28/03/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Os fundamentalistas do ritmo

Publicado em 24/07/2015 12:00 - Rodrigo Amém

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Vivemos uma era de transição de valores. As viúvas da incorreção política lamentam o que chamam de "patrulhamento moral". Sentem saudade das piadas de preto, de rir das bichas loucas, de xingar o juiz de retardado. Não dá mais para agarrar mulher à força na micareta. O mundo está sem graça, dizem, naquele típico tom mimado de criança quando lhe tomam os brinquedos.

Uma parcela considerável da sociedade só consegue manifestar uma pretensa superioridade acusando a inferioridade alheia. Se não é possível rir da cor da pele, da orientação sexual, da nacionalidade, da renda, do credo e da forma física, como fazer? Como é que podemos reafirmar nosso status diante dessa gentinha toda? 

Discriminar a identidade cultural ainda é um terreno fértil para a intolerância humana, frequentado por radicais das mais variadas orientações políticas, filosóficas e espirituais.

A solução não é nova. Mas, como é a que sobrou, está na moda: utilizamos a cultura como instrumento de discriminação. Gosta de sertanejo, funk, axé? Temos um termo derrogatório para você. Gosta de novela? Temos outros tantos. Filmes do Leandro Hassum? Sai de perto de mim.

Se você não ouve a música que eu ouço, vê os filmes que eu vejo ou aprecia os autores da minha estante, você é inferior, manipulável, gado de manobra de uma indústria que te alimenta com dejetos e você não tem o discernimento intelectual de perceber sua condição sub-humana. Sua arte é menor, tão pequena que nem é arte. Fala ao seu coração porque ele é simplório, incapaz de perceber as belezas da minha arte elevada. Você é menos. Eu sou mais. 

Discriminar a identidade cultural ainda é um terreno fértil para a intolerância humana, frequentado por radicais das mais variadas orientações políticas, filosóficas e espirituais. É onde coxinhas e petralhas ainda andam de mãos dadas, destilando seu desprezo pernóstico por aqueles que não compartilham seus valores.

Do outro lado, nós – os românticos e otimistas inveterados – continuamos sonhando com o dia em que ser humano nenhum será julgado pelo que move sua cabeça, seu coração ou seus quadris. 

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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