20/04/2024 - Edição 540

Especial

Planeta plástico

Publicado em 09/09/2019 12:00 -

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Quase todo mundo viu ou ouviu falar do vídeo da tartaruga encontrada com um canudo plástico enfiado no nariz. O episódio aconteceu há quatro anos, quando a bióloga marinha norte-americana Christine Figgener conduzia com colegas um estudo sobre tartarugas na Costa Rica. Em alto-mar, eles avistaram um exemplar da espécie verde-oliva com o que parecia ser um verme tubular gigante em uma de suas narinas. Os pesquisadores logo concluíram que era um pedaço de canudo, de cerca de 10 centímetros, e decidiram remover o objeto. O procedimento, filmado pelo grupo, mostrou o animal agonizando de dor. Postada na internet, a gravação rapidamente se disseminou pelas redes sociais e contribuiu para que os canudos passassem a ser encarados como um dos grandes vilões do meio ambiente. Desde a divulgação do vídeo, visualizado até hoje 36 milhões de vezes no YouTube, o produto vem sendo banido de várias cidades ao redor do mundo.

Esse acontecimento tornou-se emblemático de um problema de grandes proporções que aflige o planeta: o consumo desenfreado de plásticos e a poluição gerada por seu descarte inadequado. Estima-se que 8,9 bilhões de toneladas de plásticos primários (ou virgens) e secundários (produzidos de material reciclável) já foram fabricados desde meados do século passado, quando os plásticos começaram a ser produzidos em escala industrial. Cerca de dois terços desse total, ou 6,3 bilhões de toneladas, viraram lixo, enquanto 2,6 bilhões de toneladas ainda estão em uso.

Esses dados integram o artigo Production, use, and fate of all plastics ever made (Produção, uso e destino de todo o plástico já feito), publicado na revista Science Advances, em julho de 2017. Considerado um dos estudos mais completos sobre o tema, ele foi liderado pelo físico Roland Geyer, da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara.

Especialistas preocupam-se particularmente com o impacto da poluição por plásticos nos mares. Calcula-se que, a cada ano, mais de 8 milhões de toneladas de lixo produzidos desse material cheguem aos oceanos, provocando prejuízos à vida marinha, à pesca e ao turismo. Grandes aglomerações de plástico flutuante estão presentes em todos os oceanos – são os chamados giros. O maior deles, a Grande Mancha de Lixo do Pacífico, forma-se na altura do Havaí e da Califórnia e se estende até o Japão.

“Um dos maiores problemas é a complexidade dos plásticos existentes nos oceanos. Estamos falando de redes de pesca, dos materiais usados na fabricação de roupas, nos produtos descartáveis, nos duráveis e pellets [pequenas esferas plásticas usadas como matéria-prima pela indústria]. Cada um deles usa polímeros específicos que afetam de forma diferente o ambiente e exigem soluções próprias”, declarou à Pesquisa FAPESP o cientista ambiental Marcus Eriksen, cofundador e diretor do 5 Gyres Institute, entidade com sede na Califórnia focada na redução da poluição plástica nos mares. “É até possível remover todo o plástico marinho, mas levaria tanto tempo e custaria tanto dinheiro que não valeria a pena”, diz Eriksen, considerado um dos maiores especialistas no tema. O custo do prejuízo para o ecossistema marinho, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), é estimado em US$ 8 bilhões por ano. E a tendência é que esse valor aumente.

Uma das raízes do problema é a alta demanda da sociedade por plástico. Em 2016, a produção atingiu 396 milhões de toneladas; em 1950, foram colocados no mercado 2 milhões de toneladas. A fabricação de plástico virgem no século XXI equivale ao volume produzido nos 50 anos anteriores. E as projeções indicam que, se o ritmo de crescimento não for contido, o mundo terá que acomodar cerca de 550 milhões de toneladas do material em 2030.

Poluição plástica em números e imagens

Não é difícil entender as causas do vertiginoso crescimento da produção desses polímeros originários principalmente de materiais fósseis, como petróleo, gás e carvão. “O plástico é um material leve, resistente e durável, que traz inovações para o desenvolvimento da sociedade”, afirma José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), entidade que congrega 12,1 mil empresas e 323 mil empregados. “O uso de descartáveis na área da saúde, por exemplo, evita contaminação e transmissão de doenças. No setor automotivo, ele garante redução de peso dos carros e ganho de eficiência energética. Já as embalagens alimentícias servem para aumentar a vida útil de prateleira das comidas.”

“A sociedade estaria 200 anos atrasada se o plástico não tivesse sido inventado”, complementa o engenheiro de materiais especialista em polímeros Luis Fernando Cassinelli, presidente da consultoria paulista Avantec BR Participações, focada em gestão de inovação. “O planeta não seria capaz de suportar a população atual e futura sem o plástico originado do petróleo. Os materiais sucedâneos, como vidro, metal ou papel, trariam problemas de outra natureza, entre eles aumento do consumo de energia ou de água.”

O físico Munir Salomão Skaf, do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (IQ-Unicamp), concorda que a versatilidade, o baixo custo e a estabilidade dos plásticos diante dos processos naturais de degradação o tornaram onipresente no mundo, mas ressalva: “Essas mesmas propriedades fazem dele um sério agente poluidor por não se degradar facilmente no ambiente”. Diretor do Centro de Pesquisa em Engenharia e Ciências Computacionais, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da FAPESP, Skaf trabalha para tornar mais fácil essa degradação. Ele participa, com o pós-doutorando Rodrigo Leandro Silveira, de um grupo internacional responsável pela criação de uma enzima que degrada mais facilmente plásticos, a PETase.

A poluição por materiais plásticos, sustenta Skaf, é um grave problema ambiental e requer, para seu enfrentamento, três abordagens complementares: a drástica redução do uso, a substituição por novos materiais (com características similares ao plástico sintético) facilmente degradáveis e a destinação adequada dos resíduos, via coleta e reciclagem.

Produtos plásticos de uso único, aqueles com vida útil efêmera, são a maior preocupação dos ambientalistas, por serem descartados imediatamente após sua utilização. Entre 35% e 40% da produção atual é composta por esse tipo de material, nos quais se incluem copos, sacolas, canudos, embalagens e talheres descartáveis. Os demais são produtos de longa duração, uma gama diversificada de itens que vai de celulares a peças automotivas, de tubulações para água e esgoto a equipamentos médicos e de informática.

“Descartamos uma quantidade de plásticos de uso único a uma velocidade que a natureza não consegue absorver”, constata a especialista em gestão ambiental Sylmara Lopes Gonçalves Dias, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). “Se tivermos materiais ou mesmo plásticos que tenham maior durabilidade e não sejam jogados fora tão rapidamente, vamos reduzir bastante a escala dos produtos descartados.”

Um problema é que na natureza os plásticos sintéticos levam um tempo excessivo para se degradar. Garrafas de água e refrigerantes feitas de PET (polietileno tereftalato) precisam de até 400 anos para se decompor, enquanto um copo de plástico permanece pelo menos 200 anos no ambiente. Por isso, dizem os estudiosos do tema, não é possível dissociar os impactos gerados pelo plástico no ambiente da gestão de resíduos nas cidades.

“Aproximadamente 80% do plástico achado nos mares vem de fontes terrestres. O restante tem origem em atividades humanas realizadas no próprio oceano. São contêineres que caem de embarcações, redes de pesca perdidas ou abandonadas e lixo de navios”, conta o especialista em ecologia e conservação marinha Alexander Turra, do Instituto Oceanográfico (IO) da USP. “No Brasil, parte importante do lixo que chega ao mar é gerado em áreas ocupadas irregularmente, como terrenos em morros e manguezais, onde não há oferta de serviço de coleta de lixo. É, portanto, um problema ligado à ocupação territorial irregular e que tem raiz essencialmente socioeconômica.”

Um estudo divulgado este ano pela organização não governamental WWF (Fundo Mundial para a Natureza) mostrou que, em razão da má gestão dos resíduos, um terço do lixo plástico produzido anualmente no mundo polui a natureza. “Nossos solos, águas doces e oceanos estão contaminados com macro, micro e nanoplásticos. A cada ano, seres humanos ingerem cada vez mais nanoplástico a partir de seus alimentos e da água potável, e seus efeitos totais ainda são desconhecidos”, aponta o relatório “Solucionar a poluição plástica: Transparência e responsabilidade”.

Situação do Brasil

País com sérias deficiências na infraestrutura de saneamento básico, o Brasil sofre com esse tipo de poluição e, ao mesmo tempo, contribui para seu agravamento. De acordo com o WWF, o país foi o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo em 2016, com 11,3 milhões de toneladas, superados apenas por Estados Unidos, China e Índia. A maior parte dos resíduos gerados no país, 10,3 milhões de toneladas ou 91% do total, foi coletada pelo serviço de limpeza urbana, mas somente 145 mil toneladas, equivalente a 1,28%, foram encaminhadas para reciclagem. Esse é um dos menores índices do mundo e bem abaixo da média global, de 9%, segundo a ONG ambientalista, que utilizou em seu relatório dados primários do estudo What a waste 2.0, do Banco Mundial, lançado em 2018.

A indústria do plástico faz ressalvas a esses números. “A base de dados utilizada pelo WWF está errada, tanto no que diz respeito à quantidade de plástico reciclada quanto ao volume de lixo produzido no país”, diz o engenheiro químico Miguel Bahiense Neto, presidente da Plastivida – Instituto Socioambiental dos Plásticos, entidade mantida pelas empresas do setor. De acordo com ele, o consumo de produtos plásticos no país foi de 6,1 milhões de toneladas em 2016. Desse total, 33% são produtos de vida curta, de até um ano, que são rapidamente descartados, categoria na qual estão classificadas embalagens, garrafas, copos e sacolas. “O volume de plástico descartado no país corresponde a 20% do total divulgado no relatório do WWF”, afirma Bahiense.

