25/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Teorias de Bolsonaro ecoam entre 30% de lunáticos

Publicado em 29/07/2021 12:00 - Victor Barone

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O que você acha de alguém que acusa uma pessoa de roubo sem apresentar nenhuma prova? Pior: exigindo que essa pessoa demonstre sua honestidade, caso contrário sofrerá uma campanha de difamação e será vista como ladra? É, no mínimo, alguém sem ética e escrúpulos, um risco à sociedade, que precisa ser contido. O que fazer, contudo, quando esse caluniador que inverte o ônus da prova é o próprio presidente da República?

"Os que me acusam de não apresentar provas, eu devolvo a acusação. Me apresente provas [de que] não é fraudável", afirmou Jair Bolsonaro.

Em meio à sua campanha pela introdução do voto impresso, ele havia prometido apresentar provas cabais de fraudes na urna eletrônica em uma live na noite de quinta (29). Convidou jornalistas, colocou a TV Brasil de prontidão para transmiti-lo, divulgou amplamente entre seus seguidores. Mas no dia D, na hora H, fué, fué, fué, fuéééé…

Disse com todo óleo de peroba disponível no mercado que "não tem como se comprovar que as eleições não foram ou foram fraudadas". E jogou a responsabilidade de atestar a lisura das urnas eletrônicas para o Tribunal Superior Eleitoral, ignorando que, a cada quatro anos, a Justiça já realiza testes públicos para mostrar a confiabilidade do sistema. E desconsiderando que o voto eletrônico é sim auditável. Em suma, é a tática miliciana de todos são culpados até que ele decida o contrário.

É triste ver Bolsonaro minar a credibilidade das eleições, usar as Forças Armadas para atacar as instituições como se elas fossem seu pinscher de estimação e ameaçar o país com golpe de Estado caso não seja reeleito. Mas deprimente mesmo é o fato de ele usar toscos vídeos com desmentidas teorias da conspiração que circulam há tempos nas redes bolsonaristas como indícios e evidência de que as urnas eletrônicas foram fraudadas. Já não bastasse ele espancar a democracia diariamente, agora nos trata como membros de um rebanho que aceita essas bobagens de forma acéfala.

Em outras palavras, na live desta quinta, Bolsonaro conspirou contra a República, tratando a esmagadora maioria dos brasileiros como idiotas.

Jair passou quase três décadas sendo reeleito como um parlamentar come-dorme, sem ter aprovado um mísero projeto de lei relevante. Enquanto era reconduzido a cada quatro anos à possibilidade de coletar mais rachadinhas dos servidores de seu gabinete, não questionou a lisura das eleições para deputado federal no Rio de Janeiro.

Bolsonaro começou a despejar esse chorume durante a eleição de 2018 de forma preventiva. Desde então, tem dito que a venceu no primeiro turno. "Pelas provas que tenho em minhas mãos, que vou mostrar brevemente, eu fui eleito no primeiro turno mas, no meu entender, teve fraude", afirmou, de forma bisonha, em março de 2020. Nunca mostrou nada decente e nem vai mostrar.

Ele tem, dito que "ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições". Parte de uma premissa mentirosa (que as eleições não são limpas no Brasil porque não há voto impresso) e coloca em risco o processo de escolha do próximo presidente. Os sucessivos ataques à urna eletrônica querem preparar terreno para uma derrota em 2022, excitando seus seguidores civis mais fiéis e deixando suas tropas de policiais simpatizantes de prontidão. A impressão do voto, para ele, tem o objetivo de criar mais uma forma de questionar a eleição, não de melhorar a sua segurança.

A live desta quinta serviu para animar o seu rebanho e distribuir argumentos, mesmo que falaciosos e fantasiosos, para que disputem a narrativa. E atacar, mais uma vez, o Tribunal Superior Eleitoral e seu presidente, o ministro Luís Roberto Barroso.

Se o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, tiver dignidade, não receberá mais o presidente para um cafezinho passa-pano.

Bolsonaro é um moleque mimado que pensa primeiro em si mesmo. E, em segundo, também em si. Com tudo isso, o pequeno Jair mostra que está morrendo de medo do que vai acontecer se ele amanhecer em Primeiro de Janeiro de 2023 sem a imunidade presidencial.

