23/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Longe do cercadinho o presidente surtou na Jovem Klan

Publicado em 28/10/2021 12:00 - Victor Barone

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Jair Bolsonaro teve um lembrete de como é dura a vida fora da proteção do cercadinho de fãs na porta do Palácio do Alvorada e dos comícios eleitorais organizados por seus apoiadores – locais onde ele pode promover um vírus assassino, ser homofóbico e contar mentiras e ainda ser chamado de "mito" pelos presentes. Em uma entrevista ao programa Pânico, na Jovem Pan, na quarta (27), para marcar a estreia do canal de TV da empresa, Bolsonaro pensou que encontraria a mesma tranquilidade que viu diversas vezes em conversa com a área de jornalismo. Foi questionado, contudo, pelo humorista André Marinho, se "rachador tem que ir para a cadeia".

O presidente e dois de seus filhos, o hoje senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), são acusados de terem praticado por anos o desvio de dinheiro público através da devolução compulsória dos salários dos servidores de seus gabinetes, prática conhecida carinhosamente como "rachadinha".

O humorista elaborou uma pegadinha, citando investigações que apontam para supostos casos de desvios envolvendo o PT no Rio e perguntando ao presidente o que ele achava disso. Irritado, respondeu que o pai de André, Paulo Marinho, quer a cadeira de seu filho Flávio. O empresário, um dos principais apoiadores de Jair durante a eleição de 2018, sentiu-se abandonado após o início do governo e se tornou um crítico.

A entrevista é um exemplo de como a Presidência da República, sob Bolsonaro, perdeu o respeito. E por culpa do próprio capitão.

Por Leonardo Sakamoto

VALE QUANTO?

Sem saber que estava sendo gravado durante o intervalo de uma entrevista para a estreia do canal Jovem Pan News, na quarta-feira (27), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi flagrado descrevendo a assessores como receber propina e ainda pergunta quanto valeria uma vaga no STF.

A resposta é muito simples. Sob Bolsonaro, o preço da indicação para o Supremo é a conivência. Tramita na Segunda Turma do Supremo, por exemplo, recurso do primogênito Flávio Bolsonaro para assegurar foro privilegiado no caso da rachadinha. O presidente da turma é Nunes Marques, que sentou em cima de um processo que aguarda na fila de julgamento há arrastados dez meses. A demora é conveniente, pois paralisa as investigações contra o primogênito.

É como se Nunes Marques, o primeiro magistrado indicado por Bolsonaro para a Suprema Corte, empurrasse o julgamento com a barriga à espera da chegada do terrivelmente evangélico André Mendonça. Segundo escolhido pelo capitão, Mendonça também irá compor a Segunda Turma se conseguir ultrapassar o calvário a que vem sendo submetido no Senado.

Outros presidentes já vestiram a toga em auxiliares diretos e apaniguados. Mas nenhum foi tão espalhafatoso quanto Bolsonaro. São muitos os processos e investigações que encostam no presidente, em sua prole e nos seus aliados. E o dono da caneta não hesita em expor as faturas à luz do dia. Sobre Mendonça, Bolsonaro já informou que, confirmando-se a nomeação, terá de almoçar uma vez por semana com ele. Será uma toga do tipo prato feito, mastigando suas decisões na mesa do Alvorada. O preço da indicação é a absoluta submissão.

Por Josias de Souza

O BURRO E O JEGUE

O ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, de “burro” durante reunião que discutia os R$ 600 milhões de recursos retirados da pasta. No encontro, que tinha deputados da base e da oposição, o nome de Pontes não foi citado, apenas o apelido de “astronauta”. De acordo com relatos, ele deu a entender que o colega de Esplanada vive no “espaço” e não entende nada de gestão. Guedes também disse que pode conversar para devolver o dinheiro cortado do Ministério da Ciência, mas especificou que não negociará com o “astronauta”, apenas com técnicos que entendam do assunto.

