25/04/2024 - Edição 540

Poder

Bolsonaro quer nova CPMF para financiar a Previdência

Publicado em 02/11/2018 12:00 -

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

A equipe econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro, quer criar um imposto sobre movimentações financeiras, nos moldes da antiga CPMF, para acabar com a contribuição ao INSS que as empresas recolhem sobre os salários dos funcionários. O tributo incidiria sobre todas as operações, como saques e transações bancárias. Autores da proposta estimam que a medida poderá gerar ao governo pelo menos R$ 275 bilhões em receita por ano.

A informação foi confirmada pelo economista Marcos Cintra, responsável pela área tributária no grupo coordenado por Paulo Guedes, já anunciado como futuro ministro da Economia. Cintra, no entanto, rejeita a comparação com a extinta CPMF, alegando que não se trata da criação de um novo imposto, mas de substituição.

Bolsonaro, no entanto, foi ao Twitter desautorizar o economista a falar sobre o assunto: "Desautorizo informações prestadas junto a mídia por qualquer grupo intitulado 'equipe de Bolsonaro' especulando sobre os mais variados assuntos, tais como CPMF, previdência, etc.".

Durante a campanha eleitoral, a intenção de Guedes de criar um tributo sobre movimentações financeiras. Com a repercussão negativa da notícia, Bolsonaro negou que a proposta estivesse em discussão e fez seu assessor econômico cancelar a participação em debates e sabatinas.

A ideia da equipe econômica é implantar o tributo aos poucos, substituindo num primeiro momento apenas a contribuição previdenciária patronal. Segundo Marcos Cintra, a alíquota do novo tributo seria de 0,4% a 0,45%, em cada operação.

Na origem e no destino

De acordo com o economista, numa transferência bancária, as duas partes seriam descontadas. Quem transferir dinheiro para outra pessoa será taxado entre 0,4% e 0,45%. Quando o dinheiro entrar na conta do favorecido, haverá um novo desconto na mesma alíquota. Portanto, a alíquota total da transação ficaria entre 0,8% e 0,9%.

Em contrapartida, ressalta a reportagem, as empresas deixariam de recolher os 20% sobre a folha de pagamento. Nos cálculos do economista, esse sistema faria frente à arrecadação da contribuição sobre folha, que ficou em cerca de R$ 275 bilhões, conforme o mais recente Balanço Geral da União, de 2017.

Cintra alega que a mudança vai gerar mais empregos. Para ele, a tributação sobre folha de pagamento impede a formalização no país. Atualmente pouco mais de 30% dos empregados têm carteira assinada. Já o desconto no contracheque do empregado seria mantido. Hoje, trabalhadores recolhem 8%, 9% ou 11%, segundo a faixa salarial.

Adicional de compensação

A proposta prevê que as empresas paguem um adicional ao trabalhador como espécie de “compensação”. Um empregado que recebe R$ 3 mil de salário, por exemplo, receberá um adicional de R$ 27 no caso de a alíquota ser de 0,9% sobre o salário. Já trabalhadores informais não seriam compensados, já que não contribuem para a Previdência.

Marcos Cintra diz que ainda não há uma definição sobre se esse plano será posto em prática nesses moldes exatamente. Mas, segundo ele, a medida poderá ser tomada já no primeiro momento do governo, que assume em janeiro. O economista, que foi diretor da Fundação Getúlio Vargas e deputado federal, considera que, para aprovar a “CPMF previdenciária”, seria necessária a aprovação apenas de uma lei complementar, e não de uma proposta de emenda à Constituição, que exige um número maior de votos no Congresso. No caso de lei complementar são necessários 257 votos na Câmara e 41 no Senado. Procurado pelo jornal, Paulo Guedes não retornou as ligações.

Benefício mínimo universal

Entre as medidas listadas na proposta de reforma previdenciária dos aliados de Bolsonaro estão a criação de uma renda mínima para idosos —benefício universal sem limite de contribuição ou comprovação de renda; a instituição da Previdência dos militares; a criação de fundos de pensões nos estados, com a retirada do gasto com inativos da folha de pagamento estadual; além da previsão de equiparação das previdências pública e privada em pouco mais de uma década.

Aprovado em sua totalidade, o novo regramento vai economizar R$ 1,3 trilhão em dez anos —o equivalente a quase o triplo da economia prevista pela última versão de reforma apresentada pelo governo Michel Temer.

