20/04/2024 - Edição 540

Brasil

Janot defende fim da Lava Jato antes que mãos externas a encerrem

Publicado em 30/08/2017 12:00 -

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O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu o fim da Operação Lava Jato antes que “mãos externas” a encerrem. Em evento promovido pelo jornal O Globo, Janot diz que vislumbra um possível desfecho para a operação depois que ela chegou ao alto escalão, inclusive ao presidente Michel Temer (PMDB-SP), denunciado por ele por corrupção.

Ele relatou conversa que teve no ano passado com a então vice-presidente da Câmara italiana, na Embaixada da Itália em Brasília. “Ela me disse: ‘Vai chegar um momento em que, ou o Ministério Público se programa para encerrar a investigação, ou mãos externas vão encerrá-la. Então, é melhor que o senhor faça um final programado para ela.’”

Para o procurador-geral, as delações de executivos da J&F que atingiram Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) indicam o derradeiro capítulo da operação. “Acho que a Lava Jato não pode ser uma investigação permanente. Ela não existe por si mesma, tem um escopo. A sociedade e o Estado brasileiro não podem ficar reféns de uma investigação eterna. Acredito que, com os últimos episódios, a gente vislumbre o final. Temos uma linha traçada de até onde a investigação pode ir e até onde se espera que ela vá”, afirmou.

Defesa de Raquel Dodge

Na avaliação de Janot, as investigações mostraram que debaixo do fundo do poço havia um alçapão. “Antes desses últimos episódios, nós achávamos que já tínhamos chegado ao final do poço, mas entendemos o seguinte: abriu o final do poço, tinha um alçapão; abriu o alçapão, tinha outro poço. Mas, agora, acho que é visível a linha de chegada. Já se sabe até onde vai chegar essa investigação”, acrescentou.

Embora tenha perfil diferente e tenha apoiado Nicolao Dino na disputa contra Raquel Dodge, Janot defendeu sua sucessora das críticas de que ela poderia abortar a Lava Jato. “(Mudança) de método, pode ser que sim, porque cada um tem seu método de trabalho. Agora, como meta de trabalho, acho que não muda. Todos nós somos formados na escola de Ministério Público, todos temos a mesma formação”, declarou.

Segundo o procurador-geral, que se despede do cargo no próximo dia 17, a Lava Jato não pertence ao Ministério Público mais. “Esta investigação não é do Ministério Público. É da sociedade brasileira. Existem outros órgãos com autonomia, quadros permanentes e profissionais que atuam nessa investigação. O Judiciário controla essa investigação. A sociedade brasileira está atenta. E, sobretudo, temos uma imprensa livre e muito atuante no Brasil. Não acredito que todos esses atores vão fechar os olhos para um eventual recuo na investigação. Não acredito mesmo”, declarou. “A Lava Jato não é de ninguém, hoje é do coletivo. Todo mundo se interessa, todo mundo cobra, todo mundo fala. Eu vejo (a transição na PGR) com naturalidade. Não temo”, emendou.

“Faria tudo de novo”

Janot rebateu as críticas aos termos do acordo de delação premiada com os executivos da JBS. Segundo ele, a imunidade penal garantida aos delatores não se estende a eventuais crimes que não foram citados no documento assinado pela PGR.

“Hoje faria tudo da mesma maneira. Em todas as outras colaborações, os colaboradores nos dão ciência de ilícitos cometidos. Essa era sobre ilícitos em curso, praticados por nada mais, nada menos que o presidente no exercício da Presidência da República. Um senador que teve 50 milhões de votos na última disputa pela Presidência (Aécio Neves), um deputado federal (Rodrigo Rocha Loures) e um colega infiltrado (o procurador Ângelo Goulart Villela). Tomando conhecimento disso, eu vou dizer: ‘Não vou (assinar a delação), porque não concedo imunidade, e vou deixar que os ilícitos continuem acontecendo, ou vou conceder imunidade e fazer cessar a pratica desses ilícitos?’. Ponderei e optei por atender ao que era de interesse público”, justificou.

Janot prepara segunda denúncia contra Michel Temer. A primeira, por corrupção, foi barrada pela Câmara. Além dos depoimentos dos executivos da JBS, ele deve incluir informações da delação do doleiro Lúcio Funaro, entregue por ele nesta semana ao ministro Edosn Fachin, relator da Lava Jato, para homologação.

Com esse Congresso…

Dizendo trazer experiência de quem passou pelo “Caso Banestado” – que, na década de 1990, investigou escândalo de evasão de dezenas bilhões de reais do Banco do Estado do Paraná –, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, fez duras críticas ao sistema político brasileiro.

Em sua apresentação no 9º Seminário de Transparência e Controle, em Florianópolis, na quarta-feira (30), Carlos Fernando acusou o Congresso de tramar um plano para anistiar políticos investigados dos crimes a eles imputados pela Lava Jato, medida que, segundo ele, põe em risco as apurações dos últimos três anos e meio da maior operação de combate à corrupção da história do país.

“Eles não vão arriscar perder o foro privilegiado. E será uma anistia enganosa, vão pedir pela finalidade de caixa dois para se livrarem de todos os crimes”, afirmou, sem especificar de que maneira a proposta é articulada. “Se mantivermos esse Congresso, a Lava Jato vai perecer”, acrescentou.

Segundo o procurador, as revelações da Lava Jato precisam resultar na punição dos reconhecidamente culpados para não cair em descrédito. “Precisamos de um Legislativo que não queira se anistiar de qualquer forma e de um Judiciário que não mude a jurisprudências de acordo com a cara do freguês”, declarou.

Depois do impeachment

Carlos Fernando também demonstrou incômodo com as críticas que a Lava Jato recebeu. Primeiro, da parte de petistas, que acusavam a operação de mirar somente o Partido dos Trabalhadores e os governos Lula e Dilma. E, depois, dos que se deram por satisfeitos com a saída da petista do Planalto.

“Sentimos uma mudança muito grande a partir do impeachment da presidente (Dilma). Sabemos e sempre soubemos que parte do establishment só queria retirar o Partido dos Trabalhadores do poder. Nós estamos investigando corrupção, seja de que partido for. Infelizmente, parte da comunidade jurídica, da imprensa e da população não entendia da mesma forma. Entendia que isso era apenas um movimento para tirar a presidente Dilma do poder. Isso não é fato, as investigações continuaram e revelaram fatos de outros partidos”, disse.

Para Carlos Fernando, a transparência na administração pública e as investigações são boas ferramentas para se combater a corrupção. “Mas podem representar mais corrupção se a população souber o que ocorre e nada for feito”, observou. “Nós precisamos mudar os paradigmas. Quem cumprirá a lei quando percebe que parlamentares não precisam cumprir”, emendou.


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