29/03/2024 - Edição 540

Campo Grande

O caos na saúde em Campo Grande

Publicado em 03/08/2017 12:00 -

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A saúde em Campo Grande – e por tabela, em Mato Grosso do Sul – está definhando. Desde a noite de quarta-feira (3) a Santa Casa de Campo Grande, maior hospital do Estado – não está mais recebendo pacientes. Uma faixa fixada no portão, que está fechado para a entrada de ambulâncias do Corpo de Bombeiros e do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), avisa da superlotação no Pronto-Socorro, no Centro de Terapia Intensiva (CTI) e nas alas de internação.

A direção do hospital aponta que tomou a decisão de parar de receber pacientes porque a instituição já atende acima da capacidade máxima. O superintendente do hospital, Augusto Ishy, diz que mandou ofícios para as secretarias municipal e estadual de Saúde e para o Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul (CRM-MS) para comunicar sobre a situação e pedir soluções.

“É uma medida para tentar garantir assistência e qualidade para os pacientes que já estão aqui. Tivemos que fechar o portão para que novos pacientes não entrem e desse modo possamos garantir assistência para quem já está aqui dentro”, comentou.

Em razão da falta de leitos no hospital, os pacientes muitas vezes tem sido colocados em macas nos corredores. Os números demonstram a situação da Santa Casa. No começo da noite destas quarta-feira, o Pronto-Socorro da Ortopedia estava com 15 pacientes, 9 a mais do que deveria. Na área verde estavam 49 pessoas, quando a capacidade máxima é 5.

Na área vermelha do hospital, uma sala com capacidade para atender no máximo 6 pacientes, estava com 22 e eles deveriam estar em outro lugar, no CTI, porque são considerados casos graves. Com esse setor lotado, até o centro cirúrgico tem sido usado como leito.

A situação fez a médica infectologista da Santa Casa, Priscilla Alexandrino, registrar às 18h desta quarta-feira uma boletim de ocorrência na Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário do centro da cidade (Depac Centro) para pedir a preservação de direito.

No boletim, a médica relata a situação de superlotação no Pronto-Socorro e nas alas verde e vermelha e aponta que com esse quadro a “Santa Casa apresenta-se acima da capacidade técnica resolutiva em prestar atendimento digno e preconizado para um atendimento de qualidade”.

Deslealdade

O presidente da Santa Casa, Esacheu Nascimento, disse nesta semana ao MSTV, da TV Morena, que o prefeito Marquinhos Trad (PSD) e o secretário se Saúde Marcelo Vilela Brandão não estão cumprindo acordo de repasse de verbas contratuais para o atendimento da população na unidade.

De acordo com Esacheu, desde janeiro o relacionamento do hospital enfrente dificuldade com o município porque os pagamentos estão sendo feitos sempre atrasados.

O diretor ressaltou que a insatisfação dos médicos continua pelo não pagamento em dia dos honorários. “O princípio que deve reger o contrato entre o município e a Santa Casa deve ser a lealdade, infelizmente isso não está acontecendo e está levando ao caos esse relacionamento. A Santa Casa precisa receber pelos serviços que presta”.

Ele também explicou que novas cirurgias eletivas, aqueles que dependem de agendamento, estão suspensas no hospital porque eles não têm recursos devido ao “calote” da Prefeitura para realizar os procedimentos.

Nascimento disse que só esse ano foram mais de 7 mil cirurgias e no mês de junho houveram 1.500. Ele reclama que Prefeitura deve desde maio.

Agora estão comprometidas às compras de material, de medicamentos além da permanência de pacientes dentro da unidade.

Vale lembrar que a Santa Casa não é um hospital público e como a cidade não tem unidade desse porte, vê-se obrigada há décadas a contratar a unidade para atendimento da população através de recursos públicos.

A Secretaria de Saúde mandou nota dizendo que está fazendo o possível para resolver essa situação.

Atraso no repasse

O governo de Mato Grosso do Sul está com cinco meses de atraso no repasse de transferências obrigatórias de recursos da saúde para o município de Campo Grande e a dívida já chega a aproximadamente R$ 21 milhões. A denúncia é do presidente do Conselho Municipal de Saúde da cidade, Sebastião de Campos Arinos Junor.

