29/03/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Tráfico do bem

Publicado em 15/05/2015 12:00 - Rodrigo Amém

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

Ninguém entra para política para mudar a sociedade. Claro, um ou outro idealista talvez contrarie minha generalização. Mas é apenas como margem de erro.  Em outras palavras, exceções que confirmam a regra.

Daí temos os radialistas, pastores, sindicalistas, cantores, sub-celebridades e ex-atletas. Gente conhecida por ser conhecida. Vá lá, alguns até acabam revelando levar jeito para a coisa. Mas é algo tão aleatório quanto sua própria fama. O que faz de alguém virar candidato é a esperança de transformar um eventual prestígio social em poder político.

Nem se pode dizer que o salário é o grande atrativo. Obscenamente alto para os padrões da população brasileira, o pagamento de um senador é relativamente modesto. Diretores de corporações multinacionais ganham muito mais e – em alguns casos – carecem do mesmo mérito que nossos membros do congresso.

É no tráfico de influência que o político lava a égua. É o "libera uma verba que eu voto contigo" que faz a carreira dos aventureiros das câmaras municipais, estaduais e federais. É ali que eles aumentam seu patrimônio e garantem apoio para reeleição, num círculo vicioso de mãos sujas que se lavam mutuamente. Não há clima, tempo ou disposição para encampar as mudanças que, a longo prazo, poderiam tirar o país da lama.

Ninguém entra para política para mudar a sociedade. Claro, um ou outro idealista talvez contrarie minha generalização. Em outras palavras, exceções que confirmam a regra.

E por falar em lama, os bancos privados brasileiros vão muito bem, obrigado. Os lucros não param de crescer e superar expectativas. O mesmo não se pode dizer da opinião pública dessas instituições. Prova disso são os constantes investimentos em artes (através de programas de isenção fiscal) e programas sociais (idem). Os banqueiros andam preocupados com a imagem de suas instituições e investem alguns merréis para conquistar a simpatia do público. Como visibilidade de marca, bacana. Agora, imagine o impacto positivo se uma instituição dessas resolvesse arregaçar as mangas e colocar o Brasil pra funcionar.

Imagine se cada banco criasse uma premiação para leis e projetos voltados para o desenvolvimento do país? Uma espécie de prêmio Nobel parlamentar. Cada banco poderia abraçar uma causa. O Santander apoiaria projetos de educação. Itaú poderia ficar com segurança pública. Talvez o HSBC pudesse premiar soluções para a área de saúde.

Seria o fim do tráfico de influência? Com certeza, não. Mas em termos de custo, sairia até mais barato para as instituições financeiras que as costumeiras e surradas ações de marketing social. Para os deputados, seria mais um estímulo para pensar projetos a longo prazo, já que o prêmio poderia ser convenientemente anunciado (e pago) em anos eleitorais. O banco ganha visibilidade, o político ganha dinheiro e o Brasil ganha as reformas que tanto precisa.

Esse programa poderia se chamar "Propina do Bem"," Suborno Popular" ou "Jeton Cidadão". Pensando bem, talvez fosse melhor colocar o João Santana e o Duda Mendonça pra cuidar do nome. Gente que sabe falar a linguagem do povo. 

Leia outros artigos da coluna: Meia Pala Bas

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *