29/03/2024 - Edição 540

Eles em Nós

Hora de chutar o supremacista branco

Publicado em 28/10/2020 12:00 - Idelber Avelar

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Faltam quatro dias para que chutemos um psicopata mentiroso e supremacista branco para fora da Presidência dos EUA. A importância disso para o mundo é enorme e para o Brasil, como vocês sabem, é especial. As notícias são:

1. Não, as pesquisas não dizem agora o mesmo que diziam em 2016. As pesquisas de 16, nos estados-pêndulo, mostravam a boca do jacaré fechando. Ou seja, mostravam que, apesar da diferença no voto popular geral, do país inteiro, a vantagem em favor de Hillary nos estados decisivos estava diminuindo. Agora ela está aumentando em favor de Biden. Todas as nossas pesquisas de estados-pêndulo mostram a boca do jacaré abrindo.

2. As pesquisas de 2016 não “previram errado,” porque nenhuma pesquisa prevê nada. Uma pesquisa lhe oferece a fotografia de um momento e, justaposta a outras pesquisas anteriores ou posteriores, lhe oferece uma tendência. Em 2016, leu-se muito mal, nas comarcas progressistas, as curvas que importavam, que eram as curvas dos estados-pêndulo. A campanha arrogante de Hillary contribuiu a essa leitura. No fundo, as pesquisas não erraram, no voto nacional elas previram vitória de Hillary por 2-4 pontos, o que foi exatamente o que aconteceu.

3. Em 2020, o quadro é outro; há uma curva muito mais favorável e quase 70 milhões de americanos já votaram. Entre aqueles que estamos trabalhando por Biden-Harris no telefone, é visível que ninguém vai descansar até a noite do dia 03 de novembro. Não tem NINGUÉM aqui achando que já ganhou.

4. Mas é, sim, muito remota a possibilidade de que Trump vire o jogo na bola. O que pode acontecer é que nossa vitória seja dependente das cédulas do correio, ou seja, que o jogo seja parelho o suficiente para que Trump possa tentar chutar o tabuleiro e provocar violência. É uma possibilidade. A maneira de encolhê-la é ganhar de goleada.

5. É difícil fazer campanha para Biden, um velho fraco, com um histórico complicado, e ainda por cima gago. Mas a Vice-Presidente tem sido um alento. Sim, é sabido que Kamala Harris entrou à política como Procuradora ultra-punitivista, mas ela amadureceu muito desde então. Foi tecendo um perfil de estadista. Ela tem sido o destaque nos meus telefonemas.

BAGUNÇA DESORGANIZADA

Na inacreditável eleição do cargo executivo mais poderoso do mundo feita com regras de DCE vagabundo, a população de um estado importantíssimo, Minnesota, acordou ontem com a notícia — a cinco dias da eleição — de que um tribunal federal havia determinado que as cédulas já enviadas a eleitores tinham agora que SER RECEBIDAS até 03/11, e não tinham mais a garantia de ser contadas caso tivessem o CARIMBO do correio até 03/11, como era a compreensão até então e como está escrito na própria fucking cédula. Não é inacreditável?

Não estamos falando de pouca gente. 1,8 milhão de cédulas já viajaram pelo correio. Isso dá 50% do eleitorado do estado.

Hillary venceu Minnesota em 16, mas foi por um fio de cabelo. Além das vitórias esperadas nas cidades grandes (chamadas lá cidades gêmeas) de Minneapolis e Saint Paul, Obama havia vencido em 08 e 12 uma série de condados do sul e do oeste do estado que, em 16, foram para Trump.

Não me peçam previsões, mas só digo uma coisa: quem está tranquilo não está bem informado.

MELADO

Para quem quiser uma boa matéria sobre as iniciativas trumpistas de melar a eleição, recomendo esta de Eliza Griswold na New Yorker.

