29/03/2024 - Edição 540

Especial

Bolsonaro prepara o terreno para a derrota

Publicado em 30/07/2021 12:00 -

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Na expectativa de aumentar a mobilização a favor do voto impresso às vésperas da discussão ser retomada na Câmara, o presidente Jair Bolsonaro dobrou a aposta contra o sistema eleitoral brasileiro. Mas mostrou, mais uma vez, que insiste em uma mentira para sustentar sua cruzada contra a urna eletrônica.

Em sua live semanal de quinta-feira (29), feita pela primeira vez com a presença da imprensa, disse ter apenas “indícios” e não provas concretas de que o sistema eletrônico de votação brasileiro ―reconhecido pelo mundo como um dos mais seguros―, foi fraudado. Os indícios apresentados foram fragmentos de notícias baseadas em vídeos da internet, que tratam de suspeitas já investigadas e desmentidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Não tem como comprovar se as eleições foram ou não foram fraudadas. São indícios. Crimes se desvenda com vários indícios”, disse presidente.

Se indício tivesse peso de prova, será que o presidente Jair Bolsonaro e seus três filhos Zero ainda estariam soltos? O pior é que nem indícios ele apresentou em duas horas de falatório ao vivo no Facebook sobre a suposta fragilidade do voto eletrônico.

Em clima de campanha, Bolsonaro disse que a um ano e meio das eleições de 2022, ele não quer problemas, quer “democracia” por isso sua insistência no voto impresso que seria a única forma de garantir transparência no sistema eleitoral. “Não queremos desafiar, brigar com nenhum poder, queremos paz e tranquilidade”, afirmou ele, embora toda a apresentação seja mais um episódio de crise que ele fomenta para criar um clima de desconfiança de outras instituições. “É justo quem tirou o Lula da cadeia, quem o tornou elegível, ser o mesmo que vai contar os votos numa sala secreta no TSE. Cadê a contagem pública de votos”, disse, em uma das várias provocações que fez ao ministro Luís Roberto Barroso, do TSE, que vem combatendo, inclusive com campanhas na mídia, as acusações de fraude nas urnas eletrônicas. “Temos limites, os onze do Supremo não são imortais”, disse o presidente, em relação ao que acha de interferência do Judiciário. A afirmação mescla o julgamento de Lula, que passou pelo Supremo Tribunal Federal, que nada tem a ver com o Tribunal Superior Eleitoral.

“Bolsonaro prepara o caminho para sair de cena no caso de se sentir derrotado de véspera. Poderá simplesmente não disputar a eleição ou disputá-la e dizer que lhe roubaram a vitória. O fantasma de não ir para o segundo turno é o que mais o assombra.”

Na quinta-feira, Barroso afirmou que jamais foi documentado um episódio de fraude nas eleições. “Em 2014, o partido do candidato derrotado pediu auditoria do sistema, que foi feita, e o próprio candidato reconhece que não houve fraude. Isso não aconteceu. Nunca se documentou, porque o dia que se documentar, o papel da Justiça Eleitoral é imediatamente apurar”, disse Barroso. “Uma fraude exigira que muita gente no TSE estivesse comprometida. Ia ser uma conspiração de muita gente. Não há precedente e não há razão para se mexer num time que está ganhando”, completou o ministro.

Bolsonaro mentiu ao afirmar que o sistema eletrônico semelhante ao do Brasil ser utilizado apenas em Bangladesh e Butão. “Por que o Japão não adota um sistema como o nosso se é tão confiável”, afirmou. Criticou várias vezes o ministro Barroso. “Por que ele teme tanto o voto democrático”, disse. De acordo com o TSE, é mentira que só três países usam sistema de urnas eletrônicas. De acordo com o Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral Internacional (Idea), o voto eletrônico é adotado por pelo menos 46 nações. “Sete agências de checagem confirmaram que essa informação é confiável”, destaca o TSE. A Secretaria de Comunicação e Multimídia do TSE teve de produzir conteúdos específicos que explicam de forma clara alguns dos pontos trazidos pelo presidente.

Simulando uma invasão

Durante a apresentação, um programador, apresentado apenas como Gederson, mostrou como ele teria conseguido invadir uma urna falsa. Mas o pesquisador de cibersegurança Carlos Cabral analisou a apresentação e encontrou vários equívocos. “Primeiramente, se a tese de Bolsonaro é de transparência, o próprio programador deveria compartilhar o código dele para que a comunidade técnica avalie e chegue a mesma conclusão que ele chegou”, afirma Cabral.

Além disso, ele explica que o código utilizado foi feito para dar um resultado específico e não se pode dizer que outra urna vai responder da mesma forma. Isso porque o código das urnas não é aberto à população. “Para que o resultado fosse autêntico, ele precisaria rodar isso usando o código original da urna. Seguindo esse princípio, ele poderia criar um simulador igualmente falso de qualquer outra coisa, de caixas eletrônicos a sistemas de lançamento de mísseis, e dizer que essa coisa pode ser fraudada”, diz o pesquisador.

A exposição foi simplória e, como o próprio presidente admite, não provava nada. Bolsonaro usou também um vídeo de um astrólogo que faz acupuntura em árvores.

O TSE também já havia informado que as as investidas de hackers nas Eleições 2020, com mais de 486.000 conexões por segundo, não obtiveram sucesso. Além disso, a Justiça Eleitoral esclarece que, apesar do código-fonte do software de votação não ser aberto à comunidade em geral, é permitido a representantes técnicos dos partidos políticos, ao Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e à Polícia Federal, dentre outras entidades, acompanhar todo o desenvolvimento dos sistemas eleitorais.

Três anos de campanha do contra o sistema que o elegeu

Essa não é a primeira vez que Bolsonaro volta suas baterias contra o sistema eleitoral brasileiro e defende o que chama de “voto impresso e auditável” —ao contrário do que diz o mandatário, no entanto, a urna eletrônica já é auditável. As acusações infundadas de que houve fraude no pleito têm sido uma constante desde antes da vitória que o levou ao Planalto, em 2019. Em 2018 ele já havia feito uma ameaça direta ao modelo democrático brasileiro, afirmado que não aceitaria nenhum resultado “diferente da minha eleição”, lançando suspeita sobre a urna eletrônica.

As acusações de fraude continuaram mesmo após sua vitória, e em março de 2020 ele se comprometeu publicamente a apresentar evidências que embasassem suas alegações, o que não foi feito até o momento. Mesmo sem provas, as alegações do presidente colocam em cheque um sistema eleitoral conhecido por ser seguro e auditável, o que é atestado até por observadores internacionais. Neste ponto, ele emula o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, de quem era próximo, e que também se esforçou para desacreditar o voto em 2020, quando perdeu para o atual mandatário Joe Biden. Bolsonaro chegou até mesmo a endossar a tese trumpista de golpe no pleito americano, novamente sem prova alguma.

“O pequeno Jair mostra que está morrendo de medo do que vai acontecer se ele amanhecer em Primeiro de Janeiro de 2023 sem a imunidade presidencial.”

Os ataques de Bolsonaro tem como principal intuito mobilizar suas bases, seja nas redes sociais ou no Congresso. A tropa de choque parlamentar e alguns ministros, como o general Walter Braga Netto (Defesa), também encampam a defesa do voto impresso. O militar, inclusive, teria usado um interlocutor para ameaçar o presidente da Câmara, Arthur Lira, no sentido de deixar claro que poderia não haver eleição em 2022 com o atual modelo de votação, de acordo com reportagem do jornal O Estado de São Paulo. Netto nega ter colocado em cheque a realização do pleito, mas reiterou a defesa do voto impresso.

As chances de implementação do voto impresso até 2022 são pequenas. O próprio presidente do TSE, o ministro Barroso, já afirmou que o atual sistema será mantido, e que o voto impresso é “um risco” para o processo eleitoral. Vários partidos, como o DEM, PT, PSD e MDB também se pronunciaram de forma contrária aos desejos de Bolsonaro, e ensaiam a formação de uma frente ante o retrocesso.

Apesar disso, a Câmara analisa em uma comissão especial a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 135/2019, que estabelece a obrigatoriedade do voto impresso. No dia 16 a tropa bolsonarista —liderada pelo relator da matéria, o deputado Felipe Barros (PSL-PR)— conseguiu adiar a votação da proposta para o final do recesso parlamentar, que vai até o dia 30. A expectativa é de que após a live do presidente haja uma maior mobilização popular em prol da medida, que estava prestes a ser descartada na comissão.

Reação

A reação às falas de Jair Bolsonaro na live de quinta-feira (29), em que – em cerca de duas horas de transmissão – usou uma série de alegações falsas para contestar a segurança da urna eletrônica, além de repetir ataques ao TSE e ao ministro Barroso, presidente da Corte eleitoral, foi a pior possível, tanto no Supremo Tribunal Federal (STF) como no TSE.

Bolsonaro foi chamado de "moleque" por um dos magistrados do STF, e teve o apoio e a concordância de outros colegas –que têm usado adjetivos igualmente contundentes quando se referem ao mandatário.

No TSE, que é integrado por três ministros do STF (Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes), o clima é o mesmo.

Um dos integrantes da corte eleitoral afirma que as respostas institucionais e as iniciativas de comunicação do tribunal têm sido boas, mas não são suficientes para barrar as investidas de Bolsonaro contra as eleições.

Durante a live do presidente, o TSE foi rápido e rebateu em série 18 alegações feitas por ele. Além de usar o Twitter para desmentir Bolsonaro em tempo real, a Secretaria de Comunicação do TSE compilou uma série de links que refutam várias de suas declarações. Bolsonaro divulgou uma profusão de mentiras e de suspeitas que já foram seguidamente desmentidas por investigações feitas pela Polícia Federal ou pela própria corte.

Na opinião de magistrados do tribunal eleitoral, no entanto, seria necessário atuar de maneira mais firme, com medidas concretas que resultem em punição, inclusive no âmbito eleitoral, para que Bolsonaro cesse as tentativas de desacreditar as urnas eletrônicas e, em consequência, o próprio resultado das eleições.

É possível investigar o próprio presidente e assessores que participaram da divulgação de fake news sobre as eleições na live também no âmbito criminal. O STF já instaurou inquéritos para apurar a disseminação de mentiras.

É preciso atuar agora, afirma um dos ministros, para que o país possa realizar as eleições de 2022 dentro da normalidade.

Os magistrados acreditam que tentativas de diálogo com Bolsonaro, como ainda defende o presidente do STF, Luiz Fux, são inúteis e que ele, na verdade, tenta criar um ambiente para tumultuar o processo eleitoral em 2022 caso chegue em desvantagem na disputa para se reeleger.

As pesquisas eleitorais mostram que, se a eleição fosse hoje, Lula venceria Bolsonaro no segundo turno por ampla margem. De acordo com o Datafolha, o petista teria 58% dos votos, contra 31% de Bolsonaro.

O presidente do STF, Luiz Fux, deve usar o tradicional discurso de retomada dos julgamentos na Corte na segunda-feira, 2, após o recesso do Judiciário, para enviar recados ao Palácio do Planalto, diante das sucessivas ameaças à realização das eleições em 2022. Fux prepara uma resposta à tentativa de intimidação do ministro da Defesa, Walter Braga Netto. Como revelou o Estadão, o ministro mandou um interlocutor avisar aos Poderes que não haveria eleições de 2022 se não fosse aprovado o voto impresso.

O recado chegou para o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), que cobrou do presidente Jair Bolsonaro respeito ao processo democrático. Desde a semana passada, Fux vem sendo pressionado a se manifestar sobre as ameaças golpistas que agora também partem da Esplanada dos Ministérios. O presidente do STF deve discursar em defesa da democracia, destacando que os Poderes não podem extrapolar o seu papel no Estado de Direito.

Em conversas reservadas, o ministro disse que avalia citar nominalmente as Forças Armadas e Braga Netto, que teriam gerado a crise política instalada a partir de acenos golpistas. Há, ainda, a possibilidade de que a declaração seja mais genérica, evitando despertar animosidade no meio militar, mas que, mesmo assim, cumpra o papel de sinalizar aos outros Poderes e à caserna o comprometimento do Supremo com a estabilidade democrática.

A crise entre o Supremo e o Planalto ganhou fôlego depois que ministros da Corte se reuniram com dirigentes de partidos para reverter a tendência de aprovação do voto impresso pelo Congresso. Após a ameaça de Braga Netto, houve reação pública de três magistrados — Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso –, e se chegou a considerar uma nota conjunta a respeito.

Vice-presidente do TSE, Fachin declarou, momentos após a publicação da reportagem do Estadão, que “o sistema eleitoral do País encontra-se desafiado pela retórica flagiciosa, perversa, do populismo autoritário”. Na quinta-feira, 29, Barroso fez duras críticas à proposta de adoção do voto impresso como mecanismo adicional de auditagem das urnas eletrônicas. “O discurso de que se eu perder houve fraude, é um discurso de quem não aceita a democracia”, afirmou. A manifestação de Barroso foi feita no mesmo dia em que Bolsonaro prometeu apresentar provas de que as eleições de 2014 e 2018 foram manipuladas. O presidente queria dizer que as do ano que vem também serão. Em transmissão ao vivo nas redes sociais, porém, acabou admitindo não ter provas, mas apenas “indícios”.