Gabriela Yamaguchi, diretora de comunicação e engajamento do WWF-Brasil, explica que o resultado da indústria é distinto do apresentado pela ONG porque parte de base de dados diferentes – o do WWF foca na estimativa do vazamento de lixo plástico na natureza a partir de dados coletados em 2016 pelo Banco Mundial. Ela ressalta, no entanto, que os resíduos plásticos produzidos em determinado ano não se limitam exclusivamente aos materiais de uso único descartáveis fabricados naquele período – como sugere Bahiense. “Plásticos de longa duração colocados no mercado no passado serão descartados em algum momento, elevando o volume de lixo gerado naquele ano”, diz Yamaguchi.

A Plastivida e a Abiplast também contestam os dados relativos à reciclagem. De acordo com elas, 550 mil toneladas de plásticos foram recicladas em 2016. “Se tomarmos o volume reciclado por ano e compararmos com o que efetivamente é consumido de embalagens e equiparáveis no Brasil, temos um índice de reciclagem de 25,8%”, informaram as duas entidades em nota. Comparando-se, entretanto, o volume reciclado com o consumo total de plástico no ano, o índice cai e fica próximo a 9%.

Apesar da assimetria entre os levantamentos, todos concordam que ainda é baixo o volume de plástico reciclado no país. E essa é uma das formas para enfrentar o problema. “O Brasil tem que investir na implementação de políticas que promovam as técnicas de reciclagem e a economia circular, envolvendo todos os atores da cadeia, como grandes produtores de resinas e insumos, indústrias de transformação [que fabricam os produtos plásticos], revendedores e consumidores”, opina o engenheiro químico José Carlos Pinto, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ). Economia circular é um conceito fundamentado na reutilização, recuperação e reciclagem de materiais pós-uso.

Para o presidente da Abiplast, José Ricardo Roriz Coelho, esse é o caminho a ser seguido. “A coleta seletiva e a reciclagem são essenciais para a resolução do problema da poluição ambiental, mas essas frentes ainda enfrentam empecilhos, como a bitributação do setor, a baixa oferta de matéria-prima e o alto custo logístico para o transporte do material. Para reverter esse quadro, a indústria da reciclagem precisa ser incentivada e valorizada”, destaca o executivo. Em outras palavras, o processo ainda permanece não lucrativo em larga escala e atrai poucos interessados.

Pesquisadores e ambientalistas concordam com a importância do fortalecimento da economia circular, mas afirmam que a reciclagem não é uma solução mágica para os desafios do lixo plástico. “Não é possível enfrentar o problema olhando apenas para o pós-consumo. Há plásticos que não são naturalmente recicláveis. Polímeros aditivados e embalagens compostas, feitas de plástico e metal, muito usadas em alimentos, não são reciclados mecanicamente, assim como itens contaminados e de baixo valor”, explica Yamaguchi, do WWF. Além da reciclagem mecânica, a mais usada no Brasil e no mundo, existem outros dois tipos, a química e a energética, adotadas principalmente em países desenvolvidos.

Por isso, defende Sylmara Dias, da EACH-USP, é importante trabalhar também no início da cadeia produtiva, focando em produtos com design amigáveis ao ambiente. “Precisamos de uma política pública que condicione os fabricantes a aprovar o design e os materiais usados em novas embalagens, antes de seu lançamento, garantindo que não tenham potencial poluidor”, afirma Dias. “Ao mesmo tempo, é preciso investir em novas soluções, como materiais biodegradáveis de origem biológica, que a natureza consiga naturalmente regenerar.”

As múltiplas faces do material

É difícil pensar na vida cotidiana sem a presença dos plásticos, embora eles sejam uma invenção relativamente recente. O primeiro, a resina sintética baquelite, foi criado apenas na primeira década do século XX, para substituir o marfim de elefantes e chifres e cascos de boi. Rígida, resistente ao calor e durável, ela é usada até hoje para fabricar tomadas, cabos de panela, ferramentas e telefones.

A indústria ganhou força nos anos 1930 com o surgimento do poliestireno, da poliamida (nylon é a principal marca) e de polímeros acrílicos, todos à base de petróleo. Mas foi a partir da década de 1950, com o fim da 2ª Guerra Mundial, que o material se popularizou. Tecidos de poliéster, lycra e nylon, mais baratos, fáceis de lavar e que dispensavam a necessidade de passar, começaram a competir com roupas de algodão e de outros tecidos naturais. O PVC, utilizado na fabricação de materiais de construção, barateou processos desse setor e a resina de melamina-formaldeído começou a ser largamente empregada na produção de utensílios domésticos.

Os plásticos passaram a ser valorizados e associados a um novo estilo de vida, de uma sociedade direcionada ao consumo. Nas últimas décadas do século passado, a procura pelo material acelerou ainda mais graças à explosão de plásticos de uso único, embalagens descartáveis e sacolas plásticas. Esses produtos inundaram o mercado, substituindo principalmente bens manufaturados de uso pessoal e doméstico, feitos de outros materiais, como vidro, madeira, papel e metal.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com as garrafas de PET, que, pouco a pouco, desbancaram as retornáveis de vidro. Brinquedos que antes eram fabricados de madeira passaram a ser confeccionados de resinas plásticas. E canudos, copos, pratos e talheres descartáveis conquistaram o consumidor pela comodidade de não precisarem ser lavados – baratos, podiam ser jogados no lixo após o uso.

Hoje, o vasto universo dos plásticos – um material feito pela união de grandes cadeias moleculares chamadas polímeros, que, por sua vez, são formados a partir de moléculas menores, os monômeros – inclui quase uma centena de variedades e suas derivações. Eles se dividem em dois grupos. Os termoplásticos (80% dos plásticos consumidos) são maleáveis a altas temperaturas e recicláveis. Já os termorrígidos se decompõem ao aquecer e não são recicláveis mecanicamente.

A fabricação de embalagens, itens descartáveis que logo viram lixo, domina o setor. Em 2015, responderam por cerca de 36% do plástico produzido no mundo. O setor da construção consumiu 16% das resinas e a indústria têxtil 14%.

Proibir sacolas plásticas é um pequeno passo em tempos duros

Será que existe alguém que seja contra o banimento de sacolas de plástico? Devem ser bem poucos. Nesse sentido, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, não encontrará grande resistência a seu engajamento pela proibição.

No passado tentou-se enfrentar o problema com restrições voluntárias por parte das cadeias de supermercados, com muito sucesso. Mas como agora anda muito na moda marcar pontos na política ambiental e climática com medidas enérgicas, a ministra não quer ficar para escanteio.

Repetindo: não é nada contra a proibição. Mas é preciso saber que as sacolas são responsáveis por apenas uma pequena parcela do lixo plástico alemão. E a União Europeia já aprovou muitas medidas contra as montanhas de lixo plástico, que a Alemanha implementa obedientemente. Na proibição das sacolas plásticas, ela está bem atrasada. Há muito tempo, diversos países da África e da Ásia já tomaram a dianteira.

No entanto, algo se move na Alemanha em relação à política do meio ambiente e do clima. Ainda em setembro (espera-se) deverá ser finalmente estipulado quais iniciativas decisivas serão tomadas na luta contra os gases de efeito estufa. Deverá haver algum tipo de taxa de CO2.

Simplificando, pode-se dizer que a linha divisória corre entre os velhos mecanismos dos conservadores (criar incentivos para procedimentos mais ecológicos) e uma política mais agressiva, que considere também proibições, como a atual. E de repente são possíveis coisas até há pouco tempo impensáveis: o presidente da União Social Cristã (CSU), Markus Söder, propõe tornar os bilhetes de trem inteiramente livres de impostos.

O dilema da política ambiental e climática global é que muitos problemas fundamentais, como os gases de efeito estufa ou o plástico, só podem ser resolvidos em nível internacional. Os políticos sentem a pressão de uma juventude insurgente que afirma, com razão, que a geração dos pais negou os problemas por tempo demais.

Os efeitos se fazem sentir fortemente em todos os campos: os mares se afogam em plástico; especialistas estimam que em 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos. A mudança climática se abate de forma cada vez mais implacável, há muito se fazendo sentir no rico Ocidente, e não só na África.

No entanto, a ocasião não poderia ser pior para encontrar soluções a todos esses problemas. Cada vez mais Estados são liderados por governos nacionalistas, populistas de direita, que têm um ponto em comum, entre outros: para esses políticos, os problemas ambientais são temas de luxo das velhas e odiadas elites, não precisando, em absoluto, ser levados a sério – veja-se a Itália, Brasil, os Estados Unidos.

Tudo depende de que forças se imporão: se os democratas, que afirmam que está mais do que na hora de encarar os problemas dos quais eles reclamam há anos, deixando claro que as soluções afetam a todos – economia, política, cidadãos; ou se os outros, empenhados na destruição das ordens estabelecidas e aparentemente se divertindo em incendiar o mundo de vez ou soterrá-lo de lixo. A juventude parece antes apostar no primeiro grupo. E já alcançou algumas vitórias, pelo menos por enquanto e na Alemanha.

Como a indústria de plástico luta para continuar poluindo o mundo

Os alunos da Westmeade Elementary School trabalharam duro em seu dragão. E valeu a pena. O saco de plástico que as crianças pintaram de verde e enfeitaram com dentes brancos triangulares e uma placa dizendo “me alimente” garantiu aos estudantes do subúrbio de Nashville, nos EUA, o primeiro lugar em um concurso de decoração de caixas de reciclagem. A ideia, como o orgulhoso diretor de Westmeade disse a um programa de TV local, era ajudar o meio ambiente. Mas a verdadeira história por trás do dragão – como acontece com grande parte da escalada da guerra pelo lixo plástico – é mais complicada.

