Ponte Aérea
Publicado em 02/06/2021 12:00 - Raphael Tsavkko Garcia
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Eu talvez esteja entrando atrasado nesse lamaçal (e, por ser um lamaçal era melhor ficar calado), mas….
Eu ri quando o "medico" Bolsominion foi preso no Egito? Ri. E muito.
Mas algumas reações francamente indigentes à prisão me deixaram de cabelo em pé. Então se uma ditadura diz que algo é crime, então é e pronto? O Egito, país que costuma tratar mulheres e LGBTs como um lixo diz que algo é crime (no caso, assédio), então vamos celebrar, está provado!?
Vamos conversar sobre como gays são tratados no Egito? Ou mesmo mulheres no dia a dia? O tratamento comumente dispensado a esses grupos também prova que, não sei, homossexualidade é doença? Prova que mulheres são inferiores aos homens? Sejamos coerentes, oras.
A única coisa que essa história prova é que existe uma galera disposta a aplaudir até ditadura quando se encaixa nas suas pautas. Não há reflexão, há apenas o comportamento de uma turba sedenta por sangue que come o que lhe for jogado como isca.
Como me disse uma amiga, "esse tipo de prisão acontece justamente por conta do machismo. A coisa não é feita pra proteger a mulher, mas pra proteger o direito de posse dos maridos sobre suas esposas. A ideia por trás é que só quem pode achincalhar a mulher é seu marido!"
Aí a gente vê como essa galera identitária é só derrota. São incapazes de uma análise complexa que vá além do mais puro punitivismo que encaixe em sua visão moralista e justiceira do mundo. É um pessoal que não só ri do Bolsominion, quer lacrar – e errado – e acabam sendo, também, motivo de riso… e pena.
Ainda bem que não é essa gente que decide o que é piada aceitável ou não – porque não parecem entender a diferença entre piada e o que realmente é assédio – porque seria a morte definitiva do humor.
A história, caso alguém não esteja a par.
APAGA
Meu mais recente texto para a Vice/Motherboard sobre os bolsonaristas deletando vídeos do YouTube sobre curas falsas para COVID. Dentre eles Alexandre Garcia Oficial, Leda Nagle e tantos outros desqualificados. Com comentários do Guilherme Felitti e da Yasodara Córdova.
IMPRENSA
Um erro grotesco da imprensa. Não faz sentido e vai contra qualquer manual básico de redação. Protestos são importantes. Foram imensos. Não tem como não merecerem destaque e capa. Ombudsmen vão ter que trabalhar dobrado essa semana.
Como escreveu a Madeleine Lacsko no Twitter:
"São muito ruins para nós, jornalistas, as decisões equivocadas de ignorar, minimizar ou mentir sobre as manifestações de ontem e da semana anterior.
Se já deu errado nas Diretas Já que nem tinha internet, agora arruína a credibilidade da imprensa porque o cidadão só fala nisso.
A busca utópica da neutralidade ou isenção acaba dando a impressão de engano. O público sabe a tendência ideológica de cada publicação do país e espera que ela esteja presente no produto editorial. Pouco importa o juízo de valor sobre o protesto, importam os fatos.
Um veículo pode celebrar os protestos de ontem e condenar os da semana passada. Pode condenar os de ontem e celebrar os da semana passada. Pode celebrar ou condenar os dois.
Não pode fingir que não aconteceram ou mentir sobre a natureza deles."
O grande problema roblema é que a "isenção" da imprensa promove doisladismos. Coloca posições inaceitáveis no jogo como se fossem normais e, agora,esconde o absolutamente necessário e newsworthy.
Some-se a isso, como tambem lembrou a Madeleine, que "existe uma misperception de opinião pública na elite jornalística, jurídica e política. A tendência de achar que há mais apoio para as causas que apóiam e rejeição àquilo que rejeitam é gritante"
Cada lado acha que a imprensa está do lado do inimigo e esse tipo de comportamento só reforça essa percepção. Imprensa pode ter e tem opinião, vai além do editorial, está na escolha de lides e do que é mais importante, do que estará na capa, nas principais seções do jornal, mas ESCONDER algo como os protestos de ontem que sob qualquer ótima é material de capa? Inaceitável.
Meus parabéns à Folha por ter feito sua obrigação. O Globo, Estadão e tantos outros, só resta a vergonha.
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