24/04/2024 - Edição 540

Poder

Show de horrores

Publicado em 03/08/2018 12:00 -

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Foi um verdadeiro show de horrores a entrevista de Jair Bolsonaro (PSL) no programa Roda Viva.  Afirmou ser vítima de fake news, mas repetiu várias afirmações falsas ou distorcidas sobre sua própria trajetória.

Ao ser questionado, por exemplo, sobre texto do jornal suíço Tribune de Genève que o descreve como homofóbico, misógino e racista, o presidenciável reagiu com espanto e com questionamentos sobre o que levaria as pessoas a chegar a tal conclusão.

Sobre a homofobia, Bolsonaro diz em todas as suas manifestações, e repetiu nesta segunda, que não tem nada contra gays e que sua única ação relacionada ao tema se deu a partir de 2011 no combate ao que ele e apoiadores classificam como "kit gay".

Resumindo seu discurso na campanha e no Roda Viva, o candidato do PSL teria sido um dos responsáveis por barrar, no Congresso, a suposta intenção do governo federal de distribuir a criancinhas de seis anos de idade material pornográfico de estímulo à homossexualidade. 

"O que não pode é o pai chegar em casa e encontrar o Joãozinho, de seis anos de idade, brincando de boneca por influência da escola", afirmou no Roda Viva.

O discurso de Bolsonaro é falso, nessa questão, em dois pontos cruciais. 

O primeiro é o de que o kit anti-homofobia debatido no Ministério da Educação em 2011 tinha como destinatários professores do ensino médio de escolas com histórico de discriminação contra estudantes gays. A versão preliminar do material seria apresentada a alunos, de 14 anos em diante, a critério de cada escola. 

O kit continha três vídeos sobre transexualidade, bissexualidade e homossexualidade que foram considerados adequados pela Unesco (órgão da ONU para a educação). "O material do projeto Escola sem Homofobia está adequado às faixas etárias e de desenvolvimento afetivo-cognitivo a que se destina", afirmou a organização à época.

Além disso, não é verdade que a ação de Bolsonaro nesse tema se restrinja "à briga contra o material escolar", como ele repetiu nesta segunda.

O candidato tem um retrospecto de declarações contra gays, anteriores e posteriores a esse episódio.

"Não vou combater nem discriminar, mas, se eu vir dois homens se beijando na rua, vou bater", afirmou em 2002. Em 2010, voltou à carga: "Se o filho começa a ficar assim, meio gayzinho, [ele] leva um couro e muda o comportamento dele." No ano seguinte, reforçou: "Seria incapaz de amar um filho homossexual. Não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí."

Bolsonaro também negou no Roda Viva tratar mulheres com desapreço, mas em entrevista de 2014 ele defendeu patrões que pagam menos a funcionárias sob o argumento de que as mulheres engravidam, posição que reiterou dois anos depois.

"Entre um homem e uma mulher jovem, o que o empresário pensa? 'Poxa, essa mulher tá com aliança no dedo, daqui a pouco engravida, seis meses de licença-maternidade. (…) Por isso que o cara paga menos para a mulher. (…) Eu sou um liberal, se eu quero empregar você na minha empresa ganhando R$ 2 mil por mês e a Dona Maria ganhando R$ 1,5 mil, se a Dona Maria não quiser ganhar isso, que procure outro emprego! O patrão sou eu", afirmou em entrevista ao jornal Zero Hora.

Dois anos depois, reiterou a posição em entrevista à apresentadora Luciana Gimenez na RedeTV! "Eu não empregaria [homens e mulheres] com o mesmo salário", afirmou, ressalvando: "Mas tem muita mulher que é competente."

Sobre racismo, Bolsonaro disse no Roda Viva que se tivesse tal atitude estaria preso, tendo em vista a prática ser crime no Brasil.

Foi lembrado que responde a denúncia da Procuradoria-Geral da República por ter dito que em um quilombola que visitou em São Paulo "o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas" e quem nem pra procriar eles serviriam mais.

"Jair Bolsonaro tratou com total menoscabo os integrantes de comunidades quilombolas. Referiu-se a eles como se fossem animais, ao utilizar a palavra 'arroba'. Esta manifestação, inaceitável, alinha-se ao regime da escravidão, em que negros eram tratados como mera mercadoria", escreveu na denúncia a procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Bolsonaro também foi alvo de representação por ter dito, em entrevista ao programa CQC, da TV Bandeirantes, que não iria discutir "promiscuidade" em resposta a uma pergunta da cantora Preta Gil sobre como ele reagiria caso um filho seu se apaixonasse por uma negra.

Após a veiculação do programa, o parlamentar disse que tinha entendido "gay" no lugar de "negra".

O caso foi arquivado no Supremo, sob o argumento de que Bolsonaro goza de imunidade parlamentar e porque a emissora não forneceu a gravação original, sem edição, que permitisse juízo de valor sobre a possibilidade de engano em relação à pergunta.

Bolsonaro também disse na entrevista ao Roda Viva abominar a tortura, mas para além de ser um defensor de integrantes da ditadura militar envolvidos com a prática, ele próprio a defendeu em entrevistas durante sua carreira política


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