29/03/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Muito músculo, pouco miolo

Publicado em 17/02/2021 12:00 - Victor Barone

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Preso na noite de terça-feira (16), Daniel Silveira foi abordado por um repórter ao chegar no Instituto Médico Legal, para o exame de corpo de delito. Ouviu a seguinte pergunta: "Como o senhor espera que a Câmara avalie isso?" Respondeu de bate-pronto: "Vai revogar a prisão, vai revogar. O poder é independente." Desde então, tudo ganhou uma aparência de epílogo na rotina do deputado.

Quem olha para Daniel Silveira logo percebe que lhe sobram músculos. Quem ouve o personagem não demora a notar a falta que lhe fazem os miolos. Natural que a ficha do deputado demore a cair. Mas até ele, com todo o seu excesso e a sua escassez, já deve estar próximo de se dar conta de que inventou uma nova modalidade de autoeliminação: o burricídio.

O tronco hipertrofiado levou o deputado a fazer do seu mandato um ato físico. Em menos de 48 horas, Daniel Silveira descobriu que não possui costas tão largas. Às voltas com seus próprios calos no Supremo Tribunal Federal, o suposto amigo Jair Bolsonaro achou melhor não se meter em novos apertos. Fingindo-se de morto, o presidente como que liberou o funeral do aliado.

Embora o ex-PM Daniel Silveira atue no Legislativo como um franco-atirador, líderes do centrão chegaram a cogitar a hipótese de lançar sobre o mandato dele o manto diáfano do corporativismo. O placar de 11 a zero no Supremo a favor da prisão levou o conglomerado partidário a dar meia-volta.

O centrão, como se sabe, é 100% feito de investigados, denunciados, réus, culpados e cúmplices. O próprio Arthur Lira, presidente da Câmara e líder máximo do grupo, é réu em dois processos que correm no Supremo. De repente, os chefões do centrão perguntaram a si mesmos: por que deveríamos acionar o espírito de corpo para defender um corpo estranho?

Surfando a onda Bolsonaro, Daniel Silveira imaginou ser um legítimo representante da nova política. Inundou as redes sociais com ideias que não dão água pela canela. Servindo-se de instrumentos da democracia —imunidade parlamentar e liberdade de expressão— desancou os mais elementares valores democráticos. Navegando o próprio mandato como um comandante de navio que se queixa da existência do mar, bateu no iceberg do Supremo.

Os velhos tecelões do Congresso são seres solidários. Mas só levam sua solidariedade até a beirada da sepultura. Jamais pulam na cova. Enxergam o suicídio como uma coisa muito íntima, relacionada ao direito constitucional de ir e vir. Daniel Silveira exibe um comportamento de alto risco. Apaixonou-se pela autocombustão. E foi correspondido. Descobriu que, em política, a burrice também é um tipo de suicídio, mesmo que seja na forma de um desafio à própria sorte.

Por Josias de Souza

O problema não é o deputado Daniel Silveira, mas a turma do general Villas Bôas. Silveira (PSL-RJ) não é apenas a expressão do bolsonarismo mais extremista. Não se trata de um bárbaro que destoa da orquestra. Ele representa o fascismo moreno que bate à porta da nossa democracia.

O discurso criminoso de Silveira é semelhante ao feito pelo ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas. Que diferença há na fala absurda e tosca xingando ministros do STF e os tuítes de abril de 2018 pressionando o Supremo que Villas Bôas disse ter combinado com o Alto Comando do Exército? São conversas típicas dos chamados "cidadãos de bem".

Villas Bôas endossou um golpe parlamentar, pressionou o STF a prender Lula e ajudou Bolsonaro a conquistar a Presidência, papel semelhante ao de Sergio Moro, figura autoritária poupada pela imprensa. Villas Bôas e Moro são a nata desse fascismo moreno, que mistura discurso anticomunista anacrônico com falso desejo de combate à corrupção. Tudo em nome de Deus e da pátria.

