25/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Eles reabriram a tampa do esgoto

Publicado em 09/12/2021 12:00 - Victor Barone

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O presidente Jair Bolsonaro fez uma sessão de excitação pública de sua base ideológica entregando o que ela mais gosta de ouvir. Ação preventiva e reativa, tanto para evitar perda de simpatizantes para seu ex-ministro Sergio Moro quanto para estancar a defecção de aliados que atacaram o STF em seu nome e, depois, foram abandonados por ele na rua da amargura.

Não é novidade que, de tempos em tempos, quando quer dar uma mobilizada em seus seguidores ou precisa esconder deles algum fato ruim, como um novo caso de corrupção envolvendo sua família, ele põe-se a defender bandeiras da extrema direita, negacionistas ou terraplanistas.

Ex-apoiadores que pegaram uma cana ao agir em nome do bolsonarismo, como Sara Geromini e Roberto Jefferson, vêm criticando duramente o presidente. Alguns afirmam que o PT não abandona os seus, mas Jair tem deixado que aliados se afoguem quando não forem mais úteis para ele. O que surpreende é que eles descobriram isso só agora.

A fórmula é manjada, mas funciona com seu público. Nesse sentido, no combo-terror desta quinta, Jair:

1) Criticou a adoção do passaporte vacinal, usando o mimimi negacionista-libertário de que exigir vacinação representa um ataque às liberdades individuais;

2) Vociferou o governador de São Paulo, João Doria, que afirmou que vai exigir certificado de vacinação no estado;

3) Atacou os senadores que coordenaram a CPI da Covid por conta de um pedido de impeachment protocolado contra ele com base no relatório final da comissão;

4) Mandou, aliás, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), para a "ponta da praia", em referência clara à base da Marinha na Restinga da Marambaia, que era centro de tortura e assassinatos durante a ditadura militar;

5) Defendeu Daniel Silveira (PSL-RJ), sem citá-lo, afirmando que "doeu no coração ver um colega preso". Preso após ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal, inclusive falando de "surra de gato morto" contra Edson Fachin, Silveira estava presenteno evento;

6) Criticou indiretamente o ministro Alexandre de Moraes, que ordenou a prisão de Silveira, entre outros aliados seus. Bolsonaro disse que caso tivesse tomado "medidas extremadas" com relação à decisão, o resultado seriam barreiras comerciais internacionais e "problemas internos", dando a entender que só não foi para cima do STF por receio das consequências.

7) Reclamou que, agora, no Brasil, qualquer motivo serve para extraditar alguém, referindo-se ao blogueiro Allan dos Santos. A decisão também foi determinada por Moraes, em outubro, para trazê-lo dos Estados Unidos, onde se refugiou.

8) Bateu em Moro, descrevendo-o como uma pessoa improdutiva, incompetente e dado a intrigas;

9) Reclamou de um novo inquérito no STF por causa da live em que afirmou que vacina contra covid causa Aids. "A que ponto nós chegamos! Um inquérito contra o presidente da República por causa de uma live. Porque eu falei, nessa live… Falei, não, eu li um material que falava da correlação de HIV com covid", afirmou. E disse que um bloqueio em suas redes sociais representaria um golpe na democracia, já temendo o pior. "Isso é jogar fora das quatro linhas."

10) E novamente situou a liberdade de não obedecer a quarentenas e de não se vacinar como algo mais importante que a vida.

Após as micaretas golpistas de 7 de setembro, afirmamos que o presidente iria submergir por um tempo, depois voltaria à carga abertamente contra as instituições – digo "abertamente" porque ele nunca parou de atentar e sequestrar instituições em silêncio. E assim, em "aproximações sucessivas", ele vai golpeando a democracia, animando o seu rebanho e preparando sua manutenção no poder.

Poe Leonardo Sakamoto

No UOL News, o colunista Josias de Souza comentou as falas do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, contra a exigência do comprovante de vacinação contra a covid. "É melhor morrer do que perder a liberdade", afirmou o chefe do Executivo; a frase foi repetida por Queiroga.