Fraga encomendou o trabalho inicialmente para entregá-lo ao apresentador Luciano Huck, quando ele ainda cogitava ser candidato à Presidência. Com a desistência de Huck, manteve o projeto para dar uma contribuição a quem vencesse a eleição presidencial.

"Já encaminhamos a proposta ao presidente eleito, e o seu destino é uma decisão interna da equipe dele”, diz Fraga. “Mas o resultado ficou acima das minhas expectativas: simplifica, elimina distorções e injustiças do atual sistema, trazendo mais economia que a proposta atual.”

A primeira medida da nova regra é retirar da Constituição os benefícios previdenciários, que passam a ser detalhados em lei complementar.

A ideia é dar flexibilidade a eventuais futuras mudanças, que podem se tornar necessárias de acordo com o envelhecimento da população.

Na tentativa de reorganizar todos os regimes em pouco mais de dez anos, a nova regra unifica todo o sistema atual (INSS, servidores públicos, professores e rural), estabelecendo uma idade mínima comum para a aposentadoria: 65 anos tanto para homens quanto para mulheres ao fim do período.

O ponto de partida do sistema é a instituição de uma renda mínima universal para pessoas acima de 65 anos equivalente a 70% do salário mínimo no primeiro ano.

Os reajustes são feitos com base na inflação anual e não será preciso contribuir para ter direito ao benefício. “Para receber esse benefício básico, basta provar que está vivo e tem 65 anos”, diz Tafner.

Para receber acima desse valor, será preciso contribuir com o sistema previdenciário. A partir de um ano de contribuição, um pequeno percentual é adicionado ao valor mínimo e assim sucessivamente até a aposentadoria.

Segundo a proposta, com 15 anos de contribuição, uma pessoa que ganha R$ 1.000 se aposentaria com um benefício equivalente a 88% da média das contribuições. Para atingir 100%, seria preciso contribuir por 40 anos.

A renda mínima substitui o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante um salário mínimo para aqueles idosos com renda familiar de até um quarto do salário mínimo, independentemente de contribuição.

Nesse sentido, a nova regra universaliza o benefício. Em contrapartida, diferentemente do BPC, que garante o mínimo, o novo benefício se restringirá a 70% dele.

O desenho tem ainda regras de transição. A exigência dos 65 anos vai levar dez anos para servidores públicos e trabalhadores rurais, 12 anos para os trabalhadores do setor privado e 15 anos para os professores.

A proposta tem diferenças fundamentais com relação à que está no Congresso.

Após idas e vindas, o último desenho previa idade mínima para aposentadoria de 65 para homens e 62 para mulheres e um tempo mínimo de contribuição de 15 anos.

Tafner, que atua como pesquisador da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) da USP (Universidade de São Paulo), contou com uma equipe de especialistas para redigir a proposta.

Estão no grupo Leonardo Rolim, ex-secretário de Previdência e consultor da Câmara; os pesquisadores do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Rogério Nagamine e Miguel Foguel; o ex-pesquisador do Ipea Marcelo Pessoa; Pedro Nery, consultor do Senado; e Sergio Guimarães, economista do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Contas Individuais

A proposta de reforma da Previdência patrocinada pelo economista Armínio Fraga estabelece um regime de contas individuais de aposentadoria —a chamada capitalização— para todos os nascidos a partir de 2014. 

O novo regime de capitalização nasce com o cuidado de incluir apenas aqueles que chegarão ao mercado de trabalho em 15 anos ou 20 anos, de forma a não descapitalizar o sistema atual, de repartição.

Isso porque, no regime de repartição, as contribuições vão para uma conta comum em que os mais jovens financiam a aposentadoria dos mais velhos e o governo entra para cobrir eventual insuficiência. 

Para evitar déficits, a proposta restringe os aportes feitos nas contas individuais. O futuro trabalhador não vai poder migrar todas as suas contribuições para a capitalização, mas apenas a porção que ultrapassar um teto intermediário, de cerca de R$ 3.800. 

Assim, a maior parte das contribuições segue no regime de repartição, sustentando aposentados do sistema geral.

Segundo Paulo Tafner, coordenador da proposta, a lei prevê que trabalhadores mais antigos também entrem no regime de capitalização. “Mas vai depender de decisão do Executivo e de suas contas”, diz.

A ideia é que os bancos criem fundos específicos para receber as contas individuais. Para estimular a competição com as instituições financeiras, a proposta inclui ainda um fundo administrado pelo próprio INSS. 