O concurso foi patrocinado pela A Bag’s Life, um esforço de promoção e educação de reciclagem da American Progressive Bag Alliance, a APBA, um grupo de lobby que luta contra as restrições ao plástico. Essa organização faz parte da Plastics Industry Association, um grupo comercial que inclui a Shell Polymers, a LyondellBasell, a Exxon Mobil, a Chevron Phillips, a DowDuPont e a Novolex – todas as quais lucram com a produção contínua de plásticos. E mesmo quando a A Bag’s Life encorajava as crianças a espalhar a mensagem edificante de limpar o lixo plástico, a American Progressive Bag Alliance estava apoiando um projeto de lei que tiraria dos moradores do Tennessee a capacidade de lidar com a crise dos plásticos. A lei tornaria ilegal que os governos locais proibissem ou restringissem as sacolas e outros produtos plásticos de uso único – uma das poucas coisas que realmente reduzem o desperdício de plástico.

Uma semana depois do dragão de Westmeade vencer o concurso, a APBA recebeu sua própria recompensa: o projeto de lei passou pela legislatura estadual do Tennessee. Semanas depois, o governador assinou a lei, sabotando um esforço em andamento em Memphis para cobrar uma taxa pelas sacolas plásticas. Enquanto isso, A Bag’s Life dava às crianças da Westmeade que trabalhavam na caixa um cartão-presente de US$ 100 para usar “como bem entendessem”. E, com isso, uma minúscula fração de sua vasta riqueza, a indústria de plásticos aplicou um verniz verde à sua cada vez mais amarga e desesperada luta para continuar lucrando com um produto que está poluindo o mundo.

A Bag’s Life é apenas uma pequena parte de um esforço massivo liderado pela indústria que busca sufocar as tentativas de redução do desperdício de plástico, mantendo viva a ideia de reciclagem. A realidade da reciclagem de plásticos? Ela está praticamente morta. Em 2015, os Estados Unidos reciclaram cerca de 9% de seus resíduos plásticos e, desde então, o número caiu ainda mais. A grande maioria dos 8,3 bilhões de toneladas métricas de plástico já produzidas – 79% – acabou em aterros sanitários ou espalhados pelo mundo. E quanto àquelas sacolas plásticas que as crianças esperavam conter: menos de 1% das dezenas de bilhões de sacolas plásticas usadas nos EUA a cada ano são de fato recicladas.

Isso não quer dizer que não devamos tentar descartar adequadamente o conjunto de brinquedos, embalagens descartáveis, garrafas, sacos, recipientes para viagem, copos de café, canudos, sachês, potes de iogurte, sacolas, embalagens de barras de chocolate, utensílios, sacos de batatas fritas, tubos de produtos de higiene, eletrônicos e tampas para tudo o que passa diariamente em nossas vidas. Temos que fazer isso. Mas estamos bem além do ponto em que os esforços sinceros de crianças em idade escolar ou de qualquer outra pessoa do lado do consumidor possam resolver o problema dos plásticos. Não importa mais o quanto nos preocupemos. Já existe plástico demais que não se decompõe e, finalmente, não tem para onde ir, seja ele triturado em um recipiente de dragão ou não.

A política National Sword da China

A decisão da China, em 2017, de deixar de receber a grande maioria dos resíduos plásticos de outros países fez estourar o já frágil limite do nosso disfuncional sistema de reciclagem. Naquele ano, quando o governo chinês anunciou a política da National Sword, como é chamada, os Estados Unidos enviaram 931 milhões de quilos de rejeitos plásticos para a China e para Hong Kong. Os EUA têm se livrado de grandes quantidades de lixo dessa forma desde, pelo menos, 1994, quando a Agência de Proteção Ambiental, a EPA, começou a catalogar a exportação de plásticos. A prática serviu para mascarar a crescente crise e absolver os consumidores norte-americanos de culpa. Mas, de fato, grande parte do resíduo de plástico “reciclado” que os EUA enviaram para a China parece ter sido queimada ou enterrada em vez de ser transformada em novos produtos.

Embora a reviravolta da China tenha tornado a falha do sistema de reciclagem de plásticos repentina e inegavelmente óbvia, na verdade, o problema dos plásticos tem estado conosco desde que o plástico existe. Ao longo das décadas, à medida que a produção cresceu exponencialmente, nunca conseguimos reutilizar nem um décimo dos nossos resíduos plásticos. Desde que a EPA começou a catalogar a reciclagem de plásticos em 1994, quando os Estados Unidos reciclavam menos de 5% a taxa chegou a apenas 9,5% em 2014. Embora não haja nenhum dado anterior a 1994, a taxa certamente era ainda mais baixa na época. Consumidores descuidados podem ser os culpados por uma parte desta falha, mas muito dos resíduos que de fato são postos em latas e sacos de lixo reciclável também começaram a ser aterrados e queimados porque não havia um mercado para eles.

O problema do plástico tem crescido exponencialmente por décadas. Em 1967, quando o personagem de Dustin Hoffman estava sendo aconselhado a investir em plásticos em “A Primeira Noite de um Homem”, menos de 25 milhões de toneladas eram produzidas por ano. Mesmo naquela época, as empresas que fabricavam plástico já sabiam do crescente problema da coleção de resíduos. No entanto, em 1980, a produção havia dobrado. Dez anos depois, dobrou novamente para 100 milhões de toneladas, superando a quantidade de aço produzida globalmente. Hoje, a indústria de plásticos, estimada em mais de 4 trilhões de dólares, gera mais de 300 milhões de toneladas de plástico por ano, de acordo com os registros mais recentes – quase a metade é para itens de uso único, o que significa que se tornará lixo quase que instantaneamente.

Com a instituição da nova política da China em janeiro de 2018, a extensão da crise dos resíduos plásticos tornou-se dramaticamente mais visível. Em todo o mundo, fardos de plástico usado que apenas um ano antes teriam sido destinados à China começaram a se acumular. Nos EUA, algumas cidades pararam completamente seus programas de reciclagem de plásticos.

Sem boas alternativas, os Estados Unidos estão agora queimando seis vezes a quantidade de plástico que estão reciclando – ainda que o processo de incineração libere poluentes causadores de câncer no ar e crie cinzas tóxicas, que também precisam ser descartadas em algum lugar. E as pessoas pobres estão presas às piores conseqüências da crise dos plásticos. Oito em cada 10 incineradores nos EUA estão em comunidades que são mais pobres ou têm menos pessoas brancas do que o resto do país, e moradores que vivem perto deles estão expostos à poluição tóxica do ar que sua combustão produz.

Globalmente, também, o problema está sendo despejado nos menos afortunados e menos poderosos. Como os Estados Unidos não podem mais enviar seus resíduos plásticos para a China, grande parte desse lixo está indo para a Turquia, Senegal e outros países que não estão bem equipados para lidar com isso. Em maio, o mês mais recente para o qual há dados disponíveis, os EUA enviaram 64,9 milhões de quilos de sucata para 58 países. Tailândia, Índia e Indonésia – onde mais de 80% dos resíduos são mal administrados, de acordo com dados publicados na Science – estão entre os países que agora estão cercados de plástico proveniente dos EUA que está sendo despejado e queimado ilegalmente.

Todo o plástico nos mares

As terríveis notícias sobre o plástico parecem ser tão inescapáveis quanto o próprio plástico, cujos pedaços minúsculos agora estão em quase toda parte. Um estudo descobriu esses “microplásticos” no ar da montanha dos Pirineus, a mais de 160 quilômetros de distância da cidade mais próxima. Outro descobriu que os microplásticos estão sendo transformados em lodo de esgoto e espalhados em campos que cultivam alimentos. E, como sabemos pelas baleias cheias de plástico que regularmente voltam à superfície mortas, os oceanos estão repletos de resíduos de plástico e agora contêm cerca de 150 milhões de toneladas do material – uma massa que em breve ultrapassaria o peso de todos os peixes nos mares.

Nós humanos também temos plástico alojado em nossos corpos. A substância frequentemente vendida para nós como proteção contra contaminação está tanto na comida quanto na água. A água engarrafada, cujas vendas estão aumentando em parte porque as pessoas vêm buscando alternativas para o abastecimento de água contaminado, agora também contém plástico. Um estudo de 2018 descobriu que 93% das amostras de água engarrafada continham microplásticos. Enquanto todas as grandes marcas testaram positivo para microplásticos, o pior foi a Nestlé Pure Life, que afirma que sua água “passa por um processo de qualidade de 12 etapas, para que você possa confiar em cada gota”.

Vale ressaltar que, tanto em 2017 quanto em 2018, a Nestlé classificou-se entre as três principais marcas cujo lixo plástico foi mais frequentemente coletado nos esforços globais de limpeza realizados pelo grupo ambiental Break Free From Plastic.

A confluência de notícias terríveis levou a indignação pública em relação ao plástico a um outro nível. Uma vez considerado principalmente como algo desagradável ou incômodo, os resíduos plásticos agora são amplamente compreendidos como sendo uma das causas de extinção de espécies, destruição ecológica e problemas na saúde humana. E, como mais de 99% do plástico é derivado de petróleo, gás natural e carvão – e sua destruição também usa combustíveis fósseis – grupos ambientalistas agora reconhecem o plástico como um dos principais causadores das mudanças climáticas. O naturalista David Attenborough comparou a mudança na opinião pública sobre os plásticos ao processo pelo qual o público chegou a um consenso sobre os danos da escravidão.

Entre a extração, o refino e o gerenciamento de resíduos, a produção e a incineração de plásticos adicionará mais de 850 milhões de toneladas de gases de efeito estufa à atmosfera somente este ano – um montante igual às emissões de usinas a carvão de 189.500 megawatts, segundo um relatório do Center for International Environmental Law.