Voltando a Daniel Silveira, imunidade parlamentar não é escudo para proteger crimes cometidos por congressistas. O discurso de Silveira é um ataque ao STF, à Constituição e à democracia. A quebra do decoro parlamentar é evidente. Logo, ele merece a cassação. Resta saber se a Câmara resistirá à tentação de uma reação corporativa.

Prender parlamentares não é algo a ser vulgarizado, mas parecem que os elementos contra Silveira mais do que justificam a detenção. Ele está incitando agressões verbas e físicas contra ministros do STF. Isso é criminoso.

Com verbas e privilégios, Bolsonaro está enchendo a estrutura do governo com militares. A maior liberdade para compra de armas e munição atende ao projeto miliciano-político. O caminho para estruturar uma nova aventura golpista está se desenhando sob os olhos das instituições. Punir gente como Daniel Silveira é preciso, mas há personagens mais ameaçadores e perigosos a serem enfrentados.

Por Ricardo Noblat

O ponto mais grave do vídeo disseminado nas redes sociais pelo deputado federal Daniel Silveira está no seu próprio objetivo declarado. É ainda pior do que as ofensas pessoais aos ministros do STF porque aposta no caos institucional: ele usa uma figura relevante entre os militares, o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas, para tentar jogar as Forças Armadas contra o STF.

Os defensores do deputado falam em liberdade de expressão, que ele fez "críticas" ao ministro Edson Fachin e a outros ministros do tribunal. Ele foi muito além – e aí está a chave para entender sua prisão. Com outras palavras, aparentemente bem estudadas, foi o que escreveu o ministro Alexandre de Moraes na ordem de prisão. Ele disse que o deputado adotou "condutas criminosas" que "atentam diretamente contra a ordem constitucional e o Estado Democrático".

O que Alexandre de Moraes disse, sem dizer, é que Daniel Silveira semeia a discórdia dentro das Forças Armadas para escalar uma ação contra o Judiciário. Nesse momento o STF decide se mexer mais seriamente porque a mera opinião de um parlamentar, resguardada pela Constituição, se confunde com a tentativa de atentado à ordem democrática.

O ‘Caso Daniel Silveira’ foi mais um capítulo dos testes que o bolsonarismo tem feito à integridade das instituições. Há um padrão, inclusive, na vitimização que eles adotam: quando a estratégia não dá certo, apelam para um conceito distorcido do direito à liberdade de expressão. Sempre que a sociedade e os outros poderes da República minimizaram ou pouco se importaram com ataques às instituições, o bolsonarismo avançou. Com isso, fraturas foram produzidas pelo próprio Poder Executivo na Receita Federal, no Coaf, na Polícia Federal, no Ibama, no Incra, no ICMBio, na Procuradoria-Geral da República, que se tiveram que se dobrar às necessidades da primeira-família.

Dentro do projeto de país do clã Bolsonaro, as instituições que não podem ser domesticadas são consideradas inimigas. Boa parte do Congresso Nacional, que se vendeu ao presidente em troca de acesso a cargos e verbas, foi domesticado.

A construção de limites democráticos é uma atividade cotidiana. Bolas de neve gigantescas começam bem pequenas e, quando você percebe, já nos soterraram. O bolsonarismo começou pequeno. Já existia antes de Bolsonaro chegar ao poder e continuará vivo depois que ele se for. Ou seja, conter seus impactos será um trabalho de Sísifo, ainda mais se for feito dentro da lei.

Por Leonardo Sakamoto

Daniel Silveira é um tipo de personagem que não possui biografia, mas prontuário. Já trabalhou como cobrador de ônibus. Nesse honroso ofício, especializou-se em apresentar atestados médicos falsos para faltar ao trabalho.

