19/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Apesar de tudo, há ainda quem…

Publicado em 12/08/2020 12:00 - Victor Barone

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Saíram ontem à noite os resultados da última pesquisa de avaliação do governo Bolsonaro feita pelo Datafolha, com entrevistas realizadas nesta segunda e terça-feiras. O Brasil acabara de ultrapassar 100 mil mortes pelo novo coronavírus (e definitivamente impulsionadas pela má condução brasileira da pandemia), mas isso não parece ter influenciado em nada as respostas. A aprovação do presidente subiu em quase todos os estratos demográficos e econômicos e atingiu o maior nível desde sua eleição: 37% dos brasileiros consideram seu governo ótimo ou bom, o que dá um aumento de cinco pontos percentuais desde o levantamento anterior, do fim de junho. Antes, a pontuação máxima já registrada tinha sido de 33%. Não bastasse isso, a reprovação caiu incríveis dez pontos: hoje, só 34% o consideram ruim e péssimo, contra 44% em junho.

O auxílio emergencial, como já era de se esperar, continua tendo grande impacto nos números. Entre quem pediu e recebeu o benefício, 42% acham o presidente ótimo ou bom (cinco pontos acima da média). No Nordeste, onde 45% dos moradores receberam o auxílio, a rejeição a Bolsonaro caiu de 52% para 35% e aprovação subiu de 27% para 33%. Mauro Paulino e Alessandro Janoni, diretores do Datafolha, notam que pelo menos três dos cinco pontos conquistados pelo presidente vêm de pessoas que estão no grupo apto a receber essa renda mensal: trabalhadores informais ou desempregados com renda familiar de até três salários mínimos.

Mas isso não explica tudo, já que houve certa uniformidade nos resultados. A rejeição a Bolsonaro caiu em vários grupos que se opunham a ele, como pessoas com curso superior (a rejeição caiu de 53% para 47%). Entre estudantes, recordistas no ‘ruim ou péssimo’, essa avaliação caiu de 67% para 56%. No Sudeste, onde Bolsonaro vinha perdendo campo continuamente, seu desempenho voltou a subir: a aprovação saltou de 29% para 36%.

Não deve ser coincidência, como nota o jornalista da Folha Igor Gielow, que a melhora tenha se dado junto com uma grande mudança na postura pública do presidente, que, desde a prisão de Fabricio Queiroz, anda extremamente manso em relação aos outros poderes. Ultimamente, em vez de participar de atos que pedem o fechamento do Congresso e do STF, Bolsonaro deu para viajar país afora inaugurando obras. 

Em tempo: o presidente reconheceu que, afinal, não deve conseguir criar o Aliança pelo Brasil. “É difícil formar um partido, não é impossível, mas é difícil. Uma burocracia enorme”, justificou, sinalizando a possibilidade de reconciliação com o PSL. A ver.

Além do auxílio emergencial e da mudança de comportamento do presidente, há, ainda, uma terceira questão a ser levada em conta: o brasileiro médio não está nem aí para os desmandos do bolsonarismo. Simplesmente, falta empatia.

O SILÊNCIO DOS VIVOS

Passamos das 105 mil mortes. A tragédia sem precedentes na história do país não mereceu panelaços. A imprensa tem se esforçado para dimensionar seu significado em históriascomparaçõessimulações e gráficos diversos.  Mas alguma coisa parece ter estancado a indignação que era demonstrada numa base diária meses atrás. Concordamos com o advogado Thiago Amparo quando ele diagnostica que o luto coletivo existe, só que está sendo esmagado pela necropolítica. “Bolsonaro está vencendo pelo cansaço”, constata, por sua vez, o jornalista Bernardo Mello Franco. 

No dia do fatídico marco dos 100 mil mortos, só atingido até agora pelos Estados Unidos, Jair Bolsonaro celebrou a vitória do Palmeiras e replicou a propaganda da sua secretaria de Comunicação que distorce informações para comemorar números catastróficos. Como os milhões de “recuperados” – conceito extremamente duvidoso em se tratando de uma síndrome que tem mostrado poder para desabilitar permanentemente suas vítimas, com pulmões lesionados, rins danificados. Ou o número de mortes por milhão de habitantes, métrica que não serve. “Se cai um avião com 210 pessoas ninguém diz que foi uma morte por milhão de habitantes”, explica Ricardo Parolin, em entrevista ao UOL. “Com cerca de 3% da população mundial, concentramos 14% dos óbitos registrados por covid-19”, situam as pesquisadoras Jurema Werneck, Gulnar Azevedo e Zeliete Zambon. 

