20/04/2024 - Edição 540

Poder

Acuado, Bolsonaro leva seu governo para o brejo

Publicado em 19/06/2020 12:00 -

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O mais potente de todos os golpes desferidos até agora em direção ao presidente da República ocorreu na quinta-feira 18, com a prisão do ex-policial Fabrício Queiroz, suspeito de ser laranja da família Bolsonaro e considerado testemunha-chave na investigação do esquema de rachadinha no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador.

A prisão, por si só, já representaria um fator de desgaste para o presidente Jair Bolsonaro, que sempre reclamou do uso do caso para desestabilizar o seu governo. Mas ela tem uma agravante: Queiroz foi detido numa casa em Atibaia, no interior de São Paulo, que pertence ao advogado Frederick Wassef, defensor de Flávio no inquérito da rachadinha e detentor de uma procuração assinada pelo presidente lhe dando amplos poderes para representá-lo na Justiça. Ou seja, dependendo do que vier a ser descoberto de agora em diante, ficará cada vez mais difícil estabelecer uma barreira separando Queiroz e suas transações financeiras suspeitas dos ex-­patrões Flávio e Jair Bolsonaro.

Não é exagero dizer que o destino do governo passa pelo que o ex-po­licial pode revelar. Desaparecido desde que explodiu o escândalo das rachadinhas na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, no fim de 2018, Queiroz virou uma espécie de assombração. A suspeita das autoridades é de que ele recolhia parte dos salários dos funcionários do gabinete de Flávio e repassava os valores ao próprio deputado. As investigações já revelaram que ele movimentou 7 milhões de reais entre 2014 e 2017. Para não deixar rastros, o dinheiro era arrecadado e depositado em espécie. O Ministério Público também encontrou um repasse de Queiroz para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro (24 000 reais). O presidente, em entrevista, disse que se tratava de pagamento de um empréstimo. Na única vez que se pronunciou sobre o caso, Queiroz disse que ganhou dinheiro comprando e vendendo carros. Depois disso, sumiu do mapa. Não deu mais entrevistas, mudou de endereço, trocou o número dos telefones e o máximo que se sabia dele é que estava em São Paulo, submetendo-se a tratamento de um câncer.

Depois de mais de um ano da eclosão do caso, a Justiça do Rio autorizou a prisão preventiva de Queiroz e da mulher dele, Márcia Aguiar, após investigadores reunirem evidências de que o ex-assessor poderia eliminar provas importantes para o esclarecimento do caso da rachadinha. Segundo os promotores, Queiroz mantinha contato com outras testemunhas com o objetivo de atrapalhar as apurações em curso. Ex-funcionária do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia do Rio e ex-mulher de Adriano Magalhães da Nóbrega, amigo de longa data de Queiroz, Danielle da Nóbrega escreveu numa mensagem que tinha sido avisada de sua demissão pelo “amigo”. Adriano da Nóbrega, morto em fevereiro deste ano, respondeu: “O amigo pediu pra vc não ir em lugar nenhum e tbm não assinar nada (sic)”. O amigo, de acordo com os investigadores, era Queiroz. Em outra mensagem, a mulher de Queiroz chega a compará-lo com um preso que estava “dando ordens” e “resolvendo tudo”.

A operação para prender o ex-policial foi batizada de “Anjo”, numa referência ao advogado Wassef, que se apresenta como o protetor da família presidencial. Como convém a operações dessa natureza, tudo foi planejado sob grande sigilo. Os policiais chegaram a Atibaia às 6 da manhã, tocaram a campainha e, como ninguém atendeu, arrombaram a porta. Queiroz estava dormindo numa cama improvisada. “Ele perguntou o que era a prisão. Leu com calma o mandado e fez contato com a filha dele para avisar que estava sendo preso, mas estava bem”, afirmou o promotor Jandir Moura, responsável pela operação. A polícia apreendeu com ele dois telefones celulares, documentos e uma pequena quantidade de dinheiro. O ex-­PM foi transferido para o Rio de Janeiro, onde será interrogado nos próximos dias — o momento mais delicado da investigação que começou quando Jair Bolsonaro ainda era candidato a presidente da República.

