18/04/2024 - Edição 540

Especial

Quanto vale a vida de um índio?

Publicado em 15/06/2016 12:00 -

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Um índio morreu. Não é novidade. Esta tem sido a regra no constante conflito por terra que se arrasta há décadas no Mato Grosso do Sul. De um lado os guarani-kaiowá, um povo destroçado culturalmente devido a sistemática destruição de suas referências étnicas, que tem na terra ancestral o principal pilar. De outro, fazendeiros convictos de que a ordem jurídica do homem branco lhes dá direito a posse daquele chão. O resultado deste choque cultural tem sido, via de regra, mortal para a população indígena. Na última terça-feira (14), mais do mesmo. Fazendeiros e capangas apelaram para a violência na tentativa de expulsar os índios da fazenda Yvu, a 20 km de Caarapó (MS). O local, reivindicando como terra tradicional guarani-kaiowá, havia sido ocupada no domingo (12). O agente de saúde indígena Cloudione Aquileu Rodrigues Souza, de 26 anos, foi morto com dois tiros à queima-roupa. Outros cinco indígenas foram feridos à bala, entre eles uma criança de 12 anos – atingida por um disparo no estômago.

"O jovem agente foi morto covardemente por homens armados que atiraram em cerca de cem indígenas, incluindo quatro agentes de saúde indígena, que estavam reunidos no território próximo à aldeia Teikuê quando foram surpreendidos por homens armados em aproximadamente 60 veículos (caminhonetes)", afirmou o secretário especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde em Brasília, Rodrigo Rodrigues. "Usaram balas de borracha e balas de verdade", reforçou o professor indígena Eliel Benites, da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).

Um grupo de 100 famílias havia reocupado o território chamado de tekoha Toropaso no domingo. "Quando chegamos lá, não tinha ninguém na fazenda, só um funcionário que era indígena. Explicamos nossa luta e ele se propôs a ficar com nós", relata uma liderança indígena que pediu para não ser identificada. No dia seguinte, os indígenas receberam a Polícia Federal (PF), acompanhada da Força Nacional, Polícia Militar e Polícia Civil, além de duas caminhonetes em que estavam, segundo a liderança, alguns fazendeiros da região. Após a saída da polícia, um grupo de carros se aglomerou num ponto a cerca de três quilômetros do acampamento indígena, e os observou por cerca de quatro horas. Na terça-feira (14), por volta das sete da manhã, cerca de 200 carros se concentraram no mesmo local do dia anterior. "Começamos a avistar carro chegando. Vinha mais de duzentos carros. Fizeram uma divisão, dois grupos: um veio de um lado, pela divisa da aldeia, fizeram um cerco na gente. Do outro lado, veio pá cavadeira [tipo de trator] e arrebentou a cerca, e começaram a entrar pelo campo. Vieram atirando, atirando, tiroteio feio mesmo, arma pesada", afirmou a liderança.

Em filmagens feitas pelos próprios guarani-kaiowá é possível observar cerca de uma centena de homens queimando motos e demais posses dos indígenas. Alguns agressores, vestidos de preto, gritavam “Bugres! Bugres!”, forma pejorativa usada para se referir aos indígenas na região sul do país. Na filmagem é possível ver caminhonetes circulando ao redor dos capangas e das fogueiras usadas para incendiar os pertences dos guarani-kaiowá.

Os cinco índios feridos no confronto foram internados no Hospital da Vida de Dourados (MS). Além de Josiel Benites, o menino de 12 anos, estão no estabelecimento Jesus de Souza, de 29 anos, também ferido na barriga, Libesio Marques Daniel, de 43 anos, ferido no tórax, barriga e cabeça, Norivaldo Mendes, de 37 anos, ferido no tórax e barriga e Valdilio Garcia, de 26 anos, ferido no tórax. O estado de saúde de todas as vítimas é considerado grave.

De acordo com relatos obtidos pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e pelo Instituto Socioambiental (ISA), fazendeiros se aproximaram com caminhonetes, motocicletas e um trator e efetuaram os disparos. Fugindo dos tiros, os indígenas correram para dentro de uma reserva próxima.

Após o confronto, um grupo de índios rendeu três policiais militares e os espancou com pedaços de madeira. A guarnição da PM foi à região para averiguar a extensão do conflito e acompanhar uma equipe do Corpo de Bombeiros que foi socorrer as vítimas do tiroteio, mas acabou cercada pelos guarani-kaiowá. "Ambos os lados estão armados, mas os fazendeiros estão mais escondidos, acho que por isso os índios não conseguiram atingi-los. Uma guarnição nossa esteve no local e foi rendida pelos índios, mas conseguiu ser resgatada pelo Corpo de Bombeiros", disse o tenente-coronel Carlos Silva no calor do momento. Um policial militar contou, em uma rede social, que os índios ficaram com três pistolas, uma escopeta, algemas e onze carregadores pertencentes à PM.

O local do conflito foi uma das áreas declaradas como terra indígena nas últimas semanas da gestão da presidente Dilma Rousseff, afastada em 12 de maio para responder a processo de impeachment. Com Michel Temer no poder, lideranças indígenas temem a revogação da decisão. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai) divulgou na época, a terra tem 55,5 mil hectares e iria atender cerca de 5,8 mil indígenas guarani-kaiowá de quatro comunidades diferentes entre os municípios de Caarapó, Laguna Caarapã e Amambai, todos no MS.

Tradição x Expansão

Raquel Silvana Cerqueira Amado Buainain, dona da fazenda Yvu, herdou a propriedade após a morte de Sylvio Amado, em 2014. Ele foi um dos fundadores da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul). “Essa fazenda foi adquirida, formada e montada desde a década de 60 por Sylvio Mendes Amado. Ele constituiu a fazenda há mais de 50 anos. A fazenda é próxima da aldeia indígena e eles tinham convivência pacifica, nunca nesses anos todos índio reclamou que teria invadido a terra deles e vice-versa. Mas depois que a Funai baixou a portaria há um mês, criou-se uma convulsão social nas áreas pacificas e produtivas do estado de Mato Grosso do Sul”, diz o advogado da fazendeira, Gervásio Oliveira.

Os estudos antropológicos contratados pela Funai identificaram quatro territórios tradicionais no local – os chamados tekoha: Javorai Kue, Pindo Roky, Urukuty e Laguna Joha – onde vivem aproximadamente 5,8 mil pessoas. Segundo a Fundação, os guarani-kaiowá que viviam na região foram forçados a sair da terra por volta de 1822, quando a produção de erva mate e a chegada de colonos gaúchos intensificaram o processo de expropriação dos territórios tradicionais e de expulsão das comunidades indígenas. Os antropólogos responsáveis pelo estudo de identificação e delimitação da área concluíram que os guarani-kaiowá nunca abandonaram seus vínculos históricos, mantendo forte relação com a terra. Parte do grupo indígena hoje vive confinada na Reserva Indígena de Caarapó, de apenas 3,5 mil hectares.

O procedimento de identificação e delimitação da terra indígena é resultado de um Compromisso de Ajustamento de Conduta (CAC) que a Funai assinou com o Ministério Público Federal (MPF) em 12 de novembro de 2007. Em maio, os indígenas estiveram em Brasília, pressionando pela publicação do relatório da terra indígena Dourados-Amambai Peguá. Sob pressão, a Funai assinou o relatório. O ataque, para as lideranças indígenas, é uma tentaiva de intimidar as autoridades públicas e expulsar os guarani-kaiowá da região. Em nota, o CIMI categorizou como "paramiltar" a ação, e afirma que, no último semestre, foram registrados ao menos vinte e cinco casos similares entre os guarani-kaiowa do estado.

Ataque anunciado

Poucas horas antes do ataque, uma nota publicada pelo jornal Caarapó News revelou que a intenção dos produtores rurais de ir à área retomada já era conhecida e que a Polícia Federal havia estado no local na tarde de segunda-feira (13).

Nascido em Caarapó, o antropólogo Diógenes Cariaga, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reiterou que a situação de conflito era anunciada e disse que o Sindicato Rural de Caarapó estaria incitando os produtores a agir contra as retomadas indígenas. No dia 18, logo após a publicação do relatório de identificação da TI Dourados-Amambaipegua I, o sindicato rural do município mobilizou os produtores rurais da região para discutir medidas contra a demarcação com advogados da Famasul no Parque de Exposições Pedro Pedrossian.

“Esse ataque é fruto da leniência e da lentidão do Estado Nacional em resolver a demarcação das Terras Indígenas”, criticou Cariaga, para quem as atitudes violentas dos produtores são fruto da sensação de impunidade e do descaso dos poderes públicos em investigar denúncias de formação de milícias financiadas por produtores. Em agosto de 2015, o ataque à comunidade indígena da TI Ñande Ru Marangatu que vitimou o jovem Simião Vilhalva, ocorreu horas após uma reunião promovida pelo Sindicato Rural de Antônio João, na fronteira com o Paraguai.

O advogado Gustavo Passarelli, assessor jurídico da Famasul, que representa 69 sindicatos com cerca de 55 mil produtores rurais, disse que a entidade tem orientado seus filiados a "ficarem dentro da legalidade, aguardar as decisões do Poder Judiciário" e evitar "qualquer ação que envolva violência".

Deslocamento compulsório

Na Reserva Indígena Caarapó, ou Te’ýikue, de onde partiram os guarani-kaiowa para retomar o território de Toro Passo, no último domingo, vivem cerca de seis mil indígenas, de famílias deslocadas de vários territórios tradicionais entre os rios Amambai e Piratini.

Cariaga explica: “Essas famílias foram levadas compulsoriamente para o interior da reserva e durante muitos anos foram obrigadas a permanecer lá. Com o processo de luta política dos índios pelo reconhecimento de direitos territoriais nos anos 1980, você tem um início da ação política dos indígenas em reaver os seus territórios. Essas retomadas são formas de os índios reaverem esses territórios no qual eles têm circulado historicamente”. Ele aponta que já na década de 1980 os guarani-kaiowá na região protagonizavam retomadas, como no caso de Rancho Guaimbé.

O antropólogo lembra também que Toro Passo e os outros territórios dentro dos limites da TI Dourados-Amambaipegua I fizeram parte de um Compromisso de Ajustamento de Conduta (CAC) firmado entre a Funai e o Ministério Público Federal, obrigando o órgão indigenista a publicar os estudos das áreas reivindicadas pelos indígenas. De 2007, quando o CAC foi assinado, até a delimitação da TI pela Funai já se passaram quase 10 anos.

Cariaga lembra que a mobilização dos guarani-kaiowá pela demarcação de terras na região de Caarapó já dura 30 anos e que outros episódios de violência têm sido registrados na região. “Outras áreas de retomada como Te’yjusu e Pindo Roky também foram vítimas de violências. Em Te’yjusu houve vários ataques – não só por armas de fogo, mas também por despejo de inseticidas sobre a população. Em Pindo Roky foi assassinado um adolescente kaiowa que pescava na represa no interior de uma propriedade, Denilson Barbosa. Esse é mais um caso de homicídio por conta da demarcação das terras nessa região”. Em Dourados, outra área indígena sofre ameaça de despejo esta semana: Apyka’i.

Apyka’i: resistência e genocídio

No último dia 10, o juiz federal Fábio Kaiut Nunes requisitou ao Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, o envio de tropas da Força Nacional de Segurança Pública para retirar os indígenas de Apyka'i. Dois dias antes, a Justiça notificou a liderança da comunidade, Damiana Cavanha. Ela foi levada até a sede da Funai para receber a notificação da oficial de Justiça, mas recusou-se a assinar o documento. "Não vou assinar nada. Pode cavar o buraco para enterrar todos, porque não vamos sair do nosso tekoha", afirmou. A Funai entrou com pedido de Suspensão de Liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), com o objetivo de evitar o confronto.