O pronunciamento de Fux ocorrerá pouco após um novo episódio de conflito entre as instituições. O discurso na sessão inaugural, no entanto, não será o único ato do presidente do Supremo na tentativa de debelar a crise institucional instalada na Praça dos Três Poderes. Na próxima semana, Fux deve se encontrar com Bolsonaro e com os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (Progressistas-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

O encontro deveria ter ocorrido no último dia 14, mas foi desmarcado porque Bolsonaro precisou ser submetido a tratamento médico de emergência em São Paulo. Naquele momento, o presidente do STF tentava reunir as lideranças para remediar a crise política entre os Poderes causada, sobretudo, pela atitude beligerante de Bolsonaro em relação à adoção do voto impresso.

No dia 12 deste mês, pouco antes da data prevista para a realização do encontro de líderes, Fux chamou Bolsonaro ao Supremo para selar um acordo de paz. Na ocasião, o magistrado pediu ao presidente que ‘respeitasse os limites da Constituição’. Em resposta, o político teria se comprometido a moderar os ataques aos ministros do STF e do TSE. Esse encontro ocorreu depois que Lira avisou Bolsonaro que não compactuaria com atitudes golpistas, como revelou o Estadão.

A promessa, no entanto, caiu por terra pouco tempo depois da conversa com Fux. No último sábado, 24, Bolsonaro voltou a questionar a lisura do sistema eleitoral brasileiro e a defender o voto impresso. "Na quinta-feira (29) vou demonstrar em três momentos a inconsistência das urnas, para ser educado. Não dá para termos eleições como está aí", disse a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada. Ele ainda afirmou que o povo não aceitaria o pleito sem a possibilidade de imprimir o comprovante do voto.

Horas antes da live prometida, Bolsonaro voltou a atacar o Supremo. Dessa vez, o tensionamento da relação com a mais alta corte do Judiciário ocorreu devido ao vídeo publicado ontem pela Secretaria de Comunicação do STF.

Na peça publicitária que integra a campanha “#VerdadesdoSTF”, é desmentida mais uma vez a versão reproduzida reiteradamente pelo presidente e por aliados do Planalto de que o tribunal teria proibido o governo federal de agir no enfrentamento à pandemia de covid-19.

Parafraseando a famosa frase de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda do regime nazista de Adolf Hitler, o Supremo dizia no texto de divulgação do vídeo em resposta a Bolsonaro que “uma mentira contada mil vezes não vira verdade”.

“Indícios apresentados pelo presidente foram fragmentos de notícias baseadas em vídeos da internet, que tratam de suspeitas já investigadas e desmentidas pelo Supremo Tribunal Eleitoral”

Na manhã de quinta-feira, 29, o presidente respondeu e subiu o tom em conversa com apoiadores em frente ao Alvorada: “O Supremo cometeu crime ao dizer que prefeitos e governadores podem suprimir direitos”. A afirmação desinformativa foi seguida pela declaração também inverídica e recorrente de que o tribunal o impediu de atuar. “Prefeitos e governadores tinham mais poder do que eu”, disse. Em sua conta oficial no Twitter, Bolsonaro escreveu que o Supremo “delegou poderes para que Estados e municípios” agissem no enfrentamento da doença.

A decisão por unanimidade no plenário da Corte apenas definiu a possibilidade de concorrência entre as instâncias do Executivo na adoção de medidas preventivas à doença. O voto do ministro Edson Fachin, por exemplo, avaliou que a concentração das decisões na figura do presidente da República, sem contrapartida aos prefeitos e governadores, viola a separação dos Poderes.

Em uma medida cautelar que referendou a decisão do Supremo, o ministro Alexandre de Moraes declarou que não cabe ao Executivo tomar qualquer iniciativa “que vise a desautorizar medidas sanitárias adotadas pelos Estados e municípios com o propósito de intensificar ou ajustar o nível de proteção sanitária”. Apesar de não poder evadir a competência de prefeitos e governadores, a decisão não retira os poderes do governo federal “de atuar como ente central no planejamento e coordenação de ações integradas de saúde pública, em especial de segurança sanitária e epidemiológica no enfrentamento à pandemia da Covid-19”, como cabe em suas atribuições.

Uma trégua, se houver, será apenas institucional. Na agenda do tribunal encontram-se pautas importantes, que dizem respeito inclusive a Bolsonaro, como o julgamento previsto para setembro que definirá se o presidente prestará depoimento no inquérito que apura se ele tentou interferir indevidamente nas atividades da Polícia Federal. Em novembro, os ministros votam a criação do juiz de garantias nos processos judiciais do País.