Pontes reagiu. Disse ter sido a primeira vez que foi chamado de burro na vida. "Sobre as falas do PG [Guedes], não tem muito o que comentar. A parte engraçada é que já fui chamado de muita coisa, mas de burro é a primeira vez". O ministro diz não ver problemas nos ataques desferidos pelo colega de governo, e que continua a ter o mesmo respeito pessoal por Guedes. "Ele está em um momento difícil e deve estar meio confuso para expressar suas ideias. Não seria a primeira vez que ele foi mal interpretado em suas falas", defende.

VICIADO

O ex-deputado Roberto Jefferson, preso no Complexo Penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro, afirmou que o presidente Jair Bolsonaro e seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), estão “viciados nas facilidades do dinheiro público”. Na carta, revelada pelo jornal O Globo, o ex-deputado demonstrou insatisfação com as últimas escolhas de Bolsonaro. “Bolsonaro cercou-se com viciados em êxtase com dinheiro público; Farias, Valdemar, Ciro Nogueira, não voltará aos trilhos da austeridade de comportamento. Quem anda com lobo, lobo vira, lobo é. Vide Flávio”, afirmou. Jefferson foi preso em agosto por sua participação em uma organização criminosa digital montada para ataques à democracia.

PASSADOR DE PANO

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que o presidente Jair Bolsonarofoi mal interpretado ao relacionar vacinas contra a Covid-19 com diagnóstico positivo para Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids). A afirmação divulgada por Bolsonaro é falsa e não tem embasamento científico. O presidente deu a declaração durante transmissão ao vivo no YouTube, Facebook e Instagram. O vídeo foi retirado de todas as redes sociais. Em entrevista à agência de notícias portuguesa Lusa, Queiroga disse que o presidente havia afirmado que não estava “fazendo juízo de valor”. Para o cardiologista, os espectadores devem verificar o vídeo com atenção…

A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) divulgou uma notadesmentindo Bolsonaro e afirmando que “não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a Covid-19 e o desenvolvimento de Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (HIV/aids)”.

ZÉ RUELA

O caminhoneiro Marcos Antonio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, se apresentou na Delegacia da Polícia Federal, em Joinville (SC), cidade onde mora, após permanecer quase dois meses foragido. Após ter a prisão decretada, o Zé Ruela fugiu para o México, de onde gravou vídeos e publicou na internet dizendo ser um refugiado político, perseguido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

OUTRO ZÉ RUELA

O blogueiro bolsonarista Allan dos Santos decidiu pedir asilo político aos Estados Unidos por, supostamente, sentir-se ameaçado pelo Supremo Tribunal Federal. Em 21 de outubro, o ministro Alexandre de Moraes determinou a prisão preventiva do dono do Terça Livre. Allan dos Santos é investigado em dois inquéritos que tramitam no STF: o que apura a divulgação de fake news e de ataques a integrantes da Corte e o que mira a ação de milícias digitais que atuam contra a democracia. No último dia 22, o YouTube tirou do ar o canal Artigo 220, que estava sendo utilizado pelo blogueiro bolsonarista para driblar os bloqueios impostos por Moraes ao canal Terça Livre.

BOSTA NA ITÁLIA

A Diocese de Pádua, na Itália, fez um apelo a Jair Bolsonaro, e disse que o título que ele vai receber de cidadão honorário de Anguillara Vêneta, um vilarejo da região onde nasceu seu bisavô, causa "grande constrangimento". Devido à homenagem, ativistas protestaram contra o presidente brasileiro. Eles picharam "Fora Bolsonaro" na sede da prefeitura e deixaram como presente ao presidente alguns quilos de esterco.

Ativistas do "Rise Up 4 Climate Justice" ("Levante pela Justiça Climática", em tradução livre) afirmaram em uma rede social que "a figura de Bolsonaro representa perfeitamente o modelo capitalista, predatório, destrutivo e colonialista contra o qual lutamos". "Depois de saber a notícia de que a prefeita de Anguillara Veneta, da Liga Norte, concederá cidadania honorária a Bolsonaro, presidente do Brasil que visitará Pádua, como ativistas e ativistas do 'Levante pela Justiça Climática', não pudemos deixar de nos fazer ouvir", escreveu o grupo.  Os ativistas também criticaram a forma como o presidente brasileiro lidou com a pandemia e o crescimento do desmatamento no Brasil e disseram que "Bolsonaro encarna o principal inimigo do clima" e "da vida". "Vamos nos opor aos destruidores de nosso planeta aqui e em todos os lugares".

