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Artigo da Semana

Entenda por que a reforma da previdência de Temer é inconstitucional

Publicado em 14/12/2016 12:00 -

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A Proposta de Emenda à Constituição 287/2016, de autoria do Poder Executivo, altera artigos da Constituição de 1988 no sentido de reformar a seguridade social e estabelecer regras de transição. Prestes a ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, a PEC tem o efeito de abolir direitos e garantias individuais, o que torna a proposta inconstitucional (artigo 60, parágrafo 4º, do texto constitucional). Listamos a seguir nove inconstitucionalidades da Reforma da Previdência.

1) Violação ao Direito Fundamental à Previdência – O direito à previdência integra o rol dos direitos humanos e está assentado no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 e no artigo 9º do Protocolo de São Salvador (Decreto 3321/99, c/c artigo 5º, § 2º, da CF/88). A PEC cria entraves excessivos à aquisição dos benefícios previdenciários, de um lado, e os reduz brutalmente, de outro, o que equivale a inviabilizar seu exercício, configurando ofensa à cláusula pétrea consagrada no artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

2) Violação ao Princípio do Não-Retrocesso – Decorrência dos princípios da dignidade humana e da segurança jurídica, que constituem princípios norteadores do ordenamento jurídico brasileiro. Ele é reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (vide ARE 639337), e está assentado na Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969, obrigando o Estado a preservar os direitos sociais já concretizados. Assim, a PEC que reduz substancialmente os direitos previdenciários conferidos pela Constituição Federal também por este motivo malfere direitos e garantias individuais, em ofensa à cláusula pétrea consagrada no artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

3) Revogação das regras de transição das PECs 20/98 e 41/03 – Ao propor a revogação expressa das regras de transição estabelecidas pelas PECs 20/98 e 41/2003, a PEC retira garantia fundamental dos trabalhadores amparados por elas, além de conferir retroatividade às novas regras propostas, e atribuir tratamento desigual aos servidores em igualdade de posições exclusivamente em função da idade destes, configurando mais uma vez ofensa à cláusula pétrea consagrada no artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

4) Tratamento anti-isonômico entre homens e mulheres – Ao estabelecer a mesma idade mínima para aposentadoria para homens e mulheres, a PEC confere tratamento igual aos desiguais e retira o tratamento protetivo conferido às mulheres pela Constituição Federal de 1988, a ofender a cláusula pétrea consagrada no artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

Prestes a ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, a PEC da Previdência tem o efeito de abolir direitos e garantias individuais, o que torna a proposta inconstitucional.

5) Alteração das idades para aposentadoria compulsória e voluntária – A PEC propõe o aumento das idades de aposentadoria compulsória e voluntária sempre que se verificar aumento da expectativa de vida da população. Ao fazê-lo, sem nem ao menos determinar se tal mudança ocorrerá por meio de emenda, lei ou automaticamente, atenta contra a segurança jurídica. Por outro lado, também atentando contra a segurança jurídica e contra o princípio da dignidade humana, não prevê a hipótese contrária, em que se verificar a redução da expectativa de vida, tendência hoje reconhecida por exemplo nos Estados Unidos da América em razão de problemas coletivos de saúde que igualmente acometem a população brasileira.

6) Redução de benefícios (Pensão por morte e acumulação de benefícios) – A PEC atenta contra os princípios da segurança jurídica e da dignidade humana, bem como o princípio do não retrocesso, ao estabelecer redutores significativos para benefícios adquiridos após longo período de contribuição de forma injustificada.

7) Violação ao Princípio da Solidariedade – O princípio norteia o regime previdenciário estabelecidos pela Constituição Federal e é ferido fatalmente pela PEC, eis que se requer um enorme sacrifício dos contribuintes do sistema a fim de sustentar os atuais aposentados, com a perda de direitos futuros daqueles. Ora, a solidariedade não pode ser uma via de mão única, com o sacrifício de direitos de alguns em prol de outros. A ofensa se mostra ainda mais grave com a exclusão da reforma proposta de todos os integrantes das Forças Armadas, que acumulam benefícios diferenciados e respondem por parcela significativa dos gastos do governo com previdência, a atingir também a isonomia. Por outro lado, como se pedir sacrifício dos trabalhadores ao mesmo tempo em que se anuncia um novo REFIS, a envolver inclusive tributos que custeiam a própria seguridade social

8) Desvinculação da Pensão por Morte do Salário Mínimo – Trata-se, talvez, de um dos aspectos mais perversos da PEC, pois atinge majoritariamente a população de baixa renda. Ao excepcionar a aplicação do § 2º, do artigo 201, da CF/88, no cálculo da pensão por morte, a PEC retira proteção fundamental dos beneficiários, privando-os do mínimo necessário à subsistência, o que ofende frontalmente os direitos sociais dos trabalhadores, conforme assentados no artigo 7º, da Constituição Federal de 1988, e, por conseguinte a cláusula pétrea consagrada no artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

9) Retirada da proteção ao Trabalhador Rural – A PEC altera completamente o regime previdenciário do trabalhador rural, retirando-lhe o caráter assistencial e protetivo que a Constituição Federal lhes estende, em vista do reconhecido estado de vulnerabilidade destes trabalhadores. A PEC impõe uma idade mínima elevada a trabalhadores que começam sua vida produtiva ainda na infância, além de exigir destes a comprovação do recolhimento de contribuições pelo período mínimo de 25 anos, equiparando-os aos trabalhadores urbanos e ignorando as peculiaridades e dificuldades da atividade rural. Ao fazê-lo a PEC mais uma vez ofende os princípios da dignidade humana, da segurança jurídica e do não-retrocesso, ofendendo a cláusula pétrea do artigo 60, § 4º, IV, da CF/88.

Paulo Teixeira – Deputado federal (PT/SP), bacharel em Direito e mestre em Direito do Estado pela USP.


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