20/04/2024 - Edição 540

Especial

País precisa investir R$ 760 bilhões em habitação

Publicado em 10/09/2015 12:00 -

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A equalização do déficit habitacional no País demandará investimentos de R$ 760 bilhões ao longo de dez anos, de acordo com estudo “Políticas Permanentes de Habitação – A importância do programa Minha Casa Minha Vida”, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O levantamento considera que até 2024 o País terá 16,8 milhões de novas famílias, sendo 10 milhões com renda familiar de até três salários mínimos – ou seja, com menor ou nenhuma condição de adquirir uma casa por conta própria, sem subsídio.

Com um déficit estimado de 5 milhões de moradias no fim de 2014, o desafio total será proporcionar habitações para cerca de 22 milhões de famílias na próxima década.

Se o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida (MCMV) atender ao menos 51% das famílias, isso representará a necessidade de construção de 11,2 milhões de habitações populares, o equivalente a 1,1 milhão por ano.

Considerando uma atualização do valor médio das habitações para R$ 68,1 mil nos próximos dez anos, o levantamento da FGV calcula a necessidade de investimentos de R$ 760 bilhões, o equivalente a R$ 76 bilhões por ano.

A coordenadora do estudo, Ana Maria Castelo, ressalta que a viabilização desses investimentos só será possível se houver melhoria das operações entre construtoras, bancos e os órgãos públicos envolvidos.

"Uma das maiores dificuldades dos investimentos diz respeito à perenidade do programa. O aporte de R$ 760 bilhões só será possível se o programa contar com metas plurianuais e volume de investimento que permitam às empresas ter visibilidade sobre o andamento dos seus negócios", explicou.

Queda no déficit

De acordo com levantamento da FGV, o déficit habitacional caiu 8% entre 2009 e 2013, impulsionado pelo apoio às famílias por meio do MCMV. Com isso, a falta de moradias caiu de 5,7 milhões para 5,2 milhões.

A modalidade coabitação, quando familiares compartilham a mesma residência, caiu em 24,12%. Já no caso das habitações precárias, aquelas em áreas de risco e sem acesso a serviços, a redução no déficit foi de 18,99%. No caso do déficit causado pelo adensamento, ocupação do solo sem o planejamento, o déficit caiu em 5,45%.

Criado em 2009 durante o governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e mantido durante o governo da presidente Dilma Rousseff, o MCMV contou com metas definidas apenas para o período dentro dos mandatos.

Na primeira fase, foram alocados R$ 34 bilhões no programa. Na segunda, serão R$ 125,7 bilhões, segundo dados compilados pela FGV.

Para Ana Maria Castelo, o país tem uma dívida enorme com uma parcela significativa da população que ficou à margem do mercado imobiliário, por causa das restrições de renda, mas avalia que são necessárias mudanças no programa. “É da máxima importância para as empresas que o programa se transforme em uma política de estado”, afirma.

Segundo ela, o programa contribuiu para reduzir o déficit habitacional. O déficit habitacional no Brasil, em sua composição, é quase totalmente de famílias de baixa renda. Hoje, 73% das famílias que estão no déficit têm até três salários mínimos, afirma a pesquisadora. Castelo afirma que as pessoas de baixa renda têm mais dificuldade de se inserir nas condições exigidas pelos agentes financeiros. “Os programas habitacionais, ao fornecer subsídios e condições de financiamento subsidiadas, permitem inserir essa população e ajudam a reduzir o déficit habitacional”, disse Ana Maria Castelo.

Quatro categorias compõem o déficit habitacional brasileiro, de acordo com o estudo da FGV: habitações precárias (favelas), coabitação (famílias que dividem uma mesma casa), locatários e adensamentos populacionais. Destes grupos, apenas um reduziu significativamente desde o lançamento do MCMV: o de coabitação, que caiu 24,12%. O segmento de habitações precárias teve um recuo de 18,99%. O adensamento baixou 5,45%, enquanto o setor de locações não reduziu. Pelo contrário, aumentou 13,49% no período 2009 e 2014. A pesquisa deduz que esse crescimento se deve à elevação da renda, o que aumentou o número de casamentos e fez subir a quantidade de pessoas morando sozinhas.

Boa parte destes R$ 760 bilhões necessários para fazer frente ao déficit seria em forma de subsídios, já que as classes que mais dependem do MCMV estão na faixa de um a três salários mínimos. Para a FGV, o aumento no volume de unidades produzidas pelo programa só seria possível se houvesse mais oferta de terrenos, mais contrapartida de estados e municípios e mais investimento em produtividade por parte das empreiteiras.

As construtoras são praticamente unânimes em relação ao programa. Para 93%, ele é visto como “importante” para o setor da construção civil. As empresas também entendem que o MCMV teria produzido muito mais unidades não fossem gargalos como burocracia, carga tributária e falta de incentivos para a adoção de sistemas construtivos industrializados.

Política de estado

Para a melhor continuidade dos programas de habitação de interesse social, Ana Maria Castelo defende a tese de que programas como o Minha Casa, Minha Vida sejam transformados em políticas de estado. “É preciso que haja uma política continuada”, afirmou.

Para a professora, o MCMV precisa superar questões como o valor do preço dos terrenos, sobretudo nos grandes centros, a destinação de áreas para moradia de interesse social, a qualificação de mão de obra do mercado do setor e a melhoria da produtividade nas construtoras.

A economista acredita que a modalidade de arrendamento ou aluguel social, “sem tradição no Brasil”, poderia ser alternativa às ações de redução do déficit habitacional. “A gente não vai conseguir resolver toda questão da necessidade de habitação simplesmente produzindo moradias novas”, afirmou.

Retração

O ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, afirmou nesta semana que eventuais cortes nos programas sociais do governo — entre eles o MCMV — poderão ocorrer caso a arrecadação não aumente nos próximos meses.

O MCMV é um dos principais programas sociais do governo no âmbito da distribuição de renda e da habitação popular. Berzoini disse que a fase 2 do programa habitacional está garantida e prevê a entrega de 1 milhão e 400 mil casas.

"Ainda tem mais de 1,4 milhão de casas para serem entregues da fase 2 do Minha Casa, Minha Vida. Ou seja, é um programa de grande impacto social, grande impacto orçamentário. A fase 3, certamente, vai dar continuidade a isso. Evidentemente, ajustada à disponibilidade orçamentária", afirmou o ministro.

Berzoini disse ainda que os recursos para os programas sociais estão previstos no Orçamento de 2016 enviado ao Congresso, mas que a aplicação futura de dinheiro neles e em projetos de Habitação e Educação precisa estar atrelada aos dispositivos constitucionais. Ou seja, não poderá haver gastos que ponham em risco o ajuste fiscal pretendido pelo governo.

Em outras palavras, o ministro das Comunicações afirmou que tudo, daqui pra frente, precisará ser planejado tendo em vista o saldo negativo do Orçamento e que não se pode garantir investimentos que venham a aumentá-lo. O governo enviou ao Congresso o Orçamento de 2016 em que, nele, prevê déficit de R$ 30 bilhões.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, exemplificou que, em programas como o Minha Casa Minha Vida, no caso das unidades já contratadas, têm que ser honrados os pagamentos às empresas que as construíram.

Novas regras

Sem dinheiro para bancar subsídios, o governo anunciou na quinta-feira (10) uma reforma no programa que vai encarecer o custo para famílias de baixa renda adquirirem imóvel.

O MCMV tem dois segmentos. No primeiro, chamado faixa 1, a família com renda até R$ 1.600 recebia um subsídio direto do governo para a compra do imóvel, o que deixava o valor da prestação em até R$ 80 por mês. As construtoras faziam imóveis específicos para a faixa.

Essa faixa sofreu alteração, sendo dividida em duas. Uma para as famílias que ganham até R$ 800, que vão continuar pagamento até R$ 80. E outra faixa para renda acima deste valor e até R$ 1.800. Neste caso, os mutuários vão pagar entre 10% e 20% do rendimento, o que pode elevar a prestação para até R$ 360. Na prática, porém, dificilmente as famílias com renda até R$ 800, que contam com subsídio do Tesouro, vão conseguir comprar imóveis nessa modalidade do programa. Isso porque o governo não tem recursos para bancar o benefício.

A estimativa é que, só em 2016, seja necessário pagar R$ 8 bilhões a essas companhias pela construção de casas subsidiadas já contratadas. Na prática, essa modalidade estará congelada até que novos recursos sejam destinados para o programa.

No segundo segmento, estão as faixas 2 e 3, que compreendem famílias que ganhavam entre R$ 1,6 mil e R$ 5 mil. Para esse público, o governo entrava com um subsídio menor — até R$ 25 mil por imóvel, a depender da faixa de renda do beneficiado.

Agora, o governo inseriu quem ganha até R$ 2.350 nesta modalidade do MCMV, na qual a prestação inclui pagamento de juros. A nova faixa passou a ser chamada de 1,5.

O comprador precisa pegar um empréstimo no banco para pagar o imóvel, com juros baixos (5% ao ano). Esse financiamento é mais barato por usar recursos do FGTS.

O teto para as famílias subiu para R$ 6,5 mil, e o subsídio passou para até R$ 45 mil, mas apenas para quem ganha até R$ 2.350.

O valor que o governo desembolsa para reduzir a prestação vai caindo conforme o aumento da renda da família. O restante do valor do imóvel será pago com empréstimo pego pelo comprador que terá juros entre 5% a 8%, a depender da renda. Nas regras antigas, o valor da prestação dessas famílias ficava em torno de R$ 400. Agora deverão subir. O teto de valor do imóvel, que era de R$ 190 mil nas regiões mais desenvolvidas, vai subir para R$ 235 mil.


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