Brasil
Publicado em 01/04/2021 12:00 -
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O Congresso Nacional aprovou um corte de mais de 90% no orçamento do Censo do IBGE que estava planejado para este ano. Digo "estava" por que esse valor inviabiliza na prática o levantamento, fundamental para o país.
A previsão era gastar R$ 2 bilhões neste ano – o que já seria uma sombra da estimativa de R$ 3,4 bilhões de 2019. Naquela época, o valor foi desidratado e o número de questões, reduzido.
O Censo, que já estava atrasado um ano por conta da pandemia, entrou na fila da UTI. Funcionários ainda temem pela covid, mas não foi isso que enterrou a pesquisa, mas o fato de termos um governo que não dá valor para dados e fatos reais e que construiu essa desidratação orçamentária.
No último dia 25, a presidente do IBGE, Susana Guerra, pediu exoneração por "motivos pessoais".
Não é preciso ser especialista para entender que um país deve fornecer informações confiáveis não apenas sobre sua economia, mas a respeito dos outros aspectos da vida cotidiana, a fim de que pessoas, organizações e empresas tomem decisões baseadas na realidade.
O Brasil sempre produziu números embasados, nossos institutos têm renome internacional e os trabalhadores desses órgãos são de grande competência. Mas os últimos tempos têm sido sinistros para quem trabalha com levantamento de de dados, uma vez que o próprio governo, insatisfeito com a realidade, vem comprando brigas com ela.
Para nossos gestores, não raro, o problema não é uma febre, mas o termômetro que a indica.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, menosprezou o questionário do Censo. "Vamos tentar, pelo amor de Deus, simplificar", afirmou no dia 22 de fevereiro de 2019, sugerindo a redução do questionário. "Se perguntar demais você vai acabar descobrindo coisas que nem queria saber. Sejamos espartanos, façamos as coisas mais compactas e vamos tentar de toda forma ajudar", disse.
O presidente Jair Bolsonaro já afirmou que a metodologia de cálculo de desemprego do IBGE estava errada porque não concordava com ela.
O general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, disse que as taxa de desmatamento eram manipuladas e infladas.
Osmar Terra, então ministro da Cidadania, já reclamou que não confiava em pesquisa da Fiocruz, instituição de renome internacional que, hoje, vem sendo fundamental para a produção de vacinas contra a covid e o combate à pandemia.
O chanceler Ernesto Araújo não acredita em mudanças climáticas e afirmou que o aumento da média da temperatura global ocorreu porque estações de medição de temperatura que estavam no "mato" hoje estariam no "asfalto".
Aliás, após dizer que tinha a "convicção" de que dados de desmatamento da Amazônia do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais são "mentirosos" e ouvir uma resposta dura de Ricardo Galvão, então chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Bolsonaro revelou que o objetivo era maquiagem mesmo.
Disse que estava preocupado com dados que podiam "prejudicar o país", ser "propaganda negativa" ao Brasil no exterior. E que se Galvão tivesse identificado dados alarmantes, deveria ter procurado seus superiores para avisar por questão de "responsabilidade" e "patriotismo".
O atual governo federal é um motorista que conduz o país por uma estrada esburacada e, ao invés de usar toda informação possível para uma travessia tranquila, grita que as placas sinalizando "pista escorregadia" são fake news, e acelera.
Após um esperado acidente, lamenta o ocorrido dizendo que nunca desconfiou das placas ou as culpa por uma suposta falta de clareza – e critica quem diz que ele não sabe dirigir.
Já fiz essa análise aqui, mas achei que valia a pena trazê-la de novo. Pois tudo isso seria engraçado se nós não fossemos nós os passageiros desse ônibus, que não conta com cinto de segurança.
Políticos pouco afeitos à democracia, quando colocados contra a parede, tendem a reduzir a transparência de informações às quais a sociedade tem acesso a fim de adaptar a realidade à sua narrativa.
Não foi à toa que veículos de comunicação se juntaram em um consórcio, em junho do ano passado, para apurar e divulgar os dados sobre casos e óbitos por covid-19 diariamente. Isso surgiu a partir do momento em que o Ministério da Saúde começou a fazer malandragem com a sua divulgação uma vez que os números de mortos começavam a incomodar.
Pelo menos é um governo que honra suas origens. Diante de cenários negativos, tortura números até que gritem o que ele deseja ouvir.
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