JÁ FOI A DUBAI?

Na viagem que fez à Paraíba para garimpar votos na prévia presidencial do PSDB, o governador paulista João Doria deu uma demonstração das dificuldades encontradas pelos candidatos da terceira via, que não passam de um dígito nas pesquisas, para se comunicar nos encontros com a vida real dos eleitores de um Brasil para eles desconhecido. Habituado a frequentar os salões da elite paulistana, no bairro dos Jardins, onde mora, Doria viu-se numa saia justa ao tentar interagir com o auditório, como costuma fazer nos encontros de empresários com políticos. Em Guarabira, cidade de 59 mil habitantes na região do brejo paraibano, Doria soltou o insólito desafio: "Quem aqui já foi a Dubai, levanta a mão." Para espanto da plateia, que caiu na risada, um deputado tucano levantou a mão.

ACABOU A MAMATA

Deu-se que em 21 de agosto último, um sábado, decolou de Brasília para São Paulo um avião da Força Aérea Brasileira requisitado por Damares Alves, ministra da Mulher e dos Direitos Humanos. Objetivo da viagem: participar de evento do Pátria Voluntária, programa de Michelle Bolsonaro. Michelle estava a bordo com sua filha mais velha, três irmãos, um cunhado e duas sobrinhas. À noite, Damares e Michelle compareceram à festa de aniversário do maquiador das duas, Agustin Fernandez. No domingo, Fernandez pegou uma carona no voo de volta a Brasília. Acontece que um decreto baixado pelo presidente Jair Bolsonaro diz que comitiva transportada em avião oficial

Por Ricardo Noblat

MAIS MAMATA

O presidente Jair Bolsonaro conseguiu matricular a filha, Laura Bolsonaro, em colégio militar mesmo sem ter passado por processo seletivo. O presidente "faz do privilégio a sua religião", dá mau exemplo para a caçula e "trata escola militar como casa da Mãe Joana"

FRASES DA SEMANA

“Não podemos confundir a neutralidade da Justiça com tolice. Podemos absolver a chapa por falta de provas, mas sabemos o que ocorreu. Sabemos o que vem ocorrendo”. (Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, ao votar contra a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão)

“Bolsonaro cercou-se de viciados em êxtase com dinheiro público: [Fábio] Faria, Valdemar [Costa Neto], Ciro Nogueira. Não voltará aos trilhos da austeridade de comportamento. Quem anda com lobo, lobo é. Vide Flávio [Bolsonaro]”. (Roberto Jefferson, presidente do PTB, ora preso)

“Despreparado, desonesto, caviloso, arrogante, autoritário, com índole golpista, belicoso, mentiroso. Agiu como um missionário enlouquecido para matar o próprio povo”. (Renan Calheiros, senador, relator da CPI da Coviv-19, sobre o presidente Jair Bolsonaro)

“É sempre assim, estou morrendo afogado e ele [Bolsonaro] aparece e renova a confiança. E nós continuaremos nessa aliança de conservadores e liberais por um futuro melhor para o nosso país”. (Paulo Guedes, ministro da Economia)

“Tem muita gente boa no Brasil. O mau exemplo, infelizmente, é o que chama a atenção. Hoje, a maioria da Câmara não merece respeito. A maioria do Senado também não merece respeito. Mas tem que separar o joio do trigo.” (Ciro Gomes, PDT)

“Não vamos deixar o povo passar fome pra tirar 10 em política fiscal. O déficit no ano que vem que seja de 1%. Preferimos atender os mais frágeis. A economia é forte e vigorosa pra segurar. Nenhum governo saiu gastando menos do que entrou”. (Paulo Guedes, ministro da Economia)

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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