Hoje, a quantidade de vidas perdidas já aumentou mais um “muito”: milhares cadáveres se acumularam de lá para cá. “E seguimos contando os corpos que não podemos velar”, escreve Antonio Prata, resgatando a conclusão do atual presidente sobre a ditadura – ‘o erro foi ter torturado e não matado’, disse Bolsonaro no rádio em 2016 – para inferir: “Era óbvio, mas segue sendo surpreendente que um presidente eleito hasteando a bandeira da morte nos entregue, vejam só, a morte.”

Diante dos mais de cem mil mortes, Supremo e Congresso decretaram luto oficial. Não há punição à vista para quem optou pelo “caminho da insensatez”. “A responsabilização por esta tragédia humana não pode deixar de ser feita”, defendem as entidades da ciência, da advocacia, da imprensa, etc. O difícil é achar quem tenha poder para tal e esteja disposto a assumir a tarefa. Aparentemente, estão todos “tocando a vida”. 

MATAM MESMO

Um estudo publicado no American Journal of Tropical Medicine and Hygiene calcula o quanto as notícias falsas sobre a pandemia já mataram mundo afora. Segundo os pesquisadores, só nos primeiros meses do ano quase 5,8 mil pessoas deram entrada em hospitais por causa de informações falsas recebidas em redes sociais, e pelo menos 800 morreram. Em muitos casos, os óbitos foram por ingestão de metanol ou produtos de limpeza, devido à crença de que esses produtos poderiam curar a covid-19.

Vale lembrar que um líder mundial envolvido em fake news sobre tratamentos bizarros é Donald Trump, que em abril sugeriu que infectados recebessem injeções de desinfetante. Somente nas 18 horas seguintes, Nova Iorque registrou 30 casos de ingestão desses produtos. 

Perto disso, o incentivo ao uso de hidroxicloroquina é fichinha. Aliás, Eduardo Pazuello falou sobre a droga ontem, em audiência pública no Congresso. De acordo com ele, a pasta não conseguiu atender nem metade das demandas pelo medicamento. Jair Bolsonaro, para não perder o hábito, fez sua propaganda na transmissão ao vivo de ontem à noite. Garantiu que as pílulas extras produzidas pelo Exército vão ser usadas, então não vai haver desperdício… Não duvidamos, já que a pressão do governo (inclusive via orientações do Ministério da Saúde) é justamente no sentido de que se use tudo, mesmo que não faça bem.

O FRANGO CONTAMINADO

Autoridades chinesas informaram que uma amostra de asas de frango congeladas exportadas pelo Brasil testou positivo para o novo coronavírus. A OMS reforçou que não há evidências de que o SARS-CoV-2 possa ser transmitido pela comida, mas a notícia gerou algum furor, além de temores de que a compra de carne brasileira possa ser suspensa. O governo chinês disse que, “por enquanto”, não vai haver restrições.

TRÊS CRÍTICAS BEM DIFERENTES

O ranking elaborado pela Secretaria de Governo para dar munição a parlamentares aliados contra gestores locais, principalmente adversários do presidente no campo político, mereceu uma nota de repúdio da Frente Nacional de Prefeitos. Para a entidade, o governo Bolsonaro promove mais uma vez “confronto federativo” com o objetivo de “imputar responsabilidades” e “apontar culpados”. O texto bate mais. Segundo a Frente, desde o início da pandemia, “o governo federal tem se esquivado das responsabilidades“, além de atrapalhar “medidas implementadas por prefeitos e governadores para salvar vidas”.

E depois de Gilmar Mendes, foi a vez de Cármen Lúcia criticar o governo. Mas ao contrário do colega de toga, a ministra do Supremo adotou um tom velado. “Cem mil mortos é uma tragédia. Cem mil mortos não precisava ter acontecido, em que pese ser fato que este coronavírus é realmente uma doença grave e que acometeria muita gente. Mas foi uma atuação estatal, aliada a uma atuação em parte de uma sociedade perplexa, aturdida diante de tantos desmandos, de tanta falta de orientação segura seguindo-se a ciência e a medicina de evidências, que nos levou a um fim de semana de luto. Portanto, luto que impõe luta permanente pela democracia”, disse em um seminário virtual. 

Enquanto isso… O filho 03 do presidente divulgou uma das teses preferidas do bolsonarismo – e não em qualquer lugar, mas num evento promovido pelo Itamaraty. De acordo com o deputado federal Eduardo Bolsonaro, a pandemia “é o laboratório perfeito para globalistas”. “Tem gente que fica falando que ‘ah, Eduardo, isso é teoria da conspiração, não existe globalismo’. Mas nos vimos, mesmo aqui dentro do Brasil, órgãos e tribunais preterindo o Ministério da Saúde e as secretarias estaduais de Saúde com bases em argumentos da OMS. Ou seja, colocou a OMS acima dos órgãos nacionais”, disse. Tem mais: segundo ele, a Organização Mundial da Saúde “não sabe com o que está lidando”. A reportagem do Globo destaca que intervenções como essa se tornaram comuns na gestão de Ernesto Araújo, com palestras de ‘ilustres’ blogueiros e militantes pró-governo no lugar de especialistas e diplomatas. 

BAIXAS NA EQUIPE ECONÔMICA

Na terça (11), os secretários de Desestatização, Salim Mattar, e de Desburocratização, Paulo Uebel, pediram demissão. Com isso, já são oito baixas na equipe econômica. O motivo de Uebel foram os breques de Bolsonaro, que vem retardando o envio da reforma administrativa ao Congresso. Já Mattar, que é dono da empresa de aluguel de veículos Localiza, colocou o ônus no “establishment”. Em entrevista à CNN Brasil, ele reclamou que não há “vontade política” para avançar nas privatizações.

Cada vez mais sozinho no seu liberalismo radical, Paulo Guedes mirou em colegas de Esplanada para dizer que aqueles que aconselham o presidente a burlar a regra do teto de gastos estão empurrando Bolsonaro para “uma zona de impeachment”. Pedidos de afastamento por outras razões, inclusive pela condução do chefe do Executivo da pandemia, é o que não faltam. Não se admira que a declaração do ministro da Economia tenha sido dada ao lado do dono da gaveta em que estão todos esses processos: Rodrigo Maia (DEM-RJ).

A propósito: hoje chega mais um. Assinado pela Coalizão Negra por Direitos, o pedido de impeachment de Bolsonaro argumenta que o governo federal tem agido contra a saúde pública durante a pandemia. Para a entidade, que reúne 150 organizações e coletivos do movimento negro, faltaram medidas de apoio a populações vulneráveis e houve erros nas negativas de pedido do auxílio emergencial a pessoas pobres.

OUTRAS ENGRENAGENS

O ministro da Justiça, André Mendonça admitiu que a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do ministério produziu um “relatório” sobre 579 policiais que se declararam antifascistas na internet. O reconhecimento aconteceu depois de dias em que o ministro tentou abafar o escândalo do dossiê de inteligência, revelado por Rubens Valente, no UOL. Segundo parlamentares, ele se defendeu, dizendo que tomou conhecimento do documento só depois da reportagem. 

As declarações de Mendonça foram dadas em reunião da comissão mista do Congresso que trata do tema, fechada ao público. “Para mim ficou patente e caracterização de que vivemos um caso clássico de espionagem política do governo em relação a opositores“, avaliou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), presente no encontro.

Em 2019, um dos primeiros atos do presidente foi transformar a Seopi em um serviço de informação. Antes, a Secretaria tinha a missão de intermediar ações policiais. Na mesma linha, o governo Bolsonaro gastou 68% a mais com ações de inteligência e segurança institucional do que a média verificada na gestão de Michel Temer. Ao todo, foram R$ 90,9 milhões – e esse ano, os gastos já tinham alcançado R$ 41,7 no início de agosto, segundo levantamento do Globo

Em 31 de julho, a Abin passou por uma reestruturação e foi criado um Centro de Inteligência Nacional, com mais cargos e a atribuição de enfrentar “ameaças à segurança e à estabilidade do Estado e da sociedade” – bem no espírito da Lei de Segurança Nacional, entulho autoritário cada vez mais usado pelo governo.