Os plásticos reciclados – antes vistos como um sinal de virtude ambiental – são cada vez mais reconhecidos como ameaças à nossa saúde. Os plásticos contêm aditivos que determinam suas propriedades, incluindo estabilidade, cor e flexibilidade. A maioria dos milhares desses produtos químicos não é regulada, mas é claro que alguns desses aditivos, que acabam em plásticos reciclados, são perigosos. Um estudo descobriu que metade dos plásticos reciclados na Índia continha um retardador de chama associado a danos neurológicos, reprodutivos e de desenvolvimento.

O plástico preto, usado em tudo, de brinquedos infantis a utensílios de cozinha, embalagens de alimentos, estojos de celulares e garrafas térmicas, parece ser particularmente perigoso. O plástico é muitas vezes proveniente de eletrônicos reciclados que contêm ftalatos, retardadores de chama e metais pesados, como cádmio, chumbo e mercúrio. Mesmo em níveis muito baixos, estes produtos químicos podem causar problemas reprodutivos e de desenvolvimento.

Mas a maioria dos aditivos não são rastreados ou bem estudados. “A indústria não tem ideia do que está colocando no plástico e de quem está colocando essas coisas”, disse Andrew Turner, um químico britânico que recentemente encontrou produtos químicos tóxicos em 40% dos brinquedos de plástico preto, garrafas térmicas, misturadores de coquetel e utensílios testados. Em alguns plásticos, ele encontrou os produtos químicos presentes em 30 vezes os padrões de segurança estabelecidos pelos governos.

Mesmo os produtos químicos que são regulamentados geralmente têm limites definidos para eletrônicos, mas não para produtos reciclados. “Você tem algo que não seria compatível com os regulamentos como um item elétrico, porque seus níveis são muito altos, mas como se transformou em um garfo, não há nada que impeça que ele seja usado”, disse Turner. Antimônio, que Turner encontrou em recipientes de comida, brinquedos e material de escritório, “é restrito em água potável, mas não em lixo elétrico.” Turner e Zhanyun Wang, outro cientista com quem falei que estuda aditivos químicos em plásticos, me disseram que não usam mais utensílios de plástico preto. “Dada a opção, eu prefiro algo branco ou claro”, disse Turner, acrescentando que ele tenta evitar utensílios feitos de qualquer tipo de plástico.

A solução para essa confusão global claramente tem que ser muito maior do que as escolhas pessoais de cutelaria. Entre as organizações que pedem que superemos a ideia de reciclagem e exijamos que as empresas limitem a produção de plásticos estão o Greenpeace, a Surfrider Foundation, As You Sow, a Rainforest Alliance e a 5Gyres, uma organização iniciada por um casal que atravessou o Oceano Pacífico em uma jangada feita de garrafas descartadas. Alimentado por um aumento na frustração dos consumidores com produtos que os tornam cúmplices do problema, restaurantes e supermercados livres de plástico estão surgindo.

Impostos, proibições e taxas sobre produtos de plástico estão se espalhando pelo mundo. Em março, a União Europeia votou pela proibição de plásticos de uso único até 2021. Em junho, o Canadá fez o mesmo, com o primeiro-ministro Justin Trudeau prometendo não apenas proibir os plásticos de uso único, como sacos, canudos e talheres, mas também responsabilizar os fabricantes de plásticos por seus resíduos. Cento e quarenta e um países, incluindo a China, Bangladesh, Índia e 34 países africanos, implementaram impostos ou proibições parciais de plásticos.

Nos Estados Unidos, o governo Trump trabalhou contra os esforços internacionais para reduzir os resíduos de plástico, e as cidades e comunidades locais estão puxando a frente. Enquanto apenas oito estados decretaram restrições ao uso de plásticos, mais de 330 leis locais de sacolas plásticas foram aprovadas em 24 estados. Alguns legisladores federais também reconheceram que a ação federal é necessária para conter a crescente onda de plástico. “A reciclagem de plásticos não é uma solução realista para a crise da poluição plástica. A maioria dos plásticos de consumo é economicamente inviável de reciclar apenas com base nas condições do mercado “, escreveram em uma carta ao presidente Donald Trump em junho, o deputado Alan Lowenthal e o senador Tom Udall, observando que a” disseminação de produtos plásticos de uso único levou à extensa poluição por plásticos nos EUA e causou um crescente ônus financeiro às agências reguladoras estaduais, governos locais e contribuintes, para custear a remediação.”

A indústria do plástico contra-ataca

Até mesmo os executivos de uma recente conferência da indústria do plástico admitem como a crise é ruim – pelo menos entre eles. Tudo o que ouvimos é “você precisa se livrar dos plásticos”, disse Garry Kohl, da PepsiCo, a seus colegas da Associação da Indústria de Plásticos, em uma conferência em abril. Reunidos no dourado salão de festas de um hotel em Dallas, os representantes de grandes fabricantes de plásticos, recicladores, fornecedores de matérias-primas, extrusoras, donos de marcas e outros no setor de plásticos levantaram a voz sobre seu papel na crise. Especialmente difícil, disse Kohl, que dirige a inovação em embalagens dos salgadinhos e alimentos da PepsiCo, foi a imagem amplamente divulgada de um albatroz morto, cheio de plástico dentro do seu corpo. “Isso é muito comovente para nossos superiores”, disse Kohl, enquanto a imagem agora icônica do albatroz – na verdade, apenas algumas penas e um bico em decomposição organizado em torno de uma variedade de tampas de garrafas, partes mais leves e pedaços de plástico – aparecia acima dele. “Todos eles estão falando sobre o albatroz.”

Patty Long, presidente interina e diretora executiva da Associação da Indústria de Plásticos, o grupo que convocou a reunião no Texas, também reconheceu a dor de ser a face pública de uma indústria responsabilizada pela devastação da natureza. Long admitiu que ela sofreu com outro fenômeno de mídia social que, junto com o albatroz, mudou o curso da guerra sobre os plásticos: o vídeo da tartaruga marinha com um canudo plástico preso em sua narina. Long não é a única. Desde que foi postado em 2015, excruciantes oito minutos em que os biólogos marinhos puxam o canudo plástico com alicates enquanto a criatura se contorce e sangra, o vídeo foi visualizado 36 milhões de vezes.

No fim das contas, Long admitiu, foi um ano difícil, no qual foram apresentados cerca de 376 projetos de lei anti-plásticos, e a opinião pública sobre a indústria de plásticos continuou a “piorar exponencialmente”. A Associação da Indústria de Plásticos está levando sua imagem negativa a sério, trabalhando para compensar isso com apresentações de produtos plásticos para alunos do ensino fundamental e médio, um programa de embaixadores plásticos e, para que os jovens possam “se sentir bem” trabalhando na indústria, disse Long, formou ainda um grupo de “futuros líderes em plásticos”.

Mas apesar do desconforto sobre o albatroz morto, a tartaruga sangrando e a imagem pública da indústria, as empresas que fazem bilhões de plásticos não têm intenção de desacelerar. Em vez disso, a indústria está se preparando para a luta de sua vida, o que explica porque um especialista em conflitos armados deu a palestra de abertura na conferência de plásticos.

Em 2000, o Comandante Kirk Lippold da Marinha dos EUA guiou sua tripulação durante um ataque terrorista ao USS Cole, no qual 17 marinheiros foram mortos e 39 ficaram feridos. Hoje consultor de gerenciamento de crises, Lippold contou à platéia da Associação da Indústria de Plásticos uma história extenuante de vítimas em massa, experiências de quase morte e uma embarcação cheia de estilhaços fazendo água. Sua história, que terminou com Lippold pilotando seu navio estropiado de volta a mar aberto e com o hino nacional a todo volume, sugeriu que, com determinação feroz o suficiente, os executivos de plásticos também poderiam ser capazes de ultrapassar as ameaças que enfrentam.

O que está em jogo para eles não é apenas o atual mercado de plásticos que vale centenas de bilhões de dólares por ano, mas sua provável expansão. A queda dos preços do petróleo e do gás significa que o custo de fabricar plástico novo, já muito baixo, será menor ainda. A queda de preço levou a mais de 700 projetos da indústria de plásticos agora em progresso, incluindo expansões de usinas antigas e a construção de novas da Chevron, Shell, Dow, Exxon, Formosa Plastics, Nova Chemicals e Bayport Polymers, entre outras empresas, de acordo com uma apresentação do diretor de assuntos regulatórios da BASF Corporation na conferência da indústria de plásticos.

A crescente produção de novos plásticos baratos enfraquece ainda mais o argumento da indústria de que a reciclagem pode resolver a crise dos resíduos. Já é impossível para a maioria dos plásticos reciclados competir com plástico “virgem” no mercado. Com exceção das garrafas feitas de PET (No. 1) e HDPE (No. 2), o resto dos resíduos é essencialmente sem valor. Cerca de 30% dos dois tipos de garrafas de plástico foram vendidos para reciclagem em 2017, embora alguns deles possam ter sido depositados em aterro ou incinerados. O recente boom de combustíveis fósseis torna ainda mais barato fabricar plásticos novos e, portanto, é ainda mais difícil vender o produto reciclado. Isso, por sua vez, torna o esforço das empresas de plásticos pela reciclagem ainda mais implausível – e torna ainda mais desesperadora a sua batalha para eliminar os esforços por limitar a produção de plásticos.

Proibindo as proibições ao plástico

Matt Seaholm, diretor executivo da American Progressive Bag Alliance, pareceu apreciar sua participação na luta. Enquanto outros participantes da conferência da indústria do plástico tendiam a lamentar excessivamente e reconhecer em algum nível o problema do plástico, Seaholm mostrou-se sem remorsos em seu antagonismo com grupos ambientalistas que têm chamado a atenção para a questão. No Texas, Seaholm, o ex-diretor nacional dos Americans for Prosperity, liderado pelos irmãos Koch, posicionou-se como inimigo dos ambientalistas.

