28/03/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

O País do futuro

Publicado em 24/04/2014 12:00 - Rodrigo Amém

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O avô de um amigo meu era daquelas pessoas horríveis, que disparava preconceitos como quem cospe caroço de melancia. O mais horrendo dos seus petardos nunca me saiu da memória. Era hora do lanche e as crianças comiam biscoito com suco na cozinha. A TV ligada na sala gritava algo sobre política. Algum escândalo de corrupção, não me lembro bem. O velho levantou, veio até a cozinha e, apontando para a TV no outro cômodo, falou para a mãe do meu amigo: “Tá vendo, minha filha? É aquilo que eu te digo! Pra melhorar esse país, tinha que matar muito mais gente!”

Eu, moleque, achei aquilo perverso. Como matar gente melhora as coisas? Velho maluco! Alguns anos e horas de voo mais tarde, minha ficha caiu. A questão não é o que se perde na tragédia, mas o que se ganha.

O Brasil tem jeito e tem futuro. Só que vai piorar muito antes de melhorar.

Através da história, toda grande nação floresceu de terra arrasada, regada com sangue de sua própria gente. O parque industrial americano foi erguido da miséria da depressão e forjou a potência que hoje é polícia do mundo. A Inglaterra renasceu dos escombros da Segunda Guerra na mesma medida em que o Japão floresceu de duas bombas atômicas. A fome absoluta da Coréia do Sul pavimentou a reforma educacional que fez daquele país um dos maiores PIBs da Ásia, numa área cinco vezes menor que Minas Gerais. Chicago é uma referência mundial em arquitetura e foi reconstruída sobre as cinzas de um incêndio que destruiu a cidade.

Patriotismo é o nome que uma nação dá ao desejo de não perecer. É um eufemismo para o instinto de sobrevivência comunitária. Não tem nada a ver com esporte. Tem a ver com esperança, com amparo mútuo. Países divididos entre o conforto de alguns e o desespero de muitos tendem a patinar sem sair do lugar porque esses opostos se cancelam. A vontade de mudar e o poder de realizar criam uma inércia paralisante. Tensões sociais promovem debate, embate, combate. Mas apenas as nações dilaceradas conseguem ser solo fértil para o progresso.

Em outras palavras, o que o velho maluco queria dizer: o Brasil tem jeito e tem futuro. Só que vai piorar muito antes de melhorar.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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