O relatório do Ministério da Justiça, os gastos crescentes com vigilância e a criação do Centro da Abin dão concretude às declarações que vieram à tona com a divulgação do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, quando Bolsonaro cobrou relatórios diários de inteligência da Polícia Federal, que não tem essa atribuição, e disse que tinha um sistema “particular” de informação.  

Naquele mesmo dia 22, Bolsonaro afirmou que iria intervir no Supremo, conforme reportagem da revista Piauí – que até agora não foi negada pelo Planalto. O El País constatou que nem os próprios ministros da corte parecem dispostos a dar a importância que a revelação merece. Preferem botar panos quentes por avaliarem que o pior momento da crise institucional já passou. “Se você não puder e/ou não quiser fazer impeachment e cadeia, é mais fácil não dizer em voz alta que Bolsonaro tentou um autogolpe”, nota Celso Rocha de Barros em sua coluna na Folha.

Tem pouco mais de um mês que o presidente não ataca os outros poderes. Bolsonaro está mais pragmático em meio às investigações e denúncias que pesam sobre si e sua família. Só nos últimos dias, foram reveladas inconsistências nas suas declarações sobre os depósitos feitos por Fabrício Queiroz e Márcia Aguiar na conta de Michelle Bolsonaro. Foram rastreados 27 depósitos num total de R$ 89 mil. Quando o caso estourou em 2018, o presidente disse que o dinheiro (então depósitos que totalizavam R$ 24 mil) era parte do pagamento de um empréstimo feito por ele a Queiroz no valor de R$ 40 mil. Já a última envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) dá conta de que ele usou R$ 86 mil em espécie para pagar salas comerciais no Rio.

“Por mais grave que seja, o já revelado está longe do que pode alcançar. Bolsonaro sabe o que esconde e se preparou desde a campanha para montar um sistema protetor”, nota Janio de Freitas.

E parte do mecanismo que dá hoje sustentação ao presidente (e casa bem ao pragmatismo recém-adotado) é o auxílio emergencial. Para André Singer, a “pandemia criou uma situação inesperada que pode facilitar uma transição inesperada”, já que para receber os R$ 600 a maioria dos beneficiários do Bolsa Família teve de abrir mão do programa criado –e super identificado – com Lula e com o PT. “É como se as pessoas tivessem saindo do programa lulista e entrando num programa bolsonarista. O governo começou a pensar numa estratégia inteligente, mas depende de ter recursos, que é fazer com que as pessoas não voltem mais para o Bolsa Família, mas entrem direto no Renda Brasil”, analisou, numa entrevista ao Globo em que fala que, pela primeira vez, vê se delinear no horizonte uma ameaça concreta ao lulismo.

SEM PUNIÇÃO

Há um ano, focos de incêndio espalhados propositalmente à beira de uma rodovia no Pará ajudaram a agravar ainda mais o cenário das queimadas na Amazônia, que atingiram níveis recordes. O “Dia do Fogo” – que levou o número de focos no sudoeste do estado a triplicar entre 10 e 11 de agosto de 2019 – foi combinado pelo WhatsApp por dezenas de pessoas, entre produtores rurais, comerciantes, grileiros e sindicalistas da cidade de Novo Progresso. Uma “vaquinha” chegou a ser feita para comprar combustível e contratar motoqueiros para o serviço.

Mas até hoje nenhum responsávelfoi preso ou indiciado, como mostra a matéria de Daniel Camargo na Repórter Brasil. Na verdade, os únicos detidos foram trabalhadores rurais sem-terra contra os quais não havia evidência alguma, e que ficaram 50 dias na prisão.

O inquérito da Polícia Civil de Novo Progresso não aponta responsáveis: conclui que o fogo foi alastrado pelo tempo seco e que as queimadas acontecem todo ano. Já a Polícia Federal (PF) chegou a apreender documentos, celulares e computadores de empresários e fazendeiros, mas não concluiu a perícia (nem terminou o inquérito). A apuração de Camargo aponta entraves às investigações. Primeiro, os grandes proprietários da região têm boas relações com deputados e senadores do Pará, além de interlocução com o alto escalão do governo federal. Segundo, há um racha entre policiais civis e federais no estado – e por isso depoimentos tomados pela Polícia Civil de Tapajós sequer foram repassados à PF, por exemplo.

Além de não ter havido prisões e indiciamentos, as multas aplicadas a desmatadores também foram escassas. O Greenpeace identificou 478 propriedades onde ocorreram queimadas no Dia do Fogo. Entre elas, pelo menos 66 tinham algum tipo de embargo prévio por crime ambiental e 207 tiveram incêndios em áreas de floresta, mas só 5,7% foram autuadas. Mais: uma equipe da ONG sobrevoou a região e observou que quase todas as áreas que eram florestas e foram queimadas já viraram pasto. “Apenas um ponto não tinha pasto. Nos outros, já tinha pasto e gado sendo engordado”, afirma Rômulo Batista, do Greenpeace, na Folha

NÃO ACABOU

É claro que vem mais fogo por aí. Ainda de acordo com Batista, nos sobrevoos foi possível ver pilhas de árvores derrubadas, que estavam secando e aguardando para requeima. “É incontestável a relação entre as duas questões: a queimada é o passo seguinte da derrubada. Ainda há uma grande área desmatada na Amazônia no ano passado que não foi queimada, cerca de 4,5 mil quilômetros quadrados”, diz o relatório da ONG. 

Este ano, a temporada de fogo está só começando (o pico de registros costuma ser em setembro). Mas dados do Inpe divulgados no início do mês mostram que o número de focos de incêndio já aumentou 572% em todo país em 2020, comparando com agosto do ano passado. Novo Progresso está entre os dez municípios brasileiros com mais focos este ano. Lá, não há viaturas disponíveis do Ibama para combater as chamas. Procuradores do Ministério Público Federal explicam, na Deutsche Welle, por que tudo deve continuar piorando: “Com esse governo, a gente tem tido dificuldades enormes impostas por quem deveria ser parceiro, como Ibama, Funai, governo federal, Ministério do Meio Ambiente. Eles acabam se transformando em inimigos“, diz Igor Spíndola, procurador e integrante da força-tarefa Amazônia, que investiga crimes ambientais.

Os focos se multiplicam em outras regiões também. O Pantanal está há semanas com incêndios descontrolados (este ano, o mês de julho teve o maior número de queimadas já registrado por lá, com um aumento de 421% em relação ao ano passado). Já foram mais de um milhão de hectares queimados. “Quem põe fogo no Pantanal é o homem. O fogo natural acontece por causa de raios, sempre associado ao período de chuvas. Como não tem chovido, então é claro que o homem é o grande causador disso”, afirma, na BBC, o biólogo André Luiz Siqueira.

E na (muito mais úmida) região serrana do Rio, seis dias de incêndio destruíram 360 hectares do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Também lá, tudo indica que os focos foram criminosos. 

PARA MOSTRAR SERVIÇO

Por razões óbvias, o Brasil tem perdido protagonismo no debate internacional sobre a Amazônia. Com a pressão de investidores internacionais, o governo quer recuperá-lo, segundo a Folha: o vice-presidente Hamilton Mourão pretende dar um gás na OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica), que reúne reúne Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela e busca articular atividades conjuntas na região. Ultimamente ela tem estado em segundo plano – e o Brasil acumulou mais de R$ 8 milhões em contribuições atrasadas. Mourão quer quitar a dívida. Além disso, nos próximos dias deve ser recriada (sob o guarda-chuva do general) a comissão nacional responsável por acompanhar a aplicação do tratado de cooperação, que havia sido extinta no ano passado. 

E o governo enviou ontem um pedido para realocar R$ 410 milhões do orçamento federal para o Ministério da Defesa. O dinheiro serviria para compensar as despesas das Forças Armadas na operação contra o desmatamento da Amazônia (a Brasil Verde 2), comandada pelo vice. Que, como já comentamos aqui, não parece estar dando os melhores resultados.

MAIS UMA

No dia 10, o Partido Verde denunciou o governo Bolsonaro por ir na contramão de recomendações científicas de combate ao coronavírus. O pedido foi apresentado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O partido quer que a Organização dos Estados Americanos (OEA) condene o país e obrigue o governo a seguir as orientações da OMS.  

