29/03/2024 - Edição 540

Brasil

Movimento antimanicomial pede saída do coordenador de Saúde Mental

Publicado em 23/12/2015 12:00 -

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Militantes do movimento antimanicomial, psiquiatras, pacientes, familiares e trabalhadores da área estão pedindo a renúncia do novo coordenador geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde, Valencius Wurch, empossado há uma semana. Segundo os militantes, ele representa um retrocesso na luta antimanicomial e na reforma psiquiátrica implantada no país a partir da Lei 10.216/2001, que instituiu os cuidados psicossociais aos pacientes e não mais o isolamento e a internação.

A integrante do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial Melissa de Oliveira Pereira explica que o psiquiatra foi diretor da Casa de Saúde Dr. Eiras de Paracambi, na região metropolitana do Rio de Janeiro, o maior manicômio privado da América Latina, que foi fechado por ordem judicial em 2012 após anos de denúncia de violações de direitos humanos.

“Ele foi coordenador numa época em que Paracambi representava uma casa de tortura e maus tratos, chegando a um período em que morria uma pessoa por dia por abandono. Os pacientes ficavam algemados nas camas de concreto onde tinha uma canaleta para escorrer o xixi. Passavam fome, eram estupradas. Isso na década de 90. Nessa mesma época ele se posicionou na imprensa contrário à reforma psiquiátrica brasileira e assim tem permanecido enquanto professor, se posicionando contrário à luta antimanicomial”.

A Coordenação-Geral de Saúde Mental do ministério está ocupada pelo movimento desde o dia 15 e os militantes afirmam que são vão deixar o local até a saída de Valencius Wurch do cargo.

Ex-paciente psiquiátrico, aos 70 anos Milton Freire trabalha nos Centro de Atenção Psicossocial (CAPs) e afirma que a reforma foi extremamente benéfica. “Eu fui para o hospital com 15 anos e pelo menos 12 eletrochoques eu tomei. A gente não podia falar nada. O mais importante é que cria uma tradição psicossocial, antes só havia uma tradição organicista, eles isolavam as pessoas e davam remédio. Hoje as pessoas tomas remédio, porém um dos remédios é a vida social, são as atividades expressivas, a vida afetiva, a vida próxima à família, não isola as pessoas. Um dos objetivos é a inserção social”.

Casa sem condições

Pesquisadora do Laboratório de Saúde Mental e Atenção Psicossocial da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Ana Paula Guljor, foi contratada pelo município de Paracambi para supervisar a casa dirigida por Valencius, onde verificou muito cheiro de urina, fezes e criolina, pacientes maltrapilhos, nus, jogados pelo chão ou amarrados nas camas de ladrilho sem colchão, pouquíssimas atividades terapêuticas e sem ressocialização.

“Ele tinha uma atuação fora, na conferência ele estava organizando as defesas contra o projeto da reforma, que é a ampliação dos serviços, a implantação do hospital dia no local. A forma como ele fala é uma mentira deslavada. Ele pertenceu ao Ministério da Saúde, mas o fato de você trabalhar no hospital público não significa que você tenha compromisso público e muito menos experiência de gestão pública”.

Diálogo

Valencius Wurch disse que está aberto ao diálogo e que isso implica as pessoas falarem o que pensam e também ouvirem os outros. Disse que é declaradamente a favor da reforma psiquiátrica e concordou que a situação da casa de saúde que dirigia era degradante. “A Dr. Eiras era um horror, ainda bem que fechou. Eu fiz um projeto: 'isso aqui não pode mais existir, mas enquanto existir as pessoas têm que ser bem tratadas'”.

Segundo Wuech, quando assumiu a direção havia 2.300 pessoas internadas em Paracambi e quando ele deixou a instituição eram 1.500, “portanto, eu contribui para a desinternação”.


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