A prisão de Queiroz põe em risco a estratégia da família Bolsonaro para tentar enterrar o caso da rachadinha e suas implicações políticas. O plano era manter o ex-PM escondido, distante do alcance dos investigadores, até que o advogado Frederick Wassef conseguisse na Justiça o arquivamento do caso. Desde o início do ano passado, Wassef apresentou inúmeros recursos, em diferentes instâncias, com esse objetivo, mas até aqui fracassou. O último deles seria julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) na terça-feira passada (16), mas a análise foi adiada a pedido da própria defesa. Wassef sempre alegou que o senador é inocente e a família, alvo de uma conspiração. Em conversas reservadas, dizia temer que o ex-assessor, se fosse preso, pudesse ser coagido a testemunhar contra os Bolsonaro. Por trás dessa trama, segundo ele, estaria o governador do Rio, Wilson Witzel, adver­sário de Bolsonaro, que usaria para fins políticos seus aliados na polícia, no Ministério Público e na Justiça fluminenses. O que não se sabia é que o próprio advogado se encarregara de manter o ex-policial fora do alcance de quem quer que fosse.

Em abril passado, a revista Veja revelou como o caso preocupava os Bolsonaro. Em conversas reservadas, membros da família manifestavam a apreensão com a possibilidade de, diante da crise política e econômica e da perda de popularidade do presidente, haver a prisão de Queiroz e de seus familiares, o que poderia levá-lo a contar os seus segredos. O objetivo da ação não seria atingir apenas Flávio, mas principalmente desestabilizar o governo. Àquela altura, Queiroz parecia sob controle, como mostrou um áudio revelado. Disse o ex-PM na gravação: “Valeu, valeu, meu irmãozão. Obrigado por tudo aí, tá? Gratidão não prescreve, cara, não prescreve mesmo. O que você está fazendo pelas minhas filhas aí, cara, não tem preço. Serei eternamente grato, entendeu?”. A promessa de gratidão — não se sabe a quem — foi feita quando Queiroz já estava escondido no sítio de Wassef. Ela reforça a hipótese de que havia um esquema de blindagem patrocinado pela família Bolsonaro desde o início do escândalo para evitar que o ex-PM fosse alcançado pela polícia.

Ex-aliado convertido em desafeto, o empresário Paulo Marinho fortaleceu essa versão. Ele contou à Polícia Federal que, entre o primeiro e o segundo turnos da eleição de 2018, três assessores de Flávio foram avisados por um delegado de que seria deflagrada uma operação, batizada de Furna da Onça, que alcançaria Queiroz e familiares dele empregados nos gabinetes da família Bolsonaro. A operação teria sido adiada para depois da votação, a fim de não atrapalhar a campanha de Jair Bolsonaro, conforme relato do tal delegado. Com base nessas informações, Jair e Flávio demitiram o ex-assessor e seus parentes, numa tentativa de se antecipar às revelações das transações financeiras milionárias de Queiroz, finalmente tornadas públicas em dezembro de 2018, quando o ex-capitão já estava eleito presidente da República. Em depoimento sigiloso de cinco horas na Superintendência da Polícia Federal no Rio, Marinho afirmou ter ouvido todos os detalhes desse enredo numa reunião com o próprio Flávio, de quem é suplente.

“O senador Flávio Bolsonaro começou relatando que estava muito preocupado com a questão Queiroz”, afirmou o empresário no depoimento, ao qual VEJA teve acesso. Em outro trecho, Marinho ressalta que o senador também se disse “muito preocupado com a possibilidade desse fato causar um dano ao governo do pai dele” e que o parlamentar “ficou emocionado e chegou a lacrimejar”. O empresário contou ainda que ele, Flávio e Gustavo Bebianno, à época braço direito de Jair Bolsonaro, decidiram contratar um advogado. Vários foram consultados, mas, durante as negociações, um azarão assumiu o caso: Frederick Wassef, com a bênção de Jair Bolsonaro. Wassef sempre teve uma preocupação especial com Queiroz. Uma demonstração disso foi a recente indicação que ele fez, para defender o ex-PM, do advogado Paulo Emílio Catta Preta, que representa também a família do ex-capitão do Bope Adriano Magalhães da Nóbrega, antigo parceiro de Queiroz. São muitos os elos soltos. Fabrício Queiroz, acreditam os investigadores, é o único que pode unir todos eles.