NEGACIONISTA BABA OVO

O ministro da Saúde Marcelo Queiroga afirmou que "não se pode discriminar as pessoas entre vacinada se não vacinadas" ao anunciar que o Brasil não vai adotar o chamado passaporte vacinal. Viajantes não imunizados poderão entrar no país se cumprirem uma quarentena de cinco dias e apresentarem um teste PCR negativo. No melhor estilo baba ovo, parafraseou uma imbecilidade do presidente: “É melhor perder a vida do que perder a liberdade”.

AXORUBALEBABA

Em entrevista ao UOL News, o pastor Henrique Vieira falou sobre o vídeo em que a primeira-dama Michelle Bolsonaro aparece comemorando a aprovação de André Mendonça no STF; Michelle, que é evangélica, se emociona e fala "em línguas", uma prática religiosa.

VACAS MAGRAS

A Vaca Magra, sofrida, amarela e com costelas à mostra, é o verdadeiro símbolo do Brasil sob a gestão Jair Bolsonaro. Uma escultura de uma mimosa emagrecida foi colocada em frente à B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, exatamente onde estava o Touro de Ouro – réplica brega do bovino de bronze que habita Bowling Green, em Nova York, próximo à bolsa de Wall Street.

Nada contra importar boas ideias, mas o símbolo de um mercado pujante não é o que melhor representa o atual momento do país. Hoje, o nosso retrato é o da fome e da carestia. Por isso, a vaca magra, concebida pela artista plástica Márcia Pinheiro, não é o que gostaríamos de ser, mas aquilo que deixamos que nos transformassem.

A Vaca Magra representa as imagens de brasileiros remexendo um caminhão de lixo em Fortaleza e disputando pelancas e ossos no Rio, mas também a queda de 11% na renda média do trabalhador de um ano para cá, a inflação devorando a comida da classe trabalhadora, a seca que explode o preço da energia porque o governo ignorou as mudanças climáticas. Representa a prisão de uma mãe de cinco filhos, sem teto e desempregada, por furtar dois pacotes de miojo, dois refrigerantes e um suco em pó.

FRASES DA SEMANA

“Queriam que a gente impusesse aqui a obrigação do cartão vacinal. Como eu posso aceitar o cartão vacinal se eu não tomei a vacina? E é um direito meu não tomar, como é direito de qualquer um”. (Jair Bolsonaro, o mais poderoso sócio da Covid-19 desde o início da pandemia)

“Somos o terceiro maior produtor de alimentos do mundo e temos 19 milhões de pessoas passando fome e 116 milhões com algum problema de segurança alimentar. Isso é pra gente ficar indignado e não aceitar. É preciso colocar a indignação para fora para poder mudar”. (Lula)

“É um erro estratégico brutal. Nenhum empresário manifestou-se em favor dessa chapa [Lula presidente, Alckmin vice]. Para quem quer uma campanha aguerrida, passa um simbolismo negativo colocar um anestesista na vice”. (Rui Falcão, deputado federal e ex-presidente nacional do PT)

“Não vou dizer que meu governo não tem corrupção, porque a gente não sabe. Se tiver qualquer problema, a gente vai investigar. Não posso dar conta de mais de 20 mil servidores comissionados, ministérios com mais de 300 mil funcionários”. (Jair Bolsonaro)

“Quer melhor vacina, comprovada cientificamente, do que a própria contaminação? E qual a validade de cada vacina? Vale por quantos meses? Parece que há um interesse de vender cada vez mais”. (Jair Bolsonaro)

Tomara que não precise cancelar o Carnaval no Rio” (Eduardo Paes, prefeito do Rio, logo após anunciar o cancelamento das festas de Réveillon).

“O crescimento está contratado. A conversa de que o Brasil não vai crescer é uma conversa de maluco. [Este] não é o melhor governo do mundo, mas não é tão ruim quanto estão dizendo”. (Paulo Guedes, ministro da Economia)

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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