20/04/2024 - Edição 540

Brasil

Bolsonaro pode acabar com 129 processos de demarcação de terra indígena

Publicado em 25/10/2018 12:00 -

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A promessa defendida por Jair Bolsonaro (PSL) de cancelar qualquer nova demarcação de terra indígena no País acabaria com 129 processos que hoje estão em andamento, em diferentes etapas, dentro do governo. Nessas terras vivem cerca de 120 mil indígenas, segundo dados da Fundação Nacional do Índio (Funai). Se somadas, as áreas em estudo envolvem 11,3 milhões de hectares, um território superior à área total de Pernambuco, com seus 9,8 milhões de hectares. Parte expressiva dessas terras está localizada em regiões afastadas do Norte e Centro-Oeste do País.

As mudanças propostas por Bolsonaro não ficariam restritas às novas demarcações de terras. Nos casos das 436 terras indígenas plenamente reconhecidas – que somam 117 milhões de hectares, 14% do território nacional –, ele já defendeu em entrevistas que elas fossem abertas para empreendimentos de infraestrutura, como hidrelétricas, estradas, ferrovias e atividades de mineração. Nesses casos, a lei proíbe a construção de projetos que tenham impacto direto em terras indígenas. Para modificar, seria preciso alterar a Constituição (são necessários três quintos da Câmara e do Senado para aprovar uma emenda).

Em relação ao cancelamento de novas áreas, o Ministério Público Federal já se posicionou afirmando que recorrerá à Justiça caso Bolsonaro interrompa os processos. A presidência da Funai afirmou, por meio de nota, que “independentemente do resultado das eleições, a fundação continuará cumprindo sua missão institucional, sempre respeitando a Constituição e a legislação vigente”. Para o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, “o reconhecimento, a demarcação e a proteção das terras indígenas é um imperativo constitucional” e uma obrigação do governo federal: “Nenhum governo tem legitimidade para desrespeitar a Constituição brasileira.”

Caso todos os 129 pedidos fossem regularizados, as terras indígenas chegariam a 15% dos 851,6 milhões de hectares do Brasil. Levantamento realizado no início do ano pelo Instituto Socioambiental (ISA) com a Funai apontou que há pelo menos 40 empreendimentos de grande porte previstos para cortar essas terras indígenas. São projetos como as hidrelétricas do Tapajós, no Pará, e a construção da linha de transmissão entre Manaus (AM) e Boa Vista (RR).

Sem menção. O plano de governo divulgado por Bolsonaro não faz nenhuma menção aos índios ou processos de demarcação, mas em diversas ocasiões o candidato do PSL já deixou clara a sua posição sobre o assunto, ao criticar o que chama de “indústria da demarcação de terras indígenas”. Bolsonaro prometeu que, uma vez eleito, “não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola”.

A demarcação de novas terras é uma prerrogativa do Poder Executivo. Cabe exclusivamente ao Ministério da Justiça, ao qual a Funai é vinculada, dar andamento a esses processos.

O setor produtivo tenta, há anos, regulamentar o artigo 231 da Constituição, para entrar nas terras indígenas. O artigo estabelece que os povos indígenas são os detentores de direitos originários sobre as terras que ocupam e que é competência da União demarcá-las, mas há pressão para que uma regulamentação da lei permita a exploração dessas terras, “ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados.”

No Congresso, os parlamentares têm procurado avançar no tema por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que retira do Executivo a função de homologar terras indígenas, transferindo essa função para os parlamentares.
Na semana passada, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) apresentou suas reivindicações sobre o assunto a Jair Bolsonaro. Eles foram taxativos ao pedir o cancelamento de demarcação de novas terras indígenas.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) apresentou no último dia 19, a nota pública “Eleições 2018: Em defesa da democracia e dos nossos direitos” para reforçar o alerta em proteção à vida e aos direitos assegurados pela Constituição Federal e tratados internacionais assinados pelo Brasil, tendo em vista o posicionamento de Bolsonaro.

“Jair Bolsonaro, defensor da ditadura militar e das práticas de tortura, pretende entregar as riquezas nacionais ao capital internacional, regredir com as conquistas sociais, não demarcar mais nem um centímetro de terra indígena e quilombola, desmarcar terras indígenas como a Raposa Serra do Sol, facilitar o roubo e exploração das terras indígenas e dos bens naturais pelo agronegócio e os grandes empreendimentos, colocar mais veneno na mesa dos brasileiros, flexibilizar a legislação ambiental, principalmente as regras do licenciamento ambiental, acabar com os órgãos de fiscalização e juntar o Ministério do Meio Ambiente com o Ministério da Agricultura (o ministério dos ruralistas), acabar com o Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBIO) e a FUNAI, armar a população contra os pobres, declarar guerra ao ativismo socioambiental e de direitos humanos e tratar como inimigos os movimentos e organizações sociais que se organizam e mobilizam para defender a democracia e os direitos”, afirma a nota.


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