O contribuinte poderá capitalizar até 25% dos depósitos do FGTS recebidos a partir do momento em que abrir sua conta individual. Feito isso, porém, terá de deixar o dinheiro na conta até se aposentar. 

No regime de repartição, há uma regra que inova: quem contribuir por mais de 40 anos recebe como prêmio o benefício acima do teto previdenciário, hoje em R$ 5.645,80 —Tafner admite que não ser trivial contribuir por tanto tempo. 

A proposta avança ainda sobre categorias consideradas sensíveis, como servidores e militares. No caso destes últimos, são estabelecidas regras diferenciadas dentro de um regime próprio de aposentadoria —opção que enfrenta resistências da categoria. 

Grosso modo, diz Tafner, a proposta prevê que integrantes das Forças Armadas poderão se aposentar mais cedo, aos 45 anos, equiparando o regime brasileiro a boa parte dos países desenvolvidos. Porém, também de acordo com esses países, o valor da aposentadoria seria menor. 

Se hoje é possível um militar se aposentar mais cedo com praticamente 100% do salário, a ideia é que esse percentual caia para algo ao redor de 40%, no caso de aposentadoria aos 45 anos, por exemplo.

O período de transição dos militares será, contudo, bem mais longo. Enquanto a transição dos servidores públicos duraria dez anos, por exemplo, a dos militares se prolongaria por quase 20 anos. “É bom para o país que nossos soldados sejam jovens, pois os mais velhos podem não aguentar o combate. Então, a regra tem que permitir que o militar saia antes.”

Entre os casos específicos, os policiais militares também terão uma idade diferenciada: poderão se aposentar aos 60 anos —cinco anos antes do previsto no regime geral.

Quanto aos servidores públicos, eles seguirão o regime geral, com um benefício que varia de acordo com o salário e o tempo de contribuição.

Para os servidores já aposentados, muda a alíquota de contribuição, que hoje é de 11%, podendo chegar aos 14%. O aumento é uma colaboração pelo fato de terem benefícios mais vantajosos para os quais muitos não contribuíram proporcionalmente.

Tafner lembra que o esforço para equacionar os déficits da Previdência dos servidores hoje se concentram sobre ativos e os inativos que ganham acima do teto. 

A ideia, diz o economista, é criar uma contribuição extraordinária, que poderá ser acionada para cobrir eventuais déficits e será cobrada até de quem ganha abaixo do teto. 

“Como nos estados e nos municípios a grande maioria dos servidores ganha abaixo do teto, acaba não contribuindo quando se aposenta. Agora, vão ter que contribuir com 8% toda vez que existir déficit”, diz Tafner. 

Essa contribuição será progressiva, de acordo com o benefício de aposentadoria, e segundo a decisão dos governos estaduais ou municipais.

Na nova proposta, as mães também ganham alguma vantagem sobre a regra geral. 

Embora as mulheres se aposentem com a mesma idade dos homens (65 anos), a mães somarão um ano a mais de contribuição para cada filho —limitado a três crianças.

Segundo Tafner, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) está pronta, junto com a exposição de motivos e um conjunto de quatro leis complementares —um calhamaço de mais de 400 páginas. 

Questionado sobre a possibilidade de que sua proposta tenha que dividir os holofotes com a reforma de Temer, Tafner diz que os desenhos são diferentes. “A PEC do Temer põe tudo na Constituição, na nossa proposta a desconstitucionalização é geral. Mas, no mundo político, tudo é possível, eles dão nó em pingo d’água.”

Proposta reduz pensão de idoso pobre e dificulta vida de trabalhador rural

O ''benefício universal'' mínimo para todos os brasileiros maiores de 65 anos, tendo sido contribuintes ou não, no valor de 70% do salário mínimo substituiria as pensões garantidas aos idosos pobres através do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a aposentadoria rural especial.

Eduardo Fagnani, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho sobre esse ponto específico, fala sobre isso. Segundo ele, a proposta dificulta o acesso à aposentadoria dos trabalhadores rurais da economia familiar.

''Não se pode comparar a realidade socioeconômica de uma mulher nordestina que trabalha no campo com a de um trabalhador urbano'', afirma. Além disso, a desvinculação do reajuste pelo salário mínimo dos trabalhadores da ativa terá impactos na qualidade de vida, rebaixando os valores pagos os aposentados. ''Vamos revisitar as regras vigentes na ditadura militar que corroíam o valor real dos benefícios.''

A proposta apresentada por Armínio é uma novidade como tem sido apresentada?

A suposta proposta de Armínio é, na verdade, uma adaptação do modelo do Chile, implantado pelo general Augusto Pinochet, no início dos anos de 1980 e que está sendo questionado pela sociedade chilena em função do seu caráter excludente.

Posteriormente, em 1994, o Banco Mundial aperfeiçoou e transformou o modelo chileno em modelo global. O documento “Envejecimento sin crise” propõe o chamado modelo dos “três pilares”, no qual o “pilar básico” é semelhante ao proposto por Armínio. Em 2017, o documento “Um Ajuste Justo – Análise da Eficiência e Equidade do Gasto Público no Brasil”, também elaborado pelo Banco Mundial, atualiza essa proposta para o caso brasileiro.

A proposta não é original. É um plagio que vem sendo tentado no Brasil, desde 1988, quando o presidente José Sarney explicitou a tesa da “ingovernabilidade” em decorrência da aprovação dos direitos sociais na Constituição Federal. Nos últimos 30 anos, tivemos dezenas de “Pontes para o Futuro” [nome da proposta de governo de Michel Temer e do MDB] com o mesmo objetivo. E, agora, baseada na tese de que “as demandas sociais da democracia não cabem no orçamento”.

Como vê a proposta de universalizar uma pensão de 70% do salário mínimo a todos os brasileiros com mais de 65 anos?

A idade de 65 anos valerá também para os trabalhadores rurais da economia familiar, que hoje se aposentam aos 60 anos, homens, e 55 anos, mulheres. Essa idade é semelhante à idade mínima praticada na região da Escandinávia [Noruega, Suécia, Dinamarca] – sendo que o Brasil é o nono país mais desigual do mundo. É evidente que se trata de regras de acesso muito restritivas. Não se pode comparar a realidade socioeconômica de uma mulher nordestina que trabalha no campo com a de um trabalhador urbano brasileiro ou sueco.

Essa proposta acaba com a Seguridade Social da Constituição de 1988. Na prática, teremos um mega Bolsa Família previdenciário para os velhos e os desassistidos. Os que conseguirem o benefício por um curto período de vida terão valores rebaixados: de 100% do salário mínimo, como é hoje tanto para idosos pobres quanto para trabalhadores rurais, para, inicialmente, 70%.

Inicialmente 70% do salário mínimo?

Essa renda básica deixará de estar atrelada ao salário mínimo, segundo o projeto. Ou seja, o índice que reajusta os benefícios pode ser inferior ao utilizados para quem está na ativa. Vamos revisitar as regras vigentes na ditadura militar que corroíam o valor real dos benefícios.

A desvinculação somada ao fato de que a Previdência Social deixará de ter status constitucional pode fazer com que mudanças aconteçam por legislação ordinária. Isso abre espaço, inclusive, para que o índice que reajusta os benefícios seja inferior à inflação no futuro. A experiência de outros países – como o Chile, por exemplo – demonstra que, no médio prazo, esses valores podem ser achatados para a metade do salário mínimo ou para patamares inferiores a isso.

Salário mínimo

O Ministério da Fazenda sugerirá à equipe econômica do presidente eleito que reavalie as regras para o reajuste do salário mínimo. Durante a campanha, Bolsonaro afirmou que pode manter o reajuste do salário mínimo. “Há uma [regra] que está em vigor e pode ser renovada. Quando não se tem uma nova proposta, mantém-se a que está em vigor. Não tem que inventar nada”, disse o assessor do presidente eleito.

O salário mínimo é reajustado pelo resultado do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes mais a inflação do ano anterior, medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor). A medida vale até 2019, quando o piso salarial será revisado para R$ 1.006, conforme o Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) em debate no Congresso Nacional.

Tanto o Ministério da Fazenda quanto os auxiliares de Bolsonaro têm um diagnóstico semelhante sobre o reajuste do piso salarial. Um deles é de que a revisão dos salários acima do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pressiona a inflação e contribui para o baixo nível de produtividade da economia.

“Esses reajustes ainda pressionam as despesas com aposentadorias e pensões porque a regra vale para os benefícios da Previdência. Mas é um tema impopular, e qualquer medida errada nesse momento pode trazer transtorno para o debate da reforma”, afirmou o mesmo assessor de Bolsonaro.

Entretanto, a Fazenda não fará uma proposta de novo cálculo, e a equipe de Bolsonaro esperará uma sinalização do presidente para começar estudos sobre o tema.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *