Meia Pala Bas
Publicado em 21/08/2015 12:00 - Rodrigo Amém
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Em 1949, portos eram lugares perigosos. A maior parte das vagas de trabalho consistia em descarregar caminhões e carregar navios, a famosa estiva. Mesmo contando com até 100 estivadores por navio, as embarcações levavam semanas para escoar a mercadoria. Era tragicamente comum que trabalhadores fossem mutilados ou esmagados por caixas mal empilhadas. Muita mercadoria “sumia”.
Era um trabalho ineficiente, lento e dispendioso. Mas profundamente enraizado na cultura da navegação comercial mundial. Funcionou assim por séculos e, como sabemos, a tradição é tão poderosa e contraproducente quanto a inércia.
Aí chegou uma figura nova ao porto de Nova York. Seu nome era Malcolm McLean. Dono de uma firma de caminhões, ele teve uma ideia: como demorava muito para percorrer as precárias estradas norte-americanas do início dos anos cinquenta, ele queria embarcar seus caminhões e percorrer a maior parte do trajeto pela costa.
A revolução digital tem provocado um chororô semelhante entre os que defendem o tradicionalismo de seu modelo ineficiente de negócio.
Mas MacLean acabou repensando seus planos. Afinal, um caminhão é uma caixa presa a um motor. Por que não fazer essa caixa destacável e embarcar só a carga? Muita gente viu problemas. E se chover e entrar água nas caixas? O navio vai afundar? E se as caixas balançarem demais o navio? Será que ele vira? Malcolm mandou confeccionar algumas dessas caixas e fez várias viagens em um navio lotado delas. Percorreram a costa diversas vezes até encontrarem uma tempestade. Resultado? Deu tudo certo. Estava inventado o container. Uma maneira mais barata, segura, eficiente e eficaz de transportar mercadorias.
Não dá para exagerar a importância do container para o crescimento da economia mundial. Graças a ele é possível comprar camisetas produzidas com algodão indiano no Alasca e chinelos de borracha brasileiros na Broadway. Se hoje é possível escoar sua produção para qualquer parte do mundo, agradeça à invenção de MacLean.
Pessoas sensatas imaginariam que uma inovação tão estratégica e revolucionária seria recebia de braços abertos pelas empresas da marinha mercante. Mas só depois de uns vinte anos a ideia finalmente ganhou força. O sindicato dos estivadores fez tudo o que pôde para matar a iniciativa. A economia mundial sofreu um atraso de literalmente décadas em nome da tradição do posto de trabalho ineficiente. No final das contas, as empresas navais se comprometeram a fazer um considerável depósito nos fundos de aposentadoria do sindicato e o container virou uma realidade global.
A revolução digital tem provocado um chororô semelhante entre os que defendem o tradicionalismo de seu modelo ineficiente de negócio. Os taxistas exigem o fim do Uber. A TV a cabo faz mimimi sobre o sucesso do Netflix. Aos chorões de plantão ofereço a lição dos estivadores. Para sobreviver, os estivadores se especializaram, aprenderam a usar maquinário pesado e agora operam os guindastes que erguem os containers que mataram os empregos de seus ancestrais.
Ironicamente, parece que é preciso um guindaste para fazer os acomodados levantarem as bundas das cadeiras e correrem atrás da própria eficiência.
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