28/03/2024 - Edição 540

Eles em Nós

Marquem geral!

Publicado em 02/09/2020 12:00 - Idelber Avelar

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Para rodar mundo aí, marquem os amigos gringos.

ACABEI DE LER UM LIVRO ASSOMBROSO

A literatura argentina é tão rica, tão absurdamente caudalosa, que você toma um romance menor de um escritor que, se não é menor, também não é da meia dúzia de maiores gigantes, e encontra a mais fina antecipação da pandemia de 2020 de que se tem notícia por aí.

“Diário da guerra do porco” (1969), de Adolfo Bioy Casares (1914-1999), conta a história de uma guerra de extermínio levada a cabo pelos jovens contra os idosos, para que eles sejam varridos da Terra. O “porco” do título é o apelido dado aos velhos.

Isidoro Vidal é um aposentado no limite da velhice, que mora em um "conventillo" (o que no Brasil chamaríamos de vila). Para alguns, ele ainda passa por jovem, o que lhe permite tentar sobreviver naquela agonia do clandestino. O governo começa a cortar as pensões e as gangues de jovens saem pelas ruas espancando idosos com tacos de baseball. Jovens que têm amigos velhos começam a fingir que não os conhecem. Tudo vai ficando tão intenso e absurdo que, apesar de o romance ser narrado como um relato realista (com ruas reais de Buenos Aires etc.), você começa a viver aquilo tudo como fantástico, bem à la Bioy. Em 1975, o genial Leopoldo Torres Nilsson fez um filme baseado na obra.

Coloco nos comentários os links para o PDF de “Diario de la guerra del cerdo,” o romance de Bioy sobre a guerra de extermínio aos velhos, e para “La guerra del cerdo,” o filme de Torres Nilsson. Em ambas as obras, o espanhol é tranquilo, legível para um brasileiro de instrução média ou alta, mesmo sem treinamento no idioma.

"Diário da guerra do porco" saiu em português, no volume II das Obras Completas de Bioy. Tenho certeza que na Livraria Bamboletras, na Quixote Livraria, Editora e Café e nas outras boas livrarias vocês conseguem encomendar. Tradução de Sergio Molina para a Editora Globo.

Literatura argentina, ladies and gentlemen, literatura argentina.

PERDA

Morreu o antropólogo e ativista anarquista David Graeber, figura chave do Ocupar Wall Street. Autor de um livro seminal sobre a dívida. Cunhou também a notável noção de “empregos de merda” (bullshit jobs). Pensador essencial do nosso tempo.

Tinha 59 anos.

CONVITE

Por iniciativa do Stone Center for Latin American Studies – Tulane University e do Brazil Institute do King's College London, acontecerá no dia 07 de outubro, às 17h de Brasília, uma mesa-redonda com as presenças do ex-Ministro da Justiça do governo Bolsonaro, o Dr. Sergio Moro, e deste atleticano que vos fala. A mesa-redonda será mediada pelo Prof. Anthony W. Pereira, do King's. A organização é obra do Prof. Christopher Dunn, de Tulane.

O evento será transmitido de forma aberta ao público, em canal ainda a ser determinado, e consistirá em uma palestra de 30 minutos do Dr. Moro, seguida por uma palestra minha de 30 minutos, e um breve período de debate/ perguntas.

Em breve, chegam os cartazes e o link do canal. Mas marquem já seus calendários, porque vai ser bom.

DESAMPARO

Vocês sabem aquela sensação terrível de desamparo que tem a criança quando vê a mãe ou o pai chorando? Ou apanhando? Ou passando por humilhação?

Acontece comigo quando vejo um líder indígena chorando.

Eu tenho tanta reverência por eles, tanto respeito, tanta admiração, eu os considero tão superiores a mim, a nós, moral, intelectual e humanamente, que quando um indígena está conversando comigo e começa a chorar de desespero com a situação, sinto-me completamente desamparado.

Passa pela minha cabeça algo do tipo: "se esse cara, que é muito superior a mim, está chorando assim, é porque já não há mesmo esperança".

Que sensação terrível de desamparo me dá.

AMIZADES

O querido cacique Raoni Metuktire, do povo Kayapó, foi diagnosticado com Covid-19 e está internado em Sinop, no Mato Grosso. O Instituto Raoni nos informa que o quadro dele é bom. Sem febre, respirando bem, mas com dor torácica.

Alguns de nós recebemos a notícia no sábado e estávamos aguardando a autorização da família para publicar este apelo à colaboração de vocês.

Se você puder enviar alguma ajuda neste momento, ela seria de muita utilidade aos Kayapó e ao povo do Xingu. Se puder circular esta informação, a gente agradece também.

Banco do Brasil
Agência: 1779-5
Conta corrente: 19.001-2
Instituto Raoni
CNPJ: 04.413.610/0001-78

CRIME

O criminoso que nos governa estimulou os cidadãos brasileiros a não se vacinarem, em meio a uma pandemia. Não satisfeito, o governo usou o seu próprio órgão de comunicação para traficar negacionismo.

O absurdo vai além e inclui uma mentira."Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina".

A verdade é que pode, sim. E pode segundo uma lei assinada pelo próprio minúsculo. Está lá, no Artigo 3º da Lei 13.979, sancionada por Jair em 06 de fevereiro de 2020 (crédito: jornalista Felipe Corazza).

Está lá, com todas as letras:

Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas:

I – isolamento;

II – quarentena;

III – determinação de realização compulsória de:

a) exames médicos;

b) testes laboratoriais;

c) coleta de amostras clínicas;

d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou

e) tratamentos médicos específicos;

*****

Em sua política explícita de produção da morte, o vagabundo nem lê o que assina.

Se existe uma coisa que há tempos funciona bastante bem no Brasil, é a vacinação. A informação chega até os cafundós do país, o processo é fácil, rápido e grátuito, e tudo é feito até em postos de saúde dos lugares mais pobres.

Com o minúsculo, isso está em perigo e o Brasil se prepara para entrar na onda de negacionismo antivacina, uma desgraça que é obra de fanáticos capazes de causar muito dano.

O minúsculo não se importa de produzir mais mortes para gerar a confusão e o conflito no qual prospera a sua política.

É um criminoso, um assassino.

Leia outros artigos da coluna: Eles em Nós

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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