Daniel Silveira foi policial militar no Rio de Janeiro. Levantamento do jornal O Globo revelou que, em pouco mais de cinco anos de farda, ele contabilizou 26 dias de prisão e 54 de detenção. Colecionou 14 repreensões e duas advertências. Em 2018, quando respondia a processo administrativo que poderia resultar na sua demissão, o sujeito trocou a farda pelo palanque eleitoral.

Abertas as urnas, constatou-se que o cobrador de ônibus que falsificava atestados médicos, o PM que estava na bica de ser expurgado da corporação foi enviado à Câmara dos Deputados com 31.789 votos. Repetindo: esse cidadão que desfila pelos corredores do Congresso como um deputado tóxico, possui 31.789 cúmplices. O pior é que Daniel Silveira não é a única nulidade do Congresso. Há muitas outras. O eleitor pode tomar distância e lavar as mãos. Mas aos poucos, sem que ele perceba, vai surgindo a imagem de um culpado no espelho. O regime democrático é muito bom. Mas dá trabalho.

Por Josias de Souza

DITADURA, NUNCA MAIS

O ministro Gilmar Mendes usou as redes sociais para rebater o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas. O militar ironizou a reação do ministro Edson Fachin, que subiu o tom contra uma declaração dita por ele há três anos.

UMA DUPLA E TANTO

Na próxima segunda-feira (22) começa a primeira reunião do ano do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Vai ser um encontro virtual com 130 chefes de estado e ministros. O Brasil vai ser representado por por dois de seus ministros que têm mais apego às causas conservadoras: Damares Alves (Família, Mulher e Direitos Humanos) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores)

Segundo o colunista do UOL Jamil Chade, o Brasil vai ser alvo de um “tsunami” de denúncias de violações de direitos humanos em atos liderados por ONGs, governos estrangeiros e a própria ONU. Neste momento, Damares começou um processo de reavaliação do Plano Nacional de Direitos Humanos sem a participação da sociedade civil e sem que nenhuma informação seja liberada até o encerramento das atividades do grupo de trabalho, em novembro. Vindo de onde vem (e como vem), não se pode esperar boa coisa. 

A ministra avisou que vai usar seu tempo na reunião para fazer propaganda das ações de Jair Bolsonaro para proteger a população na pandemia. Ficamos imaginando quais serão: tratamentos com kit-covid, incentivo ao contágio para obter imunidade de rebanho ou o auxílio emergencial, que se dependesse do governo federal teria sido de R$ 200?

Ainda segundo Chade, vai ser o único caso de um país com dois oradores. Não se sabe por que Araújo vai participar, já que normalmente só o chefe da pasta de Direitos Humanos se apresenta. Ele não revelou qual será o teor de seu discurso, mas especula-se que seja o “tecno-autoritarismo”…

QUEM PODERIA IMAGINAR?

O Ministério da Saúde pediu a liberação de créditos extraordinários, que não entram no teto de gastos, para lidar com a pandemia. Precisar de dinheiro, precisa. Mas tem um problema: a Constituição só permite esse tipo de recurso em casos urgentes e imprevisíveis, enquanto os previsíveis devem estar no orçamento. Então a pasta alegou em seu pedido (obtido pela Folha) que o avanço da covid-19 no país este ano era “incerto” até o fim do ano passado. A visão foi sustentada por dois argumentos: o de que havia “perspectiva de imunização” da população e o de que o número de mortes estava caindo.

Ok, a qualidade dos dados brasileiros é muito ruim, temos poucos testes PCR, deixamos os que existem estragando em um depósito e acabamos avaliando as curvas de contágio tardiamente, quando aumentam ou diminuem as internações e mortes. Só que, até levando isso em conta, qualquer um poderia prever que 2021 começaria muito mal. Em novembro do ano passado, imprensa e especialistas comentavam o tempo todo o “repique” ou a “segunda onda” no país, com um cristalino aumento das internações na maior parte dos centros urbanos;  os casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) também estavam em alta.

Quanto à “perspectiva de imunização”, o argumento é mesmo um escárnio. No fim do ano não havia nenhuma vacina liberada pela Anvisa e era óbvio que, mesmo houvesse autorização, o país tinha poucas doses garantidas.  

O pedido do Ministério foi feito no dia 29 de janeiro e, segundo o jornal, passa por avaliações jurídicas internas para respaldar a justificativa. 

DISSE ME DISSE

Um dia após apresentar a governadores seu cronograma de distribuição de vacinas, o Ministério da Saúde já teve que rever um número. Como dissemos ontem, os cálculos da pasta davam como certas 9,3 milhões de doses da CoronaVac a serem entregues pelo Instituto Butantan este mês, sendo que o próprio Butantan havia dito horas antes que seriam apenas 2,7 milhões. A redução se deve ao atraso no fornecimento do Ingrediente Farmacêutico Ativo pela Sinovac.

O secretário-executivo Élcio Franco disse que, diante da diminuição da remessa, a pasta vai ter que rever os grupos prioritários e refazer seu planejamento de distribuição… “Fica muito difícil planejar sem ter a confirmação de que vamos receber”, afirmou ele, em vídeo divulgado pela pasta. Em outras palavras, responsabilizou o Butantan pela bagunça, o que foi reforçado por nota do Ministério: “A redução no número de vacinas quebra a expectativa do Ministério da Saúde de cumprir o cronograma divulgado ontem”, diz o texto, completando que a dificuldade “está em o Butantan conseguir cumprir as entregas das doses previstas em contrato”.

O instituto de pesquisa rebateu, afirmando que a Saúde omite “que, como é de conhecimento público, o desgaste diplomático causado pelo governo brasileiro em relação à China provocou atrasos no envio da matéria-prima necessária para a produção da vacina” e que “a autorização para envio só ocorreu após intervenções feitas pelo governo de São Paulo”.

Farpas à parte, o Ministério enviou um ofício ao Butantan para adquirir mais 30 milhões de doses da CoronaVac. Elas seriam adicionais às 100 milhões que já estão previstas para entrega até setembro.

ESTÁ ERRADO

A Advocacia-Geral da União informou ao STF que o governo federal já vacinou todos os idosos com mais de 90 anos do país, além de 73% dos profissionais de saúde, e todos os idosos e pessoas com deficiência institucionalizados.

É mentira, como mostra a apuração do G1, com dados de estados e municípios que contrariam a versão do Ministério. Em Minas Gerais, o próprio governo estadual informa que pouco mais de metade dos idosos institucionalizados receberam suas doses. Na Paraíba a vacinação dos idosos com mais de 90 anos ainda não começou, assim como em Cabo Frio (RJ). 

Por Outra Saúde

APELO POR SAÍDA

A Confederação Nacional dos Municípios publicou uma nota pedindo a saída do ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello. O texto diz que a troca do comando é “necessária, urgente e inevitável” por conta do fiasco da vacinação: “A pasta tem reiteradamente ignorado os prefeitos do Brasil, com uma total inexistência de diálogo. Seu comando não acreditou na vacinação como saída para a crise e não realizou o planejamento necessário para a aquisição de vacinas. Todas as iniciativas adotadas até aqui foram realizadas apenas como reação à pressão política e social, sem qualquer cronograma de distribuição para estados e municípios. Com uma postura passiva, a atual gestão não atende à expectativa da Federação brasileira, a qual deveria ter liderado, frustrando assim a população do país”.

A entidade, que reúne 5,2 mil municípios, diz que vários prefeitos precisaram ou vão precisar suspender suas campanhas de imunização porque as doses acabaram – isso já foi relatado em Salvador, Porto Alegre e em cidades do Rio de Janeiro e do Mato Grosso. Mas salientamos, mais uma vez, que o cenário geral é de lentidão para a aplicação das vacinas disponíveis: 11,1 milhões de doses foram distribuídas a estados e municípios, mas só 5,5 milhões foram usadas. Os gestores têm dito que a escassez justifica a lentidão, mas faz muito mais sentido esgotar rapidamente as doses do que racioná-las. 

