28/03/2024 - Edição 540

Mato Grosso do Sul

Trutis fingiu atentado para defender porte de arma, conclui PF

Publicado em 13/11/2020 12:00 -

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A investigação policial do suposto atentado sofrido em fevereiro de 2020 pelo deputado federal Loester Trutis (PSL), alvo da Operação Tracker, concluiu que o ataque relatado pelo parlamentar foi simulado. A motivação seria forçar uma situação que fosse capitalizada politicamente em defesa do porte de arma por civis, uma das bandeiras de seu mandato parlamentar.

As informações constam em decisão interlocutória da ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), que ordenou deflagração da operação, ocorrida na manhã do último dia 13, na qual Trutis também foi preso por porte de arma de uso restrito. A conclusão citada foi decorrente de laudos periciais no veículo e no local, dentre outros.

Para a decisão que ordenou a deflagração da operação, Rosa Weber considerou laudos periciais de exame de local, de identificação de resíduos de disparo de arma de fogo, de informática e de balística, além de diligências de campo, colheita (sic) de depoimentos, pesquisas em bancos de dados e reprodução simulada dos fatos.

As provas embasaram a hipótese de que “prática de condutas que, ao menos em tese, amoldam-se às figuras penais tipificadas nos artigos 14 e 15 da Lei nº 10.826/2003 (porte ilegal de arma de fogo de uso permitido e disparo de arma de fogo), 163 e 340 do Código Penal (dano e comunicação falsa de crime), entre outros ilícitos que podem vir a ser desvendados no curso das investigações”.

Conforme o relato de Trutis, no momento do ataque, supostamente promovido por ocupante de uma Mitsubishi L200 no km 374 da rodovia BR-060, o deputado estava acompanhado do assessor Ciro Fidélis, e conseguiu revidar o ataque com cinco a seis disparos. Todavia, o laudo apontou que os disparos ocorreram “de modo incompatível com a ação descrita” pelo deputado.

Já quanto à trajetória dos disparos dentro do veículo, o laudo também “concluiu que apenas em uma situação muito específica, com o primeiro disparo atingindo o porta-malas, o ocupante do banco traseiro sairia ileso da ação”. O laudo também aponta que a maioria dos disparos poderia ter sido feito por atirador embarcado ou não, mas que um deles “não é compatível com o atirador embarcado em uma caminhonete, por ter trajetória ascendente”.

As investigações também fizeram as suspeitas ramificarem para demais aliados de Trutis. Como não tem registro formal de arma em seu nome, e como havia confirmação do empréstimo, a PF também concluiu que arma que Trutis ostenta em publicações nas redes sociais seja de propriedade de Alberto Carlos, seu irmão. Segundo o documento, a marca é similar àquela responsável pela impressão de raiamento no encamisamento de projétil encontrado no interior do veículo onde estavam o parlamentar e seu assessor.

Estrada vicinal

Mais um laudo, com base em informações fornecidas por empresa de GPS no veículo alugado no qual estava o parlamentar e seu assessor, demonstraram que o veículo foi conduzido por duas estradas vicinais, sem asfalto, localizadas próximas à BR 060, permanecendo parado, com a ignição desligada em uma delas (fato não informado pelos investigados).

As investigações também analisaram câmeras de segurança instaladas às marges da BR-060, nas quais apontam-se “imagens indicativas de que o veículo dos investigados transitou em velocidade baixa, alternando sentidos (o que indicaria sucessivos retornos na rodovia), e efetivamente deixou a pista de rolamento da rodovia federal e adentrou em estrada de terra, cuja entrada se localiza em frente à empresa Tecnoblock”.

Por fim, um laudo pericial de exame de local, que examinou uma das estradas vicinais indicadas no GPS do veículo e na câmera de segurança da empresa Tecnoblock. “No local onde, segundo informações extraídas de seu rastreador, o veículo esteve parado, apreende estojos de munição calibre 9mm e fragmento de vidro”

Planejamento

As investigações também detalharam provas encontradas nos telefones celulares dos envolvidos, que voluntariamente cederam os equipamentos para perícia. No caso, foram identificada mensagens entre o assessor Ciro Nogueira Fidélis e um terceiro chamado Jovani em tratativas a respeito de armamento, caça, prática de tiro desportivo e assuntos afins.

“Indicam ainda que, poucos dias antes do suposto atentado, os interlocutores teriam passado a tratar de um assunto de modo cifrado (‘aquela prosa’), trocando mensagens de potencial interesse para a investigação apagadas do celular do primeiro e que podem estar preservadas no celular do segundo. A apreensão dos aparelhos serve, finalmente, para a apuração do elemento subjetivo das condutas dos agentes que não tiveram participação material direta e imediata no evento suspeito”, traz trecho da decisão.

Com base nas provas periciais apresentadas, foi que a ministra entendeu a necessidade de deferir mais diligências. “Enfim, tais elementos demonstram a necessidade de implementação das diligências requeridas, a fim de que sejam preservadas as provas potencialmente conducentes à revelação da autoria dos delitos, em tese, perpetrados”.

Uso político

A decisão de Weber detalha que a simulação do atentado ocorreu com o objetivo “de capitalizar politicamente o parlamentar e promover pautas de interesse de seu mandato, como o porte de armas e a autodefesa por civis”. Weber cita, inclusive, depoimento de Trutis, ainda como vítima de tentativa de homicídio, no qual afirmou que não poderia “indicar com certeza, mas certamente decorre de sua atuação como Deputado Federal, pois em razão de sua atuação acaba irritando muita gente do Estado de Mato Grosso do Sul”.

Assim, como não haveria motivação clara para o atentado e como houve extensa exploração pública do episódio, levantou-se suspeita de que “o atentado contra a vida do parlamentar pudesse ter sido simulado a fim de promover a capitalização política dos acontecimentos pela ‘vítima'”.

Clique AQUI para conferir a decisão na íntegra.


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