28/03/2024 - Edição 540

Artigo da Semana

Educação integral para todos

Publicado em 19/02/2015 12:00 -

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O Plano Nacional de Educação estabelece o objetivo de se chegar a 50% das escolas e 25% dos alunos da educação básica até 2024, com oferta de ensino em tempo integral. A meta seis do Plano fala em aumentar o tempo de exposição dos alunos a situações de aprendizagem e ampliar seu repertório sociocultural por meio de atividades ligadas à arte, cultura, ciência, tecnologia e esporte, em articulação com a comunidade e as famílias. Esse desafio requer uma estrutura da qual os governos hoje não dispõem e pressupõe enormes desafios técnicos e orçamentários.

O número de escolas e docentes é claramente insuficiente para dar resposta ao aumento da demanda que temos pela frente, bem como a formação dos gestores para implantar projetos de educação integral, que ofereçam formação plena em todo o país. É consenso, entretanto, que a proposta deve avançar se quisermos de fato imprimir melhorias significativas à qualidade do ensino no Brasil.

A questão que devemos encarar é que não é possível que gerações sucessivas sofram pela falta de condições para uma educação de melhor qualidade. A resolução desta equação passa pela vontade política de se dar dramática prioridade à Educação. Assumida essa prioridade, um dos caminhos é a busca de parcerias do Estado com a iniciativa privada e a sociedade civil, como já vem acontecendo no Brasil e em outras partes do mundo, onde organizações não governamentais ocupam papel de destaque na educação de crianças e jovens.

Nos EUA, um exemplo interessante vem da "Every Hour Counts" (do inglês toda hora conta) – iniciativa que apoia cidades nos seus esforços locais de ampliar as oportunidades de aprendizagens de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social, por meio da construção de redes colaborativas entre organizações da sociedade civil e governos.

A bandeira por trás desse movimento é o da promoção da equidade. Estima-se que cerca de 18 milhões de estudantes norte-americanos não dispõem de orçamento familiar para bancar atividades extracurriculares, o "after-school" (do inglês pós-escola). Por outro lado, avaliações no país tem mostrado como a exposição a essas oportunidades faz a diferença no desenvolvimento das crianças e jovens.

Frente a esse desafio, cidades americanas têm se mobilizado para coordenar de forma mais sistêmica a sua oferta de educação integral. A atuação local em rede possibilita um trabalho mais coordenado em áreas estratégicas como mapeamento de demanda e oferta, formação dos educadores e gestores, monitoramento e avaliação, articulação entre sociedade civil e o poder público.

É hora de unir esforços para que a educação integral deixe de ser uma mera intenção e não se torne um daqueles planos que não saem do papel. Os milhões de brasileiros que esperam por uma educação de qualidade merecem esta consideração.

Cada cidade define suas prioridades e forma de atuação, mas os propósitos tendem a ser os mesmos: melhoria da qualidade dos programas e maior integração entre as ONGs, que oferecem o "after-school", e as escolas públicas.

Cidades nas mais diversas regiões do país, como Boston, Nova York, Denver, New Orleans, São Francisco e Oakland já se organizaram nesse sentido, e a tendência já começa a aparecer em cidades menores. Mais recentemente, outros países, como França e Dinamarca, têm implementado iniciativas que investem na parceria das suas escolas públicas com organizações locais, como estratégia para ampliação da aprendizagem.

No Brasil, há um amplo e diverso conjunto de organizações sociais em todas as regiões que já vêm atuando em parceria com escolas públicas para oferecer atividades socioeducativas a crianças e adolescentes. O desafio é incorporá-las ao sistema educacional, de forma a potencializar e ampliar os resultados pedagógicos dessa atuação. Em algumas cidades já podemos encontrar experiências exitosas, que podem servir de inspiração a outros gestores e educadores.

O projeto de promover a qualidade da educação não pode prescindir de nenhum empenho e depende do compromisso de toda a sociedade. As boas práticas adotadas isoladamente podem ser exemplos e servir de inspiração para desenvolver soluções em cada localidade brasileira.

Estudos recentes apontam o grande potencial a ser explorado a partir do investimento em programas e projetos de educação integral para superar desigualdades no aprendizado, inclusive entre estudantes que estão na mesma sala, na mesma escola e na mesma rede.

Estudos também mostram que experiências educativas realizadas com apoio de ONGs em parceria com a escola podem ajudar a mudar práticas que criam boas condições para o aprendizado e melhoram significativamente o sucesso escolar, além de auxiliar os alunos a desenvolver habilidades intelectuais, competências sociais e emocionais. Para isso, é necessário que sejam implantadas de forma planejada, intencional e que persistam ao longo do tempo.

Para os que relutam em abraçar a ideia das parcerias, o exemplo norte-americano é mais que salutar. Ele mostra que mesmo em países ricos o Estado não recusa a colaboração da sociedade civil para implementar melhorias na educação. No Brasil, onde as restrições orçamentárias serão crescentes, não pode ser diferente.

É hora de unir esforços para que a educação integral deixe de ser uma mera intenção e não se torne um daqueles planos que não saem do papel. Os milhões de brasileiros que esperam por uma educação de qualidade merecem esta consideração.

Antonio Matias – Vice-presidente da Fundação Itaú Social e membro do conselho de governança do movimento Todos pela Educação e do conselho de orientação estratégica do Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor da USP (Ceats).


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