20/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Nosso verme quer imitar o verme gringo. Vamos permitir?

Publicado em 07/01/2021 12:00 - Victor Barone

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

Manifestantes a favor de Donald Trump invadiram o Congresso dos Estados Unidos, enquanto deputados e senadores debatiam a ratificação da eleição de Joe Biden. A cena, que viralizou imediatamente pelo mundo, mostra o que acontece quando um presidente ataca sistematicamente instituições da República, minando a credibilidade do sistema eleitoral e reduzindo o respeito aos outros poderes.

Ao mesmo tempo é um exemplo (leve) do que pode ocorrer daqui a dois anos no Brasil, considerando que Jair Bolsonaro tem acusado o sistema eleitoral brasileiro de fraude sem apresentar provas enquanto seus aliados e seguidores atacam instituições. Vale lembrar que também tivemos por aqui tentativa de invasão do Congresso Nacional e lançamento de rojões contra o Supremo Tribunal Federal. Isso sem contar ato pedindo o fechamento dessas instituições que contou com discurso do presidente da República.

Trump jogou gasolina na fogueira ao convocar um grande protesto em Washington D.C. e incentivar que seus seguidores pressionassem o Parlamento a não confirmar o democrata – apesar da sessão de hoje ser mera formalidade, uma vez que os votos do colégio eleitoral já foram dados.

Depois que imagens mostraram manifestantes forçando a entrada em cima de agentes de segurança no Capitólio, Trump foi às redes sociais pedir que os atos fossem pacíficos. Hipocrisia de quem, com o leite derramado, quer fugir da responsabilidade.

Ele não precisava pedir uma invasão ao Congresso para ser responsável quando isso ocorresse. Durante semanas, seus discursos inflamados, acusando as eleições de terem sido roubadas, foram decantando em pessoas que nele confiam o entendimento equivocado de que há um golpe de Estado em curso contra ele. Muitos de seus seguidores não percebem que estão atacando a democracia. Acreditam estar salvando-a.

Ao mesmo tempo, dentro do Parlamento, um grupo de deputados e senadores republicanos fazia de tudo para levar a cabo a tentativa de golpe de Trump, mesmo sem chances de sucesso. Foram beneficiados pela interrupção das sessões devido à ocupação dos plenários.

ENQUANTO ISSO, NUM CERTO PAÍS DA AMÉRICA DO SUL…

Assim como Trump, que perdeu a eleição nos EUA e culpou o sistema eleitoral, Bolsonaro ataca a urna eletrônica, expandindo uma dúvida antes restrita a pequenos grupos que acreditam em teorias da conspiração – o que pode ser útil para questionar o resultado das eleições em 2022, caso lhe seja desfavorável. O presidente defende que as urnas produzam um comprovante impresso, mesmo que especialistas afirmem que isso só tumultuaria o processo.

A campanha de desinformação contra nosso sistema eleitoral levada a cabo por bolsonaristas tem surtido efeito, tanto que pesquisa Datafolha, publicada nno último dia 3, apontou que 23% da população quer a volta do voto em papel, ironicamente mais suscetível a fraudes e que leva mais tempo para ser apurado.

Jair ajuda a pavimentar sua narrativa para a batalha que irá logo adiante dentro de um projeto maior. Assim como nos EUA, declarações como essas, sem provas, vindas de um presidente, fragilizam instituições. Simultaneamente, o governo Bolsonaro já tentou sequestrar ou enfraquecer Coaf, Receita Federal, Polícia Federal, Procuradoria-Geral da República, instituições de fiscalização e controle.

No primeiro turno das eleições do ano passado, milícias bolsonaristas se aproveitaram de problemas do Tribunal Superior Eleitoral (que em nada afetaram a segurança da votação) para colocar sob suspeita as eleições nos municípios em que seus candidatos não foram bem votados e para lançar um véu de dúvida sobre o sistema como um todo. Na mesma época, o presidente demorou para reconhecer a vitória de Joe Biden. "Eu estou aguardando um pouco mais", disse. "Teve muita fraude lá, isso ninguém discute."

CORROSÃO DAS INSTITUIÇÕES

Colocar em dúvida o resultado tem servido, nos Estados Unidos, para tentar melar o pleito, mas também para que Trump seja visto como vencedor real pelos seus seguidores fiéis, mantendo sua força, e, ao mesmo tempo, dificultar que ele seja processado por crimes fiscais após deixar o cargo e reduzir a legitimidade do governo do adversário.

