28/03/2024 - Edição 540

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Estados Unidos designam Brasil como aliado extra-Otan

Publicado em 01/08/2019 12:00 -

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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, designou oficialmente o Brasil como aliado militar preferencial do país fora da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). O status facilita a compra de tecnologia militar e armamentos dos EUA.

Com o anúncio, o Brasil se torna o segundo país da América Latina, depois da Argentina, a receber o status especial, que permitirá aprofundar a cooperação militar bilateral. Além deles, outros 16 países já foram declarados aliados extra-Otan pelo governo americano.

Trump havia indicado que pretendia nomear o Brasil como aliado preferencial extra-Otan quando o presidente Jair Bolsonaro visitou a Casa Branca em março.

O processo para designação começou cerca de dois meses depois, em 8 de maio, quando Trump notificou o Congresso sobre a intenção através de carta, seguindo o procedimento legal, que determina que o Legislativo seja informado sobre a designação de um aliado militar estratégico fora da Otan pelo menos 30 dias antes do status entrar em vigor.

No documento, Trump afirmou que faria a designação "em sinal de reconhecimento pelos compromissos recentes do governo do Brasil de aumentar a cooperação no setor de defesa com os EUA, e consciente do nosso próprio interesse nacional em aprofundar nossa cooperação em defesa com o Brasil". Após um mês sem manifestação do Legislativo, o status é considerado como aprovado, segundo a lei americana.

O status dá ao Brasil o direito de tornar-se comprador preferencial de equipamentos e tecnologias militares dos Estados Unidos, além de participar de leilões organizados pelo Pentágono. A medida também abre caminho para a colaboração no desenvolvimento de soluções de defesa e o aumento dos intercâmbios militares e a realização de manobras conjuntas entre as Forças Armadas dos dois países.

Quando recebeu Bolsonaro em março, Trump até chegou a cogitar negociar a entrada do Brasil na Otan, mas a hipótese foi negada posteriormente pela aliança militar.

Trump também declarou apoio à campanha do Brasil para aderir à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), um processo que pode levar anos, mas que Bolsonaro quer acelerar, com o respaldo formal americano.

A Otan tem 29 membros, nenhum deles na América Latina e nenhum no Atlântico Sul. As regras atuais da Otan limitam os convites para integrar a aliança a países europeus.

Entretanto, desde o ano passado a Colômbia é o único "parceiro global" da Otan na América Latina. Os "parceiros globais" podem contribuir com as operações e missões da aliança, com base em um programa individual.

Em abril deste ano, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, sugeriu que a aliança militar poderia considerar a possibilidade mais países latino-americanos, como o Brasil, se tornarem parceiros, mas não membros da Otan.

O governo os Estados Unidos designou oficialmente o Brasil como um aliado prioritário  A designação de aliado prioritário extra-OTAN se refere justamente a países que não compõem a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Fundada em 4 de abril de 1949, no início da Guerra Fria, a entidade hoje tem 29 países aliados, todos da Europa e da América do Norte, com o objetivo de cooperação coletiva em defesa. Isso significa que um eventual ataque a um membro da OTAN é considerado como uma agressão a todos. (ANSA).

Vantagem?

Héctor Saint-Pierre, professor de Relações Internacionais da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e fundador e coordenador do Grupo de Estudos da Defesa e Segurança Internacional (GEDES), afirma que a inclusão do Brasil na lista de países militarmente estratégicos para os EUA faz parte da política externa do governo de Jair Bolsonaro, mas é inédita na história das relações internacionais brasileiras, que se pautavam na liberdade nas decisões e na autonomia das missões. “Como reza a lei da política internacional, ‘aquele que me protege me obriga’. Então, há uma perda na liberdade de ação estratégica. Mas há uma coerência com esse projeto de uma submissão da política brasileira à americana.”

Em relação às vantagens desse alinhamento estratégico militar, o professor ressalta uma promessa de acesso e repasse de material bélico dos EUA, com venda privilegiada a “preço de custo”. O setor militar, de acordo com Héctor Saint-Pierre, está contente com essa aliança porque imagina que terá possibilidades de contar com produtos de tecnologia um pouco mais avançada.

O acordo deve permitir os EUA a aplicação de uma influência no desenvolvimento da indústria bélica brasileira. Essa “direção” envolveria não somente a compra de mercadorias – privilegiando produtos americanos –, mas também a venda de determinados produtos brasileiros, como agropecuários, podendo ter sua comercialização proibida a inimigos dos EUA – que, como sublinha Héctor Saint-Pierre, não são poucos.

A aliança com os EUA pode trazer riscos e representa uma “virada a 180 graus” na política externa brasileira, segundo o professor de Relações Internacionais. “Isso já ficou claro em outras manifestações, como o desplante que teve Bolsonaro com o ministro francês [das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian]. Há um deslocamento para uma diplomacia mais dura. Mais tosca, seria a palavra mais exata para essa diplomacia”, brinca.

Outro ponto importante a ser notado, para Héctor Saint-Pierre, é a possibilidade de uma maior ingerência dos EUA nos assuntos de política interna do Brasil. “O que espera o setor militar é um maior comprometimento das Forças Armadas brasileiras com as estadunidenses em termos de treinamento e cooperação em outros âmbitos”. Ou seja, isso se aplica não somente à política militar, mas à “política em geral”, uma vez que existe um condicionamento das outras áreas com a defesa. “Ao comprar mais materiais militares dos EUA, o Brasil consumirá também sua doutrina, sua organização militar e seus inimigos”, conclui o pesquisador.


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