26/04/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Entre a bala de borracha e o pedestal

Publicado em 01/05/2015 12:00 - Rodrigo Amém

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Do jardim da infância até a mais recente pós, passando por cursos de línguas, oficinas criativas e treinamentos variados, lá se vão 35 anos na minha carreira de aluno. Não consigo me lembrar de todos os professores que passaram pela minha vida. Só me lembro dos bons, cerca de 30% do total. Esses, de uma maneira ou de outra, mudaram minha percepção de mundo. O resto foi tão esquecível quanto o conteúdo das suas aulas.   

No momento em que ponderamos a condição de educador em função do horror paranaense, estamos desviando o curso da discussão sobre a qualidade da educação para um terreno infrutífero: a sacralização do professor. Quando uma coisa se torna sacra, não é mais passível de questionamento. E se tem alguém que tem que estar aberto ao questionamento, é o professor.

O debate sobre a qualidade da educação tem que passar pelo debate sobre a qualidade do professor, mas a gente finge que não. A verdade é uma imensa maioria dos nossos mestres não sabe ensinar.

Professor é chamado, dizem os chavistas (não consegui pensar num outro termo para os adoradores de chavões).  Mas esse é um chavão que não abre portas grandes (outra máxima dos amantes de frases de efeito). Estatisticamente falando, professor é plano B, onde se refugiam os que não conseguiram se estabelecer plenamente em suas áreas profissionais. O sonho era ser jornalista, geólogo, físico, pesquisador, sociólogo, matemático, rock star. Não deu? Você sempre pode dar aula.

Quando uma coisa se torna sacra, não é mais passível de questionamento. E se tem alguém que tem que estar aberto ao questionamento, é o professor.

Tire da sua cabeça a imagem da pobre professorinha em casas de chão batido ensinando o alfabeto a filhos de trabalhadores rurais. Estou falando de universidades, MBAs, cursos de Mestrado. Uma quantidade aterradora de professores que não possuem os requisitos mínimos para ensinar. Não têm ideia de como preparar uma aula, explanar um tópico e produzir um engajamento com resultados satisfatórios. Afinal, não é por isso que eles estão ali. Eles estão ali porque (pelo menos em teoria) dominam o conteúdo. Ninguém acharia razoável aprender a dirigir com um piloto de Fórmula Truck. Mas é assim que nossas escolas e universidades contratam seu corpo docente.

A sala de aula virou esse exílio profissional onde o ressentimento e a frustração preparam as gerações futuras. Esse é um problema crônico da pátria educadora. Uma parte considerável de nossa sagrada categoria de professores não quer, não sabe, não pode e nem deveria lecionar.

A solução, ainda que utópica, é simples. Dar aula só é bico porque paga como tal. A partir do momento que ser professor passar a ter a recompensa financeira e a estabilidade profissional atrativas para o topo da pirâmide, o jogo muda. Aí a amada “meritocracia” liberal entra em campo e os mais qualificados, preparados e dedicados dos professores se estabelecem. Aqueles que estão dando aula há vinte anos porque ainda não surgiu coisa melhor vão ter que procurar coisa melhor ou se tornar professores melhores.

Em tempo: um beijo para Dona Guaraciaba. Uma adorável carrasca que quase arrancou meu couro e apresentou os subjuntivos em idos da quarta série. Essa sabia.   

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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