PESQUISADOR SOLTO

O pesquisador da Fiocruz Guilherme Franco Netto foi solto na tarde de domingo (9). Ele havia sido preso na manhã da quinta, no âmbito da Operação Dardanários que teve como principal alvo o secretário de Transportes do governo Doria, Alexandre Baldy. A prisão do pesquisador foi baseada nas delações de Edson Giorno e Ricardo Brasil, donos da empresa de tecnologia da informação Vertude. Eles acusaram Baldy e seu primo – Rodrigo Dias, ex-presidente da Funasa e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – de receberem propinas em troca de vantagens à Vertude. Um dos contratos do suposto esquema de corrupção teria sido firmado com a fundação de apoio da Fiocruz, a Fiotec. Segundo o repórter Fausto Macedo, os delatores apontaram o pesquisador da Fundação como seu “contato” na autarquia.

Franco Netto é um dos cientistas mais respeitados do país na área de saúde ambiental e tem recebido solidariedade de diversas entidades e pesquisadores da área, que viram com estranheza todo o caso. Outra Saúde apurou que, nos bastidores, é disseminada a avaliação política de que a prisão teve como objetivo desacreditar a Fiocruz e colocar lenha na fogueira para uma intervenção do governo federal nas eleições à presidência da Fundação, que acontecem este ano. Um site para coletar assinaturas em apoio ao pesquisador foi criado no fim de semana.

CONDENADO

O presidente Jair Bolsonaro foi condenado a pagar as custas processuais e os honorários advocatícios relativos a um processo que propôs em 2017 contra o então deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ). Bolsonaro, que também era deputado federal na época, acusou o colega de calúnia, injúria e difamação por tê-lo chamado de ignorante, racista e desonesto, entre outras críticas, durante entrevista a um jornal, informa Fábio Grellet, do Estadão.

Wyllys alegou que estava protegido pela imunidade parlamentar, e a Justiça do Estado do Rio deu razão a ele, em decisão de fevereiro de 2019, condenando Bolsonaro ao pagamento de custas e honorários. Foi apresentado recurso, mas na última sexta-feira a Justiça emitiu nova decisão determinando que o presidente pague o valor devido (cerca de R$ 2.500) no prazo de até 15 dias, a partir da notificação, sob pena de multa de 10%.

MORO IRONIZA BOLSONARO ‘FAZENDO POLÍTICA COMO ELA É’

O ex-ministro Sérgio Moro não perdeu a chance de criticar Jair Bolsonaro após a nomeação de Ricardo Barros (PP-PR) para a liderança do governo na Câmara. Moro aproveitou declaração do próprio parlamentar, dizendo que o presidente passou a fazer a “político como ela é”, para mais uma vez se colocar como um “contraponto” ao atual ocupante do Palácio do Planalto. “É verdade (o que disse Barros). Política como ela é, talvez não como deveria ser. Mas talvez seja querer demais. Ou não?”

FANFARRÃO

O youtuber Gabriel Monteiro, que ficou conhecido por se envolver em diversas polêmicas nas redes sociais, foi expulso da Polícia Militar do Rio de Janeiro por deserção. A decisão foi publicada no boletim da PM no último dia 5, segundo informações do jornal Extra. Gabriel era lotado no 34º BPM (Magé) e faltou o serviço para o qual foi escalado no dia 22 de julho deste ano. O youtuber permaneceu até o dia 31 sem dar qualquer satisfação sobre seu paradeiro à corporação e completou mais de oito dias de ausência, o que caracteriza  o crime de deserção previsto no artigo 187 do Código Penal Militar. Ainda de acordo com  o jornal Extra, no processo de deserção houve tentativas de encontrar Gabriel no endereço fornecido por ele à corporação, mas o atual morador do imóvel informou à  PM que ele não residia naquele local. A decisão de expulsar Gabriel foi do Secretário da PM, coronel Rogério Figueredo. Após ser informado de sua expulsão, O youtuber postou uma mensagem em seu Twitter: “Não se esqueçam. Deus está comigo contra os corruptos. Aguardem e verão. Servir e proteger”.