Por Leonardo Sakamoto

DESTRAMBELHADO

O Supremo Tribunal Federal (STF) reagiu de maneira inédita, a uma declaração inverídica que o presidente Jair Bolsonaro costuma repetir ao falar sobre a pandemia. Em entrevista à rádio Mundial, da Bahia, Bolsonaro voltou a dizer que o Supremo deu muito mais poderes para governadores e prefeitos do que para ele.

O STF rebateu Bolsonaro com um vídeo, nas redes sociais. E modificou uma frase comumente atribuída ao ministro da propaganda do regime nazista de Adolf Hitler, Joseph Goebbels: a de que uma mentira contada mil vezes se torna verdade.

"Uma mentira repetida mil vezes vira verdade? Não. É falso que o Supremo tenha tirado poderes do presidente da República de atuar na pandemia. É verdadeiro que o STF decidiu que União, estados e prefeituras tinham que atuar juntos, com medidas para proteger a população. Não espalhe fake news! Compartilhe as #VerdadesdoSTF", acrescentou a publicação.

Em vídeo editado pelo canal bolsonarista que divulga as conversas no cercadinho do Palácio da Alvorada, o presidente reagiu de forma destrambelhada. Acusou o Supremo de “cometer crime” ao determinar que as ações contra a pandemia deveriam ser tomadas em conjunto entre a União, governadores e prefeitos.

“O Supremo, na verdade, cometeu crime ao dizer que prefeitos e governadores, de forma indiscriminada poderiam suprimir todo e qualquer direito previsto no Artigo 5º da Constituição, inclusive o ir e vir”, disse Bolsonaro, voltando a distorcer a decisão judicial. “Não adiantava tomar providência, pois prefeitos e governadores tinham mais poder do que eu”, reclamou.

O presidente Jair Bolsonaro deu 1.682 declarações falsas ou enganosas em 2020, o que dá uma média de 4,3 por dia, segundo um estudo anual divulgado ontem pela Artigo 19, organização britânica de defesa da liberdade de expressão.

Esse espantoso número mostra que o presidente não mente apenas de forma eventual, mas sistematicamente, o que constitui um evidente método. Sua intenção, já está claro, é usar o destaque conferido a seu cargo para confundir a opinião pública, de modo a dificultar a formação de consensos sobre a realidade. Sem esses consensos mínimos, o debate democrático se torna inviável, o que é precisamente o que Bolsonaro almeja.

Não à toa, como mostra o mesmo estudo, o presidente e seus assessores deram nada menos que 464 declarações públicas contra a imprensa em 2020, justamente para desacreditar as informações baseadas na realidade – matéria-prima do jornalismo profissional – e legitimar distorções produzidas pelo departamento de agitação e propaganda do bolsonarismo.

Se não traz novidade, pois afinal a mendacidade crônica de Bolsonaro e de seus camisas pardas, a esta altura, já é notícia velha, o estudo da Artigo 19 tem o mérito de dar a dimensão chocante daquilo que apenas se intuía: para Bolsonaro, mentir é uma virtude, talvez a principal da seita que lidera.

Um presidente com essas características impõe desafios inéditos na história republicana. As instituições democráticas, por definição, devem se alicerçar na veracidade dos fatos, para que as decisões que afetam a sociedade respeitem a realidade e, assim, sejam efetivas e aceitas como legítimas mesmo por aqueles que a elas se opuseram.

Quando a mentira impera nas mais altas esferas de governo, as decisões das instituições democráticas serão sempre objeto de desconfiança, instaurando-se o conflito – que é precisamente o combustível dos regimes de vocação autoritária. O conflito, tal como idealizado por esses governos, presume a criação de inimigos ubíquos, cujo combate demanda a politização dos menores aspectos da vida cotidiana, impedindo, mesmo nas relações pessoais e familiares, a formação de consensos triviais.

É claro que, num tal estado de coisas, a democracia se inviabiliza, razão pela qual as instituições democráticas devem reagir com firmeza a cada mentira proferida pelo presidente. O Supremo Tribunal Federal (STF) reagiu por meio de sua Secretaria de Comunicação à enésima declaração do presidente Bolsonaro acerca das decisões da Corte que, segundo ele, o impediram de interferir na administração do combate à pandemia de covid-19.

