29/03/2024 - Edição 540

Poder

Com veto, Bolsonaro tira da educação do pobre e põe no tanque de gasolina

Publicado em 27/06/2022 12:00 -

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Dizem que o presidente da República não gosta de ser chamado de "Robin Hood às Avessas", sempre tirando dos pobres. Mas é ele mesmo quem alimenta a alcunha ao abraçar ações como a redução do imposto de combustível negando a reposição de recursos que seriam usados em serviços públicos que beneficiam os mais vulneráveis.

No último dia 23, Jair Bolsonaro (PL) sancionou o projeto de lei que limita o ICMS sobre combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte. Mas vetou a compensação que o Congresso Nacional tinha aprovado para que estados e municípios pudessem manter os mesmos valores que desembolsavam em educação e saúde públicas antes da nova lei.

Com uma inflação que segue alta (o IPCA-15, prévia da inflação oficial, acelerou para 0,69% em junho, após registrar 0,59% em maio, acumulando 12,04% nos últimos 12 meses), Bolsonaro e seus aliados no Congresso buscam formas de reduzir o preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha.

Enquanto isso não acontece, a inflação corrói o poder de compra dos trabalhadores. Consequentemente, ele segue 34 pontos atrás de Lula (56% a 22%) entre quem ganha ate dois salários mínimos, segundo pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta.

Considerando que, em maio, os números eram de 52% a 20%, pode-se dizer que cerca de 80% dos mais pobres não estão vendo razão para votar em Bolsonaro.

No cômputo geral, Lula marca 47% e os outros concorrentes juntos, 41% (Jair é responsável por 28%), o que daria a vitória no primeiro turno ao petista. Não à toa, o governo Bolsonaro esteja tentando um aumento temporário de 50% no Auxílio Brasil, para R$ 600, para durar até o final do ano. Assim, ele teria uma boia em que se agarrar em meio à inflação alta e à fome, já que o valor de R$ 400 não faz mais diferença eleitoral diante da inflação.

Ao negar a recomposição de recursos, o presidente tenta mostrar resultados econômicos no curto prazo rifando a qualidade de vida futura da população que não pode pagar uma escola particular e não conta com um plano de saúde decente. Claro que reduzir os preços beneficia os mais vulneráveis, pois há um impacto nos alimentos. Mas não adianta descobrir um santo para cobrir o outro.

"Os vetos apresentados reforçam o nosso alerta: em vez de resolver a sério o problema, o governo apresenta paliativos que são prejudiciais", afirma o líder da minoria no Senado e relator dos projetos sobre o preço dos combustíveis, Jean Paul Prates (PT-RN).

Ele diz que a oposição vai atuar para derrubar os vetos presidenciais.

"O veto à recomposição dos recursos e da educação vai prejudicar demais esses serviços, e sabotar todos os ganhos que tivemos com o novo Fundeb. O governo prefere sacrificar a saúde e a educação pública a rediscutir a política de preços de combustíveis."

Caso tenha sucesso em alguma redução no preço do diesel, isso pode se traduzir em votos – apesar de não ser certo que os preços vão cair nas bombas na mesma proporção. O que é certo é que tirar orçamento da educação e da saúde fará com que a qualidade desses serviços caia. Alguma escola continuará sem água encanada e luz elétrica, outras não terão internet e ainda há aquelas que permanecerão sem laboratórios.

A questão é, portanto, de timing. Não tem importância tungar o povão, desde que ele só perceba isso quando for tarde demais.

Ciro Nogueira revela que Bolsonaro patrocina o caos para culpar a Petrobras

Engana-se quem imagina que o governo Bolsonaro deseja modificar a política de preços da Petrobras. O que o Planalto deseja é culpar a estatal pela inépcia que agrava a inflação dos combustíveis. O objetivo foi escancarado numa entrevista do chefe da Casa Civil Ciro Nogueira ao jornal Valor. O caos promovido por Bolsonaro ainda não reduziu um mísero centavo na bomba. Mas o ministro esclarece que a responsabilidade é da Petrobras, não do presidente.

Responsável pelo filtro de todas as propostas enviadas pelo Planalto ao Congresso, Ciro Nogueira disse ser contra a alteração do modelo que vincula os preços dos combustíveis à variação do dólar e à cotação do barril de petróleo no mercado internacional. O que seria necessário, disse o ministro, é a criação de "uma medida de transição" para atenuar as oscilações de preço provocadas pela guerra na Ucrânia.

"Eu acho que nós tínhamos que efetivamente ter tido medidas para enfrentar essa crise, como aconteceu em diversos outros países", disse o ministro. "Mas nós não encontramos sensibilidade na Petrobras, também muitas vezes por questões de CPF dos próprios gestores, que ficam preocupados com as penalidades que eles possam vir a sofrer se isso for implementado."

Ciro Nogueira exagera no cinismo. A atribuição da Petrobras, uma companhia de capital aberto, com ações na bolsa, é dar lucro, pagando impostos e dividendos ao Tesouro Nacional. Caberia ao governo utilizar os valores bilionários que recebe da estatal para criar mecanismos capazes de atenuar os efeitos da flutuação dos preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha.

O ministro também apontou a importação de quase 30% do combustível consumido no Brasil como outro entrave à superação da crise. Ele culpa os governos do PT, que desviaram o dinheiro que seria usado para construir refinarias.

"Por que nós estamos importando 30%?", pergunta o chefe da Casa Civil. "Porque as refinarias que eram para ser construídas no governo do Partido dos Trabalhadores foram desviados os seus recursos, não foram feitas. O Brasil é o único país grande no mundo que não é autossuficiente em refino. […] Hoje, nós estaríamos nesse momento de crise protegidos, se nós tivéssemos feito isso. Não fizemos."

Nesse ponto, o ministro ofende a inteligência alheia ao se eximir de responsabilidades. Sob o comando de Ciro Nogueira, o PP tornou-se sócio do petismo no assalto à Petrobras. Agora, é parceiro de Bolsonaro. Quem ouve o ministro se convence de que é falsa a impressão de que falta rumo ao governo. Percebe-se que a gestão Bolsonaro escolheu o rumo da perversão.


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