Em razão da grave situação, o Conselho apresentou uma moção de repúdio ao governador do estado, Reinaldo Azambuja (PSDB), na figura do secretário estadual de Saúde, Nelson Tavares, e encaminhou pedido de providências aos órgãos de controle e fiscalização, como o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MS), Ministério Público Estadual (MP-MS) e Ministério Público Federal (MPF).

A moção, conforme o presidente do Conselho Municipal de Saúde de Campo Grande foi publicada na edição de quinta-feira (3), do Diário Oficial do município (Diogrande). Para conferir a publicação clique aqui.

Ele aponta que os atrasos já estão comprometendo a assistência na média e alta complexidade. “Esse repasses são obrigatórios. Não é porque o estado é bonzinho, que pode pagar quando quer, são repasses obrigatórios. Entre eles estão recursos para as UPAs [unidades de pronto-atendimento] e para os hospitais. Tudo isso na média e alta complexidade. Tem também alguma coisa da atenção primária, para as unidades básicas de saúde, mas é pouca coisa”, explica.

Sebastião Júnior explicou que o valor mensal dos repasses de recursos do estado para o município fica entre R$ 4 milhões e R$ 5 milhões e que no sábado, 5 de agosto, vence uma nova parcela. “Se o estado não pagar [os atrasados] e não repassar a outra parcela, a dívida vai chegar a R$ 28 milhões”, alerta, completando que as informações recebidas pelo Conselho Municipal de Saúde indicam que ainda não existe previsão para a regularização dos débitos.

“O estado fala que está sem previsão para repasse. Agora como é que nós vamos tratar vidas dessa forma. Não tem como eu falar que não tem previsão. Se fossem recursos para ações preventivas, que se faz no dia a dia, ainda seria possível segurar um tempo, mas para a urgência e emergência não dá para segurar. Por isso que o Conselho Municipal repudia o secretário”, afirmou.

A prefeitura diz que tem buscado desde janeiro deste ano negociar essa situação de maneira harmônica com o governo. Admite que os atrasos têm trazido prejuízos à gestão, principalmente quanto ao pagamento dos hospitais conveniados, entre eles a própria Santa Casa. O município diz ainda que a expectativa é de que, ciente desse impacto, o estado cumpra o seu papel. “Apesar do município de Campo Grande ser gestor pleno em saúde, o SUS [Sistema Único de Saúde] é universal e os convênios com os hospitais dependem também de financiamento do estado. Essa situação atinge todas as esferas da saúde pública, desde a assistência básica até a urgência e emergência”, ressaltou a prefeitura.

Em nota, a secretaria estadual de saúde disse que vem tentando regularizar os repasses em atrasos registrados em alguns municípios de forma emergencial. Disse que essas transferências estão sendo garantidas para os serviços primordiais em saúde, não havendo interrupção nos atendimentos a população.

A secretaria diz que em Campo Grande o valor que estaria em atraso seria de R$ 8 milhões e que os recursos para os serviços estratégicos, como hospitais, alta complexidade e assistência farmacêutica estão sendo garantidos regularmente para que não ocorra impacto na oferta de serviços à população. A secretária informou ainda que já está trabalhando em um planejamento para a regularização gradativa dos débitos ainda no mês de agosto.

CRM

O presidente do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul (CRM-MS) Celso Codorniz afirmou que vai acionar o Ministério Público Estadual para acompanhar as medidas adotadas pelo município de Campo Grande para solucionar o “caos” da saúde.

“Leitos comprados pela Secretaria de Saúde na rede privada. Que a gente tenha conhecimento, neste ano não, em anos anteriores aconteceram. O conselho vai enviar ofícios com as irregularidades e pedindo uma solução imediata para isso. Vai se acionar também o Ministério Público porque é o Ministério Público que acompanha os cumprimentos das leis”, afirmou o presidente.

O conselho visitou as unidades de saúde da capital na quinta-feira (3) para analisar a situação da unidade depois da suspensão de atendimentos na Santa Casa, desde a noite de ontem, por causa da superlotação.

O relatório preliminar do CRM-MS considerou a situação da saúde da capital um caos. A gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) do maior hospital do estado é responsabilidade da prefeitura. “A Saúde não pode sozinha assumir essa responsabilidade. As outras políticas públicas têm de estar juntas”, superintendente da Secretaria Municipal de Saúde (Sesau).


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