“O STF não proibiu o governo federal de agir na pandemia! Uma mentira contada mil vezes não vira verdade!”, exclamou o Supremo em sua conta no Twitter, ao divulgar um vídeo para esclarecer que jamais proibiu Bolsonaro de trabalhar para conter a pandemia.

À reação do Supremo, Bolsonaro mentiu novamente, dizendo que a Corte “cometeu crime” por ter dado a governadores e prefeitos a possibilidade de “suprimir todo e qualquer direito previsto no inciso (sic) 5.º da Constituição, inclusive o ir e vir” – em referência às medidas de isolamento social. E arrematou: “Fizeram barbaridades acobertados pelo Supremo”.

Como se vê, ao presidente interessa transformar o País numa imensa rinha de galos. Nela, Bolsonaro joga em casa.

Com Estadão

NO GOGÓ

“Um pedido verbal”. De acordo com Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, foi assim que Bolsonaro ordenou que fossem apuradas as denúncias sobre suspeitas de corrupção envolvendo a compra das vacinas Covaxin. Em depoimento prestado na manhã de ontem à Polícia Federal, o general da ativa repetiu os argumentos que havia apresentado em ofício à Procuradoria-Geral da República (PGR) para prestar esclarecimentos sobre o caso. 

Pazuello foi ouvido sobre dois inquéritos apurados pela PF: o que investiga se Bolsonaro prevaricou ao não ter comunicado aos órgãos de investigação sobre os indícios de corrupção e o que trata especificamente das suspeitas de irregularidades na negociação da Covaxin. O ex-ministro, que falou na condição de potencial investigado, repetiu que, como toda a comunicação com o presidente foi feita em conversas informais, não há registro que possa comprová-las.

Também no boca-a-boca teria ocorrido o encaminhamento do pedido: Pazuello disse à PF que determinou a Elcio Franco, seu secretário-executivo, que verificasse possíveis problemas no contrato. Segundo ele, a resposta de Franco veio dias depois, afirmando não ter encontrado irregularidades. A apuração do Jornal Nacional conta que o ex-ministro disse à PF não saber como o seu secretário-executivo chegou a essa conclusão. Pazuello teria dito também à PF que, quando Bolsonaro o abordou, não tratou a denúncia como algo grave.

O vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), falou ao Valor depois do depoimento de Pazuello. Para o senador, a fala do ex-ministro confirma o crime de prevaricação de Bolsonaro. “Inaugurou no serviço público o pedido de providências informal. Algo que não existe. Não há dúvidas sobre o crime de prevaricação”, disse. Na mesma linha, Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, declarou em seu Twitter que o depoimento de Pazuello expõe a “prevaricação de rebanho”, confirmando que “graves ilegalidades da vacina superfaturada” não foram investigadas. 

SEGUE O BAILE

Enquanto Pazuello falava à PF, a Controladoria-Geral da União (CGU) concedeu coletiva de imprensa para apresentar os resultados da auditoria dos contratos firmados pelo Ministério da Saúde para compra da Covaxin. Diferentemente do Ministério Público Federal, do Tribunal de Contas da União e da cúpula da CPI, a CGU afirmou não ter encontrado irregularidades na compra dos imunizantes da  Bharat Biotech intermediada pela  Precisa Medicamentos.

Wagner Rosário, ministro da CGU, disse que não foram encontrados indícios de sobrepreço na compra e que os prazos de negociação foram regulares, não havendo sinais de pressa ou atenção diferenciada ao contrato em questão. Quanto aos erros nas faturas apresentadas pela Precisa (as famosas invoices), Rosário declarou terem sido corrigidos a tempo e “sem prejuízos ao negócio”. Não custa lembrar: a CPI apontou que as três invoices permitiram que o governo pagasse antecipadamente à Precisa US$ 45 milhões, depositados em um paraíso fiscal.

Foi somente quanto aos documentos com trechos em português e inglês que a CGU apontou irregularidades. O ministro confirmou a adulteração em assinaturas de uma procuração e uma declaração de inexistência de fatos impeditivos para assinar a compra, apresentados pela Precisa em nome do laboratório indiano ao Ministério da Saúde.

