26/04/2024 - Edição 540

Brasil

Para atingir Bivar, Bolsonaro deixa milhões de brasileiros sem o DPVAT

Publicado em 14/11/2019 12:00 -

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Os golpes no financiamento do SUS parecem não ter fim. Entre 2008 e 2018, o Sistema Único recebeu nada menos do que R$ 33,4 bilhões arrecadados pelo DPVAT, seguro pago por proprietários de veículos que deixará de existir em 2020. A extinção aconteceu via medida provisória assinada por Jair Bolsonaro. Mas, apesar de a MP já estar valendo, a canetada ainda precisa ser analisada pelo Congresso, que vai formar uma comissão mista com membros da Câmara e do Senado e pode mudar as coisas de figura.

Ao menos um deputado já se posicionou contra: “É um seguro que cobre 210 milhões de pessoas, todos os brasileiros, seja pedestre ou não. Se há alguma irregularidade, se o governo acha que as seguradoras não estão agindo de forma correta, é possível mexer na alíquota, fazer uma intervenção. Agora, abrir mão de uma receita, também importante para o SUS, acho que é temerário”, resumiu Hugo Leal (PSD-RJ), presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro.  

A história toda é um pouco suspeita, na verdade. Bolsonaro anunciou sua saída do PSL para fundar um novo partido – Aliança pelo Brasil – depois de semanas de crise aberta com a ala comandada pelo presidente nacional do PSL, Luciano Bivar. Pois Bivar é acionista e já foi diretor presidente de uma empresa que tem 1% das ações da Seguradora Líder, criada em 2010 como um consórcio de empresas (73, atualmente) com o objetivo de gerenciar os recursos do DPVAT. De modo que a MP que extingue o seguro além de apelar ao eleitorado de Bolsonaro, também causa um prejuízo de aproximadamente R$ 5 milhões à empresa ligada ao seu desafeto político

A distribuição da arrecadação é assim: 50% do total vai direto para o governo federal, sendo que 45% dos recursos da União vão para o SUS. No ano passado, isso representou R$ 2,1 bilhões a mais no caixa do Sistema. Os 5% restantes vão para o Departamento Nacional de Trânsito que faz, por exemplo, campanhas educativas. A parte administrada pela Líder é destinada às seguradoras do consórcio (2%), às despesas de corretagem do seguro (7,5%) e ao pagamento das indenizações em casos de acidente (40,5%), seja por morte, invalidez ou reembolso com despesas médicas e hospitalares. Nos últimos dez anos, 4,5 milhões de pessoas foram indenizadas – inclusive ciclistas e pedestres, que não pagam o DPVAT.  

Sem os bilhões do DPVAT, o SUS vai continuar arcando com as despesas causadas pelo atendimento aos acidentados, só que sem qualquer contrapartida. Levantamento feito pelo jornal O Globo em junho mostrou que, entre 1998 e 2017, os acidentes de trânsito redundaram em R$ 5,3 bilhões gastos em procedimentos médicos no Sistema Único

Quem quiser que procure

Em transmissão ao vivo no Facebook na quinta-feira (14), o presidente da República comentou a extinção do Seguro. O presidente ressaltou que o DPVAT foi extinto por medida provisória, que pode caducar ou ser rejeitada no Congresso, e o seguro voltar a valer.

“Quem quiser fazer um seguro pode procurar a seguradora; tudo o que é obrigatório não é bom”, ressaltou, ao lado do presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, que citou a seguradora do banco como uma opção.

PARA ENTENDER

O que é o DPVAT?

É um instrumento de proteção social que oferece cobertura para todas as vítimas de acidentes de trânsito registrados em território nacional, sejam elas motorista, passageiro ou pedestre. O seguro foi criado em 1974.

Que tipo de indenização o seguro oferece?

O seguro prevê três tipos de indenização: em caso de morte, com indenização de 13.500 reais; invalidez permanente, com indenização de até 13.500 reais, sendo o valor estabelecido de acordo com o local e intensidade da sequela; e reembolso de despesas médicas e suplementares (DAMS), com valor que pode chegar a 2.700 reais.

Quantas indenizações o DPVAT já realizou?

Segundo a base estatística da Seguradora Líder, administradora do DPVAT, já são mais de 4 milhões de indenizados em 10 anos por morte, invalidez permanente e reembolso de despesas médicas. Os números contemplam principalmente jovens na faixa dos 18 aos 34 anos.

Como pedir indenização?

A vítima do acidente de trânsito (ou herdeiro legal em caso de morte) deve reunir os documentos solicitados pela seguradora para cada uma das situações previstas de indenização: morte, invalidez permanente ou despesas médicas – a lista dos documentos pode ser consultada no site da seguradora. Depois, deve entregá-los em um dos oito mil pontos de atendimento autorizados disponíveis ou dar entrada pelo aplicativo do Seguro DPVAT.

Qual o cenário brasileiro em acidentes de trânsito?

A Seguradora Líder atesta que o Brasil está entre os dez países que apresentam os mais elevados números de óbitos por acidentes de trânsito, responsáveis também por sequelas físicas e psicológicas, principalmente entre a população jovem e em idade produtiva. A cada 15 minutos, uma pessoa morre em um acidente de trânsito no País. Um levantamento feito pelo jornal O Globo, publicado em reportagem no mês de  junho, mostra que, em 20 anos, os acidentes de trânsito vitimaram mais de 734 mil pessoas no País. No mesmo período, o SUS desembolsou 5,3 bilhões de reais em procedimentos médicos relacionados a acidentes nas ruas e estradas.

Por que o governo cogita o fim do seguro?

Em nota, o governo anunciou que a MP visa evitar fraudes no DPVAT, bem como amenizar/extinguir os elevados custos de supervisão e de regulação do DPVAT por parte do setor público – Superintendência de Seguros Privados (Susep), Ministério da Economia, Poder Judiciário, Ministério Público, Tribunal de Contas da União (TCU) –, viabilizando o cumprimento das recomendações do TCU pela Susep.

Como é feita a arrecadação do DPVAT?

O pagamento de todo o custo de operação do seguro DPVAT é feito via arrecadação do tributo dos proprietários de veículos.

Como os recursos são divididos?

Do valor arrecadado, 50% vão para a União, sendo 45% para o Sistema Único de Saúde (SUS) para custeio da assistência médico-hospitalar às vítimas de acidentes de trânsito, e 5% são para o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), para investimento em programas de educação e prevenção de acidentes de trânsito. Os outros 50% são direcionados para despesas, reservas e pagamento de indenizações.

De quanto são esses repasses, em média?

Em 2018, a parcela destinada ao SUS totalizou 2,1 bilhões de reais e para o Denatran, 233,5 milhões. Nos últimos 11 anos, essa destinação soma mais de 37,1 bilhões de reais.


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