“Eles odeiam o que estamos fazendo”, Seaholm disse a seus colegas da indústria de plásticos na conferência, com um sorriso provocador. “Nós usamos isso como uma prova de valor”. O fato de grupos ambientalistas se oporem às táticas da APBA, acrescentou Seaholm, é evidência de que seu grupo de lobby “deve estar fazendo algo certo”.

A APBA começou a pressionar contra as restrições de plásticos em todo o país em 2011. Por volta de 2015, o grupo da indústria levou suas táticas a outro nível. Em vez de apenas se opor às proibições individuais, a APBA começou a fazer lobby por leis preventivas. A abordagem, que outro grupo afiliado aos irmãos Koch, o American Legislative Exchange Council, o ALEC, usou para combater a ação local em outras questões, incluindo restrições a pesticidas e leis salariais, impediu que cidades e cidades aprovassem proibições locais ao plástico. Nos últimos oito anos, o Conselho Americano de Química ajudou a aprovar, em 13 estados, projetos preventivos baseados no modelo da ALEC. De acordo com Seaholm, que se juntou ao grupo em 2016, 42% dos norte-americanos vivem em estados onde não se consegue aprovar proibições locais aos plásticos.

Outros grupos de lobby da indústria de plásticos, incluindo o American City County Exchange da ALEC e a National Federation of Independent Business, também defenderam a preempção, ou “uniformidade” como eles chamam, sob a alegação de que as proibições prejudicam empresas que usam plástico. Embora apresentem proibições como sendo ruins tanto para as empresas quanto para as pessoas de baixa renda, que eles afirmam ser afetadas de maneira desproporcional, a indústria também usou doações de campanha para defender sua posição. No ano passado, a Flexible Packaging Association, cujos membros incluem a Dow, a Exxon Mobil Chemical, a SABIC, a Chevron Phillips Chemical e a LyondellBasell, mais que dobraram seus gastos em todo o país. O grupo elevou significativamente suas doações para os legisladores do Tennessee, por exemplo, no ano que antecedeu a aprovação do projeto de lei sobre o uso de sacolas plásticas naquele estado.

Embora a APBA esteja lutando arduamente para impulsionar a invalidação do projeto de lei contra os plásticos, os gastos nacionais do grupo não são claros, pois, como uma entidade de propriedade integral da Associação da Indústria de Plásticos, não há exigência federal para tornar seus gastos públicos. Mas as divulgações de lobby do estado mostram que gastou milhões lutando contra as proibições de sacolas plásticas. Essa defesa das proibições de plásticos coloca os membros da Plastics Industry Association, incluindo PepsiCo, Walmart e o Carlyle Group, em uma situação desconfortável. Todas essas marcas fizeram promessas públicas de sustentabilidade que parecem estar em desacordo com as lutas do grupo contra as leis locais que limitam o plástico.

Questionada sobre a aparente dissonância entre seu compromisso de sustentabilidade e a participação na Associação da Indústria de Plásticos, a Walmart forneceu uma declaração por e-mail dizendo que “a aspiração da Walmart é conseguir zero desperdício de plástico. Estamos tomando ações em nossos negócios para usar menos plástico, reciclar mais e apoiar inovações para melhorar os sistemas de redução de resíduos plásticos.” O comunicado também dizia que a Walmart “pediu aos nossos fornecedores para reduzir a utilização de embalagens plásticas desnecessárias, aumentar a reciclabilidade das embalagens, aumentar o conteúdo reciclado e nos ajudar a educar os clientes sobre redução, reutilização e reciclagem de plástico.”

A PepsiCo e o Carlyle Group não responderam aos pedidos de comentários.

Seaholm parecia não se importar com a terrível imagem da luta do setor contra os esforços para proteger o meio ambiente com proibições plásticas, que ele ridicularizou como “impulsionadas principalmente pela emoção”. “Eles estão fazendo isso porque parece bom”, disse Seaholm aos executivos do plástico em Dallas. “Eles podem se cumprimentar uns aos outros.”

A indústria de plásticos contra Duas meninas

Em Isle of Palms, na Carolina do Sul, as pessoas que lideraram a primeira proibição de sacolas plásticas do estado em 2015 não discordariam de que seu esforço foi motivado pela emoção. Suzette Head e Mila Kosmos, que moram na pequena cidade litorânea perto de Charleston, gritaram de alegria quando sua regulamentação local passou. “Eu fiquei feliz que as sacolas iriam desaparecer”, recordou Mila, agora com nove anos.

O esforço começou com outra emoção, quando as duas meninas estavam no jardim de infância: tristeza. Suzette estava em seu aquário local quando um naturalista segurou um frasco com um espiral cinzento dentro e perguntou o que as crianças achavam que era. Suzette pensou que era uma água-viva e disse isso. Quando soube que era, na verdade, uma sacola plástica e que uma tartaruga poderia morrer se cometesse o mesmo erro e comece a sacola, a menina ficou perturbada.

“Suzette ama animais”, explicou sua mãe, Kathy Kent. Em sua caminhada para casa do aquário após a demonstração, as duas começaram a falar sobre como impedir que as pessoas joguem fora as sacolas plásticas. “No começo eu disse a ela: Bem, você simplesmente não pode mudar as pessoas”, disse Kent. “Mas então eu me escutei e pensei, ‘meu Deus, o que estou dizendo’ e rapidamente voltei atrás.” Sem ter ideia do que exatamente estava prometendo, Kent disse à filha que elas fariam algo para evitar que as sacolas plásticas acabassem no oceano. Logo depois, elas se juntaram a Mila e sua mãe e vários outros moradores de Isle of Palms que também estavam chateados com o uso de plástico. Elas andavam pela praia à tarde pegando sacolas e trocando ideias. Com o tempo,decidiram redigir uma petição para banir as sacolas e caminharam de porta em porta para obter o apoio de vários donos de lojas locais.

“Foi fácil pedir às empresas para nos apoiar”, disse Kent. “Todo mundo sabe que ter uma praia limpa e livre de lixo é bom para todos e para todos os negócios.” Pouco mais de um ano depois da desagradável visita de Suzette ao aquário, a lei foi aprovada pelo conselho municipal em sua primeira votação. No entanto, quase quatro anos depois, a Carolina do Sul está considerando uma legislação apoiada pela APBA que não apenas proibiria futuras proibições de sacolas, mas também desfará a lei em Isle of Palms e outras 17 leis locais que restringiram o plástico na Carolina do Sul.

O índio que chora

Se a imagem de corporações multinacionais gigantescas destruindo os esforços de meninas para proteger criaturas marinhas é menos que lisonjeira, a indústria de plásticos pode se consolar com o fato de ter derrotado com sucesso as tentativas dos ambientalistas de responsabilizar as empresas pela poluição plástica utilizando táticas similares. O truque tem sido abraçar publicamente a preocupação de seus oponentes pelo meio ambiente, enquanto combate em privado as tentativas de regulamentação.

A estratégia de dois gumes data de pelo menos 1969, quando um editorial da revista Modern Plastics alertou sobre a iminente crise dos resíduos. Os grandes fabricantes de plásticos já estavam cientes do problema. Naquele ano, a DuPont, a Chevron, a Dow e a Sociedade pela Indústria de Plásticos estavam entre os grupos representados em uma conferência sobre resíduos de embalagens. E, quando o primeiro Dia da Terra foi lançado em 1970, em parte para enfrentar essa crise, a indústria estava pronta.

Naquela semana, os manifestantes realizaram uma “jornada ecológica” na qual despejaram suas garrafas não retornáveis na sede da Coca-Cola. Os ativistas tinham uma solução para a crescente crise dos resíduos: projetos de lei sobre garrafas que colocariam nos fabricantes o ônus de limpar o lixo. A Coca-Cola, que havia sido avisada sobre os protestos pela Associação Nacional de Refrigerantes, recebeu os manifestantes com refrigerante de graça e latas de lixo. As grandes empresas de bebidas e embalagens lutaram contra o projeto sobre as garrafas e criaram um truque inteligente que até hoje demonstra resultados. Eles não só apelidaram os defensores dos projetos sobre as garrafas de radicais, mas também lançaram uma massiva campanha de relações públicas que parecia incorporar parte da raiva sobre o lixo crescente que alimentou os protestos do Dia da Terra enquanto transferia a responsabilidade das empresas para os consumidores.

Em 1971, a Keep America Beautiful, uma organização anti-lixo formada por empresas de bebidas e embalagens, incluindo a PepsiCo, Coca-Cola e Phillip Morris, associou-se ao Ad Council para criar o agora infame anúncio “Crying Indian” (“O índio que chora”, em tradução livre). Embora o “índio” que chora quando vê um saco de lixo jogado no chão fosse na verdade um ator ítalo-americano com uma pluma presa no cabelo, a decepção do anúncio foi que sua expressão de preocupação com a poluição foi trazida ao ar por muitas das mesmas empresas que produziram a poluição. Mesmo que o anúncio estivesse induzindo a culpa nos espectadores por espalhar lixo, os membros da Keep America Beautiful estavam lutando contra a legislação que poderia ter feito muito para resolver o problema.

“O que torna isso ainda mais traiçoeiro é que esses comerciais de TV e outros anúncios foram apresentados como anúncios de serviço público – e, portanto, pareciam ser politicamente neutros – mas, na verdade, serviram à agenda do setor”, disse o historiador Finis Dunaway, que conta a história dos esforços de relações públicas da Keep America Beautiful em “Seeing Green: The Use and Abuse of Environmental Images” (“Vendo verde: O uso e abuso de imagens ambientais”, sem edição em português). “Foi uma propaganda que não apareceu propagandística. Ela também protegeu os poluidores corporativos de qualquer culpa, transferindo a responsabilidade para os indivíduos.”

