19/04/2024 - Edição 540

Poder

Ou vota reforma da Previdência em fevereiro ou não vota mais, diz Maia a Temer

Publicado em 31/01/2018 12:00 -

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O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deu um ultimato ao presidente Michel Temer (MDB-SP): ou ele reúne os 308 votos necessários para aprovar a reforma da Previdência em fevereiro ou não vota mais este ano. O recado foi dado durante café da manhã promovido no último dia 31, em Brasília, pela Associação Brasileira de Relações Institucionais (Abrig).

“Não dá para carregar isso para além do mês de fevereiro”, avisou o deputado, que no final do ano passado admitiu a pretensão de disputar a Presidência da República. “Votou em fevereiro, votou. Não votou, será a agenda da eleição. Aqueles que até não queiram discutir na eleição, é melhor votar alguma coisa agora”, afirmou.

Rodrigo Maia criticou o governo por ter falhado na comunicação com a sociedade sobre a necessidade de se aprovar com urgência a reforma previdenciária. Na visão dele, o Executivo não conseguiu convencer a população de que o rombo da Previdência é inadministrável e precisa ser atacado imediatamente.

Também condenou o governo por ter cortado linhas de crédito da Caixa Econômica Federal para a área de saneamento. Citou ainda as pautas mais importantes que a Câmara deve enfrentar neste ano. Entre elas, o licenciamento ambiental, porque “já tem acordo entre os ambientalistas e o agronegócio”; a regulamentação das agências reguladoras; o cadastro positivo; a Lei de Saneamento; e propostas de prevenção e combate à violência urbana. Nas suas palavras, tais medidas legais são fundamentais porque o problema deixou de ser exclusivo de cidades como Rio e São Paulo e, em razão da ação dos grupos organizados, “as nossas penitenciárias deixaram de ser escolas do crime e se tornaram o QG do crime”.

Maia chegou com 1h22 de atraso no restaurante onde foi servido o café da manhã. Teve, no entanto, uma boa explicação para isso. Pouco antes, havia nascido o seu segundo filho – Felipe. Sem gravata e de camisa polo azul, voltou a dar mostras de sua preferência por trajes informais. “Tirando o paletó, esta é a roupa que gosto de usar”, comentou.

O encontro, que fez parte da série “Café com Autoridades”, reuniu executivos do setor privado e jornalistas, todos interessados em ouvir o político que ocupa o segundo posto na cadeira sucessória do país. Além de ser na prática o “vice” do presidente Michel Temer, Rodrigo Maia preside a Câmara pela segunda vez.

Previdência

Em sua fala inicial, Rodrigo Maia disse que “o mito da Previdência está diminuindo, mas não está diminuindo como o governo diz”: “A sociedade exige hoje igualdade de modelos, tanto para o setor público quanto para o setor privado. Pros novos servidores é assim, mas para os antigos não. Essa é uma exigência da sociedade, tem apoio. O regime geral, não. A gente precisa falar a verdade. A sociedade ainda acha que o Estado brasileiro ainda tem condição de suprir o sistema previdenciário e o sistema não está quebrado”.

Acrescentou que o governo ainda não tem votos para aprovar as mudanças na Previdência: “Quando eu vejo autoridade do governo falando ‘a Previdência quebrou’, a autoridade precisa explicar primeiro para o cidadão por que quebrou para que ele possa acreditar. Hoje, 80% dos brasileiros não acreditam que o governo não tenha outra fonte para cobrir a Previdência. A gente sabe que não tem, mas a gente precisa explicar melhor para que possa chegar no mês de fevereiro e tenha alguma chance de aprovar a reforma da Previdência. Eu sempre digo que o ideal é aprovar a reforma que saiu do governo, mas a gente não tem votos para isso. A gente precisa construir alguma solução que pelo menos ajude o próximo presidente da República a começar o seu governo sem um problema grave seja no teto de gasto, seja na regra de ouro”.

Fixação de idade mínima para aposentadoria, na sua avaliação, é uma proposta que já foi assimilada pela sociedade e pelo Parlamento. O maior obstáculo agora, acredita Rodrigo Maia, é mostrar a necessidade de alterar as normas previdenciárias para o funcionalismo, estabelecendo inclusive um “pedágio” (regra de transição) para os servidores mais antigos.

Questionado por um dos participantes do café da manhã sobre possíveis dificuldades que poderiam ser acarretadas pelo adiamento da reforma da Previdência, Rodrigo Maia respondeu que o problema é que as denúncias contra Temer reduziram a base governista na Câmara para algo próximo de 250 deputados. Ele também ironizou declarações atribuídas a técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI): “Outro dia saiu uma matéria do FMI que prefere esperar para fazer uma reforma da Previdência mais profunda. Não sei em qual país viu uma reforma profunda da Previdência”.

Logo em seguida, voltou a criticar a comunicação do governo: “A Previdência está quebrada, a Previdência vai gerar um descontrole da dívida pública, só que a sociedade não acredita nisso. O que que eu posso fazer? Culpa de quem? Culpa nossa, que comunicamos mal. Culpa do governo, que tem um canhão na mão que são os comerciais, e está comunicando mal. É um dado da realidade. Culpa nossa também que, quando a gente fala, não fala direito, né?”

Missão difícil

O presidente Michel Temer admitiu na quinta-feira (1º) que pode deixar de lado a votação da reforma da Previdência caso não consiga reunir os 308 votos necessários para aprovar a proposta na Câmara em até três semanas. Esse é o prazo fixado por ele para que o assunto seja definido pelos deputados em plenário. “Nós vamos insistir muito na reforma da Previdência. Agora, de fato, é preciso ter votos. Nós temos duas, três semanas para fazer a avaliação”, disse.

Um dos principais aliados de Temer, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que, se a reforma não for votada neste mês, o governo não tem a intenção de insistir indefinidamente. “Tem momentos em que a batalha tem de parar”, afirmou. As declarações dos dois mostram uma inflexão no discurso do governo, que tratava a votação da reforma da Previdência como caso de vida ou morte para as finanças do públicas do país e uma batalha da qual não abriria mão.

“Eu já fiz a minha parte nas reformas e na Previdência”, afirmou Temer. “Agora é preciso convencer o povo, porque o Congresso sempre ecoa a vontade popular”, completou. O presidente tem participado de programas populares para tentar diminuir a resistência da população em torno do tema. Já tratou do assunto na TV com Silvio Santos e Ratinho, entre outros.

O presidente disse que que avaliará com Maia se o texto será colocado em pauta no dia 19 de fevereiro, mesmo sem a certeza dos 308 votos necessários para aprovação.

Eliseu Padilha entende que o governo não deve insistir na pauta caso o texto não seja votado este mês. “Se passar de fevereiro, não podemos ficar com essa pauta de forma indefinida. Mas estamos com fé de que vamos construir condições para votar a reforma em fevereiro”, ponderou.

Empurrando com a barriga

Temer não tem o respaldo político necessário para dialogar com a sociedade e votar a reforma da Previdência. Deveria deixar a votação da proposta para o sucessor, presidente a ser eleito pelo voto popular. A opinião não é de uma liderança oposicionista, mas do líder do MDB no Senado, Raimundo Lira (PB).

Para o senador, só um chefe do Executivo consagrado pelas urnas tem apoio suficiente propor mudanças profundas que mexem diretamente com a vida de milhões de brasileiros. Lira conta que fez a sugestão a Temer para que desista da votação durante reunião com a bancada do MDB no ano passado. O presidente ouviu, mas não disse nada.

“Como é um assunto tão importante, deveria ser feito com a profundidade necessária e com o apoio e o convencimento da população. Somente um presidente eleito pode fazer isso”, acredita Lira.

O líder do MDB diz que considera fundamental a aprovação de uma reforma da Previdência, mas evita expressar sua opinião sobre a proposta enviada por Temer ao Congresso. “Não sou contra nem a favor, não tenho opinião formada. Só vamos entrar no assunto quando ela passar na Câmara. Aí passa a ser discussão do Senado.”

Ele admite que não há certeza se a proposta será aprovada pelos deputados. “A gente não sabe se vai ser aprovada ou não. Se for aprovada, qual será o conteúdo dela. A partir daí, quando ela atravessar o tapete, vamos discutir. Não adianta pensar em um assunto dessa importância sem ser de forma objetiva. Seria até uma interferência no trabalho da Câmara”, explica.

Para Raimundo Lira, não falta legitimidade para Temer – presidente que chegou ao Planalto após um processo de impeachment de Dilma –, mas, sim, maior respaldo político. “Não é falta de legitimidade. A maior reforma que um país pode promover é por meio de uma Assembleia Constituinte. Os constituintes são eleitos para isso. Ninguém consegue fazer uma reforma profunda sem uma Constituinte. Considero a reforma da Previdência tão importante que deveria ter esse respaldo popular”, avalia.

A posição do líder do MDB no Senado prenuncia a dificuldade que o governo terá para concretizar a reforma da Previdência. O Planalto reconhece que ainda não tem os 308 votos necessários para aprovar a proposta na Câmara. Ministros e lideranças governistas na Casa correm contra o relógio para que o texto seja votado ainda em fevereiro. Depois disso, a batalha será no Senado, onde também haverá resistência.

Presidente da comissão especial do impeachment em 2016, Raimundo Lira está na liderança do MDB desde julho do ano passado. Ele substituiu Renan Calheiros (AL), que deixou o posto após fazer sucessivos ataques a Temer e atuar como oposicionista. Com um perfil considerado conciliador, o senador paraibano ainda tem o desafio de apaziguar uma bancada dividida. O grupo de Renan no Senado resiste à reforma da Previdência e outras iniciativas do governo. Já a ala liderada por Romero Jucá (RR) dedica fidelidade absoluta ao presidente.


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