviço, cobrava uma comissão alta. “Sempre, claro doutor, sempre”, respondeu o pecuarista quando questionado sobre a compensação financeira pelo serviço que prestava.

“No início era entorno do sessenta, oitenta mil do PMDB, por mês. A partir de 2010, 2011 aumentou bem mais, aí foi para duzentos, duzentos e cinquenta”, disse o delator.

Ivanildo contou que se tornou amigo de Joesley Batista, um dos donos da JBS, e ajudou o empresário a resolver um problema com um dos sócios da Eldorado Celulose, com sede em Três Lagoas, na região leste do estado, e fundada em 2010 pelo grupo J&F Investimentos.

Em nota, a Eldorado Brasil informa que “nunca teve relacionamento de qualquer natureza com Ivanildo Miranda e que, portanto, nega as referidas acusações”.

O delator afirma que recebeu um cachê altíssimo para convencer um dos sócios a vender a parte dele para o grupo J&F.

“Pediram à época, quinhentos milhões pela saída dele. Ficou de me pagar comissão, quinze milhões, na época. Resumindo, tá aqui os instrumentos de compra das ações, tá aqui a nota promissória pra o responsável me pagar dez milhões, ficou acertado dez milhões, como de fato pagou”, contou Ivanildo

Outro político

Ivanildo também trabalhou para um adversário político de André Puccinelli. Em 2012, o então senador petista Delcídio do Amaral recorreu aos serviços do operador de campanha. O dinheiro foi entregue por um conselheiro fiscal da JBS.

A assessoria de imprensa de Delcídio do Amaral informou que o ex-senador nunca recebeu dinheiro de Ivanildo. Ainda afirmou que ele já respondeu a esse questionamento na investigação sobre a JBS e que Delcídio considera a acusação um absurdo, principalmente, por que não tem adega em casa.

“O Florisvaldo me entregou um milhão de reais, eu entreguei pro Delcídio na casa dele, por sinal na casa dele você entrando tinha uma adega, ele pediu pra colocar dentro da adega, ele conferiu esse valor lá”, disse.

O delator também explicou aos policiais federais o motivo dos pedidos de propina por parte dos políticos.

“Esse candidato a governador, por exemplo, eles preparam todos os prefeitos, vereador, presidente de bairro, tudo eles preparam antes, pra quando chegar na campanha e já estar… prepara que eu digo, é dar dinheiro”, afirmou Ivanildo.


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