Não foi a primeira vez que o juiz substituto da 1ª Vara da Justiça Federal de Dourados decidiu pela reintegração de posse contra os guarani-kaiowa de Apyka'i. Na última decisão, em maio, Kaiut requisitou ao governo do Mato Grosso do Sul o uso da PM para o cumprir a reintegração, mas o pedido foi negado.

Mais de uma década vivendo na beira da estrada, sofrendo ataques de seguranças privados, barracos criminosamente incendiados a mando de produtores rurais, bebendo da água mais podre dos córregos envenenados pela monocultura – o Apyka'i figura como uma espécie de "comunidade modelo" do genocídio que sofrem os povos indígenas no Brasil.

Nove pessoas faleceram no local – oito, vítimas de atropelamentos, e uma envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam a retomada. Os moradores do tekoha sobrevivem essencialmente de doações e de cestas básicas oferecidas por apoiadores e pela Funai. Não tem acesso à água, à floresta, à educação, saúde, à segurança ou a dignidade mínima.

A usina

Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai (propriedade do pecuarista José Carlos Bumlai), especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelos Kaiowá de Apyka'i.

Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka'i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

Em 2015, José Carlos Bumlai foi preso no decurso da Operação Lava Jato, acusado de fazer parte de um esquema de corrupção e fraude no pagamento de dívidas de campanha eleitoral do Partido dos Trabalhadores.

Novo Governo, mesmo descaso

A questão indígena não foi tratada com respeito nos 13 anos do Governo do PT. Lula e Dilma tergiversaram sobre o problema, empurraram com a barriga. No Governo Temer (PMDB), a expectativa é ainda pior. Dias depois de assumir o Ministério da Justiça no governo provisório, o ex-secretário de Segurança do estado de São Paulo Alexandre de Moraes afirmou à imprensa que irá combater "movimentos de esquerda", e que ações de grupos que ocupem terras – em referência ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), citado pelo ministro – iriam "ser combatidas assim como os crimes". A luta indígena pela terra está entre os movimentos que o novo governo pretende combater.

O governo Dilma foi um dos que menos homologou terras indígenas desde que o país voltou a normalidade democrática. No entanto, o governo interino ameaça rever decisões recentes que beneficiaram os indígenas. O medo tem razão de ser. No último mês,  um grupo de lideranças indígenas se reuniu com Alexandre de Moraes. Eles queriam saber sobre a possível revisão de demarcações. O ministro deixou um clima de dúvida no ar. Ao seu entrevistado pelo jornal Folha de S.Paulo, Moraes reforçou ao afirmar que não haveria demarcações "no apagar das luzes”..

As áreas mais ameaçadas são as que foram delimitadas, declaradas ou homologadas nos últimos momentos do Governo Dilma, como as áreas em disputa pelos guarani-kaiowá no Mato Grosso do Sul, onde quase 400 indígenas já foram mortos mortos entre 2003 e 2014, segundo dados do CIMI. Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental (ISA), protocolou um ofício no Ministério da Justiça onde afirma que “os atos que reconhecem direitos territoriais indígenas não podem ser simplesmente revogados pelo Poder Executivo”. Ele embasa o argumento com jurisprudência do STF.

Voz em Brasília

Pressentindo o acirramento das políticas de descaso, Cerca de 50 indígenas da etnia guarani-kaiowá protestaram na Praça dos Três Poderes, em frente ao Palácio do Planalto, no dia 20 de maio, defendendo a demarcação de terras indígenas em Mato Grosso do Sul.

Segundo Leila Rocha, da comunidade Yuy Katu, no município de Japorã, os indígenas não sabem o que vai acontecer com a demarcação de terras no Governo Temer. “Nossa preocupação é com este governo que a gente não conhece. Estamos procurando nosso direito à terra. Muitas lideranças e caciques já morreram em Mato Grosso do Sul”, disse.