O QUE ESTÁ POR TRÁS DO PLANO DE EVANGELIZAÇÃO EM MASSA NO BRASIL

O discurso é pop, e as igrejas têm neon e fumaça branca. Mas o discurso deste movimento evangélico que quer arrebatar jovens é conservador e segue uma lógica mercantil. O The Send conquistou apelo entre os jovens porque misturam cultura pop norte-americana em todas as suas ações. Suas igrejas chamadas de churchs têm estilo de franquias, parede preta, fumaça no ar e louvor worship. Mas por trás da fachada descolada, reproduzem o mesmo discurso conservador, que espiritualiza e normaliza as injustiças sociais. Jackson Augusto, do Afrocrente, detalha as origens desse movimento que apoiou Jair Bolsonaro e se alinha a grupos como Jocum e Missão Novas Tribos do Brasil.

O QUE ELON MUSK QUER COM A BOLÍVIA?

O país de Evo Morales concentra as maiores reservas de lítio do mundo, material fundamental para a fabricação de baterias dos carros elétricos da Tesla.

GENTE DE BEM

A primeira-dama Michelle Bolsonaro ameaçou um primo que desabafou nas redes sociais após a morte da avó, Maria Aparecida Firmo Ferreira, vítima do novo coronavírus. Segundo Eduardo Castro, a primeira-dama “não fez absolutamente nada” pela avó. “Tanto poder, tanta influência e por vergonha, sim vergonha, não ajudou seu próprio sangue. Você ajuda tantas pessoas, participa de tantos projetos para ajudar os outros e sua própria família você vira as costas. Triste ver quem você se tornou. Não reconhecemos mais você!”, desabafou. Em seguida, ele compartilhou um print de uma matéria do G1 que afirma que ela não se posicionou sobre a morte de Maria Aparecida. “E nem ela se posicionou sobre o estado da própria avó, lamentável!”, disse ainda Castro. As mensagens incomodaram Michelle, que respondeu ao primo com ameaças e xingamentos. “Vou te processar por essa postagem. Acho melhor você rever sua postura em relação a essa postagem. Deixa de ser cretino. Você não é o rico de internet? Cuidado com as suas postagens, seu moleque. Você nem gostava da vó. Seu falso. Seu merda. Cuidado!”, escreveu Michelle.

Eduardo, então, compartilhou o ataque e respondeu em vídeo: “Eu não tenho medo dela, eu não tenho medo de quem ela é, eu não tenho medo das coisas que ela pode fazer porque em momento algum eu falei mentiras a respeito dela. Se ela quer bater de frente, a gente bate de frente, não tem problema não”.

FRASES DA SEMANA

“A filiação petista carrega consigo algumas responsabilidades, entre elas a de lealdade ao candidato do partido”. (Gleisi Hoffmann, presidente do PT, ao ameaçar filiados do partido que começam a aderir em massa à candidatura de Guilherme Boulos, do PSOL, a prefeito de São Paulo)

“Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento”. (Inês Marchalek Zarpelon, juíza da 1ª Vara Criminal de Curitiba, ao condenar um homem à prisão por roubo de celulares e formação de quadrilha)

“Estou olhando na cara de vocês: nem o Geisel, nem o Figueiredo, cuidaram das estruturas militares melhor do que eu. […] Antes de ser eleito tudo era sucata ali. Lamentável que tantos generais se disponham a trabalhar com um presidente troglodita como esse”. (Lula)

“A maioria, mesmo representada no Executivo e no Congresso, não pode discriminar, perseguir ou ignorar os direitos e garantias fundamentais das minorias”. (Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal)

“E chegamos à marca de 100 mil mortes. A bomba atômica de Hiroshima matou 90 mil pessoas. O senhor Bolsonaro já é responsável pela morte de mais gente… sabe? Sem soltar nenhuma bomba atômica, soltou a bomba da ignorância”. (Lula)

“Quem disse que poucos morreriam? Quem gerou aglomerações em passeios irresponsáveis? Quem sabotou uso de máscaras? Quem debochou das mortes, alegando não ser coveiro? Quem divulgou remédios ‘milagrosos’, sem ser médico?”. (Flávio Dino, governador do Maranhão)

“Estamos promovendo um genocídio com os índios. É um genocídio real. Tem gente se colocando contra o termo ‘genocídio’, mas é real. Está acontecendo nas tribos indígenas do Centro-Oeste”. (Gonzalo Vecina Neto, médico, ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária)

Com informações de Outra Saúde, BR Político e Ricardo Noblat

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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