Os futuros Dias da Terra continuariam a enfatizar a responsabilidade pessoal dos consumidores em reciclar, incluindo a comemoração nacional do 10º Dia da Terra, em 1980, que foi organizado por Michael McCabe, um ex-assistente legislativo que viria a ser diretor de comunicações e projetos especiais de Joe Biden antes de liderar a defesa da DuPont sobre um perigoso produto químico utilizado em diversos plásticos, o PFOA. Em 1990, a celebração do 20º aniversário foi marcada por um especial de TV repleto de celebridades que enfatizava a importância das ações dos indivíduos, incluindo o plantio de árvores e a reciclagem, na proteção do meio ambiente.

Até hoje, o Keep America Beautiful – que ainda é liderado por executivos de empresas de bebidas e plásticos, incluindo Dr Pepper, Dow e o Conselho Americano de Química – continua focando sua propaganda naqueles que jogam lixo no chão, estimulando cidadãos errantes a descartarem melhor seus resíduos plásticos enquanto muitos de seus membros evitam a regulamentação de sua produção desses resíduos. Vários parceiros corporativos do grupo – incluindo as empresas fundadoras Coca-Cola e PepsiCo e seu grupo de comércio, a American Beverage Associationse opuseram aos projetos de lei sobre o uso de garrafas plásticas que ajudariam a resolver o problema dos resíduos plásticos.

Noah Ullman, diretor de marketing da Keep America Beautiful, contesta a ideia de que a organização foi fundada “como um artifício. A intenção não estava lá,” disse em entrevista por telefone. Em vez disso, Ullman escreveu em um email para o Intercept, “o primeiro objetivo da Keep America Beautiful era, e continua sendo, encorajar as pessoas a ‘colocar o lixo no lixo’. Prevenir que lixo seja jogado na rua é a base para todo o resto – ajuda a manter as comunidades bonitas (o que tem uma longa lista de benefícios sociais e econômicos) e ajuda a proteger os animais e nosso meio ambiente de resíduos sólidos que acabam em lugares não planejados.” Ullman disse que a organização não tem uma posição sobre os projetos de lei que lidam com o uso de garrafas plásticas, mas observou que, enquanto os projetos melhoram as taxas de coleta de materiais reembolsados, a “consequência não intencional é que desvaloriza o restante do fluxo de resíduos para reciclagem (por exemplo, vidro, caixas de papelão, etc.) e esses itens se tornam menos propensos a serem reciclados.”

A Associação Americana de Bebidas, que se opôs aos projetos de lei sobre o uso de garrafas plásticas no passado, forneceu ao Intercept uma declaração dizendo: “Não nos opomos a quaisquer ideias que possam nos levar a melhores taxas de reciclagem no futuro, se essas não prejudicarem os abrangentes sistemas de reciclagem que os consumidores preferem.”
Em e-mail, um representante da Coca-Cola escreveu que a Associação Americana de Bebidas representa a opinião da empresa sobre os projetos sobre o uso de garrafas. O e-mail também dizia que “na Coca-Cola, nosso foco é ajudar a coletar e reutilizar o equivalente a 100% das garrafas e latas que colocamos no mercado. Isso inclui garantir que todas as nossas embalagens sejam 100% recicláveis e que utilizemos pelo menos 50% de conteúdo reciclado em nossas embalagens até 2030.”

Com foco na reciclagem e no status de organização sem fins lucrativos, a Keep America Beautiful e outras organizações anti-lixo financiadas pela indústria de plásticos e bebidas, incluindo a Recycling Partnership, oferecem às empresas a oportunidade de demonstrar preocupação com poluição plástica e redução de impostos. A Fundação Coca-Cola doou 640 mil dólares para a Recycling Partnership para melhorar a reciclagem em 2017, por exemplo. A organização “trabalha com milhares de comunidades em todo o país para fornecer acesso à reciclagem e educação para ajudar os moradores a entender como reciclar materiais cada vez melhores, incluindo papel, alumínio e latas de aço, papelão, papelão, vidro e, sim, plásticos “, de acordo com uma declaração da organização enviada por email.

Enquanto trabalha para melhorar a reciclagem e criar mercados finais para o plástico reciclado, a Recycling Partnership também apresenta uma visão particularmente otimista sobre a reciclagem. Em maio, o grupo enviou um e-mail que anunciava que “87% das pessoas acham que a reciclagem é importante”, sem mencionar a realidade dos números de apenas um dígito de reciclagem. Os outros parceiros de financiamento do grupo incluem a ExxonMobil, a Keurig, a Dr. Pepper, a Dow, a Associação Internacional de Água Engarrafada, a Associação Americana de Bebidas e o Conselho Americano de Química.

Em seu comunicado, a Recycling Partnership observou que apenas metade dos americanos que têm acesso a reciclagem conveniente fazem tudo o que podem. A declaração também dizia que o grupo está trabalhando para criar e apoiar os mercados finais de plástico reciclado.

Mas de acordo com Jan Dell, engenheiro que trabalhou como consultor de sustentabilidade corporativa antes de criar o The Last Beach Cleanup, uma organização que enfrenta poluição por plásticos, a Recycling Partnership e outras organizações sem fins lucrativos apoiadas pela indústria de plásticos estão usando informações enganosas para amenizar as preocupações que, de outra forma, levariam os consumidores a não mais comprarem plástico. “Eles estão tentando criar a percepção de que existe uma maneira viável de reciclar a maior parte dos resíduos plásticos em novos produtos, e isso simplesmente não é verdade.”

O golpe ‘reciclável’

Grande parte do lixo plástico acumulado nos oceanos, enterrado em aterros sanitários e espalhado pela natureza, é “reciclável”, o que equivale a dizer que ele poderia, em teoria, ser transformado em novos produtos. As empresas aderiram ao termo esperançoso para tornar seus mais recentes produtos de plástico mais aceitáveis. A Starbucks, por exemplo, elogiou a si mesma por sua “tampa reciclável”, lançada em seis cidades neste verão, que a empresa previu que eliminaria o uso de um bilhão de canudos. Mas como as tampas são feitas de polipropileno (também conhecido como plástico nº 5) e há muito pouco mercado para o polipropileno reciclado, esse número não tem base na realidade. Apenas 5% do polipropileno foi reciclado em 2015 – e isso foi antes de a China decidir parar de receber o lixo. Desde então, a porcentagem reciclada é provavelmente muito menor ainda, o que significa que a grande maioria das 1 bilhão de novas tampas Starbucks “recicláveis” terminará no mesmo lugar que as antigas – em aterros sanitários, montes de lixo, incineradores e oceanos.

Em janeiro, a Taco Bell também se gabou de suas próprias tampas de plástico, como se criar mais plástico pudesse de alguma forma resolver a crise dos plásticos. “Ama a Terra? Sim, nós também”, anunciou o site da empresa, “e é por isso que recentemente começamos a usar copos e tampas recicláveis em todos os nossos restaurantes”.

Outra empresa, a Tempo Plastics, anuncia explicitamente suas bolsas de plástico como “livres de culpa”. Embora sejam feitas de polietileno de alta densidade ou de plástico nº 2 – apenas 5,5% delas são recicladas nos Estados Unidos – o novo “Harmony Pack” contará com setas verdes reconfortantes e a aprovação do How2Recycle.

Um projeto da Sustainable Packaging Coalition e da organização sem fins lucrativos chamada GreenBlue – cuja diretoria inclui executivos da Dow Chemical, Mars, Target, Amazon e Delfort Group – How2Recycle faz com que alguns produtos plásticos pareçam muito mais fáceis de reciclar do que são. O Guia Verde da Comissão Federal do Comércio (FTC, na sigla em inglês) deixa claro que “deturpar, direta ou implicitamente, que um produto ou pacote é reciclável” é enganoso. Para fazer afirmações não qualificadas de que um produto é reciclável, as instalações de reciclagem devem estar disponíveis para pelo menos 60% dos consumidores a quem este é vendido. Mas o símbolo How2Recycle está agora afixado em vários produtos que serão quase impossíveis para muitos consumidores reciclarem, incluindo copos, pratos e recipientes feitos de plásticos nºs 3 a 7, todos agora com taxas de reciclagem próximas de zero.

Quando perguntada sobre a bolsa “livre de culpa”, Kelly Cramer, diretora do How2Recycle da GreenBlue, escreveu em e-mail que o produto não estava “qualificado apropriadamente” para o selo e disse que a organização “procuraria essa empresa imediatamente para corrigir”. Em relação às fotos de copos e placas de plástico que não são aceitas pelos recicladores na maior parte do país, mas cuja embalagem tinha o rótulo How2Recycle, Cramer disse que o rótulo se referia aos sacos que continham os copos e as placas, que é reciclável se trouxe de volta a um programa de reciclagem na loja, mas reconheceu que as placas e copos dentro deles não eram recicláveis.

Embora a How2Recycle forneça rótulos “não recicláveis” e “recicláveis”, é a escolha das empresas-membro aplicá-las, disse ela. “Aquele membro optou por não rotular o produto”, disse Cramer. “Esta é uma área onde nós damos ao membro a escolha de rotular o produto ou não. Se fôssemos muito rigorosos em nossos requisitos, não teríamos tantos membros no programa.”

Cramer argumentou que outro produto, copos de polipropileno ou plástico nº5, podem ou não se qualificar como recicláveis – uma questão que agora está sendo julgada em um tribunal federal na Califórnia. Cramer disse que a GreenBlue está realizando pesquisas sobre as taxas de reciclagem de polipropileno e defendeu o programa How2Recycle como uma maneira de minimizar o desperdício que é um fato da vida moderna.