No dia 17 de maio, um grupo de 44 indígenas protestou em frente ao Planalto contra retrocessos nas políticas de demarcação de terras tradicionais e em defesa dos direitos constitucionais indígenas.

Antes, o CIMI já havia divulgou nota em que manifestava preocupação com informações veiculadas de que Temer pretende revogar atos administrativos demarcando terras indígenas, assinados nos últimos dias do governo da presidente afastada Dilma Rousseff.

Em carta da Grande Assembleia da Aty Guasu ao Ministro da Justiça os indígenas afirmaram: “Soubemos recentemente que há interesse de revogar e de anular decretos e avanços nas demarcações de nosso território conquistados no último período… Revogar os processos de nossas Terras é humilhar nosso povo, pisar em nossos antepassados e violar o tumulo de nossos guerreiros. Isso não vamos permitir. Se acontecer, muitos de nossos velhos adoecerão de novo e teremos que partir para nossas retomadas”.

Na carta encaminhada ao Ministro da Justiça lembraram os ataques que sofreram nos últimos anos de grupos paramilitares, de jagunços e fazendeiros. Denunciaram mais uma vez a situação de confinamento e massacres a que estão submetidos: “Vivemos um genocídio conhecido e reconhecido mundialmente. Morre mais gente assassinada de nosso povo do que em países em guerra… Diante desse quadro que está entre as piores situações de povos originários no mundo, manifestam a sua decisão diante da única alternativa que lhes resta. Se este Ministério e o Governo revogar estes decretos, não teremos outra alternativa se não partir para nossas retomadas. Recuperar nossos territórios que já estão estudados e demarcados por nós mesmos. Não queremos ter mais mortos e nem empilhar nas costas do Executivo Brasileiro mais cadáveres para serem contados no exterior. Mas não teremos escolha. Um sinal como este de rever nossos direitos deverá ser entendido por nós e por todos os povos do Brasil como um deboche e como um anuncio de Guerra”.

Lembraram as incontáveis vezes que deixaram suas famílias e comunidades para ir a Brasília exigir justiça e respeito a seus direitos. Quase sempre foram enganados com falsas promessas. “Como fica a questão de nossas lideranças assassinadas e outras constantemente ameaçadas?”, questionaram.

A Constituição estabeleceu a demarcação de todas as terras indígenas até 1993. Em maio, a liderança de Kurusu Ambá, Eliseu Lopes, falou no Fórum Permanente da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a questão indígena. “Não queremos mais que o sangue de nossas famílias regue plantações de soja, cana ou sirva para o gado. Não vamos desistir de nossos territórios”, disse o líder indígena em discurso diante de mais de mil indígenas de todo o mundo.

Há muitas cartas a serem escritas, muitos gritos a serem professados antes de que a justiça seja feita.

Boi e gente

A jornalista Sandra Luz fez uma reflexão que resume a questão indígena no Mato Grosso do Sul.

"Em Mato Grosso do Sul um boi vale 11,5 vezes mais que uma pessoa

* A cotação da arroba do boi gordo em Mato Grosso do Sul fechou em R$ 141 nesta quarta-feira, 15. O valor, pago no ato da transação, não sofreu alteração em relação ao dia anterior. Continua estável em cerca de US$ 41.

* Para que o fazendeiro não tenha prejuízo, o boi não vai para abate com menos de 17 arrobas. Cada arroba corresponde a 15 quilos. Na prática, os bois que ontem estavam prontos para o abate foram negociados por R$ 2.397. O montante chega a US$ 691,4.

*Na cidade sul-mato-grossense chamada Caarapó, a renda per capita é de R$ 207,33, segundo o IBGE. Esse valor corresponde a US$ 59,81. Isto é: 11,5 vezes menos que o boi gordo comercializado ontem.

*Sou péssima em matemática, mas essa conta não tem erro. É isso mesmo! Em Caarapó e em todo Mato Grosso do Sul, um boi vale 11,5 vezes mais que uma pessoa. Agora, se essa pessoa for indígena…"


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