19/04/2024 - Edição 540

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Imprensa europeia e norte-americana aponta ameaça bolsonarista

Publicado em 09/04/2021 12:00 -

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A gestão da crise sanitária no Brasil está no foco da imprensa europeia. Nesta sexta, 9, os jornais franceses destacaram o aumento vertiginoso de mortes pela Covid-19 e a inércia do governo brasileiro diante da epidemia.

“O Brasil se transforma em laboratório de variantes a céu aberto e preocupa o mundo” é manchete no jornal Ouest France. O diário destaca que a ausência de medidas coordenadas contra a propagação do coronavírus faz com que o país seja não somente palco de uma tragédia local, mas também de “uma nova ameaça para a situação sanitária mundial”.

Citado pelo Ouest France, o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis classifica o Brasil como “uma bomba-relógio”. Segundo ele, com cerca de 100 mil novos casos de Covid-19 por dia, a inação do governo está resultando em mutações importantes do vírus.

Até o momento, 92 cepas foram identificadas e estão em circulação no Brasil. O diário afirma que isso “transforma o país em um gigantesco reservatório de variantes da Covid-19, podendo reinfectar em permanência todo o planeta”.

O jornal Les Echos classifica a gestão da epidemia pelo presidente Jair Bolsonaro como “um desastre absoluto”, denunciado por todas as organizações médicas e científicas do mundo inteiro.

O diário lembra a posição do líder da extrema direita brasileira desde o início da crise sanitária, classificando o coronavírus como uma “gripezinha”, ostentando seu posicionamento contra o uso de máscaras e contra as vacinas, minimizando uma tragédia que resulta hoje em mais de 345 mil mortos, em pouco mais de um ano.

“Se a política de Bolsonaro é um pesadelo, a persistência da doença no Brasil preocupa o mundo”, afirma o diário, lembrando que “a luta contra a Covid-19 deve ser feita de forma conjunta, por todos os continentes”.

O jornal conservador Le Figaro traz como manchete: “Bolsonaro em breve sob investigação devido à sua gestão da pandemia”. A matéria afirma que o Senado brasileiro deve começar a avaliar “eventuais omissões” do presidente durante a crise sanitária.

Le Figaro destaca que, desde janeiro, a situação se agrava no Brasil, quando milhares de pessoas morreram no Estado do Amazonas devido à falta de oxigênio nos hospitais. Desde então, a falta de ação do governo vem resultando em recordes diários de mortes. Na quinta-feira (8), foram registrados 4.249 óbitos em um período de 24 horas.

O jornal Libération destaca a média diária de 2.800 óbitos por Covid-19 no Brasil, “um número que cresce todos os dias de forma desesperadora”, diz. A crise está longe do fim: “em seu relatório semanal, a Fiocruz explica que a tendência é que essa situação perdure nas próximas semanas”, conclui Libé.

The Guardian, NYT, Washington Post, Economist: imprensa internacional condena atuação de Bolsonaro na pandemia

O jornal britânico The Guardian também fez duras críticas ao governo brasileiro diante do cenário de aumento de casos e de mortes de coronavírus no País, que caminha no sentido oposto do resto do mundo, que avança com a vacinação e dá sinais de melhora da situação da pandemia.

Nas duas últimas semanas, alguns dos maiores jornais e revistas do mundo publicaram textos criticando o presidente Jair Bolsonaro e a postura de sua equipe no combate à Covid-19. Entre os veículos estão The Economist, Washington Post, The New York Times e The Wall Street Journal.

Em geral, a imprensa estrangeira tem mostrado muita preocupação com a situação do Brasil, apontando que a crise de saúde nacional também é uma ameaça ao resto do mundo, citando, por exemplo, a variante P1, que também se espalha para outros países.

O The Guardian destacou no título de seu editorial que Bolsonaro representa “um perigo para o Brasil e para o mundo”, lembrando das declarações do presidente contra o isolamento social, uso de máscaras e aplicação das vacinas.

A publicação diz ainda que já havia preocupação desde a sua campanha presidencial por conta das declarações feitas por Bolsonaro contra minorias, mas, segundo o jornal, após sua eleição “o pesadelo se revelou ainda pior na realidade”.

“Ele não só usou uma lei de segurança nacional da época da ditadura para perseguir os críticos e supervisionou o aumento do desmatamento na Amazônia em 12 anos, mas também permitiu que o coronavírus se alastrasse sem controle, atacando as restrições de distanciamento, máscaras e vacinas”, destaca.

A The Economist também focou a maior parte de sua matéria em responsabilizar Bolsonaro pela crise de saúde no Brasil e a preocupação que isso é para outros países, com o título “A má gestão da Covid-19 pelo Brasil ameaça o mundo”.

“Bolsonaro promoveu curas charlatanescas, protestou contra lockdowns e tentou impedir a divulgação de dados (sobre infecções e mortes). Ele acaba de demitir o terceiro ministro da Saúde (um general do Exército) desde o início da pandemia. Seu governo demorou a encomendar as vacinas, ainda que fabricantes como Pfizer e Janssen as tenham testado no Brasil”, diz o texto.

Sobre a troca de ministros, o Washington Post apontou que a mudança recente na Defesa indica que Bolsonaro pode estar “mirando a democracia”, sendo que “Estados Unidos e América Latina devem estar atentos para garantir a Bolsonaro que qualquer interrupção da democracia seria intolerável”.

