20/04/2024 - Edição 540

Saúde

Covid: por que a cepa delta exige máscaras e mais vacinas

Publicado em 28/07/2021 12:00 -

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O Centro de Controle de Doenças (CDC) dos EUA decidiu voltar atrás e recomendar que mesmo pessoas vacinadas contra a covid-19 usem máscaras em espaços públicos fechados, nas áreas onde há alta transmissão do vírus. E pediu para que, no país inteiro, a proteção seja usada por todos os estudantes e funcionários de escolas.

O país viu os novos casos dispararem nas últimas semanas com a variante Delta, e o motivo é estagnação da campanha vacinal. Em maio, quando o CDC – num movimento bastante controverso – afrouxou o mascaramento, a motivação foi principalmente a ótima proteção individual conferida pelos imunizantes. Até hoje, praticamente todas as novas hospitalizações e mortes ocorrem entre não-vacinados

A decisão na época também foi baseada em pesquisas que demonstravam que as vacinas da Pfizer e da Moderna eram razoavelmente eficazes para reduzir a transmissão. Só que esses estudos se baseavam na circulação de outras variantes, em especial a Alfa, e os resultados não podem ser facilmente generalizados para a Delta, como explica a matéria da Nature. Sabe-se que há uma ligeira queda na proteção dos imunizantes da Pfizer e de Oxford/AstraZeneca contra doença sintomática causada por essa variante, o que pode significar também um enfraquecimento no potencial de reduzir a transmissão.

Segundo o CDC, dados recentes mostram que pessoas vacinadas infectadas com a Delta têm grande carga viral, mesmo não ficando gravemente doentes. O temor é que, nos estados com baixa cobertura – onde acontece a nova escalada –, pessoas que receberam os imunizantes continuem transmitindo o vírus, atingindo quem está desprotegido. Daí a necessidade de usarem máscaras.

Deve haver também outra razão de fundo: na prática, sempre foi inviável fiscalizar se apenas vacinados estavam deixando as máscaras de lado. Afinal, como identificá-los facilmente? “Portanto, o que nos resta é uma política mais ampla que diz que todos devem usar máscaras. Quer dizer, se você pudesse descobrir como fazer apenas os não-vacinados usarem máscaras, não precisaria forçar os vacinados a isso”, observa o médico Ashish Jha, reitor da Escola de Saúde Pública da Universidade de Brown, na New Yorker.

E o Brasil?

O endurecimento da pandemia nos Estados Unidos e em outros países com altas taxas de vacinação, agora com a Delta, dá uma ideia do que pode vir a acontecer com o Brasil em algumas semanas. Por aqui, essa variante ainda não está circulando de forma tão expressiva e a média de mortes continua em queda, como mostra o boletim do Observatório Covid-19 Fiocruz publicado ontem. 

A ocupaçãode leitosde UTI também seguem melhorando. Apenas Goiás e o Distrito Federal estão na zona de alerta crítico (com mais de 80%), mas isso ocorre por conta do fechamento de leitos. A maior parte do país, 16 estados, se encontra fora da zona de alerta, com menos de 60% de ocupação. É o melhor quadro desde novembro.

Só que o número de casos voltou a subir. Na corrida contra a Delta, a vantagem brasileira sobre os EUA e vários países europeus é que, aqui, praticamente a população inteira quer ser vacinada – e, além disso, o SUS tem experiência de sobra em fazer imunizantes chegarem aos lugares mais difíceis.

Em havendo doses disponíveis, o Brasil deveria ter plena condição de fazer como o Canadá, por exemplo: até meados de março, o país patinava na campanha vacinal, enrolado com atrasos na entrega. Naquela época, quando os EUA tinham dado pelo menos uma dose a 20% de sua população, no Canadá eram apenas 6%. Mas, quando o fornecimento foi resolvido, o percentual de vacinados disparou. Hoje, 70% dos canadenses já receberam alguma dose de imunizante, e nada menos que 56% estão com o esquema completo – os EUA, que chegaram a 40% de totalmente vacinados no fim de maio, até hoje lutam para alcançar os 50%. 

Por aqui, são agora 46% da população com ao menos a primeira dose (cerca de 60% da população adulta), o que é um percentual razoável. Mas ainda são apenas 18% com o esquema completo (um quarto da população adulta). Ou seja, falta muito chão.

O boletim da Fiocruz nota também que a vacinação tem avançado de forma muito desigual país afora. Isso tem levado pessoas a buscarem suas doses em outras cidades, distantes até 250 km do município de residência. Forma-se uma confusão: além de os deslocamentos facilitarem a circulação do vírus, ainda tornam difícil para esses municípios prever a quantidade de doses necessárias para suprir a demanda extra.

Pior Crescimento

O mundo viu na última semana a maior alta nos óbitos por covid-19 desde abril de 2020, quando a pandemia mal havia começado: foi um aumento de 20%. Enquanto a Europa ainda vê seus números caindo, o crescimento global foi impulsionado por uma alta de 30% nas mortes no Sudeste asiático; também foram registradas pioras no Leste do Mediterrâneo, na África e nas Américas.

Neste momento, Namíbia, Tunísia, Fiji, Botsuana e Oman são os países com o maior número de mortes diárias por covid-19, em relação ao tamanho de suas populações. No continente americano, Paraguai, Colômbia, Argentina e Cuba têm os piores indicadores. 

De Mosoka Fallah, ex-chefe do Instituto Nacional de Saúde Pública da Libéria, na Nature: “Durante o pior período do surto de ebola na Libéria, em julho, agosto e setembro de 2014, vi pessoas morrerem nas ruas. Em grande parte, o mundo nos deixou para combater sozinhos uma ameaça à saúde global. No entanto, quando um punhado de infecções por ebola atingiu os países desenvolvidos, cerca de US$ 3,5 bilhões foram investidos para combater o surto. Essa enorme soma veio tarde demais para salvar muitos dos 11,3 mil que morreram na África Ocidental. Menos de uma década depois, aqui estamos nós de novo. (…) Em janeiro, enquanto os países ricos estavam implementando a distribuição de vacinas, ajudei a organizar uma convocação para a ação com 30 veteranos do ebola e 81 profissionais de saúde que, reconhecendo a ameaça que a covid-19 representa para a África, pediram à Assembleia Mundial da Saúde para agir para garantir vacinas. Por que ainda estamos esperando?


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