28/03/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Os três filtros que você deve usar no Facebook

Publicado em 29/04/2016 12:00 - Rodrigo Amém

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Já ouviu falar dos três filtros de Sócrates? Reza a lenda que Sócrates propôs aos seus discípulos que toda informação, antes de repassada, deveria passar por três filtros: Verdade: você tem certeza que se não se trata de uma mentira? Bondade: é algo que você gostaria que dissessem sobre você? E utilidade: Esta informação pode ser útil de alguma forma? Caso o escrutínio resulte em três respostas afirmativas, parabéns. Você tem algo verdadeiro, bom e útil a dizer. Uma negativa? Guarde a informação para você, obrigado, beijo.

Claro, Sócrates era sábio, mas não era vidente. Não tenho certeza se a fofoca já havia sido inventada na sua época. Mas é certo que o Facebook e os fóruns de discussão online ainda eram realidades distantes. Discutir anonimamente com estranhos do conforto do seu lar é uma perversão recente na humanidade, como os desenhos eróticos japoneses com colegiais estupradas por tentáculos de monstros.

Hoje, muita gente confunde liberdade de expressão com o direito inalienável de ser escroto na internet. E tem gente que o faz pelo simples prazer de ser cruel com os outros. Por isso, buscam um ambiente de relativo anonimato, onde a sensação de impunidade é um convite à perversão do ódio.

Sócrates, se estivesse vivo, ficaria surpreso. Primeiro, porque seu discípulo Platão deu uma dentro com o tal mito da caverna. Só que, hoje em dia, a caverna é um quadrado preto preso na parede. Segundo, porque seus filtros precisariam ser atualizados. Humildemente, eis minha proposta para os três filtros do comentário online.

Discutir anonimamente com estranhos do conforto do seu lar é uma perversão recente na humanidade, como os desenhos eróticos japoneses com colegiais estupradas por tentáculos de monstros.

É fake?

Seu sangue ferveu com a nova bolsa prostituta que a bancada comunista/ateu/nazista passou na Câmara. Saiu num blog de nome estranhamente parecido com um grande portal de notícias. Antes de apertar o "share", que tal perder dois minutos no Google? Só pra ter certeza que a notícia que corrobora sua visão do mundo não é uma grosseira mentira. Afinal, quem mente junto, mente também.

Você usaria as mesmas palavras num almoço de família?

Talvez a única esfera social onde as pessoas ainda dão a mínima para a opinião alheia seja em família. E mesmo nelas o consenso é difícil. Então, antes de correr os dedinhos nervosos no teclado, imagine: você realmente diria "só quem precisa de ajuda do governo é vagabundo" na frente do seu tio desempregado? Ou que "todo PM é torturador e assassino" enquanto passa a salada para seu primo cadete? Se a resposta é sim, as ceias de natal na sua casa devem ser muito animadas.

Você gritaria seu tweet num ônibus lotado?

Já que a informação é verdadeira e ninguém na sua família se importaria com o tom da mensagem, vamos ao último filtro: você não teria problemas com a reação de estranhos num ambiente onde você não possa se esconder? Dizer que "bolsa família é coisa de preguiçoso" ou que "batedor de panela é um bando de corrupto desinformado" é uma generalização grosseira de problemas muito, muito complexos. E dá uma sensação gostosa extravasar nossa visão simplista da vida. Mas nada como o calor do olho no olho para nos lembrar de que estamos falando de gente real. E esse exercício, de imaginar gente de verdade no outro lado da linha, é ótimo para quem quer desenvolver um pouco de empatia pelo ser humano e deixar de xingar as sombras da caverna do discípulo de Sócrates.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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