Segundo a publicação, é por conta da “impressionante incompetência do presidente Jair Bolsonaro e seu governo”, que não há sinal de fim da crise sanitária causada pelo coronavírus no País. E o texto vai mais longe: “em vez de lutar contra o coronavírus, Bolsonaro parece estar preparando as bases para outro desastre: um golpe político contra os legisladores e eleitores que poderiam removê-lo do cargo”.

Os jornais destacam ainda o crescimento do debate político já mirando as eleições de 2022, principalmente após a volta de Lula à corrida eleitoral. E para o Guardian, só com a ameaça do petista sobre Bolsonaro já pode ser uma boa sinalização, já que faria com que eleitores da direita procurassem outro candidato menos extremista para disputar o pleito.

O tom geral, porém, da maior parte dos jornais é pedindo que Bolsonaro saia da presidência. “O presidente brasileiro já contribuiu muito para o agravamento da pandemia de covid-19 em seu próprio país e, por meio da disseminação da variante brasileira, pelo mundo. Ele não deve ter sucesso em destruir uma das maiores democracias do mundo também”, diz o Post, enquanto o Guardian conclui com :“sua partida [de Bolsonaro] seria bem-vinda, pelo bem do Brasil e do resto do planeta”.

Autoritarismo

Além de voltar a noticiar o descontrole da pandemia do novo coronavírus, jornais de todo o mundo chamaram atenção para a troca de comando nas Forças Armadas.

"Bolsonaro não conseguiu impedir a covid-19. Agora, pode estar mirando a democracia" foi o título do artigo de opinião publicado pelo jornal americano Washington Post.

"Em vez de lutar contra o coronavírus, Bolsonaro parece estar preparando as bases para outro desastre: um golpe político contra os legisladores e eleitores que poderiam removê-lo do cargo", afirmou o Washington Post.

Segundo o jornal, há "motivos para preocupação", "embora as instituições democráticas do Brasil sejam relativamente fortes após mais de três décadas de consolidação".

"O presidente brasileiro já contribuiu muito para o agravamento da pandemia covid-19 em seu próprio país e, por meio da disseminação da variante brasileira, pelo mundo. Ele não deve ter permissão para destruir uma das maiores democracias do mundo também", concluiu o Washington Post.

O também americano New York Times publicou reportagem intitulada "Enquanto vírus e problemas econômicos assolam o Brasil, Bolsonaro improvisa e confunde".

"Mesmo para um líder polarizador que muitas vezes parece agir por instinto, os movimentos recentes do presidente Jair Bolsonaro do Brasil confundiram e enervaram muitos no maior país da América Latina, onde o coronavírus está matando pessoas a uma taxa recorde", disse o jornal, em texto assinado pelos correspondentes Ernesto Londoño e Letícia Casado.

Do outro lado do Atlântico, o britânico Financial Times, especializado em notícias financeiras, descreveu a troca de comando na Defesa, com a substituição do ministro Fernando Azevedo e Silva e dos chefes das três forças, como "o poder explosivo de uma bomba" detonada.

"Um dos maiores céticos do coronavírus do mundo, Bolsonaro recusou-se a usar máscara durante a maior parte do ano passado, criticou as vacinações e classificou a pandemia como "gripezinha". Ele agora está lutando para manter seu governo unido e suas esperanças de reeleição vivas em meio a alguns dos piores números da covid-19 do mundo", disse o jornal.

Já o também britânico Guardian deu destaque à movimentação de líderes da oposição pelo impeachment de Bolsonaro.

"O que quer que tenha acontecido, poucos duvidam que o drama da semana representa um momento crucial e potencialmente perigoso na história moderna de um país que emergiu apenas de duas décadas de ditadura em 1985", escreveu Tom Phillips, correspondente do jornal no Rio de Janeiro.

"Com mais de 66 mil mortes somente em março, o Brasil está em meio a uma crise política e de saúde. Como o país chegou a esse ponto?", questiona o britânico Telegraph em reportagem intitulada 'Milhares de mortos e um país em turbulência: a contagem regressiva do Brasil para a catástrofe da covid'.

Para o francês Le Monde, Bolsonaro está cada vez mais "isolado e impopular".

Em reportagem assinada pelo correspondente do jornal no Rio de Janeiro, Bruno Meyerfeld, a saída "deste respeitado e influente general de 4 estrelas (Fernando Azevedo), considerado uma das poucas figuras pragmáticas do poder de Brasília, causou espanto e indignação de grande parte do Estado-Maior".

O italiano Corriere della Serra definiu a troca de comando da mais alta cúpula militar brasileira como "a pior crise desde o fim da ditadura", escreveu a jornalista Sara Gandolfi.

Em artigo no alemão Frankfurter Allgemeine, o editor de política do jornal, Klaus-Dieter Frankenberger, classificou como "fatal" a gestão da pandemia de covid-19 por Bolsonaro. "O Brasil merece mais", escreveu ele.

"Bolsonaro, o presidente populista de direita, não é inocente. De muitas maneiras, ele imitou seu modelo e seu herói Donald Trump: ignorou e minimizou o perigo do vírus por muitos meses; na verdade, até hoje. No trade-off entre conter a epidemia e manter a economia aberta, nunca optou pela proteção à saúde. Em vez disso, ele se gabava de sua resiliência".

Por sua vez, no argentino Clarín, o jornalista Marcelo Cantelmi, chefe de política internacional do diário, escreveu em artigo intitulado "Brasil em crise Por que é o pior momento de Jair Bolsonaro?": "O presidente brasileiro está encurralado, perdeu o apoio do establishment e de seus aliados. Por isso, demitiu a liderança das Forças Armadas, para tentar rearmar uma verticalidade militar que o proteja de um possível julgamento político".


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