Análise

O que você acha de alguém que acusa uma pessoa de roubo sem apresentar nenhuma prova? Pior: exigindo que essa pessoa demonstre sua honestidade, caso contrário sofrerá uma campanha de difamação e será vista como ladra? É, no mínimo, alguém sem ética e escrúpulos, um risco à sociedade, que precisa ser contido. O que fazer, contudo, quando esse caluniador que inverte o ônus da prova é o próprio presidente da República?

"Os que me acusam de não apresentar provas, eu devolvo a acusação. Me apresente provas [de que] não é fraudável", afirmou Jair Bolsonaro.

Em meio à sua campanha pela introdução do voto impresso, ele havia prometido apresentar provas cabais de fraudes na urna eletrônica. Convidou jornalistas, colocou a TV Brasil de prontidão para transmiti-lo, divulgou amplamente entre seus seguidores. Mas no dia D, na hora H, fué, fué, fué, fuéééé…

Disse com todo óleo de peroba disponível no mercado que "não tem como se comprovar que as eleições não foram ou foram fraudadas". E jogou a responsabilidade de atestar a lisura das urnas eletrônicas para o Tribunal Superior Eleitoral, ignorando que, a cada quatro anos, a Justiça já realiza testes públicos para mostrar a confiabilidade do sistema. E desconsiderando que o voto eletrônico é sim auditável. Em suma, é a tática miliciana de todos são culpados até que ele decida o contrário.

É triste ver Bolsonaro minar a credibilidade das eleições, usar as Forças Armadas para atacar as instituições como se elas fossem seu pinscher de estimação e ameaçar o país com golpe de Estado caso não seja reeleito. Mas deprimente mesmo é o fato de ele usar toscos vídeos com desmentidas teorias da conspiração que circulam há tempos nas redes bolsonaristas como indícios e evidência de que as urnas eletrônicas foram fraudadas. Já não bastasse ele espancar a democracia diariamente, agora nos trata como membros de um rebanho que aceita essas bobagens de forma acéfala.

Em outras palavras, na live de quinta, Bolsonaro conspirou contra a República, tratando a esmagadora maioria dos brasileiros como idiotas.

Jair passou quase três décadas sendo reeleito como um parlamentar come-dorme, sem ter aprovado um mísero projeto de lei relevante. Enquanto era reconduzido a cada quatro anos à possibilidade de coletar mais rachadinhas dos servidores de seu gabinete, não questionou a lisura das eleições para deputado federal no Rio de Janeiro.

Bolsonaro começou a despejar esse chorume durante a eleição de 2018 de forma preventiva. Desde então, tem dito que a venceu no primeiro turno. "Pelas provas que tenho em minhas mãos, que vou mostrar brevemente, eu fui eleito no primeiro turno mas, no meu entender, teve fraude", afirmou, de forma bisonha, em março de 2020. Nunca mostrou nada decente e nem vai mostrar.

Ele tem, dito que "ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições". Parte de uma premissa mentirosa (que as eleições não são limpas no Brasil porque não há voto impresso) e coloca em risco o processo de escolha do próximo presidente. Os sucessivos ataques à urna eletrônica querem preparar terreno para uma derrota em 2022, excitando seus seguidores civis mais fiéis e deixando suas tropas de policiais simpatizantes de prontidão. A impressão do voto, para ele, tem o objetivo de criar mais uma forma de questionar a eleição, não de melhorar a sua segurança.

A live de quinta serviu para animar o seu rebanho e distribuir argumentos, mesmo que falaciosos e fantasiosos, para que disputem a narrativa. E atacar, mais uma vez, o Tribunal Superior Eleitoral e seu presidente, o ministro Luís Roberto Barroso.

Se o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, tiver dignidade, não receberá mais o presidente para um cafezinho passa-pano.

Bolsonaro prepara o caminho para sair de cena no caso de se sentir derrotado de véspera. Poderá simplesmente não disputar a eleição ou disputá-la e dizer que lhe roubaram a vitória. O fantasma de não ir para o segundo turno é o que mais o assombra.

Bolsonaro é um moleque mimado que pensa primeiro em si mesmo. E, em segundo, também em si. Com tudo isso, o pequeno Jair mostra que está morrendo de medo do que vai acontecer se ele amanhecer em Primeiro de Janeiro de 2023 sem a imunidade presidencial.


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