A  Bharat Biotech negou ter emitido os documentos antes de cancelar definitivamente o contrato com a Precisa, na semana passada. “Nós temos que saber quem fez essa colagem de documentos, nós estamos encaminhando para a polícia. Nós não somos peritos. Os peritos estão na Polícia Federal, eles agora vão aprofundar isso”, disse Rosário. 

O vice-presidente da CPI reagiu: “Eu vivi para ver a CGU declarar que falsidade ideológica não é crime. Essa declaração da CGU equipara-se a isso”, comentou Randolfe sobre a coletiva do órgão do governo federal.

Já Marcelo Queiroga, ministro da Saúde, aproveitou a ocasião para anunciar o fim do contrato com a Precisa para compra da Covaxin. Após as recentes decisões da Anvisa – que na semana passada suspendeu a importação condicional do imunizante e, no início desta, cancelou os estudos clínicos no país –, Queiroga afirmou que o contrato, “independente de qualquer outro ponto, já perdeu o objeto”. As tratativas estavam suspensas pelo Ministério desde 29 de junho, por recomendação da CGU, mas o cancelamento do contrato não havia sido anunciado oficialmente.

DE VOLTA

Às vésperas da retomada dos trabalhos, na terça-feira, a cúpula da CPI da Covid planeja os próximos passos da investigação. Entre eles, algo talvez indique que o baile da Precisa Medicamentos pode não seguir tanto assim…

É que, segundo o Estadão, o roteiro definido pelo presidente da Comissão, Omar Aziz (PSD-AM), em reunião com o vice Randolfe Rodrigues e outros integrantes, inclui o pedido de prisão do dono da empresa intermediária

O depoimento de Francisco Maximiano, dono da Precisa, está previsto para a próxima quarta-feira. A oitiva, que deveria ter ocorrido ainda antes do recesso, foi adiada após decisão do Supremo Tribunal Federal que concedeu ao empresário o direito de ficar calado na CPI. 

Mas ainda pairam dúvidas sobre a presença de Maximiano na semana que vem. A comissão recebeu a informação de que ele teria viajado para a Índia – e por isso planeja pedir a prisão preventiva do empresário. “Evadir-se do país quando tem uma investigação em curso é crime e nós não titubearemos em pedir a prisão preventiva”, afirmou Randolfe em áudio enviado à imprensa ontem. 

Segundo o senador, o roteiro da CPI inclui ainda o requerimento para bloqueio de R$ 1,6 bilhão dos bens da Precisa e da Global Gestão em Saúde, sócia da companhia, correspondentes ao valor do contrato assinado com o Ministério da Saúde. 

Também na mira está Mayra Pinheiro. Segundo Omar Aziz, a CPI vai solicitar o afastamento da médica cloroquiner da Secretaria de Gestão em Trabalho do Ministério da Saúde. O senador avalia que a situação de Mayra ficou insustentável após a divulgação do vídeo, obtido pela CPI, em que ela se prepara para seu depoimento e afirma que tem perguntas ensaiadas com senadores governistas da comissão. “O que a servidora Mayra falou naquele vídeo é muito grave. (…) Ela disse que cinco membros da CPI estavam lá para tocar a bola para ela fazer o gol. Ela precisa ser afastada imediatamente”, disse Aziz em entrevista ao UOL na noite de ontem. 

A agenda da CPI inclui ainda o depoimento, na terça, do reverendo Amilton Gomes de Paula, fundador da associação (com nome de órgão público) Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah). O religioso é citado como intermediário informal da negociação ilegal de vacinas sem garantia de entregas, por ter levado representantes da empresa Davati ao Ministério da Saúde para tentar vender 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca.