“Não queremos que as pessoas pensem que a reciclagem alivia toda a sua culpa pelo consumo. Mas a verdade é que todos nós consumimos e a embalagem protege os produtos que precisam ser movidos para serem vendidos “, disse ela. “No futuro, seria bonito se tivéssemos reutilização robusta ou novos sistemas de entrega para repensar todo o sistema de embalagem do produto. Mas ainda não estamos lá.”

Embora a reciclagem faça pouco para aliviar a crise dos plásticos de suporte, a promoção da mesma provou ser extremamente útil para a indústria quando propostas proibições locais foram proibidas. O American Chemistry Council recentemente lançou campanhas locais para o WRAP, ou o Wrap Recycling Action Program, em vários lugares onde proibições de plástico foram propostas.

A parceria público-privada dirigida pelo ACC, que incentiva a reciclagem de sacos de plástico através de 18 mil locais de coleção de película plástica em todo o país e promove a ideia de que os sacos plásticos podem ser reciclados, lançou uma nova iniciativa em Connecticut em 2017 que coincidiu com a consideração por parte do estado de um imposto sobre sacolas plásticas. Quando Chicago considerou uma taxa sobre sacolas plásticas em 2016, a ACC também divulgou o WRAP lá, anunciando que os moradores locais podem reciclar sacolas plásticas “em quase 400 supermercados e lojas locais”. Este ano, na Flórida, a ACC criou outra iniciativa local da WRAP assim que um projeto de lei estadual para banir canudos de plástico foi apresentado.

O grupo ensina ao público como reciclar películas de plástico – qualquer plástico com menos de 10 mm de espessura – um processo que se torna complicado o suficiente para exigir sua própria organização educacional. A maioria dos programas municipais de reciclagem não aceita sacolas de compras e outros plásticos flexíveis, que podem enroscar nas máquinas. Então o WRAP orienta os consumidores a trazê-las para centros locais de devolução, que coletam as películas de plástico e mandam aos recicladores. O plástico primeiro tem que ser lavado e seco, de acordo com o WRAP, e mesmo assim apenas alguns deles podem ser reciclados. O programa pode reciclar o envoltório claro que se utiliza para conservar alimentos em casa, bem como sacos que contenham a maioria dos produtos, mantimentos e pães, mas não embalagens de doces e sacos plásticos que contenham chips ou comida congelada.

Mas, mesmo que o WRAP promova a mensagem de que as películas de plástico possam e devam ser recicladas e repreenda as pessoas que não colocam sacolas plásticas em latas de lixo, muitos dos sacos usados e outros resíduos plásticos são queimados ou enviados para aterros sanitários. De acordo com o mais recente relatório sobre reciclagem de plásticos filme publicado em julho pelo ACC, a quantidade coletada nos EUA e vendida para reciclagem caiu de cerca de 590 mil toneladas para pouco mais de 450 mil toneladas entre 2016 e 2017 – e isso antes da restrição da China às importações de plástico ter sido totalmente implementada. O relatório da ACC admitiu que algumas das sacolas acabaram onde acabaram se antes não fizessem uma breve parada em uma lata de lixo reciclável. “Devido à falta de compradores – pela qualidade e quantidade de material disponível – no final de 2017, o material de aterro começou a ser mais econômico (apesar do desvio ou outros objetivos ambientais) do que cobrir os custos de manuseio e transporte de material para o mercado.”

Não está claro o que aconteceu com as 136 mil toneladas de películas de plástico que foram vendidas para reciclagem em 2016, mas não em 2017. Como o ACC não relata a quantidade total de películas de plástico coletadas, a proporção coletada destas também é algo obscuro. Tampouco está claro por que o ACC ainda não informou os números de 2018. Mas, mesmo dentro das 450 mil toneladas de películas de plástico que o ACC categorizou como “recicladas”, grande parte provavelmente é queimada ou aterrada. De acordo com o relatório, 171 mil toneladas de películas de plástico foram exportadas, e o ACC afirmou, em declaração por email ao Intercept, que não sabe o que aconteceu com o lixo depois desse ponto.

Embora o ACC não coloque um número exato na quantidade total de sacos que foram queimados ou aterrados, uma recente chamada à ação de um grupo de recicladores de plásticos chamado Recycle More Bags o faz. O documento, que saiu em maio e cobrou por uma legislação que exigiria que os sacos plásticos contenham material reciclado, observou que mais de “600 milhões de libras (cerca de 272 mil toneladas) de sacolas plásticas coletadas para reciclagem na América do Norte em 2018 foram aterradas ou incineradas devido à falta de mercado”. Uma versão posterior do documento mudou o valor para “centenas de milhões de libras”.

“Com base nos dois relatórios da indústria, parece que podemos ter incinerado e descartado a mesma quantidade de películas de plástico e sacolas que foram reprocessados”, disse Dell.

Reciclar ou queimar?

Uma das últimas soluções que a indústria oferece à crise do plástico não é exatamente a reciclagem. Embora ainda haja muitas questões sobre o que, de fato, é o programa Hefty EnergyBag, ele está deixando claro quão caro e difícil é encontrar um uso para os resíduos plásticos.

Em abril, 49 anos depois de um grupo de manifestantes inaugurarem o Dia da Terra jogando materiais descartáveis na sede da Coca-Cola, a Dow Chemical foi um “patrocinador floresta verde” no Dia da Terra da cidade de Omaha, mesmo sendo a maior produtora de plásticos no mundo. Com uma doação de 5 mil dólares, o programa Hefty EnergyBag da Dow, uma parceria da Dow com a Reynolds Consumer Products, foi um dos dois maiores doadores do evento. Realizado no exuberante Parque Elmwood de Omaha, as festividades do dia foram tão verdes e saudáveis quanto qualquer patrocinador poderia querer. Músicas folclóricas de nativos americanos eram tocadas enquanto a população local passeava pelo gramado, de mesa em mesa, aprendendo sobre apicultura urbana, reutilização da água da chuva, micro galinhas, e plantio de árvores. Crianças acariciavam um coelhinho cinza. E dezenas de moradores do Nebraska, preocupados com o ambiente, participavam em uma aula de yoga ao ar livre, dobrando o corpo e se alongando ao sol, junto com seus vizinhos.

A Dow e a Hefty iniciaram o programa no Dia da Terra de 2016 como uma forma para os moradores de Omaha descartarem talheres plásticos, embalagens de salgadinhos e outros plásticos de uso único que a cidade não era capaz de processar. Tudo o que eles precisavam fazer era colocar o lixo em sacolas Hefty especiais, na cor laranja, deixá-las na esquina, e a cidade recolheria e reciclaria o plástico. “Eles estavam, definitivamente, chamando aquilo de reciclagem”, recorda Richard Yoder, um consultor de sustentabilidade local. Mas Yoder e outros moradores de Omaha logo souberam que, em vez de serem derretidos e transformados em plástico reutilizável, os conteúdos de suas sacolas estavam sendo queimados em um incinerador no estado do Missouri, que tinha um histórico de violações à Lei do Ar Limpo.

No ano passado, após Yoder afirmar em um debate que chamar o programa EnergyBag de reciclagem era enganoso, a Hefty parou de usar o termo. Ainda assim, com uma linguagem difícil, o site da empresa ainda vende o programa como algo bom para o ambiente, ou “uma iniciativa revolucionária que coleta plásticos difíceis de reciclar”. O programa Hefty EnergyBag “complementa os programas de reciclagem existentes”, de acordo com Ashley Mendoza, um porta-voz da Dow. “Nossa visão de longo prazo é manter cada vez mais plásticos fora dos aterros sanitários, coletando-os para reciclagem ou recuperação, se eles não puderem ser reutilizados”.

Após a Aliança Global por Alternativas a Incineradores revelar que o programa de Omaha de criava mais poluição, a iniciativa da Dow e da Hefty também parou de mandar as sacolas laranjas ao incinerador. Desde então, os rejeitos plásticos têm sido utilizados para diferentes propósitos, incluindo a compressão em pilares de cercas e dormentes para trilhos de trem e indo “para uma empresa canadense que fazia um tipo de deck”, segundo Dale Gubbels, CEO da FirstStar Recycling, empresa de Omaha parceira da Dow e Hefty no projeto.

Embora a Dow e a Hefty promovam o programa como uma forma de converter plástico em “fontes valiosas de energia”, isso não é barato, de acordo com Gubbels. O custo parece ter desapontado alguns dos primeiros defensores do programa, que esperavam que ele se pagasse sozinho. “Eu tenho que convencê-los que, se você quer reciclar, é preciso reconhecer que você tem que pagar por isso”, diz. No fim das contas, acrescenta Gubbels, o programa vendido como uma solução energeticamente eficiente para os rejeitos plásticos acabou se provando “muito mais desafiador do que qualquer um havia imaginado quando tudo começou”. Segundo um email de Mendoza, “o preço das sacolas laranjas Hefty® EnergyBag® cobre o custo do programa”.

Cientistas destacam outro obstáculo no plano das sacolas de energia: como ninguém sabe remover aditivos do plástico, produtos feitos de rejeitos reciclados, como dormentes, cercas e decks feitos com o plástico de Omaha, podem liberar produtos químicos tóxicos conforme se degradam. “Até que nós façamos um trabalho melhor para eliminar os perigos no primeiro uso, haverá problemas para administrar a toxicidade nos usos seguintes”, diz Pete Myers, biólogo, fundador e cientista-chefe da Environmental Health Sciences. “Alguns tipos de plásticos que eles propõem reciclar contêm produtos químicos relacionados a um declínio de 50 anos na contagem de espermatozoides, ao desenvolvimento de diabetes tipo 2, e câncer de mama e próstata. Esses são problemas sérios e nós não sabemos o suficiente a respeito do nível de exposição para garantir a segurança da criança que se senta em um deck desses”.

