29/03/2024 - Edição 540

Viver Bem

Sinto lhe informar, mas seus óleos essenciais são essencialmente inúteis

Publicado em 19/11/2019 12:00 -

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Os óleos essenciais são conhecidos desde a antiguidade, quando eram empregados em pomadas medicinais, perfumes e possivelmente fluídos de embalsamação. Hoje já não os usamos para mumificar nossos entes queridos, mas nos últimos anos os óleos essenciais estão em alta, vistos como solução natural, popular e potente para problemas e condições de saúde diversos.

Muitas pessoas dizem que óleos vegetais como os de lavanda, hortelã e eucalipto possuem propriedades curativas quase mágicas. Há pessoas com câncer que dizem na internet ter trocado a quimioterapia por óleos essenciais e afirmam que a doença só entrou em remissão depois que fizeram a troca. (Anúncio de serviço público: não faça isso!). Outras pessoas alegam que óleos essenciais aliviam sua enxaqueca em menos tempo que medicamentos vendidos sem receita médica. Para outras ainda, os óleos energizam sua libido quando parece que nada mais funciona.

Claro que é difícil invalidar a experiência pessoal de outra pessoa quando ela afirma que algo funcionou bem para ela. Contudo, não obstante as alegações generalizadas feitas sobre os óleos essenciais, há poucos dados científicos que comprovem esses depoimentos e pouco é sabido sobre a segurança e eficácia desses produtos.

Sim, os óleos podem ter perfumes deliciosos, e cheirá-los ocasionalmente não lhe fará mal algum e pode até ajudar com alguns problemas momentaneamente. Mas muitos especialistas dizem que eles não cumprem tudo que se promete.

O que exatamente são óleos essenciais?

Para começar, uma aulinha rápida de ciências. Os óleos essenciais vêm das plantas. São extraídos de diversas partes da planta – pense em raízes, folhas ou sementes – e destilados. Esse processo cria uma versão liquefeita e altamente concentrada de uma planta, que muitas pessoas utilizam para aromaterapia –uma medicina alternativa que tem por objetivo beneficiar a saúde física e emocional.

Os óleos podem ser aplicados sobre a pele topicamente ou inalados. Cada planta é vinculada a um benefício específico para a saúde: a hortelã aumentaria nossa energia, a lavanda ajudaria a nos acalmar, o jasmim seria bom para melhorar o humor. Dizem que alguns dos aromas podem até combater sintomas de câncer, doenças cardíacas, infecções e diabetes.

Muitas pessoas já deixaram de acreditar em medicamentos farmacêuticos sintéticos, e isso as leva a procurar tratamentos alternativos mais naturais, como os óleos essenciais, disse a obstetra e ginecologista Felice Gersh, fundadora do Integrative Medicine Group, de Irvine, Califórnia.

“Muitas pessoas estão doentes e procuram algo para ajudá-las a se sentirem melhor. Dificilmente vão rejeitar uma opção simples e natural como os óleos essenciais”, disse Gersh ao HuffPost.

Não existem muitas pesquisas sobre os óleos essenciais e sua eficácia

Os óleos essenciais não são regulados pela Food and Drug Administration (Administração de Alimentos e Medicamentos – algo como a Anvisa americana), de modo que podem ser promovidos mais ou menos livremente. Há poucas regras que regulamentam sua produção e venda. Cabe ao consumidor pesquisar o efeitos e o funcionamento dos óleos.

As pesquisas das quais dispomos frequentemente são baseadas sobre estudos muito limitados ou mal projetados, disse Gary Soffer, diretor interino do programa de medicina integrativa do Yale Cancer Center, em New Haven, Connecticut. E a maioria das pesquisas clínicas sobre óleos essenciais foi feita com camundongos, não com humanos, de modo que há poucas provas concretas de todos os benefícios alegados para a saúde, ele destacou.

Alguns dos estudos que existem sugerem que óleos essenciais podem ter um efeito ansiolítico e tranquilizador, possivelmente beneficiando o sono. Mas as evidências são inconclusivas e precisamos urgentemente de mais pesquisas para entender melhor como esses óleos interagem com o corpo e influenciam determinadas condições de saúde.

O fato de que tantas pessoas utilizam óleos essenciais regularmente sem qualquer prova de seus riscos e benefícios preocupa alguns especialistas em saúde.

“O uso generalizado de óleos essenciais sem dispormos de um conjunto substancial de evidências que fundamentem seu valor é preocupante”, comentou Soffer. “De maneira geral o uso desses óleos é seguro, mas seria imprudente considerá-los totalmente isentos de riscos.”

Os óleos essenciais podem ter efeito de placebo

Mas algumas das pessoas que apostam no valor dos óleos incluem profissionais de saúde. Alguns especialistas desconfiam que isso se deve a um efeito placebo altamente convincente.

Um estudo testou essa teoria e constatou que ela pode ter valor. Os pesquisadores expuseram pessoas a três aromas – lavanda, óleo de néroli e um produto sem cheiro. Independentemente do aroma ao qual cada participante foi exposto, todos aos quais foi dito que estavam cheirando um aroma estimulante experimentaram estímulo fisiológico mais forte (como um aumento de sua frequência cardíaca), enquanto aqueles aos quais foi dito que estavam inalando um aroma relaxante tiveram estímulo fisiológico enfraquecido. Basicamente, bastava lerem ou ouvirem sobre os efeitos alegados sobre a saúde, independentemente de serem verdadeiros ou não, para levar pessoas a sentir esses efeitos.

“Com problemas de vários tipos, incluindo ansiedade, depressão e dor, quando as pessoas acreditam que algo vai ajudá-las, elas às vezes sentem benefícios”, explicou o psiquiatra Keith Humphreys, do Stanford Health Care, em Stanford, Califórnia. “Quaisquer alegações de poder curador que extrapolem o efeito placebo devem ser vistas com extremo ceticismo.”

Óleos essenciais podem provocar efeitos colaterais desagradáveis

De modo geral, a aromaterapia é inofensiva. Mas os óleos essenciais podem criar alguns riscos à saúde se forem incorretamente usados.

Já foi comprovado, por exemplo, que uma dose excessiva pode contribuir para o aparecimento de tumores. E quando são consumidos por via oral, os óleos têm o potencial de prejudicar a pele, o fígado, os rins e outros órgãos. Mesmo seu uso excessivo pode prejudicar o corpo. Lavanda em excesso tem o potencial de mexer com o sistema endocrinológico e provocar desequílíbrios hormonais, disse Soffer.

Outro problema é que algumas marcas misturam óleos essenciais com substâncias químicas e óleos vegetais. Quanto menos puro o óleo, maiores as chances de ele provocar ou reação alérgica ou irritação, como uma erupção cutânea acompanhada de coceira ou dor.

Também sabemos pouco sobre as interações entre óleos essenciais e outros medicamentos. Especialistas em saúde acreditam que os óleos podem afetar o funcionamento de certos medicamentos. Por exemplo, segundo Soffer, a lavanda pode interferir como medicamentos anti-estrógenos empregados comumente para tratar o câncer de mama.

Pensando em tudo isso, se você estiver pensando em fazer aromaterapia, não deixe de fazer suas pesquisas e consultar seu médico. Os óleos essenciais podem ter perfumes sedutores, mas ainda não temos informação científica suficiente sobre eles. Não é prudente esperar que sejam curas milagrosas.

*Este texto foi originalmente publicado no HuffPost US e traduzido do inglês.


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