18/04/2024 - Edição 540

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Como ocorreu a aproximação entre EUA e Cuba?

Publicado em 19/12/2014 12:00 -

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Logo depois de sua reeleição em 2012, o presidente Barack Obama convocou importantes assessores para uma série de reuniões, pedindo que "pensassem grande" sobre uma agenda para o seu segundo mandato, incluindo a possibilidade de novos recomeços com adversários já antigos dos EUA, como o Irã e Cuba.

Dois anos mais tarde, depois de elaborados processos de diplomacia secreta conduzidos em separado, mas por caminhos surpreendentemente parecidos, os esforços que ele empreendeu junto a Teerã e Havana estão dando frutos.

O anúncio, quarta-feira (17), de que os EUA e Cuba normalizarão suas relações, depois de mais de 50 anos de hostilidade, sugere que um dos últimos capítulos da Guerra Fria pode estar se encerrando.

A aproximação entre os EUA e Cuba começou cautelosamente em 2013, nos meses iniciais do segundo mandato de Obama, e tomava por base a ideia de que melhora alguma seria possível a menos que o governo comunista libertasse o prestador de serviços norte-americano Alan Gross, detido e encarcerado em Cuba sob acusações de espionagem.

Na primeira conversa com John Kerry após indicá-lo como seu novo secretário de Estado, Obama discutiu o encarceramento de Gross e sua insatisfação mais ampla com relação à política dos EUA em relação à ilha.

Vaticano

Kerry rapidamente solicitou a ajuda do Vaticano, uma das poucas instituições do mundo amplamente respeitada nos EUA e Cuba. A ajuda da Igreja Católica se provaria significativa.

Por trás das cenas, Obama começou a colocar em movimento a sua diplomacia secreta e no segundo trimestre de 2013 o presidente autorizou dois de seus mais importantes assessores a fazer contato direto com o governo cubano para conversações preliminares.

O esforço mais ou menos coincidiu com discussões sigilosas semelhantes que Obama realizava no Oriente Médio entre funcionários dos governos norte-americano e iraniano sobre o contestado programa nuclear do país persa.

Enquanto Muscat, no Omã, e Genebra, na Suíça, abrigavam as negociações com o Irã, as cidades canadenses de Ottawa e Toronto e a Cidade do Vaticano serviram de palco às negociações com Cuba.

Em junho do ano passado, Ben Rhodes, vice-conselheiro de segurança nacional do presidente Obama, e Ricardo Zuniga, principal assessor da Casa Branca para as Américas, viajaram ao Canadá para a primeira de nove reuniões com contrapartes cubanas.

Os funcionários norte-americanos não identificaram os cubanos com quem conversaram, mas os descreveram como funcionários do governo a quem o ditador cubano, Raúl Castro, concedeu poderes para negociar com os EUA.

O governo canadense não estava diretamente envolvido nas negociações, mas serviu de facilitador, da mesma forma que o governo de Omã, do outro lado do mundo, nas negociações secretas entre os EUA e o Irã.

Papa Francisco

No começo deste ano, outro poderoso mediador ingressaria vigorosamente no processo de reaproximação com Cuba: o papa Francisco.

O primeiro pontífice latino-americano mencionou a possibilidade de uma reaproximação com Cuba em uma conversa com Obama em março, quando Obama visitou o Vaticano. Depois, na metade do ano, ele enviou cartas a Obama e Castro instando-os a pôr fim às décadas de impasse.

Kerry, enquanto isso, conversou quatro vezes por telefone, no mesmo período, com o ministro do Exterior cubano Bruno Rodríguez.

Nas conversas, Gross era um dos assuntos abordados, disseram importantes funcionários do governo norte-americano, com Kerry advertindo os cubanos que, se qualquer coisa acontecesse ao homem de 65 anos natural de Maryland, as chances de melhora no relacionamento cubano com os EUA estariam liquidadas.

No Vaticano, neste trimestre, funcionários norte-americanos e cubanos trabalharam para finalizar o acordo que libertaria Gross e abriria caminho para um novo relacionamento entre Cuba e os EUA.

Diálogo

As discussões prosseguiram, culminando em uma conversa telefônica de 45 minutos na terça-feira (16) entre Obama e o presidente cubano Raúl Castro — o primeiro diálogo em nível presidencial entre os EUA e Cuba desde que Fidel, o irmão mais velho de Raúl, tomou o poder em 1959 e o embargo norte-americano contra Cuba começou, em 1961.

Uma vez mais, o processo apresentou notáveis semelhanças com o relaxamento nas tensões entre os EUA e o Irã, no ano passado. Obama e o presidente iraniano Hasan Rowhani conversaram pelo telefone, o que conduziu a um acordo nuclear histórico e as conversações mais engajadas entre os dois países desde a revolução islâmica de 1979.

Rhodes, Zuniga e alguns poucos assessores de Obama estavam com ele no Salão Oval quando o presidente conversou com o líder cubano.

A libertação de Gross, na quarta-feira, acoplada a uma troca de espiões entre os EUA e Cuba, um relaxamento das sanções comerciais e promessas mútuas de restaurar plenamente as relações diplomáticas entre os dois países romperam de modo inédito os mais de 50 anos de isolamento ou de tentativas de derrubada do governo de Fidel Castro ou de seu irmão Raúl por presidentes norte-americanos.

Quando Obama explicou ao país na quarta o novo caminho que deseja tomar com Cuba, Gross assistiu ao discurso na base Andrews da Força Aérea, em Maryland, onde acabava de chegar vindo de Cuba.

Kerry, cujo voo de retorno de uma viagem diplomática incluiu uma parada no Vaticano, estava com ele, e pousou na mesma pista poucos minutos do avião de Gross.


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