A Frente Nacional de Prefeitos (que representa 412 cidades com mais de 80 mil habitantes) se posicionou sobre a falta de imunizantes, exigindo um cronograma de prazos e metas por parte do governo federal e reclamando da falta de diálogo: “A FNP solicitou, no dia 14 de janeiro, em reunião entre o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e mais de 130 governantes das médias e grandes cidades do país, encontros para o acompanhamento das imunizações no país. Na ocasião, ficou acordado que a cada 10 dias o ministro se reuniria com a comissão de prefeitos. Desde então, passados mais de 30 dias, nenhum agendamento foi feito”, diz a nota.

Nesse cenário de (previsível) crise do abastecimento de imunizantes, o Ministério formalizou a compra de mais 54 milhões de doses da CoronaVac. Junto com as 46 milhões já contratadas, chega-se ao total de 100 milhões. Isso não significa, porém, a produção e distribuição imediatas. Afinal, o Brasil ainda depende da importação do Ingrediente Farmacêutico Ativo.

O ministro do STF Ricardo Lewandowski autorizou novas diligências no inquérito sobre a atuação de Pazuello no colapso da saúde em Manaus. A Polícia Federal vai acessar a troca de e-mails entre o Ministério e as secretarias de saúde do Amazonas e da capital, depoimentos da White Martins (que fornece cilindros de oxigênio) e ainda o levantamento de gastos para compra e distribuição de hidroxicloroquina e testes para diagnóstico do coronavírus. Além disso, os desenvolvedores do TrateCOV – aplicativo do Ministério que indicava o ‘kit-covid’ indiscriminadamente – deverão ser identificados e ter depoimentos colhidos. 

Enquanto isso, o pedido de abertura de uma CPI para investigar as ações do governo federal na pandemia segue esperando um desfecho no Senado. Na Câmara, a comissão externa de combate à covid-19 vai convidar Pazuello para falar de suas ações, em data ainda a ser agendada. E os deputados devem votar amanhã a MP 1026 que libera a compra de vacinas sem a análise técnica da Anvisa – uma solução política atabalhoada que permitiria o uso no Brasil de imunizantes como a Covaxin, aprovada atualmente na Índia sem dados de eficácia e segurança. 

A DEFESA

A reação de Pazuello tem sido mentir (como vimos no Senado) e viajar para Manaus para mostrar algum serviço, além de ampliar o envio de técnicos da pasta para apoiar gestores locais. O El País conversou com funcionários anônimos do Ministério que dão uma ideia de como essas viagens têm sido coisa para inglês ver, acontecendo “sem missões claras e coordenadas”: 

“Um deles contou que técnicos estão sendo convocados para viajarem e só então verem com os gestores locais como poderiam ajudar no enfrentamento à crise. ‘Não tem um planejamento prévio do que se vai fazer lá. Uma colega enfermeira que trabalha com gestão contou que foi perguntada no Amazonas se ela poderia ajudar no hospital’, diz. Outro funcionário, que foi convocado para viajar, disse que o clima internamente já era tenso, mas piorou a partir da investigação. ‘A polêmica em relação a estas viagens é que foram decorrentes do inquérito. As viagens não têm plano. Servidores e até bolsistas são escalados de um dia pro outro. Há uma exigência equivocada de uma participação de pessoas de cada secretaria independentemente se têm relação com o problema a ser resolvido’, critica”.  