O DIA DO JAGUNÇO

Quando você acha que nada mais pode te surpreender no governo Jair Bolsonaro, a Secretaria de Comunicação (Secom) mostra sua disposição de ir muito além dos limites. Causou revolta ontem uma postagem “celebrando” o Dia do Agricultor. No Twitter, a Secom escolheu a imagem de um homem carregando uma espingarda. A chamada? “Alimentando o Brasil e o mundo”. O texto destacava a flexibilização no Estatuto do Desarmamento promovida em 2019 pelo governo, relacionando a data com o fato de o presidente ter estendido “a posse de arma do proprietário rural a toda a sua propriedade”. A repercussão negativa fez com que a Secom apagasse a publicação

Mas ainda restou outra postagem altamente questionável na mesma linha, que afirma que o governo trabalha para que “os agricultores possam trabalhar em paz” e que as “invasões de terras” estão em “baixa histórica”. 

Falando em armas… A Piauí levantou dados sobre os efeitos dessa política do governo: “De 2019 para 2020, o número de autorizações para importação de armas longas cresceu 108,4%. Já o número de registros de novas armas no Sistema Nacional de Armas, da Polícia Federal, chegou a 186.071, um salto de 97,1% no período. Ao todo, o país tem 1.279.491 registros de arma de fogo ativos no Sinarm. Esse número também dobrou nos últimos anos, num crescimento de 100,6% desde 2017. Desde que assumiu o cargo, o presidente Jair Bolsonaro assinou, entre decretos, portarias e projetos de lei, 33 atos contrários ao Estatuto.”

Por Outra Saúde

Celebrar o Dia do Agricultor com um jagunço é a cara do governo Bolsonaro

NÃO FOI POR FALTA DE AVISO

Quem lê as notícias sobre o outro escândalo envolvendo vacinas, o da Davati e dos estranhos mercadores de imunizantes que incluem PM e reverendo, sempre fica com a impressão que bastava uma ligação do Ministério da Saúde para a Fiocruz – que detém, no Brasil, o direito de produção da vacina da AstraZeneca – ou para a própria AstraZeneca para que todo o esquema fosse desmascarado.

Mas documentos enviados à CPI mostram que o Ministério da Saúde estava mais do que ciente sobre a impossibilidade de empresas privadas negociarem vacinas da AstraZeneca. A pasta acionou a Polícia Federal e a farmacêutica a respeito de ofertas suspeitas de vacinas em 29 de janeiro, semanas antes de negociar 400 milhões de doses do imunizante com a Davati.

Na ocasião, essa foi a resposta da diretora de Assuntos Regulatórios da AstraZeneca no Brasil, Alessandra Nicoli Hengles: “Conforme mencionado anteriormente para essa diretoria em outra denúncia, em virtude do compromisso humanitário externado pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford, toda a produção da vacina AZD 1222 durante o período de pandemia é destinado exclusivamente a governos e organizações internacionais de saúde ao redor do mundo, ou seja, não há possibilidade de comercialização da vacina produzida pela AstraZeneca no mercado privado”. A explicação está em e-mail enviado à Anvisa com cópia para o gabinete da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde. 

APAGÃO DO CNPQ

Diversos sistemas do CNPq, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, sofreram pane. As dificuldades começaram a ser notadas por pesquisadores no último dia 23, e foram admitidas pelo órgão no sábado. 

Na nota, o CNPq informava apenas que havia identificado a “indisponibilidade dos seus sistemas”. Em dois tuítes postados na segunda-feira, o órgão também deixava mais perguntas do que respostas ao afirmar que seguia trabalhando para restabelecer os sistemas, com prioridade para a plataforma Lattes. Ontem, os boatos começaram a correr soltos. 

O principal deles: o Lattes, que reúne os dados de produção da ciência brasileira, não teria backup. Depois do pânico, o CNPq assegurou que existem backups de todas as informações e que não aconteceram perdas.

Além do Lattes, o problema atingiu a plataforma Carlos Chagas, que reúne informações de grupos de pesquisa e dos 84 mil bolsistas do CNPq, e o Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil, outra base de dados importante para conhecer quais especialistas estão trabalhando em cada área.

O “apagão” literal do CNPq teria sido causado pela pane de um equipamento que tem a função de controlar os servidores onde as plataformas ficam hospedadas. O problema teria ocorrido durante a migração para um novo equipamento.

Não há quem não ligue o apagão literal ao apagamento mais geral do órgão, que vem sendo golpeado desde o governo Michel Temer (MDB) com cortes orçamentários – realidade que não mudou no governo Jair Bolsonaro. 