Calcanhar de Aquiles

Queiroz é o grande calcanhar de Aquiles da primeira-família, acusado de ser o responsável por gerenciar as "rachadinhas" dos salários de servidores de seus gabinetes e de ser uma de suas conexões com milicianos e com o Escritório do Crime, no Rio.

Se revelar tudo o que sabe, pode garantir não apenas uma cassação de mandato ou prisão ao seu ex-chefe, o então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro, mas também jogar na lama a imagem de probo que o governo de Jair Messias tem junto a seus apoiadores. De acordo com o MP-RJ, há indícios de desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro, organização criminosa.

O ex-assessor nunca foi depor pessoalmente aos promotores que investigam o caso e não havia sido preso ou detido. O que não surpreende, afinal de contas, ele carregava milhões em dinheiro público, mas não Pinho Sol.

O presidente da República costuma surtar quando ele e seus filhos estão em risco, dobrando as instituições às suas necessidades familiares. "Eu acima de tudo, filhos acima de todos", em suma. Nessas situações, é capaz até de interferir politicamente no comando da Polícia Federal para poder receber informação que proteja sua filhocracia.

Vale lembrar que o empresário Paulo Marinho, ex-aliado do presidente, afirmou que um delegado da PF avisou Flávio, com antecedência, que uma operação atingiria o faz-tudo da família em 2018, dando tempo de exonerá-lo. Já sabiam, portanto, que esse negócio de acesso privilegiado é bom e funciona.

O ponto é que os gabinetes de Bolsonaro e filhos atuavam de forma tão integrada que era praticamente impossível dizer onde terminava um e começava outro – e, portanto, suas responsabilidades. "Jair Bolsonaro, às sextas-feiras, quando deputado federal, era assíduo frequentador do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa. Trabalhava de lá. Ele sempre controlou os mandatos dos filhos com pulso muito forte. Inclusive havia um rodízio de pessoas e parentes entre os gabinetes", afirmou à coluna o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), que foi colega de legislatura de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio. Queiroz não era um assessor, mas uma joint venture familiar.

Ele e o clã Bolsonaro trataram o Brasil como uma nação de idiotas desde dezembro de 2018 – quando foram reveladas as "movimentações atípicas" em sua conta bancária. Alegando problemas de saúde decorrentes do tratamento de um câncer, o ex-assessor se negou a prestar depoimento pessoalmente ao Ministério Público, mandando uma carta que trouxe mais dúvidas do que respostas. Os mesmos problemas de saúde, contudo, não o impediram de continuar articulando politicamente no Poder Legislativo.

"Tem mais de 500 cargos lá, cara, na Câmara, no Senado… Pode indicar para qualquer comissão, alguma coisa, sem vincular a eles [família Bolsonaro] em nada. Vinte continho pra gente caía bem, pra c…, caía bem pra c… Não precisa vincular a um nome", diz Queiroz, em áudio de junho do ano passado revelado por O Globo, tratando a coisa pública como feira livre. "Pô, cara, o gabinete do Flávio faz fila de deputados e senadores lá, pessoal pra conversar com ele. Faz fila. P…, é só chegar, meu irmão: 'Nomeia fulano aí, para trabalhar contigo'. Salariozinho bom desse aí cara, pra gente que é pai de família, p…, cai como uma uva (sic)."

Parece negociação em boca de fumo, mas era Queiroz discutindo cargos em 2019.