CUMPRINDO PROMESSAS

“O povo tá vibrando, o povo tá vibrando“, disse Jair Bolsonaro, de folga no litoral de Santa Catarina, ao cumprimentar apoiadores no sábado. É que na véspera, como se não estivéssemos atolados até o pescoço em necessidades relacionadas à pandemia, o presidente assinou alterações em quatro decretos de 2019 que regulamentam o Estatuto do Desarmamento – piorando o que já tinha sido flexibilizado e impulsionando um dos projetos que mais avançam no seu governo: o de armar cada vez mais a população

Uma das principais mudanças está no decreto nº 10.628, que aumenta de quatro para seis o número máximo de armas que cada cidadão pode ter. Alguns, como integrantes das Forças Armadas, policiais e agentes da Abin, podem chegar a ter oito. O decreto  nº 10.629 muda regras para o grupo dos Colecionadores, atiradores e caçadores (CACs), permitindo que comprem até 60 e 30 armas, respectivamente, sem autorização expressa do Exército. O texto também sobe de mil para duas mil a quantidade de recargas de cartucho de calibre restrito que podem ser adquiridas anualmente por “desportistas”. Além disso, os CACs, que já podiam portar suas armas, entre a casa e o local de tiro, agora podem fazê-lo em qualquer itinerário e em qualquer horário. O decreto nº 10.630 permite o porte de duas armas simultaneamente, diz que policiais poderão usar em serviço suas armas pessoais e que guardas municipais poderão ter armas de fogo automáticas. Por último, o decreto nº 10.627  exclui vários itens da lista de produtos controlados pelo exército, como projéteis, máquinas para recarga de munições e carregadores com qualquer capacidade. Outras alterações foram compiladas pel’O Globo. 

“Com esses decretos somam-se mais de 30 atos normativos publicados nos dois últimos anos” com esse propósito, observa em nota o Instituto Igarapé, que vai questionar as medidas no STF.

URGENTE, MAS PODE ESPERAR

O governo Bolsonaro só gastou 9% da verba liberada, em caráter de urgência, para a compra e o desenvolvimento de vacinas contra a covid-19. Três Medidas Provisórias assinadas em agosto, setembro e dezembro garantiam ao todo R$ 24,5 bilhões, mas, pelos cálculos da Folha, até agora só R$ 2,2 bi foram efetivamente usados. A conta não considera os R$ 505 milhões pagos pelo Ministério da Saúde na compra de doses da CoronaVac, porque a pasta não disse de onde o dinheiro saiu. Mas, mesmo se tiver vindo do montante liberado pelas MPs, isso muda muito pouco o resultado final: o total gasto chegaria a apenas 11% dos créditos criados. 

A última MP, de dezembro, é a que disponibiliza mais dinheiro: R$ 20 bilhões. Veio tarde, quando já estava mais difícil – não impossível – fechar acordos com as farmacêuticas.

Em tempo: Nesta semana o Brasil atingiu a maior média móvel diária de mortes desde o começo da pandemia, com 1.105 vítimas por dia na última semana. Mas é Carnaval e, apesar da proibição de eventos, festas foram flagradas em todo o país

Por Outra Saúde

GENTE DE BEM

O Chanceler Ernesto Araújo participou, no último dia 13, de uma aula magna promovida pelo canal Terça Livre para falar sobre relações exteriores. No vídeo, divulgado pelo blogueiro bolsonarista Allan dos Santos como "masterclass", o ministro aparece sentado à frente da bandeira do Brasil imperial, em desuso desde o início da República em 19 de novembro de 1889, por decreto assinado pelo Chefe do Governo Provisório, Marechal Deodoro da Fonseca. Em mais de uma hora e quarenta minutos, Ernesto Araújo fala sobre aliança liberal conservadora, o crescimento do conservadorismo, tecno-totalitarismo e democracias pós-nacionais, que o chanceler descreve como regimes baseados "mais na lei abstrata e na convivência dentro de um arcabouço legal e não tanto a partir de uma constituição sentimental de uma nação".