“O CNPq tem de ter verbas para as atividades fim, que são as mais importantes, mas também para as atividades meio, que garantem o funcionamento do órgão“, resumiu o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Renato Janine Ribeiro, que acredita que a presente situação de crise “no fundo é decorrência de escolhas orçamentárias”. 

O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) protocolou junto à Comissão de Educação da Câmara, um requerimento solicitando que o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes, seja convocado para prestar esclarecimentos sobre o “apagão”.

VETO PRÓ-MERCADO

Venceu o lobby das operadoras privadas. Bolsonaro vetouprojeto de lei que obrigava os planos de saúde a garantirem cobertura para tratamentos domiciliares de pacientes com câncer. De autoria do senador Reguffe (Podemos-DF), o PL havia sido aprovado por ampla maioria no Congresso e aguardava sanção presidencial desde o início do mês. 

A medida previa a incorporação, pelos planos, de 23 novos medicamentos orais para tratamento do câncer, incluindo quimioterápicos e também aqueles usados para controle de efeitos colaterais.  Além disso, obrigava as empresas a disponibilizar os medicamentos e tratamentos aos pacientes em até 48 horas após a emissão de receita médica, de maneira fracionada ou de acordo com os ciclos de tratamento adotados. 

Os pacientes passariam a ter acesso a remédios não previstos na cobertura oferecida pelos planos. Além da prescrição médica, seria obrigatório somente que os medicamentos já estivessem aprovados pela Anvisa, sendo descartada a etapa de análise da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para inclusão dos tratamentos no rol de coberturas previstas pelos convênios médicos. 

A reação do mercado veio logo após a aprovação do PL, como relata O Globo. O presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Renato Casarotti, enviou ofício ao Ministério da  Saúde defendendo o veto integral ao projeto. Não surpreende que os argumentos formulados pela Abramge coincidam com aqueles apresentados pelo governo para justificar o veto. 

A Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência apontou que a medida impactaria financeiramente o mercado e, assim, resultaria em “inevitável repasse” dos custos para os consumidores. Mexer no lucro das operadoras, como de costume, parece estar fora de cogitação. 

Além disso, o órgão argumentou que, sem a avaliação técnica da ANS, a incorporação dos novos medicamentos e tratamentos à lista de coberturas obrigatórias iria “contrariar o interesse público por deixar de levar em conta aspectos como a previsibilidade, transparência e segurança jurídica aos atores do mercado e toda a sociedade civil”. 

A FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar) que representa gigantes do mercado dos planos, soltou ontem mesmo uma nota celebrando o veto. Já a relatora do PL na Câmara, a deputada Silvia Cristina (PDT-RO), lamentou a decisão do governo, argumentando que a medida seria imprescindível para “dezenas de milhares de brasileiros que, mensalmente, gastam considerável parte do seu orçamento para garantir um plano de saúde”.

NA PRÓXIMA SEMANA

A cúpula da CPI definiu que privilegiará as negociações de compra de vacina pelo governo federal na retomada dos trabalhos após o recesso parlamentar, com foco na atuação da Precisa Medicamentos e da Davati Medical Supply. Nesse sentido, a comissão quer ouvir o reverendo Amilton Gomes de Paula, em 3 de agosto; o sócio da Precisa Francisco Maximiano, em 4 de agosto; e o advogado e representante da empresa Túlio Silveira, em 5 de agosto. Na semana seguinte, a expectativa é ouvir o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), no dia 12.

BASTIDORES DA REJEIÇÃO

Vídeos exclusivos de reuniões interministeriais mostram que o governo Jair Bolsonaro agiu para dificultar a aquisição de vacinas contra a covid-19 através do consórcio Covax Facility, coordenado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O material, divulgado pela revista digital Crusoé no último sábado, expõe bastidores até agora desconhecidos de reuniões que ocorreram entre agosto e setembro do ano passado.

Exemplo é a fala de Talita Saito, subchefe adjunta de política econômica da Casa Civil, que em 15 de setembro – três dias antes do prazo final para adesão ao consórcio – comunica que Jair Bolsonaro ainda não tinha tomado uma decisão sobre o  assunto.