Questionado sobre essa possibilidade, Gubbels disse que não a havia considerado, e não era perito em produtos químicos tóxicos. De qualquer forma, Gubbels vem espalhando os rejeitos plásticos de Omaha pelos EUA. Ele mandou uma carga recente para Renewlogy, uma usina em Salt Lake City, no estado de Utah, que aquece o plástico e extrai energia dele, e diz planejar mandar uma carga a uma planta semelhante no Texas, chamada New Hope Energy.

O mito da ‘reciclagem química’

Renewlogy e New Hope são duas das empresas que oferecem o que a indústria do plástico tem anunciado como a mais nova solução aos resíduos plásticos: a chamada reciclagem química. De acordo com o Conselho Americano de Química, expandir a recuperação de plásticos a esse âmbito poderia “resultar em bilhões de dólares para a economia”. Ainda assim, até mesmo os maiores defensores da tecnologia reconhecem que ninguém ainda sabe como converter, de maneira eficiente e econômica, o plástico em suas várias partes constituintes e, depois, em combustível. Se todos os plásticos não reciclados dos Estados Unidos fossem convertidos em petróleo, “poderíamos criar combustível suficiente para abastecer 9 milhões de automóveis por ano”, disse o diretor de sustentabilidade da Chevron Phillips, Rick Wagner, em um artigo recente na revista Plastics Recycling Update. Essa transformação também permitiria que a Chevron, a segunda maior produtora de plástico no mundo, desse de ombros diante de sua responsabilidade pelas enormes quantidades de poluição que agora afogam o mundo. Mas mesmo Wagner admite que ainda estamos longe de saber como fazer uma reciclagem química. É como ir a Marte, escreve Wagner. “Ainda não chegamos lá. Não amanhã, mas algum dia. Espera-se que seja logo”. Mendoza descreveu a pirólise, o método usado na fábrica da Renewlogy para onde os resíduos da Hefty EnergyBag já foram enviados, como “um possível passo na direção de uma reciclagem avançada”.

A ideia de que o plástico pode ser quebrado em seus elementos constituintes, que então podem ser transformados em combustível, ceras e lubrificantes, circula há décadas. Mas essas usinas que convertem resíduos em combustível nunca se provaram econômica ou ambientalmente viáveis. Segundo um informe de 2017 da Aliança Global por Alternativas a Incineradores, a maioria dos projetos desse tipo nos EUA, Canadá, e Europa, que usam pirólise ou uma tecnologia relacionada chamada gasificação, foram fechados ou cancelados antes mesmo de se iniciarem. Entre os impedimentos citados no informe estava a inabilidade de cumprir com as metas de eficiência energética e controle de poluição. “Em geral, os custos são mais altos e mais incertos do que os defensores do projeto preveem, e as receitas são menores e mais incertas”, aponta o documento.

A viabilidade ambiental e financeira das mais recentes usinas do tipo também não está clara. Perguntado sobre a eficiência da estrutura utilizada pelo programa Hefty EnergyBag, Mendoza disse, por email, que “a eficiência material de uma unidade de processamento por pirólise é dependente da tecnologia usada e dos tipos de materiais consumidos na instalação”. Mendoza também escreveu que “a Dow tem um interesse vital e a responsabilidade de tornar os materiais plásticos benéficos durante todo o seu ciclo de vida. Estamos trabalhando para melhorar todo o sistema onde nossos produtos são usados, para maximizar a eficiência dos recursos e os benefícios derivados do uso dos nossos produtos”.

Nem a New Hope ou a Renewlogy, duas das nove empresas na aliança industrial em prol da reciclagem química dentro do Conselho Americano de Química, revelaram qual o volume de plásticos suas instalações precisam para produzir combustível. A Renewlogy não respondeu a vários pedidos de entrevista por email. Mas o site da empresa diz que, entre os rejeitos de Omaha e aqueles coletados através de um programa similar da Hefty EnergyBag na cidade de Boise, mais de 450 toneladas foram retiradas do lixo em 2018. Um vídeo no site também descreve o processo da Renewlogy como rentável e “comprovadamente limpo”. A usina New Hope, no Texas, publicou um comunicado de imprensa anunciando que terá a capacidade de processar 150 toneladas de plástico por dia, mas a companhia não comentou sobre a eficiência das suas instalações. “É uma indústria muito nova e há coisas sobre as quais ainda não podemos informar”, diz Lee Royal, que atendeu o telefone. “A forma como nós fazemos negócios é algo que, provavelmente, não gostaríamos de compartilhar neste momento”.

Em uma declaração enviada por email, o Conselho Americano de Química defendeu o valor da reciclagem química, assinalando que “essas tecnologias podem produzir uma ampla gama de produtos além do combustível, incluindo químicos mais valiosos e outras matérias-primas”, e que esses produtos “têm um valor muito maior no mercado do que em um aterro”.
As grandes questões ainda abertas quanto à eficiência, segurança, e viabilidade econômica do processo de reciclagem química — e as admissões de seus defensores de que eles ainda não descobriram como fazê-la funcionar — não impediram que a indústria química passasse leis facilitando o financiamento do esquema. O Texas recentemente se tornou o sexto estado a aprovar uma legislação (apoiada por Chevron Phillips Chemical, Exxon Mobil e o Conselho Americano de Química) que abriria caminho para novas usinas de reciclagem química.

Algumas dessas leis foram elaboradas de modo a garantir que as instalações estarão sujeitas a uma regulamentação mínima. Ao classificá-las como usinas de manufatura em vez de locais de descarte de rejeitos, operações de reciclagem química podem ficar imunes aos limites impostos sobre estes lugares em relação a óxido de nitrogênio, dióxido de enxofre, monóxido de carbono, materiais particulados, metais pesados e gases do efeito estufa.

Ainda assim, usinas de reciclagem química já estão sendo promovidas — e, em alguns casos, financiadas — como uma forma sustentável de resolver o problema dos plásticos. No estado do Oregon, uma empresa de administração de rejeitos está pressionando para ter sua usina queimadora de plástico como sendo de energia renovável. E na cidade de Ashley, em Indiana, uma nova usina de reciclagem química recebeu 185 milhões de dólares do estado em “títulos verdes”, fundos destinados a projetos que beneficiam o ambiente. A Brightmark Energy, empresa por trás disso, diz que sua missão é “levantar-se para preencher as necessidades do nosso planeta”.

Algumas pessoas manifestaram contrariedade ao uso de dinheiro público para financiar um processo que falhou repetidamente em termos financeiros quando foi tentado no passado. “Cada uma dessas instalações de pirólise dependeu da grandiosidade do governo para simplesmente tentar sair do chão”, diz Andrew Dobbs, diretor na Campanha do Texas pelo Ambiente, um grupo que se opôs ao projeto de lei texano. “A chamada reciclagem química não faz sentido econômico. É um processo muito caro e que demanda um uso intenso de energia, que compete com o ato de simplesmente enterrar coisas em um buraco. Por outro lado, estão produzindo combustível, que compete com o gás natural em um momento em que o gás natural é muito barato. A única forma que eles encontram para fazer isso funcionar economicamente é se os custos forem pagos por outra pessoa”.

De acordo com o email enviado pelo Conselho Americano de Química, usinas de reciclagem química “estão sendo desenvolvidas por firmas de capital de risco e de investimentos, um voto de confiança na promessa dessas tecnologias e modelos de negócios”. O email também destaca que “tecnologias de reciclagem química estão se desenvolvendo muito rapidamente e — como outras tecnologias incluindo a eólica e solar — vão se tornar mais eficientes conforme atingirem uma escala comercial”.

Se conseguir cumprir seu objetivo de transformar 288 toneladas de plástico por dia em 778 barris de diesel, 418 barris de nafta e 360 barris de cera industrial, a última palavra em reciclagem de plástico vai, como todas as usinas de reciclagem, utilizar combustíveis fósseis para transformar produtos feitos com combustíveis fósseis em mais combustíveis fósseis. Elas também vão, quase certamente, facilitar uma produção continuada de ainda mais plástico.

“Tudo isso é uma distração enorme e incrivelmente cara”, diz Denise Patel, a diretora de programa dos Estados Unidos na Aliança Global por Alternativas a Incineradores. Embora a decisão da China de parar de receber o plástico dos EUA finalmente tenha revelado o problema dos plásticos no país, a ideia de reciclagem química — por mais original que pareça — poderia enfraquecer a urgência do tema, segundo Patel. “A decisão da China é uma oportunidade para as cidades examinarem seus resíduos e aumentarem os esforços para reduzir o uso”, diz. “Mas, em vez disso, esses projetos estão exacerbando o problema ao dar às pessoas a ideia de que há uma solução e que tudo vai ficar bem se continuarem a comprar plásticos”.

Na conferência da indústria no Texas, ninguém perguntou se não havia problemas em seguir produzindo mais plástico. Após as imagens de criaturas marinhas feridas terem passado e um contador ter explicado aos executivos sobre como aproveitar os cortes de impostos aos mais ricos feito por Trump, o público presente ouviu sobre as perspectivas de futuro brilhante que a indústria tem. As exportações do plástico mais popular do mundo, o polietileno, não só vão continuar, como passarão por um “saudável crescimento” nos próximos anos, como explicou uma apresentação da firma de pesquisas de investimentos IHS Markit. Também não houve muita dúvida sobre se todo esse plástico será vendido. Uma parcela cada vez maior deve ir a outros países asiáticos além da China, já que a crescente consciência sobre a poluição plástica na Europa e na América do Norte pode enfraquecer levemente estes mercados. A única dúvida quanto à proliferação de um produto que nós sabemos estar aquecendo o planeta, acumulando-se ao nosso redor e envenenando o ar e a água no mundo inteiro, é quais serão as novas técnicas adotadas pelos fabricantes para fazer com que tudo isso pareça OK.


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