18/04/2024 - Edição 540

Brasil

Os números do abismo social brasileiro

Publicado em 23/08/2019 12:00 -

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Uma pesquisa da FGV (Fundação Getúlio Vargas) revelou que a desigualdade está crescendo no Brasil. Comparando cada trimestre com o mesmo período do ano anterior, vê-se que a desigualdade cresceu no Brasil por 17 trimestres consecutivos, entre o segundo trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2019.

É o maior período de aumento da desigualdade na série histórica, superando o pico observado no final dos anos 1980.

O estudo foi conduzido pelo economista Marcelo Neri e se baseia nos dados da Pnad Contínua, divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A Pnad abrange um grupo representativo da população brasileira. A cada três meses, ela visita 211 mil domicílios por todo o território nacional, levando em conta localização e classe social. Por se tratar de uma amostra representativa, ela não engloba aqueles cuja renda está muito distante da realidade média brasileira.

Para medir a desigualdade, o método usado pelo estudo da FGV é o cálculo do índice de Gini para a renda dos brasileiros.

O aumento da desigualdade

O estudo também traz números dos rendimentos médios dos brasileiros nos últimos anos e os compara com a medida de bem-estar social, conforme proposta pelo economista Amartya Sen.

Se considerada a média para os últimos 4 trimestres (média móvel), atenuados os efeitos sazonais, é possível ver de forma mais clara a tendência de alta desde o segundo trimestre de 2015.

O ritmo do aumento da desigualdade no Brasil, porém, não é constante. Ela vem crescendo a taxas mais baixas nos trimestres mais recentes.

No segundo trimestre de 2019, o aumento foi de 0,11% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior — é o menor crescimento nestes 17 trimestres de alta da desigualdade.

A distribuição da desigualdade por faixa de renda

O estudo também mostra que entre o quarto trimestre de 2014 e o segundo trimestre de 2019, a renda média caiu mais para os que recebem menos. A única parcela da população em que os rendimentos médios aumentaram foi a dos 10% mais ricos, para os quais a renda subiu 2,55%. Entre o 1% que mais ganha, o aumento foi de 10,11%.

Para os 10% mais pobres, a renda média não mudou, uma vez que se trata da população desempregada, com rendimento zero.

Já entre aqueles que estão no segundo decil (entre os 10% e 20% com menor renda), o rendimento médio caiu 73,13% no período.

VARIAÇÃO DA RENDA MÉDIA POR FAIXA

A variação da renda por grupos sociais

Os números da pesquisa mostram que, entre o quarto trimestre de 2014 e o segundo trimestre de 2019, a renda média geral caiu 3,71%.

Entre os homens, a queda foi de 7,16%, enquanto o rendimento das mulheres aumentou em 2,22%.

A contração da renda foi liderada por jovens de entre 20 e 24 anos, que passaram a ganhar 17,76% a menos no período.

Em termos regionais, a região Norte observou uma queda de 13,08% nos rendimentos e o Nordeste viu uma diminuição da ordem de 7,55%.

Entre a população negra, a renda caiu 8,35%. E para a população parda, a queda foi de 4,18%.

A pesquisa conclui que o grande motivo por trás da queda da renda entre o último trimestre de 2014 e o segundo trimestre de 2019 foi o desemprego. Segundo o estudo, o desemprego é “sinal de desajuste no mercado de trabalho e de frustração”, o que leva a “comportamentos precaucionais na demanda”, como a queda no consumo entre aqueles que temem perder o emprego.

O estudo da FGV mostra que a renda média vem crescendo desde 2017, recuperando parte das perdas ocorridas entre 2015 e 2016. O valor mais baixo registrado entre 2013 e 2019 foi de R$ 801,71 no primeiro trimestre de 2017. No segundo trimestre de 2019, o número anotado foi de R$ 838,50. Mesmo com essa recuperação de 4,59%, a renda média ainda não alcançou o patamar que foi observado na virada de 2014 e 2015 (R$ 854,82).

A pesquisa argumenta que o aumento da renda média nos últimos dois anos não se refletiu em termos de ‘bem-estar social’.

A variável do bem-estar social foi calculada seguindo o método proposto pelo economista Amartya Sen, que venceu o prêmio Nobel de economia em 1998. A ideia da medição do bem-estar social é ponderar a evolução da renda pela trajetória da distribuição dos recursos. Ou seja, se a renda cai mas os recursos estão melhor distribuídos, o bem-estar social pode aumentar — e vice-versa.

No caso brasileiro, a renda média aumentou desde 2017, mas o bem-estar social não acompanhou esse movimento. Isso ocorreu por conta do aumento da desigualdade, conforme detectado pela pesquisa.

Os dados mostram que o bem-estar social está praticamente no mesmo nível desde 2017, tendo apresentado uma leve alta. O aumento da renda, portanto, não se traduz em bem-estar social, uma vez que o acréscimo nos ganhos não é bem distribuído.

Colaborou Caroline Souza com os gráficos


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