Além disso, Saito informa sobre uma “alteração de posicionamento” do Ministério da Saúde, que havia decidido pela redução à metade da quantidade de doses a serem adquiridas. “Baixou de 20% para 10% da população”, diz. 

A situação de Pazuello também parece se complicar. É que os vídeos trazem uma fala da embaixadora do Brasil em Genebra, Maria Nazareth Farani Azevêdo, informando explicitamente no dia 12 de agosto que o preço unitário das doses havia caído de US$ 20 para US$ 10,55. À CPI,Pazuello caracterizou a proposta do Covax como “nebulosa” e disse que as vacinas teriam sido oferecidas ao preço inicial de US$ 40 a dose. 

Chama atenção também o argumento apresentado por Rafael Mansur, advogado da União com atuação no Ministério da Saúde, em uma reunião interministerial no dia 2 de setembro. Ele diz que “um fator que dificultou a análise [do contrato] foi essa questão do português e do inglês”, ponderando que a barreira do idioma havia atrapalhado a análise do “texto jurídico”. 

O assunto voltou a aparecer em 17 de setembro, véspera do prazo final para adesão ao Covax: Jair Capelosi, consultor jurídico do Ministério da Saúde, queixou-se outra vez sobre as propostas contratuais estarem “todas em inglês” e pondera que fariam falta as “cópias traduzidas”. 

Só que não… Na ocasião, Fábio Marzano, do Itamaraty, interrompeu Capelosi para lembrar que todos os documentos haviam sido traduzidos e encaminhados pelo Ministério das Relações Exteriores para facilitar as tratativas. 

O esforço do Ministério da Saúde para dificultar a adesão parecia ser tanto que o consultor da pasta desconsiderou o trabalho do Itamaraty e clamou por uma “tradução oficial”, argumento rebatido pela chancelaria brasileira em Genebra já que nas tratativas com o Covax, em caso de divergências contratuais o que valeria legalmente, seria a versão original, em inglês. 

O resultado já sabemos: o Brasil foi um dos últimos a ingressar no consórcio e o fez de maneira limitada. Rejeitando a oferta para aquisição de doses suficientes para imunizar metade da população, o país optou pela quantidade mínima – correspondente a 10% dos brasileiros. 

E TEM MAIS

Apareceu mais uma contradição no depoimento prestado por Eduardo Pazuello à CPI. Documentos obtidos pela comissão após a quebra de sigilo telemático do general da ativa mostram que, ainda quando ministro, ele se reuniu com o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) por fora da agenda oficial para tratar da distribuição de cloroquina e hidroxicloroquina por hospitais militares. Quando depôs à CPI, o ex-ministro negou ter incentivado ou recomendado o uso do medicamento para o combate à pandemia. 

Já a negociação de 30 milhões de doses de CoronaVac com uma empresa intermediária pelo triplo do preço oferecido pelo Instituto Butantan, revelada em vídeo pela Folha, rendeu a Pazuello uma denúncia à Procuradoria da República no Distrito Federal. O autor da representação é o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), que também encaminhou a denúncia ao Ministério Público Militar, ao Ministério da Defesa, ao Comando do Exército e à Comissão de Ética Pública da Presidência, pedindo apuração de crime de responsabilidade. 

NAS RUAS

No sábado passado todos os estados brasileiros registraram protestos do 24J. Foi mais um dia da série de mobilizações que pede o impeachment de Jair Bolsonaro, mais vacinas e medidas para enfrentamento da crise social – como a geração de empregos e a retomada do auxílio emergencial de R$ 600. Os atos foram embalados pelos acontecimentos da última semana, com destaque para as ameaças à realização das eleições de 2022. 

Além de todas as capitais e cidades do interior do Brasil, houve protestos no exterior. Tóquio, Berlim, Salamanca e Lisboa foram algumas das cidades que ecoaram os gritos de “Fora Bolsonaro” pelo mundo. Segundo apuração do El País, as maiores manifestações foram registradas no Rio de Janeiro, Brasília, Recife e São Paulo. A Frente Ampla, formada por movimentos sociais, partidos políticos e entidades sindicais, calculou oficialmente mais de 500 cidades e cerca de 600 mil pessoas participando dos protestos. 

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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