O efeito colateral de dobrar o país às necessidades individuais é uma população que acreditará menos no sistema eleitoral, nas instituições e em tudo aquilo que a mantém conectada como país.

Em março do ano passado, sem apresentar evidências, Bolsonaro afirmou que havia sido eleito no primeiro turno de 2018, mas foi roubado. Houve forte reação por parte de ministros do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal, que reafirmaram a lisura e a confiança no sistema. Foi o bastante para causar estrago e plantar dúvida.

No Brasil, instituições são menos robustas do que nos EUA. Aqui, há sempre um militar de alta patente que ameaça a Suprema Corte pelo Twitter, milhares de pessoas que vão às ruas pedir autogolpe e um bom punhado de saudosistas que sofrem por não vivermos em uma ditadura – apesar da tortura e da morte continuarem pela mão da parcela bandida de agentes de segurança nas periferias.

O RISCO EUA: O QUE ACONTECE LÁ É IMITADO POR AQUI

O que aconteceu no Capitólio é uma lição para o Brasil se preparar para 2022. Não uma lição apenas para bolsonaristas, mas para todos os que prezam pela democracia. Pois, por aqui, com uma democracia mais jovem, instituições mais frágeis e Forças Armadas com uma relação, não raro, promíscua com o presidente, podemos não ter um desfecho republicano.

Milhares de seguidores de Bolsonaro insatisfeitos com uma derrota de seu herói vão se satisfazer com protestos contra o resultado ou vão querer invadir instituições e atacar jornalistas? O que pode acontecer se bolsonaristas, que foram generosamente armados pelo presidente nos últimos anos, resolvam ir às ruas e encontrarem com soldados, cabos e sargentos simpáticos a Bolsonaro? O que acontece quando um governo com laços com milícias é profundamente contrariado?

Por Leonardo Sakamoto

TÁ DOIDO

Matéria de capa da revista Crusoé desta semana destaca foto do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido) com a pergunta: “Ele está louco?”.

A revista, do mesmo grupo do site O Antagonista, consultou psiquiatras, psicanalistas e psicoterapeutas brasileiros para responder a essa pergunta.

Na chamada da reportagem, a revista avisa: “Ao afirmar que o país está quebrado, Bolsonaro rasga dinheiro. Ao ordenar a suspensão da compra de seringas, ele de novo brinca com a vida dos brasileiros. Fomos atrás de especialistas para entender se o presidente está lelé”.

PROFISSIONAIS

O general Santos Cruz, ex-ministro do governo Bolsonaro, descartou a possibilidade das Forças Armadas apoiarem uma tentativa de golpe do presidente em 2022. A informação é da Folha de S.Paulo. “São profissionais, não dão suporte a aventureiros”, afirmou.

A declaração veio após Bolsonaro de que no Brasil pode acontecer algo pior do que a invasão do Capitólio nos Estados Unidos. Lá, o episódio deixou quatro mortos.

“O presidente tem que atuar dentro da lei para criar o voto impresso, e não ficar com ideia subliminar para fazer bagunça”, reforçou Santos Cruz.

QUEBRADO

"Chefe, o Brasil está quebrado, e eu não consigo fazer nada", afirmou Jair Bolsonaro, nesta terça (5), a apoiadores. "Um presidente é eleito para garantir qualidade de vida à população e não para combater fantasiosas 'mamadeiras de piroca' ou usar o cargo para proteger a família e os amigos. Se ele analisa que não é capaz de cumprir a exigência do cargo que ocupa, tirando o Brasil do atoleiro, o mais justo e honrado a ser feito é renunciar e dar lugar a quem saiba", avalia Leonardo Sakamoto.

QUE MARAVILHA

Entre um país que está quebrado (Bolsonaro, na terça) ou que está uma maravilha (Bolsonaro, na quarta) há uma enorme diferença. Ela é igual ao tamanho da perda de credibilidade de quem faz essas afirmações de forma tão inconsequente. Um presidente que se gaba num dia de ter poder para quase tudo, e no outro declara que não pode nada.

Por achar que para governar bastava ser engraçadinho com a claque à qual se dirige na porta do Alvorada – além de animador de auditórios virtuais –, Bolsonaro arriscou a credibilidade e perdeu a autoridade. Do ponto de vista formal (do relacionamento entre os poderes, por exemplo), a autoridade do presidente já vinha sendo encurtada desde o primeiro dia de mandato pela incapacidade dele de liderar e se articular frente ao Legislativo e ao Judiciário.

