23/04/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Os Vendilhões do Templo

Publicado em 06/08/2014 12:00 - Rodrigo Amém

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Religião não se discute. O mesmo não pode ser dito de teologia, que está aí pra ser discutida, sim, senhor.

Meto minha mão nessa cumbuca em razão da inauguração do Templo de Salomão da IURD, em São Paulo. Cerca de 100 mil metros quadrados de mármore, pedras de Jerusalém e ostentação. A inauguração contou com tudo que tinha direito: políticos, celebridades, artistas e Edir Macedo fantasiado de rabino, por alguma razão.

O templo, com capacidade para 10 mil pessoas, foi construído com um alvará de reforma. Segundo o Plano Diretor de São Paulo, um alvará de construção para uma obra desta magnitude exigiria que a Universal disponibilizasse 40% da área para moradias populares. Em caso de reforma, não existiria essa exigência legal. Se há ou não culpa da IURD cabe à justiça decidir. Mas fica no ar a pergunta: que alvará Jesus usaria?

A Universal segue uma linha filosófica conhecida como Teologia da Prosperidade, que prega que os benefícios da fidelidade religiosa serão concedidos não somente na vida após a morte, mas também em vida, na forma de bens materiais. Está endividado? Precisa de emprego? Quer trocar de carro? Jesus é a resposta.

Boa parte da pregação da Teologia da Prosperidade foca menos na caridade e no amor ao próximo e mais nas ‘recompensas’ dos fiéis mais devotos.

Boa parte da pregação da Teologia da Prosperidade foca menos na caridade e no amor ao próximo e mais nas “recompensas” dos fiéis mais devotos. Uma mensagem muito popular numa era em que o culto ao consumo e às celebridades é o parâmetro de sucesso na vida. Fulano era pobre, bebia e não tinha casa, assim como você. Aí fulano encontrou Jesus e agora é empresário, só bebe água Perrier e mora numa mansão. Amém, Senhor. Assim como o funk-ostentação, o louvor-ostentação se alimenta das frustrações dos que vivem à margem.  Seja da sociedade, seja das próprias expectativas.

Nesse cenário, faz sentido um tempo gigantesco, com arquitetura inspirada na caixa forte do Tio Patinhas. Claro, não é formula nova. A Capela Sistina está aí para provar que tudo se recicla. Até doutrinação. Mas o fiel da Teologia da Prosperidade precisa ver a opulência material que só a fé em Cristo pode proporcionar. Precisa sentir o poder da grana rápido, literalmente, assim que entra na igreja. Quanto maior for o templo, maior é a sensação de recompensa pela fé investida.

Por isso faz sentido usar um alvará de reforma e evitar que 40% da grandiosidade daquele templo virem casas populares. Não tem nada tão popular quanto o luxo.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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