Com a sua prisão, algumas perguntas podem finalmente ser respondidas:

Qual a origem da movimentação de R$ 1,2 milhão nas contas de Fabrício Queiroz, que deu origem a todo esse caso? Por que não há registros de compra e venda de carros, atividade que Queiroz usou para justificar o dinheiro? Por que funcionários do gabinete de Flávio Bolsonaro depositaram recursos nas contas de Queiroz? Todos os funcionários que trabalhavam nos gabinetes de Flávio e de Jair cumpriam suas atribuições diárias? Aliás, todos eles existiam como funcionários? Como foi o empréstimo que Bolsonaro diz ter feito a Queiroz, que justificaria o depósito de R$ 24 mil na conta da hoje primeira-dama e quando foram devolvidos os outros R$ 16 mil do total de R$ 40 mil citados pelo presidente? Qual as origens das outras movimentações milionárias identificadas cuja explicação dada pelo senador deixou mais dúvidas do que respostas? Por que o então ministro Sérgio Moro, com larga experiência em investigações, denúncias e julgamentos de "movimentações atípicas", não tem nada a dizer sobre o caso? Onde está a lista de assessores informais na base eleitoral de Flávio pagos com o dinheiro que Queiroz afirmava recolher dos funcionários na Alerj? Recursos públicos desviados da Assembleia beneficiaram milícias? Por que Flávio não abriu uma imobiliária ao invés de uma loja de chocolates, uma vez que sabe "fazer dinheiro" com compra e venda de imóveis? Por que a laranja dá tão bem em solo brasileiro?

Por mais que tenha ficado 28 anos no Congresso, Jair Bolsonaro nunca fez parte do centro do poder e usou isso em sua campanha eleitoral para convencer de que representaria o "novo" na política e nadaria em transparência. O problema é que a "nova política" de Bolsonaro nunca pediu ao filho e ao faz-tudo, amigo de longa data, que fossem depor no MP-RJ, independentemente de convite da instituição, para se anteciparem e esclarecerem tudo. Da mesma forma, a "nova política", que se vendia como ilibada, comprou votos através de emendas milionárias no governo a fim de garantir a aprovação da Reforma da Previdência. E vem distribuindo cargos ao Centrão para impedir um impeachment.

O capataz Queiroz é um lembrete da falta de transparência de uma família com quatro homens públicos que influenciam os destinos do país pelo fato do presidente governar como um chefe de clã. Não adianta exigir que o BNDES divulgue dados sobre empréstimos, reclamando de uma suposta "caixa preta" do Estado, se Bolsonaro ficava irritado toda vez que repórteres lhe perguntam onde estava Queiroz. Talvez por saber a resposta e não poder falar.

Queiroz havia alertado que poderia ir para o sacrifício, desde que sua família – esposa e filha, que também trabalharam em gabinetes dos Bolsonaros, ficassem protegidas. Mas a Justiça do Rio decretou a prisão de Marcia Oliveira de Aguiar, companheira do ex-assessor. E agora, Fabrício?

A questão é como reagirá Bolsonaro, que já estava ameaçando jogar os militares para cima da democracia diante do avanço do inquérito que investiga as fake news, das ações contra a sua candidatura no Tribunal Superior Eleitoral e dos limites impostos pelo Supremo às suas loucuras..

Vai ficar no discurso vitimista voltado para os fãs, dizendo que a investigação que busca revelar corrupção na família é uma armação para atingi-lo, e esperar para ver o que acontece? Vai sacrificar seu primogênito, torcendo para que Deus segure sua mão na hora H, tipo Abraão? Ou vai para a guerra contra as instituições de uma vez e que se exploda a República?

A única certeza é que a "pica do tamanho de um cometa", prevista por Queiroz, enfim chegou. E como se trata de uma prisão preventiva, sem prazo, ela é realmente grande.

Análise

Fabrício Queiroz foi jogado no ventilador no final de 2018, quando virou notícia. Houve um dia em que Jair Bolsonaro poderia ter saído da crise, tomando a trilha da moralidade. Foi em 12 de dezembro daquele ano. Faltavam 19 dias para a posse. Bolsonaro disse: "Se algo estiver errado —seja comigo, com meu filho ou com o Queiroz— que paguemos a conta deste erro. Não podemos comungar com erro de ninguém." Era só continuar nessa linha. Mas Bolsonaro mudou de ideia. Achou que seria possível regatear o custo da crise. A prisão de Queiroz elevou o prejuízo.