Admirador de Donald Trump, Ernesto minimizou a invasão ao Capitólio ao defender o direito de protestar de americanos que se sentem traídos por seus políticos, diante de um cenário de possível fraude eleitoral. Assim como Trump e seus apoiadores, que contestaram o resultado da eleição, o ministro brasileiro não apontou qualquer indício de fraude.

A inabilidade diplomática de Ernesto Araújo foi motivo para o atraso na compra de insumos da vacina contra a covid-19 na Índia. Em um ato midiático o chanceler chegou a anunciar que um avião iria buscar vacinas da AstraZeneca no sudoeste asiático. A pompa e publicidade da ação desagradaram Nova Delhi que, em poucos dias, mudou o discurso e desistiu da venda. O avião brasileiro, já adesivado com a campanha do SUS, teve de ser utilizado em outras operações.

GENTE DE BEM 2

O apresentador Carlos Roberto Massa, o Ratinho, foi um dos assuntos mais comentados do país, após uma entrevista sem maquiagem, esta semana, em que defendeu uma intervenção militar no país, “fuzilamento de detentos” e “limpar mendigos” das cidades. O que o apresentador não falou foi sobre sua dívida de R$ 79,3 milhões com o fisco. O calote na União tem origem em três empresas: Agropastoril Café no Bule Ltda (R$ 77,9 milhões); Agropecuária ACB Ltda (R$ 706,6 mil); e Massa & Massa Comunicação e Marcas Ltda (R$ 663 mil). As duas primeiras empresas com sede no Paraná e a última, no Rio Grande do Sul. Os dados estão disponíveis no banco de dados de dívidas ativas da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), vinculada ao Ministério da Economia. A consulta pode ser feita por qualquer cidadão através do aplicativo “Dívida Aberta”, lançado pela pasta.

FRASES DA SEMANA

“Pode chocar, mas está na hora de fazer igual à Singapura: entrou um general, consertou o país e, um ano depois, fez a revisão. Mas primeiro chamou todos denunciados e disse: ‘Vocês têm 24 horas para deixar o país ou serão fuzilados’”. (Ratinho, que deve 80 milhões em impostos)

“Como parlamentar, votarei pela soltura do deputado Daniel Silveira; pela liberdade de expressão, de opinião e pela imunidade parlamentar, direitos garantidos na Constituição Federal”. (Ricardo Barros, PP-PR, líder do governo Bolsonaro na Câmara dos Deputados) 

“O que acontece, Fachin, é que todo mundo está cansado dessa sua cara de filha da puta, de vagabundo. Várias vezes já te imaginei levando uma surra, você e todos os integrantes dessa Corte”. (Daniel Silveira, PSL-RJ, deputado, em mensagem ao ministro Edson Fachin, do STF)

“Quem está feliz com os decretos sobre armas: 1. Quem as fabrica e vende; 2. Milícias e quadrilhas, pois haverá mais armas em circulação; 3. Quem pode pagar R$ 3 mil ou mais por armas; 4. Malucos que sonham com uma nova ditadura no Brasil.” (Flávio Dino, governador do Maranhão)

“Cadê o rapaz que queria arma? Vocês estão felizes com o decreto das armas? Vocês não querem o comunismo para Santa Catarina não? Vocês estão com saudade do BNDES mandando dinheiro para Cuba? Criança na escola é para aprender sexo?” (Eduardo Bolsonaro, deputado federal)

“A pandemia chegou como uma marca de ferro dessa coisa vulgar, pequena, perversa e má que vivemos. E o Brasil parece não ver que tem saída. Uma hora vai ver. O Brasil ainda é aquele, mas está adormecido, apavorado, acuado, doente e triste. Vontade de chorar!”. (Maria Bethânia)

“A postura [de Bolsonaro] sempre foi de ataques, de agressões, de radicalismo. O contraponto tem que ser feito insistindo na ponderação e na moderação, esse é o meu jeito”. (Eduardo Leite, PSDB, governador do Rio Grande do Sul, e aspirante a candidato a presidente da República)

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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