26/04/2024 - Edição 540

Especial

Coturnos assanhados

Publicado em 15/07/2022 12:00 -

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O Ministério da Defesa voltou a colocar em dúvida na quinta-feira (14), em audiência no Senado, a segurança e a confiabilidade da urna eletrônica, de forma alinhada ao presidente Jair Bolsonaro, que também vem questionando seguidas vezes o sistema de votação – sem nunca apresentar provas de fraudes.

O chefe da equipe das Forças Armadas no grupo de Fiscalização do Processo Eleitoral, coronel Marcelo Nogueira de Souza, disse aos senadores que o Ministério da Defesa estava seguro sobre a segurança da urna contra "ameaças externas", mas tinha dúvidas em relação a "uma ameaça interna".

"Em relação a essa ameaça externa, a gente considera que há, sim, um grande nível de proteção: a urna não se conecta à internet, não tem outras ligações. Realmente, para uma vulnerabilidade externa, é muito difícil. No que tange à ameaça interna ou à vulnerabilidade interna, até o momento, a gente ainda não tem disponível a documentação que nos leve a formar uma opinião conclusiva de que a solução é segura em relação à ameaça interna", afirmou. 

Souza disse que o teste de integridade das urnas, que já é feito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em uma votação paralela, deveria ser feito nas próprias sessões eleitorais. 

Atualmente, as urnas selecionadas para o teste de integridade no dia da votação são separadas e levadas aos Tribunais Regionais Eleitorais para simular votações com representantes dos partidos e servidores da Justiça Eleitoral. Os funcionários votam em cédulas de papel e depois numa urna eletrônica. O processo é gravado por câmeras, e os resultados são checados, entre cédula e o boletim de urna.

Os militares alegam que essa modalidade de teste é insuficiente. A Defesa pede que esses testes sejam feitos nas próprias sessões eleitorais, com o uso da biometria dos eleitores, para evitar, segundo o coronel Souza, a possibilidade de que "códigos maliciosos" programados para interferir no resultado somente após a coleta da biometria. Esse teste seria feito com eleitores voluntários e o resultado também não seria considerado no resultado final. 

Na opinião dos militares, a proposta ajudaria a dar mais segurança às eleições. Entretanto, nenhuma investigação oficial já detectou fraude nas urnas eletrônicas. 

"Modificaria pequenos procedimentos no que está estabelecido, mas traria um grau de segurança, um grau de certeza maior em relação à possível ameaça do código interno como ameaça de hardware", afirmou Souza.

O TSE afirma que há municípios onde não há eleitores com biometria cadastrada e que o atual modelo do teste de integridade já preserva a rotina de uma votação normal.

Na quarta-feira (13), o Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou um relatório de auditoria concluindo que o sistema eletrônico de votação é seguro e que não há riscos relevantes para a realização das eleições de outubro.

A investigação avaliou a gestão de riscos para proteção do processo eleitoral e capacidade de evitar a interrupção da normalidade das eleições contra falhas graves.

Para os auditores, o TSE possui um cronograma para aprovação de projetos de defesa cibernética e há planos de contingências para evitar a interrupção do sistema em caso de incidentes.

Ideia de jerico

O Ministro da Defesa disse que os questionamentos das Forças Armadas sobre a segurança das urnas eletrônicas não têm “viés político”.

Claro que não, deve ser viés técnico que escapou à atenção das Forças Armadas nos últimos 26 anos de uso das urnas sem que um único caso de fraude tenha ocorrido.

Curiosa, no mínimo, a fala do general em uma Comissão do Congresso. Ele disse que o protagonista da eleição é o Tribunal Superior Eleitoral como está na Constituição, mas…

Mas, propôs que por cautela se faça uma eleição paralela com o voto impresso. Seria assim: em algumas seções, eleitores que votassem eletronicamente votariam também em papel.

E assim, mais tarde, se faria uma conferência para saber se o resultado no eletrônico e no papel fora o mesmo. Se não fosse, algo estaria errado. Simples, não? E barato. Coisa de gênio.

Na verdade, coisa de quem está interessado em desacreditar o voto eletrônico pelo qual o chefe do general se elegeu cinco vezes deputado federal e uma presidente da República, sem reclamar.

A proposta não resiste a uma pergunta: quem poderia garantir que os eleitores escolhidos para votar duas vezes repetiriam o mesmo voto? E se não repetissem de pura sacanagem?

Ex-ministro da Saúde, especialista em logística, o general Eduardo Pazuello notabilizou-se por mandar para o Amazonas uma encomenda de remédios destinadas ao Acre, e por ter afirmado: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”.

Bolsonaro mandara que ele anunciasse a compra da vacina Coronavac contra a Covid-19, e ele obedeceu. Bolsonaro arrependeu-se e mandou que Pazuello recuasse, e ele obedeceu.

Nogueira é da mesma escola de Pazuello; está ali para fazer o que o seu senhor mandar, e parece não temer o ridículo.

