29/03/2024 - Edição 540

Eles em Nós

Autoexplicativo

Publicado em 16/12/2020 12:00 - Idelber Avelar

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O mapa da vacinação pelo mundo. Fonte: Organização Mundial de Saúde. Pesquisa: Brasil em Mapas. O mapa é autoexplicativo, suponho.

IMAGEM TOSCA

A reportagem do NYT sobre o Brasil está demolidora. A foto, mes amis, a foto. Que vergonha.

Pessoal não anglófono, joguem no Google Translate, vale a pena, sai razoável. Destaco três parágrafos:

"As countries rushed their preparations to inoculate citizens against the coronavirus, Brazil, with its world-renowned immunization program and a robust pharmaceutical manufacturing capacity, should have been at a significant advantage.

But political infighting, haphazard planning and a nascent anti-vaccine movement have left the nation, which has suffered the pandemic’s second-largest death toll, without a clear vaccination program. Its citizens now have no sense of when they may get relief from a virus that has brought the public health system to its knees and crushed the economy.

Soon after Covid-19 was first identified in the country in February, Brazil became an epicenter of the global health crisis. President Jair Bolsonaro dismissed scientific evidence, called the virus a 'measly' cold that did not warrant shutting down the region’s largest economy, and berated governors who imposed quarantine measures and business closures."

OSMAR, O HORRÍVEL

Osmar Terra deve ser o 2˚ pior ser humano já nascido no Rio Grande do Sul, logo depois de Médici.

A agência Aos Fatos fez uma pesquisa sobre parlamentares que disseminam mentiras sobre o coronavírus no Twitter. Entre eles, em primeiro lugar, está o MÉDICO Osmar Terra, responsável por pelo menos 104 mensagens com dados falsos sobre o vírus, publicadas entre março e dezembro.

Imaginem! Nem se tentássemos, conseguiríamos publicar cem mentiras sobre o vírus em menos de dez meses. Mas Osmar Terra conseguiu.

Sendo médico e tendo sido ministro, para ele não há desculpa: Osmar Terra é diretamente responsável por um número indeterminado de mortes. Tem sangue nas mãos, por ser o cretino e o mau caráter que é.

Como seria de se esperar, o ranking da mentira é liderado por parlamentares da base do governo.

DICA LITERÁRIA

Minha dica literária de hoje é um dos romances mais lidos de seu tempo, que curiosamente foi um best-seller durante um século inteiro até começar a cair no esquecimento.

“O monge”, de Matthew Gregory Lewis, foi publicado em 1796, quando o autor tinha 21 anos de idade, e gerou tanto escândalo que Lewis foi forçado a retirar uma série de palavras em uma edição posterior. É uma das obras-primas do horror gótico e ao longo dos anos foi reeditado em capas terroríficas, algumas das quais eu reproduzo abaixo.

“O monge” conta a história da desgraça de Ambrosio, um personagem que é referência de virtude e padre adorado em sua congregação, até que ele começa a sentir atração por Rosario, um jovem da igreja que logo se revela como Matilda, mulher, uma das primeiras Diadorins do romance.

A partir da confusão de gênero e do amor proibido, vão se sucedendo os acontecimentos típicos de um romance gótico: paixões, mortes, epidemias, peregrinações, envenenamentos, torturas, suplícios, incestos, assassinatos. Não para um minuto, é mais ou menos como a nossa sucessão de desgraças.

Eu sempre quis ler e achei que a pandemia era um bom momento. Acabei de devorá-lo ao longo das últimas horas. Há uma edição brasileira recente, que ainda deve estar em catálogo. É bastante longo e caótico mas, enfim, a vacina ainda demora um pouco, né?

Confiram “O monge”, é bastante esquisito para a sensibilidade de hoje, mas muito interessante.

BIJUTERIAS DA COROA

O Brasil acordou no último dia 16 com a notícia inacreditável (já nem sei por que ainda uso esse vocábulo, morto há tempos): a antiga joia da coroa do Itamaraty, que sempre foi, ele próprio, uma das joias da coroa das diplomacias do mundo, ela mesma, a embaixada do Brasil nos EUA, comandada por um olavista, forneceu a Brasília durante UM MÊS INTEIRO uma bateria de mentiras, fake news e fanfics de internet sobre as eleições americanas e sobre quem as havia vencido.

Por incrível que pareça, se você se informou sobre o pleito americano aqui, uma simples página de FB feita em um par de horas vagas matinais por um professor de literatura, você teve 1.000 vezes mais informação do que tinha Brasília, que era abastecida por sua embaixada em Washington. Não é absurdo isso?

Sei que já está todo mundo anestesiado ante a sucessão de absurdos, mas é importante não perder a conta.

Repetindo: a embaixada do Brasil em Washington, durante UM MÊS, inventou ou traficou lorotas sobre inexistentes fraudes no processo que elegeu o cara que vai ocupar a cadeira executiva mais poderosa do mundo. Se alguém que pensa acha que alguém que importa se esquece dessas coisas, é porque não conhece nada de relações internacionais, né. Perguntem à Profa. Deisy Ventura.

Já tive a honra de ter um ensaio meu, sobre Machado de Assis e a música, premiado em um concurso do Itamaraty [depois houve outros, sobre Lima, Rosa, Clarice etc. O primeiro foi sobre Machado]. Naquela feita, cheguei a transitar em círculos do Itamaraty e em círculos internacionais em que a diplomacia brasileira estava presente. É impressionante o respeito que ela comandava, sempre comandou: por sua qualificação, impressionante domínio das línguas, conhecimento de direito internacional, posição tradicionalmente não alinhada (nunca antiamericana nem subserviente aos EUA) e compromisso com a paz, os diplomatas do Brasil sempre foram tão admirados como seus jogadores de futebol e seus músicos.

A música vai bem, obrigado. O futebol respira por aparelhos. E os grandes diplomatas brasileiros estão escanteados, assistindo horrorizados ao Itamaraty ser tomado por um bando de malucos deusvultinhos que acham que estão reconquistando Jerusalém dos infiéis no século XIII. Transformaram o Brasil em chacota internacional.

Não basta ver queimados a Amazônia e o maior museu do país. Tinham que arruinar nossa imagem e nossa diplomacia também.

CORRETO

Está corretíssimo o Flávio Dino. "Termo de responsabilidade" para ser vacinado é mais um mecanismo bolsonarista de produção de morte. É uma excrescência que não faz o menor sentido jurídico.

Termo de responsabilidade você usa para situações experimentais: ser cobaia de uma vacina, por exemplo. A partir do momento em que a ANVISA liberou a vacina, o poder público é o responsável; é estapafúrdio exigir algo mais do indivíduo. Para isso existe a ANVISA, caceta!

O bolsonarismo é a incessante produção de morte, é incrível. Todos os dias eles produzem morte.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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