29/03/2024 - Edição 540

Poder

Machado diz que 76% de propinas a políticos não foram doações oficiais

Publicado em 16/06/2016 12:00 -

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Em planilhas que produziu e entregou à Procuradoria Geral da República (PGR), o ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras, Sérgio Machado, apontou que 76% dos recursos que, segundo ele, fez chegar às mãos de políticos diversos entre 2003 e 2014 não foram contabilizados como doação eleitoral na Justiça Eleitoral.

Machado entregou planilhas com referências nominais a 19 políticos. A soma dos valores dessas anotações indica que o delator assumiu ter entregue R$ 106,3 milhões em "vantagens ilícitas". Ele separou os pagamentos em duas modalidades: "vantagens ilícitas em doações oficiais" e "vantagens ilícitas em dinheiro". No primeiro caso, os recursos atingem R$ 25,3 milhões, enquanto as entregas em espécie ficam em R$ 81 milhões.

Houve políticos que só receberam em forma de doação eleitoral e outros foram beneficiados pelos dois caminhos, sempre segundo a delação de Machado.

No caso do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Machado disse que lhe remeteu ao todo R$ 32 milhões. Desse total, R$ 8,2 milhões seguiram por meio de doações eleitorais, incluindo R$ 1 milhão para o filho do senador, Renan Filho (PMDB-AL), candidato a governador de Alagoas em 2014. O valor teria sido doado pela empreiteira Queiroz Galvão. Os outros R$ 24 milhões foram "em dinheiro", por meio de um sistema que Machado diz ter criado, envolvendo codinomes e senhas e encontros com assessores do senador.

Nas anotações sobre o presidente interino Michel Temer (PMDB-SP) e o ex-candidato a prefeito de São Paulo Gabriel Chalita, então filiado ao PMDB, há registro de R$ 1,5 milhão como doação eleitoral no ano de 2012.

O grosso dos recursos que chegou ao ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), na versão de Machado, também foi entregue em dinheiro. Do total de R$ 18,5 milhões que ele diz entregue a Sarney, apenas R$ 2,25 milhões foram em doações eleitorais, incluindo R$ 400 mil para a campanha eleitoral de Sarney Filho, em 2010, então no PV (Partido Verde) e hoje ministro do Meio Ambiente do governo Temer.

Em relação ao ministro do Turismo, Henrique Alves (PMDB-RN), Machado disse que os pagamentos ocorreram sempre por doações eleitorais, de 2008 a 2014, no valor total de R$ 1,55 milhão. Alves pediu demissão na quinta-feira (16).

De acordo com as anotações de Sérgio Machado, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) recebeu R$ 4,2 milhões em doações eleitorais ao longo das campanhas de 2010, 2012 e 2014 e outros R$ 16,8 milhões em dinheiro. As doações eleitorais teriam sido feitas pelas empreiteiras Camargo Corrêa, Queiroz Galvão e Galvão Engenharia.

Ministro dos governos Lula e Dilma, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) recebeu vantagens, de acordo com Machado, pelas duas formas: R$ 2,7 milhões em doações e R$ 20,9 milhões em espécie.

Sem Planilhas

Embora não tenha entregue planilhas como nos outros casos, Sérgio Machado também descreveu, nos depoimentos que prestou como parte do acordo de delação premiada fechado com a PGR (Procuradoria Geral da República), ter feito pagamentos a diversos outros políticos.

Sobre o senador Aécio Neves (PSDB-MG), Machado disse que participou de um esquema de arrecadação de recursos para pagamento a parlamentares que apoiassem o tucano na campanha pela presidência da Câmara dos Deputados, em 2000. Do total de R$ 7 milhões arrecadados, disse Machado, Aécio foi beneficiado com R$ 1 milhão em espécie.

Machado também não entregou planilhas sobre o deputado Heráclito Fortes, hoje no PSB, e Sérgio Guerra, falecido senador do PSDB de Pernambuco.