Resumo da ópera: a Pensilvânia é um de quatro estados decisivos que têm um governador democrata e um legislativo republicano. Ao longo do ano, Trump tem inventado desculpas para descartar votos, melar a eleição, criar confusão. Na Pensilvânia, isso inclui descartar votos que chegam pelo correio sem o selo do segundo envelope, por exemplo, norma que pode descartar até 2 milhões de votos nacionalmente.

Parte da estratégia usada foi desenvolvida na Flórida no ano 2000, em que apenas algumas centenas de votos separavam Gore e Bush no estado, e um exército de advogados e capangas deste último desceram no estado, foram desqualificando votos até atingir uma contagem parcial que o favorecia, e levaram o assunto até que a Suprema Corte proibisse mais recontagens, e Gore acabasse concedendo.

Dada a grande vantagem nos votos pelo correio, é possível que Trump comece a noite bem na frente. E aí quem sabe o que pode acontecer.

POPULISMO

Se você quiser uma aula sobre por que o populismo de extrema direita tem funcionado, é só ver os dois comícios de quinta (29) na Flórida, o do Trump em Tampa, o de Biden em Miami. A CNN, obviamente, só mostrava o do Biden, e para ver os dois justapostos tive que ir à Fox News.

Comício de Trump: multidão gigante aglomerada, todo mundo sem máscara (com exceção dos coitados da segurança e do serviço secreto). No palco, um palhaço entertainer, ridicularizando os adversários, fazendo piada atrás de piada, inventando uma realidade paralela em que a Covid acabou e os EUA são parabenizados no mundo todo pela sua gestão da pandemia, enfim, um showmício.

Comício de Biden: sem ninguém visível na tela, com um velhinho gaguejando, sofrendo ao longo de frases que tentam demonstrar que a realidade paralela criada pelo entertainer palhaço é mentira, o que dá à sua fala um inevitável tom deprê, em um momento em que já está todo mundo deprê. A agonia era tal que desliguei a TV depois de uns minutos.

Como em eleição sempre há algum candidato a patrulheiro, já adianto que estou lutando por votos para Joe Biden onde há votos – no telefone, não no meu Facebook. E vou votar nesse coitado terça-feira. Ao Facebook eu venho conversar, brincar, informar, e às vezes me informar.

E a informação de hoje é: não dá para tapar o sol com a peneira. Em termos de potência do jogo retórico, é um massacre. Se perdermos, vai ser por isso.

É a campanha eleitoral mais agônica da minha vida, que sofrimento.

LEGENDE. COMENTE. DIVIRTA-SE.

A PEDIDOS

A pedidos, coloquei em plataforma aberta, com links, a atualização de um post meu de uns tempos atrás com os 12 grandes jogos do futebol brasileiro dos anos 70. SEM CLUBISMO.

Copio abaixo um trecho, que é o ítem mais insólito, o número 6. Na sequência segue o link à publicação no Medium.

*****

6. Fluminense 1 (1) x (4) 1 Corinthians (campeonato brasileiro, 1976). Um jogo bastante ruim, parte dele disputado sob um temporal horroroso, vencido pelo Corinthians nos pênaltis, e importantíssimo pelo show da torcida. Eram as semifinais do campeonato brasileiro e o Corinthians vivia seu 22˚ ano sem título. A torcida carioca acordou para aquele jogo em ritmo carioca: levantar-se tarde, ir à praia, almoçar, só depois ir ao Maracanã. Quando a torcida do Flu começou a chegar, mais da metade do Maracanã já estava tomada por paulistas. A ESTUPEFAÇÃO de todos com a invasão corintiana é incrível de se ver. Cenas hilárias se multiplicaram: por exemplo, gente branquela com cara de paulista, sapatos e camisa preta na praia, levando baldes de água na cara para aguentar o calor. Um show, a maior invasão interestadual de uma torcida em toda a história. Há um especial sobre esse jogo com imagens do Canal 100 e narração de Osmar Santos. Se você tiver que assistir UMA coisa de futebol no Brasil, assista esse especial.

Leia outros artigos da coluna: Eles em Nós

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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