Militares optam pela confusão

A requisição feita pelas Forças Armadas ao Tribunal Superior Eleitoral dos arquivos relacionados às eleições presidenciais de 2014 e 2018 revelam que o Ministério da Defesa escolheu um lado. Entre Bolsonaro e a Constituição, os militares optaram por se associar à confusão projetada pelo presidente. É como se o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, estivesse empenhado em converter o questionamento de Bolsonaro ao sistema eleitoral eletrônico num processo de desmoralização das Forças Armadas.

Os resultados de 2014 e 2018 são justamente os dois que Bolsonaro aponta como fraudulentos. Num, Dilma prevaleceu sobre Aécio. O PSDB exigiu auditoria independente. Obteve amplo acesso aos dados. Virou-os do avesso. Ao final, o tucanato colocou as plumas do rabo entre as pernas. Em 2018, o próprio Bolsonaro prevaleceu sobre Haddad. A esse ponto chegamos. O presidente cospe nas urnas que o elegeram. Alega que, sem fraude, teria vencido no primeiro turno. Não pediu auditoria. Intimado a apresentar provas que dizia ter, desconversou.

Bolsonaro, como se sabe, não está preocupado com eleições limpas. Inquieta-se com a sujeita que terá que aprontar caso as urnas prefiram Lula. As Forças Armadas tampouco se interessam pela verdade. Infelizmente, optaram por vincular seu prestígio cadente ao Apocalipse de Bolsonaro.

A 80 dias da eleição, a Justiça Eleitoral deveria considerar a hipótese de dar um basta na pantomima militar. As Forças Armadas foram convidadas a participar de uma comissão de transparência eleitoral do TSE no pressuposto de que se dispunham a colaborar. Tornaram-se coadjuvantes fardados de uma palhaçada presidencial.]

Na semana passada, o presidente do TSE, Edson Fachin, fez uma previsão desalentadora. Disse numa palestra nos Estados Unidos que o Brasil pode viver crise maior do que a invasão do Capitólio, sede do Legislataivo americano, por simpatizantes de um derrotado Donald Trump.

Confirmando-se os piores prognósticos, as Forças Armadas podem ser chamadas para restaurar a ordem. O chefe supremo talvez indefira o pedido. A Constituição prevê que chefes de outros Poderes podem requisitar uma GLO, operação de garantia da lei e da ordem.

No dia da eleição, estará no comando do Supremo a ministra Rosa Weber. Interrompendo-se agora a palhaçada, pode-se oferecer ao Alto Comando a oportunidade de dar meia-volta, retornando para o quadrado constitucional.

Maioria do Congresso aposta que Bolsonaro irá contestar o resultado da eleição

O presidente Jair Bolsonaro contestará o resultado das eleições de outubro. E isso provocará no país alguma forte confusão institucional.

As duas afirmações acima são certezas para a maioria dos deputados e senadores, conforme mostra a última rodada do Painel do Poder, pesquisa trimestral que o Congresso em Foco Análise realiza com 70 dos principais líderes do Congresso Nacional. Ao longo dos próximos dias, vamos publicar extratos desta última edição.

É possível obter o relatório completo da pesquisa. Veja aqui como fazer.

De acordo com a pesquisa, 54,69% dos deputados e senadores entrevistados consideram altamente provável que Bolsonaro irá incitar no Brasil um movimento semelhante ao que fez nos Estados Unidos Donald Trump depois que perdeu as eleições para Joe Biden em 2020. Nos Estados Unidos, a contestação do resultado resultou na invasão do Capitólio, sede do poder Legislativo, no dia 6 de janeiro de 2021 e na morte de cinco pessoas.

Na pesquisa, 23,44% dos parlamentares (15 respostas) dizem considerar “quase certo” que Bolsonaro irá contestar o resultado. E isso é “muito provável” para 31,25% (20 respostas). Há ainda 14,06% que consideram a hipótese “medianamente provável” (nove respostas).

“São, portanto, 68,75% de parlamentares que percebem que poderá haver a incitação de movimentos populares que questionem o resultado eleitoral. O contraponto é de 31,25% de deputados e senadores que consideram pouco provável que aconteça algo do gênero”, observa o relatório da pesquisa.

Ambiente de estresse político

A consequência clara dessa situação é que a expressiva maioria dos parlamentares acredita que isso tornará o ambiente político do país conturbado. O Painel do Poder perguntou aos deputados e senadores se eles consideram que as eleições irão acontecer normalmente ou se haverá algum tipo de estresse institucional, nada menos que 84,4% cravaram a primeira hipótese. Somente 15,6% disseram acreditar que as eleições ocorrerão normalmente (10 respostas). Mas somente 1,6% acreditam que tal estresse redundará em ruptura institucional.

Na avaliação de 48,4%, o comportamento de Bolsonaro provocará momentos de tensão durante as eleições, mas que eles serão superados rapidamente (31 respostas).  Outros 34,4% acham que o estresse acontecerá e que os problemas serão superados com dificuldade (22 respostas).