Um presidente precisa abrir o expediente todas as manhãs oferecendo soluções. Há duas emergências sobre a mesa: a pandemia e a ruína econômica. Horas depois da prisão de Queiroz, o Banco Central divulgou o Índice de Atividade Econômica do país em abril: um tombo histórico de 9,7%. Bolsonaro não tem nada a dizer sobre os mortos da covid-19. Limita-se a lavar as mãos e questionar as estatísticas sem provas. Ainda não apresentou uma estratégia para enfrentar a tragédia econômica. No momento, o presidente oferece ao país tuítes, lives e brigas. Acuado, entrega-se ao centrão. Bolsonaro consolida-se como parte do problema.

O presidente conseguiu transformar um pesadelo criminal do amigo Queiroz e do primogênito Flávio num processo de corrosão da sua Presidência. Habituado a operar no ataque, Bolsonaro experimenta o amargor das posições defensivas. Em privado, diz ser vítima de perseguição do Judiciário. Em público, após um dia de silêncio, dedicou os minutos iniciais de sua live semanal noturna a Queiroz. Falou pouco. Calou muito. O pouco que disse foi patético. O muito que deixou de afirmar foi revelador.

Bolsonaro soou patético ao fazer as vezes de defensor do amigo enroscado com a lei: "Não sou advogado do Queiroz e não estou envolvido nesse processo. Queiroz não estava foragido e não havia nenhum mandado de prisão contra ele. E foi feita uma prisão espetaculosa. Já deve estar no Rio de Janeiro, deve estar sendo assistido por seu advogado, e que a Justiça siga o seu caminho. Mas parecia que estavam prendendo o maior bandido da face da Terra."

O presidente não fez uma mísera menção ao filho Flávio Bolsonaro. Seu silêncio é revelador. Diz muito sobre a situação em que se encontra o primogênito. Ele já protocolou em diferentes instâncias do Judiciário uma dezena de recursos pedindo a suspensão ou o arquivamento do inquérito sobre a rachadinha, eufemismo para desvio de verbas públicas. Não conseguiu senão potencializar a impressão de que percorre a conjuntura como um personagem indefeso.

Para Bolsonaro, o prejuízo é mais político do que judicial. Por enquanto, quem está com os glúteos expostos no processo é o Zero Um. Acusam-no de chefiar uma "organização criminosa". Responde pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Mas ninguém ignora que foi o pai quem indicou Queiroz, amigo de 30 anos, para a função de operador dos recursos desviados da folha salarial do gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro.

Embora o presidente não seja investigado, há nos autos um cheque de R$ 24 mil de Queiroz para a primeira-dama Michelle Bolsonaro. De resto, flutua na atmosfera o risco de delação. Em junho, do ano passado, ganhou o noticiário uma troca de áudios pelo WhatsApp. Num deles, Queiroz soou ameaçador: "Eu não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar aí. Vê, tal. É só porrada cara, o MP está com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente e não vem ninguém agindo."

A mensagem surtiu efeito. Foi nessa época que Queiroz mudou-se para um imóvel do advogado Frederick Wassef, defensor de Flávio e também do presidente. Consumada a prisão, o capitão se esforça para tomar distância de Fred, como o doutor é tratado na primeira-família. Esforço inútil. Bolsonaro já foi gravado referindo-se a Frederick como seu advogado. O personagem tornou-se frequentador assíduo do Planalto e, sobretudo, do Alvorada. Não há borracha ou conveniência capaz de apagar um convívio assim, tão intenso.

A prisão de Queiroz empurrou Bolsonaro para o córner num instante em que o presidente já enfrenta um cerco judicial. É investigado por tramar a conversão da Polícia Federal num aparato político. Assiste ao avanço do Supremo sobre a indústria de ódio mantida pelo bolsonarismo nas redes sociais e nas ruas. Sente o hálito quente da Justiça Eleitoral, às voltas com meia dúzia de pedidos de cassação da chapa com o vice Hamilton Mourão.

Sabia-se que o governo estava enfraquecido e sem rumo. Descobre-se aos poucos que Bolsonaro fez uma opção preferencial pela crise. O que estimula a suspeita de que o rumo pode vir a ser o do brejo. Antes, discutia-se o potencial do projeto de Bolsonaro de disputar a reeleição em 2022. Agora, emerge uma indagação incômoda: será que o capitão conclui o mandato?


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