29/03/2024 - Edição 540

Entrevista

‘Chegou a hora de as instituições reagirem’, diz Eugênio Aragão

Publicado em 21/04/2020 12:00 -

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O presidente da República, Jair Bolsonaro, mais uma vez, participou de manifestação e aglomerações em Brasília, contrariando recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre medidas contra o coronavírus. Desta vez, a aglomeração se deu em frente ao Quartel Geral do Exército, onde seus seguidores pediram intervenção militar e a um novo AI-5. Os manifestantes também bradaram pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), além de gritarem “fora, Maia“ e contra o isolamento social.

Para o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, Bolsonaro “é um fator de extrema perturbação do enfrentamento da crise”. Nesse contexto, segundo ele, só há uma saída para o país. “O Bolsonaro, bem ou mal, tem que sair. Isso não é uma questão partidária, mas uma questão de, realmente, preservar a República, o estado democrático de direito e nossa Constituição. Se ele não sair, vai agravar muito mais essa crise do coronavírus”, afirma.

Para Aragão, do ponto de vista jurídico, a solução seria o impeachment. “O processo tem que ser iniciado. Não tem outro jeito, porque ninguém vai fazer o Bolsonaro renunciar.” No caso de ele ser impedido, o vice-presidente, Hamilton Mourão, assumiria, a partir de um acordo costurado com todas as forças políticas, defende o ex-ministro. “Pelo menos, ele (Mourão) sabe falar uma frase completa, com sujeito e predicado.”

 

Como avalia a conjuntura política e o comportamento de Bolsonaro?

Tem duas forças aí, agindo. Uma é o Bolsonaro, que está querendo distrair a opinião pública, como sempre faz com esse tipo de carnaval, sabendo que essa crise é capaz de acabar com os planos dele para 2022. Ele sabe que não tem tamanho para essa crise, então faz esse carnaval para manter o grupo e a frente dele unida, e tentar distrair a população da grande crise do coronavírus.

Por outro lado, tem uma centro-direita tentando de alguma forma se reabilitar como força política preponderante. Em 2018, o grande perdedor da eleição foi a centro-direita. Eles não conseguiram emplacar os seus candidatos, que tiveram votos míseros e resultados absolutamente abaixo do que esperavam.

De alguma forma eles tentam recuperar o espaço deles, e, para isso, não querem bater de frente com o Bolsonaro. Estão indo devagar com o andor, mas se apresentando como as grandes forças da democracia, como antípodas do Bolsonaro. Para eles, de certa forma, Bolsonaro fazer o que está fazendo os recoloca no papel de democratas.

Você se refere ao Centrão?

Ao Centrão, de forma geral. O Centrão está se recolocando como a voz da razão, como a voz da democracia, e para que isso seja possível precisa ter um doido como Bolsonaro.

Mas Bolsonaro, com essas atitudes, está jogando fora a vida de pessoas…

Ele é um fator de extrema perturbação do enfrentamento da crise, e mostra que não tem nenhuma lealdade para com a Constituição, a qual jurou cumprir quando tomou posse. Na verdade ele pratica aqui o mais claro perjúrio. Ou seja, está descumprindo o seu juramento. Essa é a atitude de Bolsonaro, e isso já seria suficiente para tirá-lo do cargo.

Por que não tiram? Tirá-lo simplesmente significaria tirar um player do cargo, mas não significaria necessariamente substituir esse player pelas forças que querem ocupar o espaço, que é a centro-direita. Então o jogo ainda está muito confuso, está muito difícil a gente dizer o que está acontecendo. Acredito que a gente vai precisar de mais umas duas ou três semanas para saber aonde isso vai.

Qual seria a solução para essa situação dramática?

Para mim, não tem outra saída. O Bolsonaro, bem ou mal, tem que sair. Isso não é uma questão partidária, mas uma questão de, realmente, preservar a República, o Estado democrático de direito e nossa Constituição. Se ele não sair, vai agravar muito mais essa crise do coronavírus. Ele é um risco real, e a gente vai amesquinhar as nossas instituições. Não podemos mais fazer isso. O Brasil precisa das suas instituições nesse grave momento.

Qual seria então a solução do ponto de vista jurídico?

A solução jurídica seria o impeachment. O processo tem que ser iniciado. Não tem outro jeito, porque ninguém vai fazer o Bolsonaro renunciar. A única saída é o impeachment.

E assumiria Mourão…

Assumiria o Mourão, que pelo menos sabe falar uma frase completa, com sujeito e predicado.

Como vê o papel das instituições hoje?

Acho importante elas se conscientizarem de que realmente estão sendo chamadas, nesse momento, para salvar a República. Nunca, desde 1985, quando os militares saíram do poder, a democracia no Brasil sofreu um desafio deste tamanho, como agora com Bolsonaro. Me parece que chegou a hora de as instituições reagirem. Elas têm que reagir. Mas acabamos de ter um impeachment com a Dilma. Entendo que não se queira banalizar o instituto do impeachment. Está todo mundo, de certa forma, estarrecido com o que está acontecendo.

Por outro lado, temos que entender que um processo de impeachment está sujeito a paralisar a pauta do Congresso, e isso é tudo o que a gente não quer num momento de crise como essa. Isso também tem que ser negociado. O Mourão só vai ser presidente da República dentro de um acordo costurado com todas as forças políticas. De outra forma não vai chegar lá.

E isso é possível?

Acho que é possível, sim, mas temos que ver como isso vai evoluir nesta semana e na próxima.

E particularmente quanto ao STF?

Acho que o Bolsonaro está esticando a corda. Vamos ver qual vai ser o próximo passo do STF. Há diversas ações nas suas mãos para ele enfrentar esse tema, colocar barreira ao Bolsonaro de alguma forma. Isso está colocado.

Como o STF pode colocar essa barreira, por exemplo?

Pode perfeitamente dar uma ordem de proibir manifestações nesse momento. Tudo isso já foi pedido. Nós fizemos uma ação agora, que está para ser distribuída. O PT fez uma ação para verificar a subnotificação e esse tipo de atitude do Bolsonaro. Isso está na mão do Supremo.


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