“Nenhum membro da oposição aposta na normalidade completa. E nenhum membro da base aposta na ruptura institucional definitiva, revelando uma leve polarização no padrão de respostas”, observa o relatório.

Justiça dividida entre os que temem o golpe e os que não acreditam

Ainda haverá juízes em Brasília? Ou os que existem, mas andam cercados de agentes de segurança, moram em casas monitoradas por câmeras e são os últimos a embarcar em aviões e os primeiros a desembarcar, sentem-se cada vez mais tolhidos e temem exercer seu papel com liberdade e independência?

Natural que se sintam tolhidos, mas indesculpável que cedam às pressões de um presidente da República em desespero com a derrota que se avizinha e de generais que incondicionalmente o apoiam. O Estado Maior do Exército virou um serpentário de bolsonaristas, e os que não são, calam-se e apenas observam.

O golpe que Donald Trump tentou dar no dia 6 de janeiro do ano passado naufragou porque as mais altas patentes do Exército americano e os chefes das agências de inteligência se opuseram, além do vice-presidente Mike Pence. Sem o apoio das armas, o Congresso foi invadido e tudo o mais o que se viu, mas só.

Aqui, Bolsonaro está em melhor situação do que Trump para colapsar a democracia. A maioria dos generais o segue; o vice-presidente, o atual e o aspirante a próximo, também; uma grande parcela do Congresso, uma vez assegurada a preservação do mandato, não será empecilho ao golpe; nem o aparato policial.

Não se faz mais segredo de que se conspira em reuniões de ministros no Palácio do Planalto para abortar as eleições ou para anular seus resultados caso Bolsonaro não se reeleja. Há estudos de cenários para todos os gostos, só não há para o reconhecimento da derrota e a transferência pacífica da faixa presidencial.

Se a Justiça Eleitoral não admitir que os militares participem do processo de apuração de votos, Bolsonaro poderá abdicar de sua candidatura para gerar uma comoção entre seus devotos. Se esse não for o caso, um apagão de energia poderá ocorrer em algumas regiões do país no dia do primeiro turno. Se… Se… Se… Se…

Um assessor direto de Bolsonaro, talvez mais prático do que os demais, acha que não deve ser desprezada a hipótese de um lobo solitário, ou não tão solitário assim, atentar com sucesso contra a vida de Lula. Ora, Adélio Bispo (em 6 de setembro fará quatro anos) não quase matou Bolsonaro com uma facada?

Os Kennedy, John, presidente, Robert, senador, não foram assassinados? O pastor Martin Luther King não foi? Ronald Reagan, presidente, não foi baleado e quase morreu? Os Bolsonaro apreciam muito a história dos Estados Unidos. De resto, o Brasil, hoje, é um dos países onde a venda de armas só cresce.

Por se sentirem emparedados pelas tropas de Bolsonaro e a indiferença do Congresso, os ministros do Supremo se dividem entre os que acham que devem resistir cumprindo as leis, e os que ainda dizem não acreditar que a democracia acabará golpeada. A propósito, alguns lembram a renúncia de Jânio Quadros em 1961.

Eleito com uma votação espetacular, Jânio renunciou seis meses depois alegando que o Congresso o impedia de governar. Os militares o apoiaram para que permanecesse no cargo. Jânio abandonou Brasília levando a faixa presidencial. Imaginou voltar nos braços do povo. Não voltou e teve que devolver a faixa.

O último presidente da ditadura militar de 64, o general João Baptista de Oliveira Figueiredo, recusou-se a transferir a faixa para José Sarney em 1985. Preferiu deixar o Palácio do Planalto pela porta dos fundos. Menos mal.

Lula rechaça golpe e diz que Bolsonaro faz discurso ‘típico de covarde’

O ex-presidente Lula (PT) rechaça qualquer possibilidade do presidente Jair Bolsonaro (PL) não aceitar o resultado da eleição deste ano em caso de derrota. Em entrevista ao Correio Braziliense, o petista, no entanto, reforça que o ex-capitão “faz um discurso violento, cheio de bravata, bem típico de um covarde”.

Na conversa, publicada no último dia 12, o ex-presidente também deixa dúvidas sobre o tamanho do bolsonarismo após a sua volta ao poder.

“Em qualquer País existe parte da população, uma minoria pequena, de extrema direita. A diferença é que Bolsonaro os estimulou, fez parecer bonito ser ignorante, exibir grosseria e preconceito, ser violento”, disse Lula. “Vamos ver depois da eleição como ficará o bolsonarismo”.

Para o petista, não é uma opção de Bolsonaro não aceitar o resultado das urnas e que os ensaios de ruptura democrática, como foi no 7 de setembro, “não deu certo aquela vez e não vai dar certo de novo”.

Lula ainda disse que, se eleito, pretende manter o Auxílio Brasil no valor de 600 reais.


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