Em outras palavras, a caneta do presidente tem menos tinta hoje do que há dois anos. Mas a autoridade política, subjetiva, se deteriorou mais rápido ainda com a pandemia. Uma coisa é ser falastrão diante de desafios da política, como os de levar adiante reformas estruturantes, desatar os nós da economia, derrubar o governo da Venezuela, peitar os críticos internacionais das políticas ambientais, prometer maravilhas e por aí vai.

Outra coisa completamente diferente é ser falastrão diante de uma crise sanitária sem precedentes na memória de qualquer geração atual, em escala planetária. Cabe não confundir autoridade com popularidade, embora em ocasiões uma coisa tenha influência sobre a outra. A autoridade de Bolsonaro que foi embora é preciosa: é aquela atribuída a quem se confia ser capaz de ajudar a resolver uma crise aguda de vida ou morte para milhares de pessoas.

Ao tratar assuntos (pandemia), pessoas (adversários políticos), instituições (chefes de outros poderes), eventos externos (eleições em outros países) com declarado desprezo ou desrespeito, pelos fatos e pela ciência, o presidente brasileiro em boa parte incentivou a atmosfera atual, na qual a ele se dá pouco respeito. De novo, estamos diante de um fator político difícil de quantificar, mas palpável: a ridicularização do personagem político, como acontece hoje com Bolsonaro, é um indício claro de perda de autoridade.

Dela ele precisará bastante se for capaz – há uma aparente unanimidade no mundo político de que ele não será – de proceder às difíceis escolhas que tem pela frente para, por exemplo, equilibrar as contas públicas ao mesmo tempo garantindo uma renda mínima e uma alta taxa de investimentos. Bolsonaro vacilou diante de qualquer decisão abrangente até aqui, uma característica detectada pelo apurado olfato das feras do Centrão, em que está depositada no momento o que existe de autoridade política do presidente.

Não se pode criticar políticos, como Bolsonaro, que confundem índices de popularidade com autoridade. De fato, é difícil governar sem uma ou sem outra, em qualquer lugar. São fatores reais no mundo da política. Da mesma maneira, não se pode condená-los simplesmente pelo comportamento tão normal assumido por eles, que é aderir ao curto prazo deixando a visão de longo alcance para um eterno “depois”. 

Bolsonaro sacrificou autoridade em busca de popularidade efêmera e volátil. Corre o gravíssimo risco de acabar ficando sem as duas.

Por William Waack

QUE ÉTICA?

O Conselho de Ética da Câmara encerrou 2020 de forma lastimável. Não apreciou uma representação sequer das várias pendentes no órgão. São pelo menos dez, todas protocoladas ainda em 2019.

Não faltaram promessas de que o conselho iria trabalhar de forma remota. Mas o projeto de resolução que autorizaria o funcionamento do colegiado por videoconferência não foi votado. Está há cinco meses parado na Mesa da Câmara.

Os servidores do conselho chegaram a ser treinados no sistema remoto, mas suas excelências não moveram uma palha. O corporativismo das excelências é sempre mais forte do que qualquer pandemia.

E em fevereiro, toda a composição do conselho será alterada. Ou seja, mais postergação. Felizes são os acusados, que ganham sobrevida nos seus mandatos, caso da deputada Flordelis (PSD-RJ), cujo processo nem chegou ao conselho até hoje.

Agradecido também fica Eduardo Bolsonaro, que é alvo de ação no conselho por ter feito defesa da volta do AI-5.

Por Radar

ARMAÇÃO

A manifestação a favor de Jair Bolsonaro e contra o João Doria na Praia Grande teria sido uma encenação? É o que dizem certos relatos que surgiram nas redes sociais, alguns acompanhados de fotos e vídeos. Durante alguns minutos, o presidente se banhou no mar da cidade do litoral paulista, em atividade que causou uma pequena aglomeração de centenas de pessoas, as quais fizeram coro a favor do mandatário e ofenderam o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). No entanto, as redes sociais têm mostrado outra versão daquela cena. O primeiro indício partiu de uma internauta chamada Ester Nogueira. Ela assegura que “estava tudo normal, praia com algumas dezenas de pessoas na areia, outras tantas em quiosques, quando um movimento estranho se iniciou”. Em seguida, Ester conta que “um número de homens foi chegando à orla, e entrando no mar, como a espera de algum acontecimento, do qual mais ninguém sabia. Após uns vinte minutos chega o falastrão, cheio de pompa, e dentre os seus ‘seguranças’, que foram os primeiros a descer da embarcação, começaram a puxar um coro sinistro, com palavras de baixo calão, para incendiar a turba. Após o teatro macabro, estes mesmos que haviam aparecido do nada, se dispersaram e a praia voltou ao seu normal”. Também surgiram fotos e vídeos tomados desde edifícios próximos ao local onde a aglomeração aconteceu, mostrando que o movimento na praia não era tão favorável ao presidente como se via no vídeo da última sexta.