Porém, segundo Machado, ambos foram subornados em 2006 para que não criassem problemas para a aprovação de um projeto de lei no Senado que era de interesse da Transpetro e de estaleiros e que estava sendo bloqueado em uma comissão da Casa –na época Heráclito era senador pelo DEM. Machado disse que pagou Heráclito com R$ 500 mil na forma de doações oficiais de campanha, mas ficou devendo outros R$ 500 mil. Segundo Machado, Heráclito "cobrou muito" esse pagamento.

Temer rebate

Com receio dos impactos da delação de Sérgio Machado na governabilidade e na imagem da gestão peemedebista, o presidente interino, Michel Temer, chamou nesta quinta-feira (16) de "mentirosas" e "criminosas" as acusações feitas pelo ex-presidente da Transpetro e chegou a dizer que, se tivesse cometido o "delito irresponsável" apontado por ele, "não teria até condições de presidir o país".

Temer decidiu fazer o pronunciamento, sem direito a perguntas de jornalistas, depois de avaliar que a nota divulgada na quarta-feira (15) não havia tido o efeito esperado e era necessário fazer uma "defesa mais contundente". Na nota, ele já negava ter feito qualquer pedido de "doação ilícita" a Machado.

"Alguém que teria cometido aquele delito irresponsável que o cidadão Machado apontou não teria até condições de presidir o país", afirmou Temer em pronunciamento na manha de quinta-feira (16), convocado de surpresa pela sua assessoria.

Em sua fala, sem a oportunidade de perguntas da imprensa, o peemedebista ressaltou que não podia deixar passar em branco as denúncias e afirmou que nenhum "fato leviano" irá atrapalhar a atividade governamental.

"Quero registrar em alto e bom som que nada embaraçará nossa missão e desejo de fazer com que neste período que esteja à frente da Presidência da República continuemos a trabalhar em favor do Brasil e do povo brasileiro", disse.

Segundo o delator, o presidente interino pediu em 2012, na base aérea de Brasília, doação de recursos ilícitos para a campanha a prefeito de São Paulo de Gabriel Chalita. Tanto Temer como Chalita negam as acusações.

Assessores do presidente disseram que Temer quis mostrar que, ao contrário da presidente Dilma, que demorava a se manifestar sobre acusações contra ela, o peemedebista vai sempre responder imediatamente qualquer "tipo de insinuação" contra ele.

"Nossa honorabilidade está acima de qualquer função ou tarefa pública. Eu quero me dirigir ao povo brasileiro para dizer que não deixarei passar em branco essas afirmações levianas", afirmou.

Sem Demissões

Na declaração, o peemedebista também fez um balanço de um mês de sua gestão, ignorando as demissões dos ministros Romero Jucá (Planejamento) e Fabiano Silveira (Transparência), que criticaram em gravações a Operação Lava Jato.

A ideia inicial sugerida ao peemedebista é de que ele fizesse a apresentação em um pronunciamento em cadeia nacional de televisão e rádio na sexta-feira (17).

A proposta era que, assim, ele também se apresentasse formalmente pela primeira vez ao país como presidente interino.

Com receio de que a denúncia de Machado estimulasse panelaços, o peemedebista decidiu abandonar a ideia pelo menos por enquanto.

No balanço, ele afirmou que lançou mão de iniciativas para "tirar o país da crise profunda em que ele mergulhou".

"Nós eliminamos ministérios, cortamos 4.200 cargos de livre nomeação e mais de 10 mil cargos comissionados", afirmou.

Ele disse ainda que desenvolveu uma relação "muito fértil" com o Congresso Nacional, restabelecendo a harmonia entre Executivo e Legislativo.

"E lançamos um ajuste fiscal, uma nova meta fiscal que, como pude perceber, é o mais adequada para o momento que passa o país", disse.

Além das demissões, o peemedebista também não citou os recuos governamentais, como a recriação, por exemplo, do Ministério da Cultura, que havia sido inicialmente extinto.


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