COMO NASCE UM MILICIANO: A TRAJETÓRIA DE UM EX-PM, DA FARDA AO CRIME

Como um PM do Rio se tornou um miliciano após ser expulso da corporação por uso ilegal de armas e dirigir sem habilitação. E a história repete o que ocorria com os grupos de extermínio.

GENTE DE BEM

Imagens de um suposto delegado da Polícia Federal humilhando uma idosa de 86 anos em Brasília (DF) passaram a circular nas redes sociais. O agressor, que não teve a identidade revelada, ofendeu Dona Isaura por achar que ela estava falando muito alto. “Leva para o lixo ou para o hospício”, diz o homem na gravação. Quem filma toda a cena é o passageiro Igor Moraes, de 23 anos, que acabou perdendo o seu voo por conta da confusão que ocorreu no Aeroporto Juscelino Kubitschek. O agressor, que insistia em se apresentar como delegado da PF, foi confrontado por Igor: “Se você é delegado, problema seu. Eu acho que você tem que ter respeito”. “Mas para ficar ouvindo essa merda, não. Nós estamos aqui em um ambiente público”, rebateu o agressor. De acordo com funcionários do aeroporto, Dona Isaura mora no local há mais de 20 anos. Ela é surda desde os 38 anos e usa cartazes para se comunicar com as pessoas.

GENTE DE BEM 2

A juíza Ludmila Lins Grilo, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais , publicou um vídeo em seu perfil no Twitter no qual faz um “passo a passo” para andar sem máscara no shopping “de forma legítima” e “ainda posar de bondoso”. Na publicação a magistrada aparece caminhando com uma máscara pendurada na orelha e com um pote de sorvete na mão. “O vírus não gosta de sorvete”, debocha a juíza.

Grilo ainda escreveu em três itens como seria a “estratégia”. Ela recomenda que se compre sorvete, pendure a máscara no pescoço ou na orelha “para afetar elevação moral” e “caminhe normalmente”. Outras postagens no Twitter de Ludmila Lins Grilo mostram que um dos objetivos de vida da juíza é sabotar as metas de isolamento social. Ela apoia publicamente o movimento “aglomera Brasil”.

FRASES DA SEMANA

“Se tivesse sido um grupo do movimento Black Lives Matter que protestava, teria recebido um tratamento diferente do que recebeu o grupo de bandidos que invadiu o Congresso. Todos nós sabemos que isso é verdade. E é inaceitável”. (Joe Biden, presidente eleito dos Estados Unidos)

“O Congresso americano foi saqueado enquanto o líder do mundo livre se encolhia atrás de seu teclado, tweetando. Mentiras têm consequências. A violência foi o resultado inevitável do vício do presidente em alimentar constantemente a divisão.” (Ben Sasse, senador republicano)

“É muito mais coisa por trás dessa pandemia que vem com o intuito de nos destruir. Nós somos o incômodo, o calo dos comunistas. Somos nós cristãos, mas somos também a resistência e vamos permanecer fiéis, porque Deus vai nos proteger”. (Elba Ramalho, cantora)

“Sabia que o tio estava na praia nadando de máscara? Mergulhei de máscara também, para não pegar Covid nos peixinhos”. (Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, ao debochar mais uma vez do uso de máscaras contra o coronavírus)

“Os atrasos e recalcitrâncias na importação das vacinas já passam do tolerável. Países vizinhos estão iniciando a imunização. Estabelecer um cronograma de vacinação é medida urgente. A ignorância não pode prevalecer sobre a ciência”. (Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal)

É tudo muito teatral, jogo para a torcida. São pessoas que vivem no mundo virtual e não entendem que há um processo legislativo. Falta um pouco de conteúdo, e precisa de menos rede social, menos pancadaria.” (Janaina Paschoal, deputada do PSL-SP, sobre a direita brasileira)

“Este ano, enquanto esperamos pela recuperação e novos tratamentos, não negligenciemos os cuidados. Porque, além da vacina para o corpo, precisamos da vacina para o coração, que é o cuidado. Será um bom ano se cuidarmos dos outros”. (Papa Francisco)

Leia outros artigos da coluna: Ágora Digital

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *